PSICOFOBIA
TRT-4 anula acordo de demissão de médica diagnosticada com síndrome afetiva bipolar
Secom/TRT-4
Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.
Assim, à unanimidade, a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, RS) anulou acordo para encerramento de contrato de trabalho entre uma sociedade de assistência à saúde e uma médica que sofre de transtorno afetivo bipolar, em Gravataí (região metropolitana). A médica só não foi reintegrada ao emprego porque já havia passado num concurso público municipal.
Segundo os desembargadores, a empregada estava em um episódio de ansiedade e desconexão com a realidade quando assinou o documento de rescisão. Para os julgadores, o transtorno bipolar é uma doença que causa estigma e preconceito, o que justifica a caracterização da despedida como discriminatória e o pagamento de danos morais. A decisão da Turma modificou a sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara do Trabalho de Gravataí.
Rescisão sob coação
A médica trabalhou para a prestadora de serviços de saúde de novembro de 2011 a dezembro de 2018, quando assinou um acordo para a rescisão do contrato de trabalho. Segundo o processo, a empregada estaria apresentando sequelas de medicação, como sonolência e falta de atenção, e teria sido coagida a assinar o documento de rescisão por comum acordo.
Conforme a decisão do juiz de primeiro grau, não havia comprovação de que a assinatura tenha ocorrido de forma não voluntária pela médica. Segundo o magistrado, também não havia provas de que ela estivesse doente na ocasião da saída do emprego. Por fim, o juiz argumentou que depressão não é doença grave, que cause estigma ou preconceito, para configurar a despedida como discriminatória.
Recurso ordinário ao TRT-4
A médica recorreu da sentença, interpondo recurso ordinário no TRT-4. Para o relator do caso na 3ª Turma, desembargador Clóvis Fernando Schuch Santos, ao contrário do entendido pelo juiz de primeira instância, o transtorno afetivo bipolar causa estigma para a pessoa que sofre dessa doença.
‘‘A doutrina e jurisprudência colacionadas na decisão originária dizem respeito à depressão pura e simples, e não ao transtorno bipolar. Esta doença alterna episódios de depressão com os de mania. Logo, trata-se de uma condição muito mais complexa do que a depressão desacompanhada da bipolaridade’’, explicou o desembargador.
Para o relator, a empregadora tinha conhecimento das condições de saúde da empregada e deveria zelar para que não houvesse piora em seu estado emocional e psicológico. Porém, em vez de auxiliar na recuperação da trabalhadora, usou “esses sintomas para se desvencilhar dela com mais facilidade, inclusive com substancial economia no valor das verbas rescisórias pagas”, apontou Clóvis.
Com relação ao documento assinado pela médica, o desembargador concluiu, com base no depoimento da empregada, que na oportunidade ela ‘‘estava em um típico episódio de ansiedade e desconexão com a realidade’’.
Acordo de dispensa anulado
Nesses termos, a Turma declarou nulo o acordo e considerou a dispensa discriminatória. Em decorrência, a empregadora foi condenada pagar os salários que seriam devidos desde a despedida até a parte autora iniciar no emprego subsequente (Município de Canoas), bem como as diferenças de aviso prévio e multa de 40% do FGTS. Além disso, a empresa deverá indenizar a médica pelos danos morais sofridos. A indenização foi fixada no valor de R$ 25 mil.
Também participaram do julgamento a desembargadora Maria Madalena Telesca e o desembargador Gilberto Souza dos Santos. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Superior do Trabalho. (Redação Painel e Bárbara Frank/Secom TRT-4)
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0020207-06.2019.5.04.0232 (Gravataí-RS)