DANO EXISTENCIAL
TRT-RS manda Bimbo do Brasil pagar R$ 25 mil por submeter motorista vendedor a jornadas extenuantes

Causa dano moral existencial submeter um motorista entregador a jornadas de trabalho superiores a 13 horas diárias e mais de 75 horas semanais, com prejuízo dos intervalos intrajornada e interjornada, bem como dos feriados. Afinal, tal extenuante carga de trabalho, além de extrapolar o limite imposto no caput do artigo 59 da CLT, impacta negativamente a vida do trabalhador, restringindo muito o convívio familiar e social.

O reconhecimento da gravidade desta conduta levou a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) a aumentar o valor da reparação moral a ser paga a um motorista vendedor da Bimbo do Brasil Ltda (fabricante e distribuidor de comida industrializada, desde pães de forma até bolos e panetones).

Ao invés dos módicos R$ 2,8 mil, arbitrados pelo juízo da 4ª Vara do Trabalho de Gravataí (RS), o trabalhador receberá R$ 25 mil. A decisão foi unânime no colegiado.

A empresa interpôs recurso revista (RR) no Tribunal Superior do Trabalho (TST) para tentar reverter este aspecto da condenação – a reclamatória embute vários pedidos, a maioria deferidos.

Férias de 20 dias e intervalos exíguos

Conforme as provas produzidas, a sentença fixou a jornada entre 5h30min e 19h, de segunda a sexta-feira. Aos sábados, o término acontecia às 16h. Os intervalos para repouso e alimentação eram de 15 minutos por jornada. O preposto da empresa admitiu que não acontecia de os motoristas interromperem a rota, pois o trabalho só terminava depois de concluídas todas as visitas programadas para o dia. Diariamente, eram visitados de 15 a 20 clientes.

Des. Alexandre Corrêa da Cruz
Foto: Secom TRT-4

Além disso, alegando a falta de vendedores, a empresa marcava as férias dos motoristas com apenas 20 dias de duração. Não se tratava do abono, por livre escolha dos empregados, mas de uma imposição da empregadora. Apenas os feriados de Natal e Ano Novo eram respeitados. Testemunhas comprovaram as alegações do motorista reclamante no curso do processo.

Jornada extenuante configura dano moral existencial

As partes recorreram quanto a diferentes aspectos da sentença. O ex-empregado, para majorar o valor da indenização por dano moral existencial. Para o relator do acórdão, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, foi suficientemente evidenciada a jornada extenuante, sendo configurado o dano existencial.

“Essa circunstância, por evidente, restringe significativamente o seu convívio familiar e social, além de prejudicar direta e amplamente a sua saúde física e mental”, afirmou o magistrado no acórdão que reformou a sentença.

Os desembargadores Marçal Henri dos Santos Figueiredo e Tânia Regina Silva Reckziegel participaram do julgamento e se alinharam ao entendimento do relator. Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

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ATOrd 0020172-06.2020.5.04.0234 (Gravataí-RS)

VÍCIO RELEVADO
Citação por aplicativo de mensagem é válida se der ciência inequívoca da ação judicial

Reprodução Acrimesc

​Ainda que não exista previsão legal de citação por meio de aplicativo de mensagens, a comunicação por essa forma poderá ser considerada válida se cumprir a finalidade de dar ao destinatário ciência inequívoca sobre a ação judicial proposta contra ele.

Esse entendimento foi considerado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao anular uma citação realizada por meio do WhatsApp. O colegiado constatou que houve prejuízo para a ré, uma mãe que ficou revel em ação de destituição do poder familiar, na qual o pedido do Ministério Público do Rio de Janeiro foi julgado procedente.

No caso, o contato do oficial de Justiça e a mensagem contendo o mandado de citação e a contrafé foram enviados à filha da ré pelo aplicativo, não tendo havido prévia certificação sobre a identidade do destinatário. Além disso, o colegiado levou em conta que a pessoa a ser citada não sabia ler nem escrever.

A relatora do recurso na Turma, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que, diante da impossibilidade de compreensão do teor do mandado e da contrafé, o citando analfabeto se equipara ao citando incapaz, aplicando-se a regra do artigo 247, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC), que veda a citação por meio eletrônico ou por correio nessa hipótese.

‘‘É previsto investigar, em qualquer situação que envolva a formalidade dos atos processuais, se o desrespeito à forma prevista em lei sempre implica, necessariamente, nulidade ou se, ao revés, o ato praticado sem as formalidades legais porventura atingiu o seu objetivo (dar ciência inequívoca a respeito do ato que se pretende comunicar), ainda que realizado de maneira viciada, e pode eventualmente ser convalidado’’, disse a ministra Nancy Andrighi.

Citação por aplicativo de mensagem não tem nenhuma base ou autorização legal

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Lucas Pricken/STJ

Segundo a relatora, a possibilidade de intimações ou citações por intermédio de aplicativos de mensagens ou redes sociais – como WhatsApp, Facebook e Instagram – ganhou destaque após o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2017, aprovar o uso de ferramentas tecnológicas para a comunicação de atos processuais, e após ter editado, durante a pandemia da Covid-19, a Resolução 354/2020.

Nancy Andrighi observou que, desde então, proliferaram portarias, instruções normativas e regulamentações internas em comarcas e tribunais brasileiros, com diferentes procedimentos para a comunicação eletrônica, o que revela que a legislação atual não disciplina a matéria e, além disso, evidencia a necessidade de edição de normas federais que regulamentem essa questão, com regras isonômicas e seguras para todos.

Por não haver nenhuma base ou autorização legal, a ministra concluiu que a comunicação de atos processuais por aplicativos de mensagens possui vício em relação à forma – o que pode levar à sua anulação.

Vício formal não se sobrepõe à efetiva ciência da parte sobre a ação judicial

Contudo, a relatora destacou que, no âmbito da legislação processual civil, a regra é a liberdade de formas; a exceção é a necessidade de uma forma prevista em lei, e a inobservância de forma, ainda que grave, pode ser sempre relevada se o ato alcançar a sua finalidade.

‘‘Se a citação for realmente eficaz e cumprir a sua finalidade, que é dar ciência inequívoca acerca da ação judicial proposta, será válida a citação efetivada por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp, ainda que não tenha sido observada forma específica prevista em lei, pois, nessa hipótese, a forma não poderá se sobrepor à efetiva cientificação que indiscutivelmente ocorreu’’, declarou no voto. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Número do processo não divulgado em razão de segredo judicial.