APURAÇÃO DE HAVERES
Sócio retirante não tem direito a lucros futuros se não há previsão no contrato social

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Fachada da COHM em Santo Ângelo
Foto: Google Street View

Se o contrato social é omisso quanto à possibilidade de incluir lucro futuro, aplica-se, na dissolução parcial da sociedade empresarial, a regra geral válida para a apuração de haveres. Ou seja, o sócio retirante não receberá valor diverso do que receberia, como partilha, na dissolução total.

O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e resolve, de vez, o litígio surgido com a retirada de uma farmacêutica e bioquímica do quadro societário da COHM – Clínica de Oncologia e Hematologia das Missões Ltda, sediada em Santo Ângelo (RS). Dentre outros pedidos, a sócia retirante queria a inclusão de ‘‘lucros futuros’’ na apuração de haveres, que nada mais é do que o levantamento dos valores referentes à participação do sócio que se retira, ou é excluído, da sociedade.

A jurisprudência do colegiado, entretanto, caminha no sentido de excluir da apuração de haveres os lucros futuros, pois a pretensão não constitui direito decorrente da condição de sócio, porque tais valores hipotéticos não haviam ingressado no patrimônio da sociedade ao tempo da retirada.

Ministra Isabel Gallotti foi a relatora
Foto: Lucas Pricken/STJ

A relatora do recurso especial (REsp), ministra Maria Isabel Gallotti, explicou que o critério a ser observado é aquele previsto no contrato social. Ou, em caso de omissão, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução – com avaliação de bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, conforme os artigos 604, parágrafo 3º, e 606, ambos do Código de Processo Civil (CPC).

Ela afirmou que os sócios podem disciplinar, no contrato social, a forma como se efetivará o pagamento dos haveres ao sócio que se retira da sociedade. Afinal, nessa seara, prevalece o princípio da força obrigatória dos contratos, cujo fundamento é a autonomia da vontade – na inteligência do artigo 1.031 do Código Civil (CC).

‘‘Apesar de o contrato social poder dispor de forma diversa à previsão legal, a jurisprudência tem se firmado no sentido de não se admitir um mero levantamento contábil para apuração de haveres, devendo-se proceder a um balanço real, físico e econômico, mas não necessariamente que projete os lucros futuros da sociedade. Isso porque a base de cálculo dos haveres é o patrimônio da sociedade. Assim, aqueles valores que ainda não o haviam integrado não podem ser repartidos’’, definiu a relatora, derrubando a pretensão da sócia retirante.

O caso

Na origem, o juízo de primeiro grau da Justiça gaúcha julgou parcialmente procedente a ação de dissolução parcial de sociedade e apuração de haveres ajuizada pela bioquímica Lisiane Piltz, em face de sua retirada, cujo montante alcançou R$ 1,6 milhão.

Na fase de apelação, a Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) declarou a nulidade da sentença, estabelecendo critérios para a apuração de haveres, a ser feita na fase de liquidação, por meio de nova perícia contábil. E, o mais importante: excluiu a previsão de lucros futuros na apuração de haveres, entendendo que a sócia excluída não pode se beneficiar dos esforços que foram e serão despendidos pelos sócios remanescentes.

Descontente com a solução do TJRS, a ex-sócia aviou recurso especial (REsp) ao STJ, acusando a violação legal de vários dispositivos legais. Dentre esses, no ponto que interessa, citou os artigos 1.030 do CC e 606 do CPC, defendendo que a apuração deveria ter incluído os ‘‘lucros futuros’’.

Clique aqui para ler o acórdão do STJ

Clique aqui para ler o acórdão do TJRS

0279923-57.2018.8.21.7000 (Santo Ângelo-RS)

REsp 1904252/RS

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PRÁTICA HUMILHANTE
Empresa de teleatendimento é condenada por vincular remuneração a tempo de uso de banheiro

Restringir o uso do banheiro, ainda que de forma indireta, vinculando-o ao cálculo do prêmio denominado Programa de Incentivo Variável (PIV), viola o artigo 5º, inciso X, da Constituição – que protege a privacidade, a intimidade, a honra e a imagem do indivíduo –, causando dano moral no trabalhador.

Por isso, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a Vikstar Services Technology S.A. a pagar indenização de R$ 10 mil a uma teleatendente de Londrina (PR), vítima da política de vinculação ao pagamento do prêmio à frequência de idas ao banheiro. A empresa presta serviços para a Telefônica Brasil S/A. A decisão foi unânime.

Controle de pausas

Segundo a trabalhadora, a empresa adotava uma parcela denominada ‘‘Remuneração Variável (RV)’’ como complemento do salário. O valor era calculado com base na produtividade, e a RV do supervisor dependia diretamente do desempenho das pessoas subordinadas a ele. Assim, ele fazia tudo para forçá-las a atingir as metas, inclusive com práticas humilhantes, como o controle rígido das pausas para idas ao banheiro.

Incômodos

A Vikstar, em sua defesa, alegou que não restringia a utilização do banheiro, apenas solicitava que os empregados avisassem no sistema quando precisassem utilizá-lo. A providência seria necessária para que não fosse repassada nenhuma ligação ao operador na sua ausência.

Para a empresa, nenhum ambiente de trabalho está livre de desentendimentos, mas a caracterização do dano moral depende de mais elementos do que ‘‘simples incômodos’’.

Produção 

O juízo da 3ª Vara do Trabalho de Londrina e o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) rejeitaram o pedido de indenização. Segundo o TRT, não ficou demonstrado que as pausas para banheiro influenciassem negativamente o cálculo da remuneração variável ou que correspondessem a algum desconto.

Ministro Dezena da Silva foi o relator
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

De acordo com a decisão, a exigência do cumprimento de metas e a resposta do empregado aos anseios do empregador e sua cobrança são normais no mercado de trabalho, ‘‘exceto quando os limites são extrapolados, o que não se afigurou no caso’’.

Inadequados e reprováveis

Mas, para o relator do recurso da teleatendente, ministro Dezena da Silva, a matéria já tem jurisprudência consolidada no TST no sentido de que esses procedimentos são inadequados e reprováveis. O mecanismo, segundo o relator, visa a restringir o uso dos banheiros, pois induz a trabalhadora a negligenciar suas necessidades fisiológicas, sob pena de ver reduzida sua remuneração.

Silva lembrou que essa conduta contraria as disposições do anexo II da Norma Regulamentadora (NR) 17 do Ministério do Trabalho, dirigido especificamente a quem trabalha em teleatendimento ou telemarketing. Redação Painel de Riscos com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

RR-679-07.2021.5.09.0513