INIDONEIDADE MORAL
Diretor de corretora sem reputação ilibada não pode ser reconduzido ao cargo, decide TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Ter reputação ilibada é condição essencial para exercer cargo de direção em instituições financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (Bacen), como exige o inciso I do artigo 2º da Resolução Bacen 2012. Assim, mesmo que o candidato ao cargo tenha sido absolvido em algum processo, por falta de provas, nada impede que o Bacen avalie subjetivamente se preenche ou não os requisitos postos na Resolução.

Com este entendimento, a 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve sentença que confirmou decisão do Bacen de impedir a recondução de Nabi Kemmel Mellem ao cargo de diretor da Dourada Corretora de Câmbio Ltda, sediada em Curitiba. Nabi foi diretor da sua Corretora por 46 anos e estava pleiteando a recondução, que precisa do aval do Bacen.

‘‘O conceito de reputação ilibada pressupõe idoneidade moral e, embora indeterminado, possui densidade mínima a permitir sua avaliação pela autoridade administrativa, que considerou o requisito não atendido, tendo em vista a mera existência de processo penal e de processo administrativo contra o réu, ambos em tramitação à época da eleição para o cargo a que se candidatou o autor’’, resumiu a relatora da apelação, juíza federal convocada Ana Beatriz Palumbo.

Ação anulatória

Nabi Kemmel Mellem ajuizou ação judicial para anular o ato administrativo do Banco Central do Brasil (Bacen) que indeferiu a sua recondução ao cargo de diretor da Dourada Corretora de Câmbio Ltda sob o argumento de não possuir reputação ilibada, como exige a Resolução 4.122/2012.

É que Mellem, à época do pedido, respondia à ação penal pelo cometimento, em tese, de crime contra o Sistema Financeiro Nacional e lavagem de dinheiro, bem como a processo administrativo no Bacen, no qual recebeu a pena de inabilitação para o exercício de função em instituição financeira.

Juíza convocada Giovanna Mayer foi a relatora
Foto: Reprodução Youtube

Citado na ação, o Bacen defendeu a legalidade do ato administrativo, argumentando que o autor não possui a necessária reputação ilibada para exercer o cargo. Destacou que o impedimento para o seu exercício não tem natureza de pena. Acrescentou, ainda, que a absolvição penal por insuficiência de provas não confere a certeza de sua inocência, sendo o que basta para afetar a confiabilidade necessária para operar no sistema financeiro.

Sentença improcedente

O pedido de tutela antecipada foi negado pelo juízo da 5ª Vara Federal de Curitiba, decisão mantida em julgamento de agravo de instrumento pelo TRF-4.

Em análise de mérito, a Vara julgou improcedente o pedido, por entender que a falta de reputação ilibada do autor não se relaciona propriamente a sua condenação no processo criminal, ou na falta de definitividade da decisão que lhe aplicou a pena de inabilitação, mas à existência destes processos em si.

‘‘Seguindo esse raciocínio, e considerando que, como ali exposto, o bom funcionamento do Sistema Financeiro Nacional está calcado em um ‘ambiente de confiança’, parece-me, de fato, que a compreensão do Bacen acerca da rigidez que deve ser dada à conceituação de ‘reputação ilibada’ atende a um interesse maior, que não pode ser menosprezado em prestígio ao interesse particular do autor, ou de sua corretora de câmbio – ainda que estes, por óbvio, sejam também dignos de proteção estatal quando não conflitem com o interesse público’’, escreveu na sentença a juíza federal Giovanna Mayer.

Apelação ao TRF-4

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação no TRF-4, pleiteando a reforma da sentença. De relevante, alegou que restou absolvido em duas instâncias da Justiça Federal na ação penal 0005038-20.2005.4.04.7000. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), inclusive, deixou de julgar o recurso especial (REsp) apresentado pelo Ministério Público Federal (MPF-PR) em face do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal, declarando extinta a sua punibilidade. Essa ação transitou em julgado em 27 de março de 2018.

Quanto ao processo administrativo instaurado contra si, disse que, em fevereiro de 2018, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional julgou improcedente o recurso de ofício do Bacen, mantendo a decisão de primeiro grau que absolveu a Dourada Corretora de Câmbio Ltda e Rafael Augusto Formighieri Mellem. Em outras palavras, o Conselho julgou procedente o recurso administrativo, absolvendo-o e, com isso, afastando a pena de inabilitação.

Assim, sustentou que se encontra definitivamente absolvido, tanto na esfera penal quanto na administrativa, e o só fato de ter respondido a ambos os processos não afasta sua condição de possuidor de reputação ilibada.

Por fim, reiterou que a aplicação da Resolução se deu de forma retroativa, modificando situação estável, já que exercia o cargo de diretor há 46 anos, em flagrante ofensa aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Pediu a ilegalidade da decisão do Bacen que indeferiu a sua recondução ao cargo, proferida em 2017, e a procedência da ação anulatória.

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5035295-20.2017.4.04.7000 (Curitiba)

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AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Justiça Federal manda limpar área de sambaqui prejudicada por cultivo de Pinus em Tavares (RS)

Localização do sambaqui em Tavares (RS)

A legislação ambiental brasileira (Lei 6.938/81) é clara e direta: o poluidor, tendo culpa ou não, é obrigado a reparar os danos que sua atividade causa ao meio ambiente ou a terceiros.

Verificada essa responsabilidade, a 9ª Vara Federal de Porto Alegre condenou a Agroindustrial Sul Pinus Ltda, localizada no município de Tavares (RS), a limpar uma área de sambaqui, protegida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

A sentença condenatória, publicada no dia 3 de novembro, foi proferida pelo juiz federal Bruno Brum Ribas.

Sítio arqueológico

O Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul (MPF-RS) ingressou com ação civil pública (ACP) contra a madeireira, objetivando a proteção e a conservação de um sítio arqueológico. O autor narrou que a integridade de dois sambaquis estaria em risco pelo avanço da espécie exótica de árvore Pinus e pela circulação livre de animais, pessoas e veículos pelo sítio. Argumentou que, mesmo após a identificação da madeireira como a responsável pelo plantio das árvores Pinus, nenhuma medida foi tomada.

A empresa alegou a sua ilegitimidade passiva, uma vez que o sambaqui referido se encontra em propriedade da União, cabendo a esta a responsabilidade de conservação da área.

A madeireira também argumentou que, se entendesse que a plantação de Pinus ameaçava os sambaquis, o órgão ambiental deveria ter estabelecido restrições, mas não determinar, agora, que a empresa assuma a responsabilidade do sítio arqueológico.

Responsabilidade objetiva da madeireira

Ao analisar os documentos juntados no caso, o juiz identificou que ‘‘sambaqui’’ pode ser definido como uma elevação ou colina criada pelos habitantes pré-históricos como resultado da acumulação de conchas e ossos e utilizado para moradia e rituais.

O magistrado observou que a legislação prevê que a responsabilidade de reparação por dano ambiental recai sobre o infrator: ‘‘O poluidor é obrigado a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade, independentemente da existência de culpa (Lei 6.938/81, art.14, § 1º). Poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental’’.

A partir dos relatórios técnicos anexados aos autos, Ribas verificou que, apesar dos cultivos de Pinus não incidirem sobre a área do sambaqui, a proximidade provoca interferência no sítio arqueológico, tornando necessário o manejo da plantação com a remoção de futuras mudas. Dessa maneira, ficou constatada a responsabilidade objetiva da empresa.

O juiz condenou a madeireira a efetuar a remoção das árvores próximas ao sambaqui, a realizar a limpeza da área e o cercamento e a sinalização do sítio arqueológico, seguindo a orientação técnica do Iphan.

Da sentença, cabe recurso ao Tribunal Regional federal da 4ª Região (TRF-4). Com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secos) da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.

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ACP 5047285-33.2016.4.04.7100 (Porto Alegre)