EXECUÇÃO NA PANDEMIA
Arrecadação privada de hospital se equipara à verba da saúde pública

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A Lei 11.382/2006 inseriu, no artigo 649,  inciso IX, do Código de Processo Civil (CPC), a previsão de impenhorabilidade absoluta dos ‘‘recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social’’.

Assim, hospital privado que recebe recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) ou de outra fonte com esta destinação, principalmente num ambiente de pandemia, não pode ter a sua conta bloqueada nos bancos para garantir o pagamento de dívidas com fornecedores.

A decisão é do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) e beneficiou, diretamente, o Hospital de Portão (distante 43km de Porto Alegre). Em setembro de 2021, o Hospital teve R$ 755,4 mil bloqueados, nos autos de uma execução extrajudicial, para ser forçado a pagar uma dívida contraída junto à RGE Sul Distribuidora de Energia.

A 2ª Vara Judicial da Comarca de Portão negou o desbloqueio integral dos valores, mantendo o bloqueio parcial do numerário. O juízo da Vara autorizou o desbloqueio de recursos provenientes, apenas, do Fundo Estadual de Saúde, pagos pelo Governo do Estado, e de convênios do SUS com o Município de Portão, que totalizavam R$ 584,2 mil. Este valor – fruto de recursos públicos – estaria coberto pela impenhorabilidade absoluta, nos termos do artigo 833, inciso IX, do CPC. A diferença, R$ 171,2 mil, permaneceu constrita judicialmente, por ser originária de verbas privadas, fruto de doações de particulares.

Agravo de instrumento

Em combate a desta decisão, o Hospital interpôs recurso de agravo de instrumento no TJ-RS. Em síntese, argumentou que acumulava prejuízo de quase R$ 380 mil, causado, principalmente, pelos efeitos da pandemia de Covid-19 – aumento do número de pacientes e dos preços dos insumos médico-hospitalares. Tanto que chegou a promover a campanha ‘‘Fundação Doa Covid’’, criando uma conta-corrente no Banco do Brasil, específica para arrecadar fundos.

O relator do recurso na 11ª Câmara Cível do TJ-RS, desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello, observou que o Hospital de Portão é uma instituição privada filantrópica, sem fins lucrativos, com 100% de atendimentos pelo SUS, conforme Portaria 3.6500/2020 do Ministério da Saúde. ‘‘Assim, é absolutamente certo que a executada-agravante, como instituição privada filantrópica, recebe recursos públicos para aplicação compulsória em serviços de saúde, de atendimento à população carente e, mais agora, de vitimização social pandêmica’’, ponderou.

Destinação específica

A seu ver, os recursos de origem privada também possuem destinação específica (saúde pública vinculada ao SUS e à pandemia de Covid-19), já que foram arrecadados em campanhas amplamente divulgadas nas mídias sociais, justamente para viabilizar a continuidade da prestação de serviços hospitalares à comunidade.

‘‘Assim, diante das circunstâncias peculiares do caso concreto, entendo que o interesse público coletivo prepondera sobre o interesse privado, razão pela qual assiste razão à agravante [hospital]’’, concluiu Mello na decisão monocrática.

Clique aqui para ler a decisão monocrática

Processo 155/1.17.0002386-0 (Comarca de Portão)

Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCOS

SOB NOVA DIREÇÃO
Emmanoel Pereira defende Justiça do Trabalho ajustada às transformações sociais

Imprensa TST

Construir diálogos, para firmar consensos, e defender os direitos trabalhistas das minorias, que permanecem em condições desvantajosas. Este o foco do discurso do novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho(CSJT), ministro Emmanoel Pereira, que tomou posse no dia 16 de fevereiro. Este foco, segundo o novo dirigente, visa a fortalecer as atribuições da Justiça do Trabalho.

Para o presidente do TST, o cumprimento da justiça social, à luz do trabalhismo, exige exercícios de autocrítica e participação no contexto dialógico com todos os setores da sociedade. Demanda, ainda, do magistrado, maturidade e humildade, “a não confundir poder com autoritarismo, consciência social com regalias de classe, tolerância com covardia, serenidade com indiferença em face das aflições dos jurisdicionados”.

“Pretendo colher soluções criativas para a redução da morosidade e dos custos crescentes da estrutura.” Foto: Imprensa TST

Dirigindo-se “aos céticos que insistem em questionar a magnitude da Justiça do Trabalho”, o ministro afirmou que, desde seu ingresso no TST, tem acompanhado a incansável batalha para o fortalecimento do seu desempenho em prol das relações de trabalho. Na sua avaliação, apesar das demonstrações de vitalidade e de presença no cenário público brasileiro, a Justiça do Trabalho vem sofrendo de uma progressiva perda de competência resultante de interpretações restritivas do artigo 114 da Constituição Federal, contrariando as expectativas suscitadas pela Reforma do Judiciário de 2004, que ampliou sua atuação para abranger outras formas de vínculo além da relação de emprego clássica.
Em relação a isso, o ministro, que se define como “um otimista”, acredita que seu papel na presidência do TST e do CSJT é estabelecer pontes e diálogos, “para que essa Justiça mereça a deferência das atribuições que lhe foram reservadas, tanto pelo constituinte de 1988, quanto pelo poder reformador de 2004”.

Inclusão e minorias
O fortalecimento das atribuições da Justiça do Trabalho, segundo Emmanoel Pereira, se reverterá no atendimento a mais setores do mundo do trabalho que necessitem da sua tutela jurisdicional. Ele citou, como exemplo, o combate ao trabalho escravo e ao trabalho infantil e a defesa do trabalho seguro, além da defesa dos direitos trabalhistas das minorias.
“Embora a palavra inclusão tenha se propalado nas discussões cotidianas, na prática não se corporificou em realidade para as vastas minorias sociais que abrigamos na nossa sociedade”, avalia o ministro. “Resta-nos transpor a retórica e abraçar uma Justiça inclusiva e aberta à diversidade, de forma a ajustar a competência da Justiça do Trabalho às transformações sociais e culturais, aproximando o Judiciário do verdadeiro e do justo”.
O olhar inclusivo diz respeito, entre outros aspectos, à defesa do trabalho decente para os jovens. “Como somos um país majoritariamente de jovens, destaco a importância do trabalho digno, arejado pelo empreendedorismo e pela inovação, percebido como esperança e despertar do senso de pertencimento à sociedade para essa parcela da população”, ressaltou.

Soluções criativas
Outra prioridade do presidente do TST e do CSJT é conciliar a efetividade e a celeridade da Justiça do Trabalho com a necessidade de economicidade no uso de recursos públicos. “Pretendo colher soluções criativas para a redução da morosidade e dos custos crescentes da estrutura, seja nas dimensões judiciária, administrativa ou legislativa que compõem o conjunto de nossas atribuições”, destacou.
Para o ministro, olhar a Justiça do Trabalho apenas sob o viés do seu custo e de sua arrecadação é ignorar os motivos de sua criação. “É ignorar sua especialidade das relações do trabalho, vínculos que demandam não apenas uma legislação específica, mas uma Justiça afeta a tais princípios”, afirmou. “Essa é uma Justiça comprometida com o amplo acesso do jurisdicionado, uma Justiça associada ao crescente alcance social dos processos conciliatórios”.
Formação de consensos
Em relação à criação de pontes e diálogos, o ministro considera que eles só são possíveis através da formação de consensos, “zona nem sempre explícita, em que realismo e moralismo eventualmente se confundem, interesses e valores se mesclam”. Emmanoel Pereira defende o “livre mercado de ideias” concebido pelo filósofo e economista John Stuart Mill. “Pontes e diálogos igualmente presumem conflitos, debates, formação de acordos, a preservação de um quadro de referências e manutenção das regras do jogo democrático – previamente debatidas e consentidas por todos”, destacou.

Homenagens
Nesse contexto, ele prestou homenagem à imprensa, por meio dos jornalistas presentes à solenidade, “olhos e ouvidos da nossa sociedade”. Ressaltou, ainda, as referências pessoais e institucionais que consolidaram a Justiça do Trabalho e seus segmentos de política judiciária, como as associações de magistrados e de servidores, a Procuradoria do Trabalho, a OAB e a liderança moderadora dos ministros do TST.
Emmanoel Pereira citou como exemplo a gestão da ministra Maria Cristina Peduzzi e dos ministros Vieira de Mello Filho e Aloysio Corrêa da Veiga e lembrou que, num momento pandêmico e de inédito isolamento social, eles conduziram o TST com altos índices de produtividade e garantiram o caráter ininterrupto da atividade judiciária, sem deixar de lado o respeito à saúde e à vida dos juízes, dos servidores e operadores da Justiça e de toda a coletividade.

Leia a íntegra do discurso.

AÇÃO REGRESSIVA TRABALHISTA
Construtora condenada a ressarcir INSS por culpa em acidente que matou funcionário

Imprensa JFRS

A 2ª Vara Federal de Canoas (RS) condenou uma construtora a ressarcir em 50% os valores pagos pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) à família de um funcionário falecido em acidente de trabalho. A culpa pelo acidente, que causou a morte do trabalhador, recaiu na empresa, que negligenciou a prevenção de acidente, e também no empregado, que ignorou medida básica de segurança.

A sentença, publicada na quarta-feira (9/2), é do juiz Murilo Brião da Silva. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Na ação regressiva contra o empregador, a autarquia narrou que, em dezembro de 2015, uma placa de concreto tombou, esmagando o funcionário da construtora. Afirmou que as causas estão relacionadas ao descumprimento de normas de segurança e saúde por parte da empresa, conforme consta no relatório de análise de acidentes elaborado pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Rio Grande do Sul. Em síntese, não havia barreiras de prevenção capazes de evitar a ocorrência do acidente – nem imateriais (avisos e medidas de capacitação) ou físicas (proteção adequada).

Em defesa, a construtora disse não ter culpa, apontando, como causa determinante do acidente, a conduta do próprio funcionário, que infringiu regras de segurança de trabalho ao desprezar treinamentos e desrespeitar o comando de evacuação da área. O homem teria retornado rapidamente ao local depois de ter saído, supostamente para buscar algum objeto.

Culpa concorrente

Ao analisar as provas anexadas aos autos, o juiz federal Murilo Brião da Silva pontuou que a culpa do empregador é verificada sob a ótica da responsabilização acidentária, que independente da responsabilização civil comum. Assim, deve-se observar “a presença de uma conduta patronal de desrespeito evidente às regras de segurança do trabalho, de sorte a evidenciar negligência diante do risco a que é submetido o empregado”.

“Em suma, em se constatando acidente de trabalho, aquele que, seja de forma exclusiva, seja de forma concorrente, contribuiu para o resultado incapacitante ou morte, deverá ressarcir os cofres do INSS, que, de forma prematura, teve de despender gastos decorrentes de benefício previdenciário em face de culpa de terceiro”, destacou. O magistrado sublinhou que o acidente relatado nos autos foi objeto de investigação pela Secretaria de Trabalho da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, que produziu o Relatório de Análise de Acidente de Trabalho. Logo, não há controvérsia sobre a ocorrência do evento e a causa imediata da morte do trabalhador.

Para o juiz, ficou claro que a empresa “agiu de forma negligente frente aos seus deveres legais no que se refere à redução dos riscos, à integridade física de seus empregados, uma vez que a prática do ato inseguro poderia ter sido obstada pela supervisão das atividades do empregado, assim como pela adoção de medidas de segurança”. Segundo ele, houve deficiências na Ordem de Serviço e treinamentos acerca do risco envolvido na atividade de movimentações de cargas, o que era essencial para garantir que as medidas de prevenção de acidentes fossem implementadas. Além disso, o arranjo físico era inadequado, já que não havia barreiras físicas, placa de sinalização ou outras formas de isolamento do local de movimentação das peças, conforme as fotos da área no dia do acidente.

Situação de risco

Segundo as provas, o funcionário colocou-se em situação de risco ao retornar ao local de movimentação das peças de concreto após ter sido avisado pelo operador da ponte rolante para deixar a área e ter ocorrido o acionamento do sinal sonoro. O juiz concluiu, então, que houve culpa concorrente no evento – tanto por parte da empresa, pela negligência na prevenção de acidente, quanto do trabalhador, que conscientemente ignorou medida básica de segurança.

Brião da Silva julgou parcialmente procedente a ação regressiva. Condenou a construtora a ressarcir 50% ao INSS dos valores pagos aos dependentes do segurado, bem como qualquer outro benefício previdenciário concedido em razão da morte do trabalhador, abrangendo as prestações vencidas e vincendas. (Com informações da Assessoria de Imprensa da Justiça Federal do RS)

Clique aqui para ler a sentença.

Processo 5011226-68.2020.4.04.7112/RS

INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
Cooperativas de crédito podem falir, decide a Terceira Turma do STJ

Imprensa STJ

​Ao considerar que a Lei 6.024/1974  a qual regula a liquidação extrajudicial de instituições financeiras –, por ser especial, prevalece sobre a Lei 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial e Falência), a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento de que as cooperativas de crédito podem ser submetidas a processo de falência, embora haja aparente contradição entre essas normas.

O colegiado, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial (RE) interposto pelo ex-administrador de uma cooperativa de crédito rural do interior gaúcho, cuja sentença de falência foi confirmada em segunda instância. O recorrente, que também é cooperado, alegou que as cooperativas de crédito não se sujeitariam à insolvência, pois o artigo 2º, inciso II, da Lei 11.101/2005, exclui expressamente essas entidades de sua incidência.

Equiparável à instituição financeira

Relator do recurso, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino explicou, inicialmente, que a cooperativa de crédito se equipara a uma instituição financeira pela atividade desenvolvida. Por isso, sujeita-se ao regime de liquidação especial estabelecido na Lei 6.024/1974.

No caso dos autos, o magistrado observou que, conforme o disposto no artigo 21, alínea b, da Lei 6.024/1974, o Banco Central (Bacen) autorizou a cooperativa a requerer autofalência, após ser apurado em liquidação extrajudicial que o ativo da entidade não seria suficiente para cobrir metade dos créditos quirografários, além de haver indícios de crimes falimentares.

Prevalência da lei especial

Acerca da alegação do recorrente, o ministro Sanseverino observou que, apesar de o artigo 2º, inciso II, da Lei 11.101/2005, excluir as cooperativas de crédito de seu âmbito de incidência, para parte da doutrina, tal restrição se refere somente ao regime de recuperação judicial – não ao regime de falência –, tendo em vista a possibilidade de a cooperativa de crédito requerer sua insolvência, de acordo com o artigo 21, alínea b, da Lei 6.024/1974.

Isso porque, explicou o ministro, as disposições da Lei 6.024/1974, que é lei especial, devem prevalecer sobre o conteúdo da Lei 11.101/2005, o qual deve ser aplicado de forma subsidiária. ‘‘Filio-me à corrente doutrinária que entende pela possibilidade de decretação da falência das cooperativas de crédito, tendo em vista a especialidade da Lei 6.024/1974, de modo que o enunciado normativo do artigo 2º, inciso II, da Lei 11.101/2005 exclui tão somente o regime de recuperação judicial’’, afirmou o magistrado. (Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ)

Clique aqui para ler o acórdão no REsp 1.878.653.

 

ÍNDIOS SEM VOZ
Justiça Federal do RS anula processo de licenciamento da Mina Guaíba

Imprensa JFRS

A participação da comunidade indígena é pré-requisito à validade do licenciamento de empreendimento que tem o potencial de afetar o modo de vida do povo originário. Como esta condicionante não foi observada, a 9ª Vara Federal de Porto Alegre declarou a nulidade do processo envolvendo a Mina Guaíba. A sentença, publicada no dia 8 de fevereiro, é da juíza Clarides Rahmeier. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região

A ação civil pública (ACP) foi movida pela Associação Indígena Poty Guarani, Associação Arayara de Educação e Cultura, Conselho de Articulação do Povo Guarani e Comunidade da Aldeia Guarani Guajayvi contra a Fundação Nacional do Índio (Funai), Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) e Copelmi Mineração. Os atores alegam que a pretensão do empreendimento é instalar nas margens do rio Jacuí, nos municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas, a maior mina a céu aberto de carvão do Brasil, com o objetivo de minerar um volume de 166 milhões de toneladas de carvão em 30 anos em contínua atividade.

Os autores sustentam que o projeto está na fase de licenciamento prévio junto à Fepam e que já foram realizadas quatro audiências públicas. Argumentam com a ausência de qualquer consulta prévia, livre e informada aos indígenas, especialmente os da Aldeia TeKoá- Guajayvi, localizada em Charqueadas, seja pelo órgão ambiental licenciador ou pelo empreendedor. Afirmam que mesmo que a Associação Indígena Poty Guarani tenha seus direitos amparados nos ordenamentos jurídicos nacional e internacional, eles foram completamente ignorados no Estudo de Impacto Ambienta (EIA) da Copelmi.

Pontuam, ainda, que os danos ambientais geram consequências graves nas formas de organização da comunidade indígena. A falta de preocupação quanto à sustentabilidade gerará prejuízos no uso do solo para atividades agrícolas, e a redução da fauna implicará novas readaptações nas atividades cotidianas. Além disso, os indígenas terão que conviver com explosões e abalos sísmicos diários, durante cerca de 30 anos, emissões de gases tóxicos e contaminantes na atmosfera, ressaltando que a comunidade mora a menos de 3km do local do empreendimento.

Defesas

Em sua defesa, a Copelmi afirma que os autores da ação fizeram alegações genéricas sobre a ocorrência de danos ambientais à comunidade indígena e que o pedido de nulidade do licenciamento é baseado exclusivamente na ausência de consulta prévia ao povo tradicional, o que poderia ser sanado. Sustenta que os danos apontados não mais existem, porque parte deles foram incorporados formalmente ao processo de licenciamento e que Funai já expediu Termo de Referência para a realização de Estudo do Componente Indígena (ECI).

A Fepam, por sua vez, disse que não se opõe à participação das associações indígenas interessadas no licenciamento ou em relação à elaboração do ECI.

Por fim, a Funai defende que não é órgão licenciador, mas responsável por implementar as políticas indigenistas no país. Destaca que não foi omissa, já que, quando tomou conhecimento, começou a agir em defesa da terra do Povo Guarani.

Julgamento

Em fevereiro de 2020, foi deferida liminar suspendendo o processo de licenciamento até a análise conclusiva da Funai do componente indígena. A juíza federal substituta Clarides Rahmeier sublinha que o embasamento jurídico adotado “se coaduna com os recentes julgados proferidos pelo Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer o direito da participação ativa das comunidades tradicionais em decisões que possam interferir em seu modo de vida. Com isso, objetiva-se que os povos originários sejam protagonistas na defesa de sua rica cultura”.

Segundo ela, a Constituição e a legislação impõem especial atenção aos anseios e necessidades das comunidades indígenas. Para que isso se concretize, é importante que todos os interessados sejam efetivamente ouvidos e essa participação seja levada em consideração na tomada de decisão que os afete. “Resumidamente, a participação da Comunidade Indígena é pré-requisito à validade do licenciamento de empreendimento que tem o potencial de afetar o modo de vida do povo originário. Não observada essa condicionante, mostra-se nulo todo o restante do processo de licenciamento ambiental, pois as minorias oneradas foram excluídas do processo decisório.”

Na sentença, a magistrada ressalta que o licenciamento do Projeto Mina Guaíba “já se encontra em fase avançada – inclusive com a confecção de EIA desconsiderando a existência da comunidade tribal -, também não houve a participação dos indígenas nas discussões, nem mesmo através de realização de consultas concomitantemente aos estudos iniciais”.

Ao finalizar a fundamentação, Rahmeier disse que o direito a consulta prévia, livre e informada deve ser observado, sempre que possível, de maneira concomitante às fases de licenciamento ambiental, para que o processo, desde a origem, conte com a efetiva participação da minoria potencialmente afetada. Como este requisito foi desconsiderado, ela julgou procedente a ação, declarando a nulidade do processo de licenciamento do empreendimento Mina Guaíba. (Assessoria de Imprensa da Justiça Federal do RS)

Clique aqui para ler a sentença.

ACP 5069057-47.2019.4.04.7100/RS