CUMULAÇÃO EM PI
Justiça Federal não pode julgar pedido exclusivo da competência da Justiça Estadual

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Ação com pedidos de nulidade de registro de marca e de abstenção de uso, por envolver o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), deve ser julgada na Justiça Comum Federal. Por isso, não pode ser cumulada com pedido de indenização decorrente desse uso, pois esse julgamento, específico, é da competência exclusiva da Justiça Comum Estadual.

Nesse diapasão, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve sentença que excluiu a Coty – fabricante de perfumes e cosméticos, sediada na França – do pólo passivo de um processo indenizatório sobre violação de propriedade intelectual (PI), ajuizado por um microempresário na 6ª Vara Federal de Porto Alegre.

‘‘A cumulação de pedidos somente é possível quando o mesmo juízo for competente para conhecer dos diferentes pedidos, conforme o art. 327, § 1º, do CPC. Como o pleito indenizatório não envolve o Inpi, não há competência da Justiça Federal’’, resumiu, na ementa do acórdão, o juiz federal convocado Alexandre Rossato da Silva Ávila, relator da apelação.

Uma ação, três pedidos

Na ação, ajuizada na 6ª Vara Federal de Poro Alegre, o microempresário Roberto Bichara Amin acionou o Inpi e a Coty Geneva S/A Versoix, objetivando: a anulação do registro da marca Bitufo Interdental HB, a determinação judicial de abstenção de uso e a condenação pelo uso não autorizado da marca ‘‘Interdental’’.

Alegou que é proprietário do registro da marca ‘‘Interdental’’ junto ao Inpi, cujo depósito foi realizado em 18 de julho de 1986. Afirmou que a Coty já teve negado registro desta marca, pela autarquia, em 2016. Assim, como as marcas possuem identidade e atingem o mesmo nicho de mercado, o registro da Coty deve ser anulado, nos termos dos artigos 124, inciso XIX (reprodução ou imitação de marca alheia registrada), 165 (nulidade do registro concedido) e 189 (crime por reprodução de marca registrada) da LPI.

A corré Coty apresentou contestação. Em preliminar, arguiu a incompetência do juízo e a impossibilidade de cumulação do pedido de indenização.  No mérito, concordou com o pedido da parte autora, de cancelar o próprio registro.

Sentença

Ao se pronunciar sobre a primeira preliminar arguida pela Coty, a juíza federal Daniela Cristina de Oliveira Pertile Victoria afirmou que a competência da Justiça Federal está prevista no artigo 109 da Constituição. Este, no parágrafo 2º, estabelece que ‘‘as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal’’. Tal possibilidade de escolha do local de ajuizamento das ações contra a União, por sua vez, é aplicável nas ações intentadas contra as autarquias federais – o caso do Inpi.

Quanto à segunda, reconheceu a cumulação, já que em um só processo há três ações contra dois réus diferentes e sujeitos a jurisdições diversas. ‘‘ Essa espécie de cumulação (cumulação de ações sujeitas à competência de juízos diversos) já é vedada expressamente pelo CPC/2015, no artigo 327, §1º, inciso II, quando ambos os pedidos são dirigidos contra o mesmo réu, com muito mais razão verifica-se essa vedação quando diante de réus distintos, como é o caso dos autos’’, complementou. Assim, julgou extinto o processo sem resolução do mérito em relação ao pedido de indenização contra a Coty.

Com relação ao mérito, pontuou que os demandados – Coty e Inpi – não se opõem ao cancelamento do registro da marca Bitufo Intredental HD, já que reconheceram a procedência do pedido. Com isso, no aspecto, a ação foi extinta com resolução de mérito.

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Ação anulatória 5085323-17.2016.4.04.7100/RS

Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCOS

 

 

 

MCDONALD’S EM SHOPPING
Prazo máximo de renovação compulsória de aluguel comercial é de cinco anos, reafirma STJ

Imprensa STJ

O prazo máximo para a renovação compulsória de aluguel comercial, previsto no artigo 51 da Lei 8.245/1991 (Lei do Inquilinato), é de cinco anos, ainda que o contrato inicial tenha duração superior. Assim, reafirmando a sua jurisprudência, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial (Resp) interposto pela franquia do McDonald’s no Praia de Belas Shopping, em Porto Alegre.

Para o colegiado, permitir que o inquilino possa obrigar o locador (no caso, o Condomínio do Shopping Praia de Belas), por meio de ação judicial, a renovar o contrato por prazo mais elevado, desestimula a celebração de contratos mais longos de locação comercial.

Segundo o processo, a rede de fast food pleiteou a renovação do aluguel de várias lojas no Praia de Belas nas mesmas condições do contrato original, que tinha duração de 12 anos e 11 meses. Porém, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), seguindo a jurisprudência do STJ, deferiu a renovação por mais cinco anos, apenas.

Ação renovatória não pode eternizar o contrato de locação comercial

No Resp interposto no STJ, a rede locatária alegou que essa limitação de tempo não está prevista na lei, pois o artigo 51 da Lei 8.245/1991 estabelece a renovação compulsória do contrato locatício comercial pelo mesmo período em que vigorou o último contrato.

O ministro Raul Araújo, relator do recurso, lembrou que, de acordo com a interpretação dessa norma pelo STJ, quando ela dispõe que o locatário tem direito de renovar o contrato pelo mesmo prazo do ajuste anterior, ela se refere ao prazo de cinco anos previsto em seu inciso II  do artigo 51 da referida lei, e não ao prazo do último contrato celebrado.

De acordo com precedente da Terceira Turma (REsp 1.323.410), destacado pelo magistrado, a ação renovatória tem a finalidade de proteger o comerciante de abusos do locador, que, anteriormente, exigia o pagamento de altos valores para a renovação do contrato. Segundo esse julgado, tal ação não pode ser usada para eternizar o contrato de locação, restringindo os direitos de propriedade do locador e violando a natureza consensual dessa espécie contratual.

Renovação ilimitada desestimularia contratos mais longos

Conforme o ministro Raul Araújo, apesar de a Quarta Turma não ter debatido esse tema, não há razão para deixar de acompanhar a orientação já consagrada pelo STJ.

‘‘De fato, possibilitar que a ação renovatória de aluguel comercial seja capaz de compelir o locador a renovar e manter a relação locatícia, quando já não mais possui interesse, por prazo superior ao razoável lapso temporal de cinco anos, certamente desestimularia os contratos de locação comercial mais longos’’, apontou o ministro.

Em seu voto pela manutenção do acórdão recorrido, do TJ-RS, o ministro-relator concluiu que, se atendidos os requisitos legais, esse prazo máximo de renovação compulsória é razoável, sobretudo considerando as alterações econômicas que ocorrem ao longo do tempo, bem como a possibilidade de a renovação ser requerida novamente pelo inquilino, ao final de cada quinquênio.

Leia o acórdão do REsp 1990552-RS

 

 

 

EMPREITADA GLOBAL
STJ admite penhora de bem familiar por dívida de construção da casa própria

Imprensa STJ

É possível penhorar bem de família para saldar débito originado de contrato de empreitada global celebrado para a construção do próprio imóvel.  A admissão foi feita pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso Especial (Resp) de Santa Catarina.

A discussão surgiu na cobrança de dívida originada de contrato firmado para a construção do imóvel de residência dos devedores. O tribunal de segunda instância autorizou a penhora, entendendo que o caso se enquadra na exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no artigo 3º, inciso II, da Lei 8.009/1990 (dívida relacionada ao financiamento).

Os devedores alegaram que, sendo exceção à proteção legal da moradia, o dispositivo deveria ser interpretado restritivamente, alcançando apenas o titular do crédito decorrente do financiamento; ou seja, o agente financeiro. Isso excluiria o empreiteiro que fez a obra e ficou de receber diretamente do proprietário.

Proteção especial do bem de família não é absoluta

Relatora do processo no STJ, a ministra Nancy Andrighi lembrou que o bem de família recebe especial proteção do ordenamento jurídico. No entanto, ela observou que a impenhorabilidade não é absoluta, de forma que a própria lei estabeleceu diversas exceções a essa proteção – entre elas, a hipótese em que a ação é movida para cobrança de dívida decorrente de financiamento para construção ou compra de imóvel.

A magistrada destacou que as hipóteses de exceção, por restringirem a ampla proteção conferida ao imóvel familiar, devem ser interpretadas de forma restritiva, conforme entendimento já firmado pela Terceira e pela Quarta Turma do STJ.

‘‘Não significa, todavia, que o julgador, no exercício de interpretação do texto, fica restrito à letra da lei. Ao interpretar a norma, incumbe ao intérprete identificar a mens legis; isto é, o que o legislador desejaria se estivesse vivenciando a situação analisada’’, afirmou.

Legislador se preocupou em evitar deturpação do objetivo da Lei 8.009/1990

No caso analisado, a relatora ponderou que há a peculiaridade de ser a dívida relativa a contrato de empreitada global, segundo o qual o empreiteiro se obriga a construir a obra e a fornecer os materiais.

Nancy Andrighi salientou que o STJ já se manifestou no sentido de que a exceção do artigo 3º, inciso II, da Lei 8.009/1990 se aplica à dívida oriunda do contrato de compra e venda do imóvel e à contraída para aquisição do terreno onde o devedor edificou, com recursos próprios, a casa que serve de residência da família.

Além disso, citou precedente em que a Quarta Turma, ao enfrentar questão semelhante (REsp 1.221.372), entendeu que a palavra ‘‘financiamento’’, inserida no referido inciso, não restringiu a impenhorabilidade às situações de compra ou construção com recursos de agentes financiadores.

‘‘É nítida a preocupação do legislador no sentido de impedir a deturpação do benefício legal, vindo a ser utilizado como artifício para viabilizar aquisição, melhoramento, uso, gozo e/ou disposição do bem de família sem nenhuma contrapartida, à custa de terceiros’’, declarou a ministra.

‘‘Portanto, a dívida relativa a contrato de empreitada global, porque viabiliza a construção do imóvel, está abrangida pela exceção prevista no artigo 3º, II, da Lei nº 8.009/1990’’, concluiu no voto.

Leia o acórdão do REsp 1.976.743-SC