DOENÇA ESTIGMATIZANTE
Dispensa de motorista com transtorno afetivo bipolar é considerada discriminatória pelo TST 

Reprodução Martinspsiquiatria.Com.Br

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tomou como discriminatória a dispensa de um motorista carreteiro da Rumo Malha Sul S.A. diagnosticado com transtorno afetivo bipolar. Também reconheceu o direito dele à reparação pelo prejuízo extrapatrimonial.

O valor da indenização não foi definido pelo colegiado do TST, que determinou o retorno dos autos à 1ª Vara do Trabalho de Curitiba para que prossiga no julgamento e arbitre quanto o trabalhador deve receber a este título.

Afastamentos

Contratado em 2012 e dispensado em 2013, o motorista carreteiro afirmou, no processo, que estava inapto para o trabalho na data da dispensa. Alegou que a empresa tinha conhecimento dos sucessivos afastamentos previdenciários e afirmou que a dispensa ocorreu enquanto ele aguardava a decisão judicial sobre o restabelecimento do último benefício previdenciário.

Em seguida, narrou, o auxílio-doença foi restabelecido de forma retroativa a 1º de abril de 2013; ou seja, data anterior à rescisão contratual. Além da nulidade da dispensa, ele pediu indenização por danos morais, argumentando que a dispensa foi discriminatória, decorrente de sofrer de transtorno afetivo bipolar.

Dispensa nula

Ao julgar o caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) declarou a nulidade da dispensa, mas rejeitou o pedido de indenização. Conforme o TRT, o restabelecimento do benefício previdenciário implica reconhecimento de que, no momento da dispensa, em 9 de setembro de 2013, o contrato de trabalho encontrava-se suspenso, ‘‘não sendo possível efetuar a sua rescisão enquanto perdurar o período de licença’’.

Quanto à indenização, entendeu serem inaplicáveis a Lei 9.029/1995 e a Súmula 443 do TST, que presume discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito, sendo o ato inválido e com o empregado tendo direito à reintegração no emprego. Para o TRT, a enfermidade que acomete o trabalhador (transtorno afetivo bipolar) não se enquadraria como ‘‘doença grave que suscite estigma ou preconceito’’ e, assim, não poderia ser presumida a dispensa discriminatória. No caso, segundo o Tribunal Regional, não houve ilegalidade por parte da empregadora, e caberia ao trabalhador demonstrar que a rescisão contratual foi motivada pela doença psiquiátrica.

Doença, estigma e preconceito

Ministro Agra Belmonte foi o relator
Foto: Secom/TST

Com entendimento diverso do TRT, o relator do recurso de revista do motorista ao TST, ministro Agra Belmonte, destacou que não se sustenta a tese defendida no acórdão regional de que os transtornos psiquiátricos não provocam estigma e preconceito, pois essa percepção ‘‘encontra-se absolutamente desconectada da ciência e da realidade social’’.

Na avaliação do ministro-relator, é difícil escapar da presunção de que o rompimento unilateral do vínculo empregatício ‘‘teve por motivação a intenção da empregadora de não contar em seus quadros com trabalhador suscetível a essa enfermidade’’.

Segundo Agra Belmonte, mesmo sendo direito do empregador rescindir unilateralmente o contrato de trabalho, ‘‘tal prerrogativa não deve se sobrepor a todo o acervo constitucional e legal construído, democraticamente, com o intuito de salvaguardar os conceitos de igualdade, de solidariedade, de função social do trabalho, de dignidade da pessoa humana’’, assinalou. Isso, principalmente, diante do contexto histórico atual, em que ‘‘a adoção de políticas afirmativas de inclusão de grupos minoritários, inclusive dos portadores de necessidades especiais e de doenças graves e/ou estigmatizantes, floresce na população brasileira’’.

Condutas discriminatórias

O ministro citou também precedentes do TST de casos análogos que, embora não versem especificamente da situação examinada, tratam do caráter estigmatizante das doenças psiquiátricas. Mais ainda, salientou a jurisprudência atual de que as condutas discriminatórias descritas no artigo 1º da Lei 9.029/1995 constituem ‘‘elenco meramente exemplificativo’’, notadamente pelo fato de a Lei 13.146/2015 inserir a expressão ‘‘entre outros’’ na redação original daquele dispositivo.

A Sétima Turma do TST, considerando que a averiguação da situação atual do trabalhador e a verificação de que a viabilidade de sua reintegração aos quadros da empresa escapa ao papel da instância extraordinária, determinou o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem.

O relator assinalou também que, embora tenha sido reconhecida a existência do dano moral, a ausência de detalhamento fático no acórdão regional acerca da extensão da ofensa aos direitos da personalidade ‘‘recomenda que o magistrado de primeiro grau proceda ao arbitramento do quantum devido ao trabalhador’’.

A decisão foi unânime, mas foram apresentados recursos, ainda não julgados. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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ARR-184-88.2014.5.09.0001 

DIREITO DOS DEFICIENTES
Servidor celetista com filho autista consegue redução de 50% da jornada de trabalho em São Paulo

A ausência de lei específica não pode impedir a redução da jornada de trabalhador que precisa atender filho autista. Neste caso, o Direito Administrativo cede lugar à interpretação sistemática do ordenamento, que se inicia na Constituição, passa pela Convenção Internacional de Proteção das Pessoas com Deficiência e desemboca no artigo 98, parágrafos 2º e 3º, da Lei 8.212/91 – de aplicação subsidiária.

Na esteira deste entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) determinou que a Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) reduza em 50% a jornada de um servidor celetista, sem prejuízo da remuneração nem necessidade de compensação, para que possa acompanhar o filho diagnosticado com transtorno do espectro autista (TEA) em consultas e tratamentos médicos.

A medida vale enquanto comprovada a necessidade, exigindo-se apenas prova de vida anual da criança.

A decisão do segundo grau da Justiça do Trabalho modifica sentença da 1ª Vara do Trabalho de Franco da Rocha (SP), que indeferiu o pedido com base no princípio da legalidade, previsto no Direito Administrativo, concluindo que não havia base legal para autorizar a diminuição das horas de trabalho.

A negativa em primeiro grau também se deu sob a alegação de que não se trata de pai solo, que a escala 2×2 do homem permitia tais cuidados com o filho e que os acompanhamentos feitos não provocaram sanções administrativas ao profissional.

Segundo a juíza-relatora do acórdão no TRT-SP, Eliane Aparecida da Silva Pedroso, o caso envolve ainda o diagnóstico de epilepsias fármaco-resistentes e é complexo o suficiente para que a análise considere também as convenções internacionais ratificadas pelo Brasil (como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência), a Constituição da República e as leis ordinárias, hierarquicamente. Cita, por fim, jurisprudência recente envolvendo o tema.

A magistrada alerta que a lei não exige que o pai ou a mãe seja solo para ter direito à jornada reduzida, tampouco obriga que a jornada diária seja de oito horas nem condiciona o deferimento da redução à probabilidade ou não de punições administrativas.

‘‘A lei não faz nenhuma restrição para os pais de filhos com deficiência e, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo, muito menos para adotar entendimento que acabe por prejudicar aquele a quem o preceito visa a proteger’’, afirma a julgadora.

Caso a Fundação Casa descumpra o determinado pela Justiça do Trabalho, pagará multa diária de R$ 1 mil, a ser revertida em favor de entidades de amparo à criança com transtorno do espectro autista. Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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ATOrd 1001030-08.2022.5.02.0291(Franco da Rocha-SP)