EQUIPARAÇÃO A CONSUMIDORES
TRF-4 barra ação do MPF que queria representar vítimas do acidente da Chapecoense

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Reprodução internet

O Ministério Público não é parte legítima para representar as famílias afetadas pelo trágico acidente aéreo ocorrido na Colômbia que ceifou a vida da delegação da Associação Chapecoense de Futebol (ACF) e dos demais convidados no fatídico dia 28 de novembro de 2016.

A conclusão é da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao acolher recurso da Tokio Marine Seguradora S. A., alvo de uma ação civil pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público Federal de Santa Catarina (MPF-SC), que se arvorou como substituto processual das vítimas – na qualidade de ‘‘consumidores por equiparação’’ – para cobrar os prejuízos decorrentes das condutas omissivas dos responsáveis pelo acidente.

O relator do recurso, desembargador Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, explicou que o MP tem legitimidade ativa para defender interesses individuais homogêneos, mesmo que disponíveis e divisíveis, via ACP, desde que a relevância social objetiva do bem jurídico tutelado transcenda os interesses apenas das partes litigantes.

No caso dos autos, disse que o conjunto dos interessados caracteriza um coletivo, um grupo específico – passageiros de avião acidentado –, mas não a coletividade como um todo. É que as vítimas sobreviventes, familiares e sucessores das vítimas falecidas, jornalistas e tripulantes do trágico acidente, sozinhos, podem promover o resguardo de seus direitos. Ou seja, as vítimas não dependem do MPF para buscar os seus direitos na seara da responsabilidade civil.

‘‘Reforça esse entendimento o fato de que já houve composição amigável com parte dos acidentados e/ou seus familiares. Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento, determinando a extinção do processo sem resolução de mérito, face à ilegitimidade ativa do MPF (ausência de interesses individuais homogêneos revestidos de relevância social a serem tutelados), forte nos arts. 17, 18 e 485, VI, do CPC’’, decretou o desembargador no acórdão do agravo de instrumento.

Em sede de embargos de declaração, entretanto, Aurvalle retificou a parte dispositiva do acórdão, excluindo a determinação de ‘‘extinção do processo sem resolução de mérito’’. Assim, com os efeitos infringentes do provimento dos embargos, na prática, o processo volta à 2ª Vara Federal de Chapecó (SC) para análise de eventual cabimento da substituição no pólo ativo do processo, bem como quais os atos processuais a serem aproveitados, em caso afirmativo.

Clique aqui para ler o acórdão do agravo

Clique aqui para ler o acórdão dos embargos

5007886-74.2019.4.04.7202 (Chapecó-SC)

 

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br

CONTRATO DE INTERNAÇÃO
Cuidadora que internou patrão no hospital Albert Einstein não terá de pagar dívida, diz STJ

Reprodução ICTQ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) isentou uma cuidadora da obrigação de pagar as despesas de internação de seu empregador, que faleceu no hospital Albert Einstein, em São Paulo. Embora ela tenha assinado os termos de responsabilidade e de assunção de dívida, para que o patrão pudesse ser internado, o colegiado entendeu que houve vício de consentimento na contratação do serviço e que o hospital falhou em seu dever de informá-la sobre as obrigações que estava assumindo.

De acordo com o processo, ao acompanhar o patrão ao hospital, a cuidadora acabou assinando, em nome próprio, os documentos exigidos para viabilizar a internação. Após a morte do paciente, o hospital ajuizou ação para cobrar as despesas tanto do espólio quanto da cuidadora.

Em primeira instância, a ação foi julgada procedente em relação ao espólio do empregador e improcedente em relação à cuidadora. A sentença, contudo, foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), sob o fundamento de que os documentos apresentados comprovavam a contratação e não demonstravam a existência de vício de vontade.

Cuidadora não teria assinado se soubesse das consequências

Ministro Moura Ribeiro foi o relator
Foto: Flickr/STJ

O ministro Moura Ribeiro, relator do caso no STJ, observou que, conforme previsto no artigo 138 do Código Civil, os negócios jurídicos são anuláveis quando as declarações de vontade decorrem de erro substancial que poderia ser percebido por qualquer pessoa de percepção normal, consideradas as circunstâncias do negócio.

Dessa forma, segundo o relator, para que um negócio seja considerado válido, deve ser avaliada a real intenção da pessoa; ou seja, se houve a manifestação livre e consciente de seu consentimento quanto aos aspectos essenciais do negócio, em respeito à boa-fé objetiva e ao princípio da confiança.

‘‘É incontroverso que a cuidadora assinou a documentação hospitalar, mas não como contratante. Sua vontade era apenas cumprir as funções de acompanhante do empregador, que se encontrava em grave estado de saúde, de forma a viabilizar sua internação e os atendimentos médicos. Não tinha ela a ciência de que assumiria os custos pela contratação. Agiu, portanto, em erro, pois é claro que, se soubesse das consequências oriundas da documentação exigida pelo hospital, certamente esse negócio não teria ocorrido’’, afirmou.

Empregada apenas transmitiu a vontade do empregador

O ministro destacou que a cuidadora acabou assinando a documentação em seu próprio nome, mas sua real intenção era transmitir a vontade de seu empregador – o verdadeiro beneficiário da contratação com o hospital.

Para Moura Ribeiro, é cabível a aplicação da teoria da substituição, segundo a qual o empregado, no exercício de suas funções, sucede o empregador e atua como extensão de sua manifestação de vontade.

‘‘Não faz sentido nenhum uma empregada assumir encargos financeiros em decorrência de serviços prestados em favor de seu empregador. Ela não se beneficiou dos serviços hospitalares, não buscou a contratação para si, mas na qualidade de substituta do empregador, o verdadeiro contratante e beneficiário dos serviços prestados pelo hospital’’, disse o relator.

Hospital tinha o dever de dar informação de forma clara e adequada

O ministro ressaltou ainda não ter sido comprovado que o hospital tenha cumprido seu dever de prestar informações à cuidadora quanto às consequências jurídicas de assinar aqueles documentos.

Moura Ribeiro explicou que é ônus do fornecedor a demonstração de ter promovido adequada e clara informação sobre seus produtos e serviços, bem como acerca dos riscos envolvidos, sob pena de lhe ser atribuída a responsabilidade pela inexatidão no exercício da autonomia da vontade por parte de seus consumidores.

‘‘O hospital faltou claramente com seu dever de informação qualificada, especialmente considerando que a cuidadora era uma terceira pessoa, sem nenhuma relação de parentesco com o paciente, e, mais, ali estava como mera empregada, sem nenhum interesse pessoal na referida contratação, salvo a humanidade inerente a qualquer pessoa’’, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.908.549