DIREITOS PATRIMONIAIS
MPT não pode pedir anulação de acordo que envolva interesses privados, decide TST

O Ministério Público do Trabalho (MPT) não tem legitimidade para propor a anulação de acordo extrajudicial que trate de direitos patrimoniais passíveis de negociação, decidiu a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Para o colegiado, não cabe ao MPT atuar como defensor de interesses puramente privados, ainda que eventualmente possa haver alguma espécie de fraude no acordo.

Demissão coletiva na pandemia

O caso julgado diz respeito a um acordo por meio do qual um funileiro da Viação Motta Ltda., de Campo Grande (MS), havia aderido a uma demissão coletiva em razão da pandemia da covid-19, em maio de 2020. Após a homologação da transação pelo juízo da 2ª Vara do Trabalho local, o MPT apresentou uma ação rescisória para anulá-lo. O argumento era o de que a advogada que havia representado o empregado e dado quitação geral das verbas rescisórias fora contratada pela própria empresa.

Acordo unilateral

O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT-24) julgou procedente a ação rescisória, por entender que o acordo fora formulado unilateralmente pela empresa, sem que o empregado fosse representado por um advogado que defendesse seus interesses. A empresa, então, recorreu ao TST.

Ministro Douglas Alencar foi o relator
Foto: Felipe Sampaio/TST

Sem base para contestar

O ministro Douglas Alencar Rodrigues, relator do recurso no TST, observou que, mesmo que haja possíveis problemas, isso não deve prevalecer sobre o interesse dos envolvidos no acordo de rescisão durante a pandemia. Na sua avaliação, se o próprio funileiro concordou com os termos acertados sem objeções, o MPT não tem base para contestar a sua homologação.

Interesses privados

Outro aspecto considerado pelo relator é que o acordo envolve direitos patrimoniais que podem ser objeto de negociação. A eventual comprovação de que a advogada, combinada com a empresa, tivesse enganado o empregado teria efeitos cíveis, mas não legitimaria a atuação do MPT, ‘‘que não pode atuar como defensor de interesses puramente privados, ligados a direitos patrimoniais disponíveis’’.

Além disso, Douglas Alencar destacou a possibilidade de um resultado menos favorável ao trabalhador caso o acordo fosse anulado e a questão fosse submetida a julgamento.

Ficaram vencidos a desembargadora convocada Margareth Rodrigues Costa e o ministro Lelio Bentes Corrêa. Com informações do técnico judiciário Bruno Vilar, compiladas pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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ROT-24302-07.2020.5.24.0000

RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Prova de regularidade fiscal continua dispensada nos casos anteriores à Lei 14.112/20

Arte: Dunamis Gestão e Contabilidade

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso da Fazenda Nacional contra decisão do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) que, confirmando a sentença de primeiro grau, dispensou a apresentação de certidões de regularidade fiscal para a homologação de um plano de recuperação judicial, bem como para a renovação de incentivos fiscais.

De acordo com o colegiado, a partir da vigência da Lei 14.112/2020, tornou-se necessário apresentar as certidões de regularidade fiscal como requisito para a homologação do plano de recuperação judicial, nos termos dos artigos 57 da Lei 11.101/2005 e 191-A do Código Tributário Nacional (CTN). No entanto, para os processos anteriores – como o caso em julgamento –, as certidões continuam sendo dispensáveis.

Um grupo empresarial teve seu pedido de recuperação deferido pelo juízo de primeiro grau, sendo dispensado da apresentação de certidões de regularidade fiscal para a homologação do plano. A Fazenda Nacional contestou a dispensa, mas o TJPE entendeu que a apresentação das certidões não era um requisito indispensável para a concessão da recuperação.

Em recurso especial (REsp) aviado no STJ, a Fazenda Nacional alegou que a homologação do plano de recuperação não poderia prescindir da apresentação das certidões de regularidade fiscal por parte da empresa recuperanda.

Ministro Antonio Carlos Ferreira foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

Inovações trazidas pela Lei 14.112/2020 mudaram entendimento sobre a matéria

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso, comentou que, até a edição da Lei 14.112/2020, exigir prova de quitação de todo o passivo tributário para o acesso ao procedimento recuperacional tornaria absolutamente inócuo o instituto legal, pois as dívidas fiscais atingem normalmente valores altos, cujo pagamento costuma ser impossível para as empresas em situação de crise econômico-financeira.

Contudo, segundo o magistrado, a Lei 14.112/2020 trouxe diversas medidas para facilitar a reorganização da empresa recuperanda no tocante aos débitos tributários – entre elas, o parcelamento por dez anos.

O ministro apontou que, se a decisão que determinar a comprovação da regularidade fiscal não for atendida, a solução compatível com a disciplina legal em vigor atualmente não é a convolação da recuperação em falência. Em vez disso, deve-se suspender o processo, com a consequente descontinuidade dos efeitos favoráveis à empresa, como a suspensão das execuções contra ela.

Em processos anteriores à Lei 14.112/2020, aplica-se a jurisprudência antiga

Porém, disse o relator, nos processos anteriores à vigência da Lei 14.112/2020, deve ser aplicado o entendimento jurisprudencial da época, que não admitia a exigência de comprovação da regularidade fiscal. É o que decorre do princípio tempus regit actum (artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, e artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

Antonio Carlos Ferreira lembrou que o artigo 52, inciso II, da Lei 11.101/2005, em sua redação original, estabelecia que o juiz, ao deferir o processamento da recuperação, deveria determinar a dispensa da apresentação de certidões negativas para que a empresa pudesse exercer suas atividades, ‘‘exceto para contratação com o poder público ou para recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios’’.

Segundo o ministro, naquele contexto legislativo, a jurisprudência do STJ se orientou no sentido de ‘‘mitigar o rigor da restrição imposta pela norma, dispensando, inclusive, a apresentação de certidões para a contratação com o poder público ou para o recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, a fim de possibilitar a preservação da unidade econômica’’. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 1955325