IMPRECISÃO TÉCNICA
Ação para buscar patrimônio de sócio de empresa falida é incidental, não autônoma, diz STJ
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o pedido para que o patrimônio pessoal do sócio seja alcançado na falência tem natureza processual de incidente, e não de ação autônoma. Desse modo, o ato judicial de primeiro grau que soluciona a questão é uma decisão interlocutória, e o recurso cabível para impugná-lo é o agravo de instrumento.
Na origem, foi apresentado nos autos da ação de falência de uma construtora de Porto Alegre o pedido de extensão dos efeitos da quebra da personalidade jurídica para a pessoa física do sócio. O juízo, ao julgar o pedido improcedente, tratou a pretensão como ‘‘ação de responsabilidade’’ e chamou o seu próprio pronunciamento de ‘‘sentença’’.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) não conheceu da apelação interposta por entender que se tratava de um incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Assim, o recurso cabível contra a decisão seria o agravo de instrumento.
Para a corte gaúcha, o princípio da fungibilidade recursal (que permite à Justiça, em certos casos, receber um recurso errado como se fosse o correto) não seria aplicável no caso, porque teria havido erro grosseiro na interposição de apelação para impugnar uma decisão interlocutória.
Ação de responsabilização de sócio não se confunde com incidente de desconsideração
A relatora do recurso especial (REsp) no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a ação de responsabilização de sócios é demanda autônoma que segue o disposto no artigo 82 da Lei 11.101/2005. Segundo ela, esse procedimento tem como objetivo ressarcir a sociedade falida em razão de prática dos próprios sócios ou administradores e é decidido por ato judicial que tem a natureza de sentença, sendo cabível o recurso de apelação.
A ministra enfatizou que a ação autônoma de responsabilização não deve ser confundida com o caso em análise, que trata, na verdade, de incidente de desconsideração da personalidade jurídica –, instituto incluído na Lei de Falências em 2019, por meio do artigo 82-A, com o objetivo de responsabilizar pessoalmente o sócio pelas dívidas da falida.
A relatora lembrou que, quando o instituto da desconsideração ainda não havia sido integrado ao texto legislativo, o STJ já entendia que o patrimônio dos sócios poderia ser atingido, de forma incidental, nas hipóteses de fraude, abusos, desvios, entre outras, e em tais casos não era necessário o ajuizamento de ação autônoma, bastando um requerimento nos autos da falência.
De acordo com a ministra, tanto nos casos de desconsideração da personalidade jurídica quanto nos incidentes admitidos anteriormente pela jurisprudência do STJ, o recurso cabível é o agravo de instrumento, porque se trata de decisões interlocutórias, conforme o artigo 1.015, inciso IV, do Código de Processo Civil (CPC).
Imprecisão técnica justifica aplicação do princípio da fungibilidade
Ao determinar o processamento do recurso interposto em segunda instância, a ministra reconheceu que o comportamento do juízo ensejou dúvida objetiva quanto à natureza do ato judicial impugnado.
Segundo explicou, a imprecisão técnica do ato judicial – por exemplo, ao dizer que se tratava de uma ‘‘sentença’’ – afasta a configuração de erro grosseiro da parte recorrente e possibilita a aplicação do princípio da fungibilidade recursal para permitir a análise do recurso pelo tribunal de origem. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.