PARASITISMO MARCÁRIO
TJRS mantém condenação de empresa que imitou embalagens de concorrente no segmento de ração animal

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Divulgação Hercosul

Discussão que gira em torno da exclusividade de uso de marca comercial, sem envolver a declaração de nulidade do registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), é de competência da Justiça Comum estadual.

Assim, o Terceiro Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) julgou improcedente ação rescisória manejada pela Comercial de Alimentos Konzen, que pretendia desconstituir sentença e os acórdãos que decretaram a sua derrota num litígio comercial com a concorrente Hercosul Alimentos – ambas atuam no segmento de pet food e têm sede na cidade de Ivoti.

O colegiado, que reúne julgadores da 1ª Câmara Especial Cível e da 5ª e 6ª Câmaras Cíveis, não viu a tal ‘‘incompetência absoluta do juízo estadual’’, arguída pela Konzen, em função de pendência no Inpi. Com isso, enterrou a sua pretensão de derrubar as condenações no âmbito do TJRS.

Desembargador Gelson Stocker foi o relator
Foto: Imprensa TJRS

O desembargador-relator Gelson Rolim Stocker explicou que a ação rescisória consiste em medida excepcional, cuja finalidade é desconstituir decisão com trânsito em julgado, devendo se sujeitar às hipóteses elencadas no artigo 966 do Código de Processo Civil (CPC). Logo, não se presta como sucedâneo de recurso.

Citando entendimento consolidado no Recurso Especial Repetitivo 1.527.232/SP (Tema 950/STJ), pontuou que os litígios sobre trade dress (conjunto-imagem ou ‘‘vestimenta comercial’’) dos produtos, concorrência desleal e demandas afins, envolvendo particulares, são, inequivocamente, de competência da Justiça Comum estadual. Afinal, estas questões não afetam o interesse institucional da autarquia federal responsável pelos registros de propriedade industrial.

Concorrência desleal

No caso concreto, em apertadíssima síntese, os julgadores das duas instâncias da Justiça gaúcha se convenceram de que as embalagens, as cores e os nomes de alguns produtos da Konzen eram praticamente idênticos aos da Hercosul – autora da ação de abstenção de uso de marcas registradas. Concluíram que tal similaridade causa confusão na cabeça dos consumidores, caracterizando clara concorrência desleal.

Com base no laudo da perícia, a juíza Carolina Ertel Weirich, da Vara Judicial da Comarca de Ivoti, concedeu a liminar, por ver semelhanças dos produtos da ré – Free Dogs, Free Cats e Polux – com aqueles comercializados pela parte autora –Three Dogs, Three Cats e Apolo.

Embora grafados de forma diferente, termos como three dogs e three cats, foneticamente, em muito se assemelham a free dogs e free cats. Logo, a sonoridade das palavras pode vir a confundir os consumidores de ração animal.

‘‘Não há dúvida quanto à existência de perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, considerando os prejuízos que a parte autora vem sofrendo em razão da concorrência desleal da empresa ré, mormente se considerarmos que atua há muito tempo no mercado, com considerável investimento em publicidade e propaganda, impondo-se, portanto, o deferimento do pleito liminar neste ponto (uso das marcas)’’, justificou a juíza na decisão.

Ao proferir a sentença de mérito, em maio de 2016, o juiz Cristiano Vilhalba Flores condenou a Konzen a: se abster do uso das marcas Freedog e/ou Spirit Freedog, Freecat e/ou Spirit Freecat e Pólux; alterar suas embalagens; e a pagar à Hercosul, a título de danos morais, a quantia de R$ 50 mil, bem como danos materiais a título de lucros cessantes – a serem apurados em sede de liquidação de sentença.

A decisão de Flores foi chancelada pela 5ª Câmara Cível do TJRS, inclusive em juízo de retratação. Para os desembargadores, ainda que a ré detenha o registro da marca Spirit Freedog no Inpi, na prática, ela praticamente omite a expressão Spirit, que aparece bem acima, em fonte muito pequena. O mesmo ocorre com a apresentação da embalagem do Free Dog, feita de forma separada, exatamente como utilizada pela parte autora. Ou seja, há evidente intenção de imitar, pela ‘‘vestimenta comercial’’, o produto e a marca da autora.

‘‘Assim, foi mantida a sentença quanto à impossibilidade de utilização da marca Spirit Freedog, pois não está sendo apresentada na forma como registrada no Inpi pela parte ré. Ressalta-se, ainda, que a nulidade do registro está sendo discutida na seara da Justiça Federal, ainda sem decisão terminativa, o que não impede o reconhecimento de concorrência desleal na seara da Justiça Estadual’’, registra o acórdão, que teve como relator o desembargador Jorge Luiz Lopes do Canto.

Clique aqui para ler o acórdão da rescisória

Clique aqui para ler o acórdão de apelação

Clique aqui para ler a sentença

166/1.11.0001563-9 (Ivoti-RS)

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HOMOLOGAÇÃO PARCIAL
TST admite exclusão de cláusula de quitação geral de acordo extrajudicial 

Ilustração: Dooder/FreePik

O juiz do trabalho pode validar as cláusulas relativas a verbas rescisórias, sobre as quais não há controvérsia, e excluir as que considera ilegais, abusivas ou fraudulentas. Assim decidiu a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ao rejeitar recursos contra duas decisões em que as instâncias anteriores haviam homologado parcialmente acordos extrajudiciais, excluindo apenas as cláusulas que previam a quitação ampla do contrato de trabalho.

Acordo extrajudicial

O primeiro caso envolve a Volkswagen Participações Ltda. e uma contabilista de Moema (SP). Em razão do término da relação empregatícia, a empregadora e a empregada firmaram um acordo que previa o pagamento de uma indenização rescisória de R$ 78 mil complementar à rescisão em si, submetendo o documento à Justiça.

Quitação geral

Contudo, o juízo de primeiro grau afastou a cláusula que previa ‘‘a mais ampla, ilimitada, rasa, geral, completa, abrangente e irrevogável quitação’’ de todo o contrato de trabalho, inclusive eventuais reparações por danos morais e materiais, mantendo a validade das demais. Segundo a decisão, não é possível a quitação genérica de parcelas que não constem na petição de acordo.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) manteve a sentença, levando a empresa a recorrer ao TST. Seu argumento era o de que foram cumpridos todos os requisitos previstos tanto na CLT quanto no Código Civil.

Mero ‘‘carimbador’’

Ministro José Roberto Pimenta
Foto: Secom/TST

O relator do recurso na Corte, ministro José Roberto Pimenta, observou que o juiz do trabalho não pode ser transformado em um mero ‘‘carimbador’’ e aceitar automaticamente qualquer transação que lhe seja submetida. Segundo ele, o Direito do Trabalho envolve uma relação sabidamente assimétrica, desigual e potencialmente conflituosa. Por isso, cabe ao juízo verificar, por exemplo, se o trabalhador não está renunciando a direitos que não podem ser negociados ou se o ajuste cumpre a legislação tributária e previdenciária, e decidir pela exclusão somente desses pontos.

Proteção à parte mais vulnerável

O ministro assinalou, ainda, que as normas da legislação civil (aplicáveis subsidiariamente ao processo do trabalho) e a própria CLT devem dialogar, de forma a propiciar soluções mais justas, protegendo a parte mais vulnerável e dando um caráter humanista ao Direito.

Segundo o relator, a viabilidade de um acordo extrajudicial na esfera trabalhista não afasta nem desnatura a hipossuficiência característica da relação de emprego. ‘‘Muito pelo contrário, considerando que a grande parte dos acordos são firmados em virtude da extinção contratual, a situação de vulnerabilidade do empregado, muitas vezes, se agrava’’, ponderou.

Em relação aos acordos que vêm obtendo a homologação apenas parcial, o ministro observou que, em sua grande maioria, eles preveem o simples pagamento de parcelas rescisórias rotineiras. Não se trata, portanto, de direitos sobre os quais haja alguma dúvida, para o reconhecimento de concessões recíprocas.

Dupla penalização

Para o ministro José Roberto Pimenta, o acréscimo injustificado da cláusula de quitação geral é uma tentativa dos ex-empregadores de se valerem do desespero dos trabalhadores pela perda do emprego e da sua necessidade premente das verbas rescisórias incontroversamente devidas, obtendo, por via transversa, uma chancela do Judiciário.

A seu ver, não permitir ao juiz do trabalho que delibere pela homologação parcial do acordo, excluindo apenas essa cláusula, é penalizar o trabalhador duplamente, repassando-lhe o ônus do tempo da tramitação de um futuro processo para receber seus direitos. ‘‘Para o empregador, nesses casos, a demora seria indiferente (ou por vezes benéfica)’’, complementou no voto.

Livre convencimento

Ministro Godinho Delgado
Foto: Renato Araújo/Agência Brasil

No segundo caso, que trata da mesma matéria, a Turma rejeitou agravo da Fundação Educacional Monsenhor Messias (FEMM), de Sete Lagoas (MG), contra a exclusão da cláusula de quitação geral.

Segundo o ministro Mauricio Godinho Delgado, relator desse processo, é poder-dever do magistrado evitar vícios, atos simulados, fraudes ou excesso de lesividade a uma das partes.

‘‘O juiz deve firmar seu livre convencimento para, só então, homologar ou não a avença’’, assinalou. Ele também ressaltou ainda que, conforme a Súmula 418 do TST, a homologação não é um direito líquido e certo das partes.

Homologação total ou rejeição

No julgamento deste agravo, ficou vencido o ministro Alberto Balazeiro, para quem não é possível excluir apenas pontos do acordo. Embora contrário à cláusula de quitação geral, Balazeiro entende que o Judiciário não pode ‘‘pinçar’’ cláusulas mais favoráveis para a homologação parcial.

‘‘Diante de cláusula ilegal, o magistrado tem o dever de rejeitar a chancela judicial e não buscar carimbá-la com recortes estranhos à vontade das partes’’, concluiu. Com informações de Carmem Feijó e Lourdes Tavares/Secretaria de Comunicação (Secom) do TST

RR-1001542-04.2018.5.02.0720 

AIRR-10608-30.2020.5.03.0040