RISCO DO NEGÓCIO
Bancário que cursou MBA Executivo às expensas do banco se livra de ressarci-lo após demissão por justa causa

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Não tem valor legal o contrato de patrocínio educacional que prevê o reembolso de mensalidades pagas pelo empregador ao final do curso de aprimoramento profissional oferecido ao empregado. Afinal, o empregador tem interesse na evolução do empregado – mas este não pode bancar os riscos do negócio, ainda mais engessado num contrato de adesão.

A conclusão é da Quinta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1, Rio de Janeiro) ao prestigiar sentença que impediu o Banco Bradesco de cobrar 75% das despesas do ‘‘Curso de MBA Executivo em Negócios Bancários’’ de um empregado que acabou demitido por justa causa após 18 anos de contrato de trabalho.

Desembargadora Márcia Campos foi a relatora
Foto: Secom /TRT-1

A relatora do recurso ordinário no Regional, desembargadora Márcia Regina Leal Campos, tal como o juízo de primeiro grau, disse que na época da realização do curso o bancário não havia celebrado nenhum contrato com o banco – o que só viria a ocorrer meses mais tarde. Tanto que, no espaço de duração do curso (outubro/2019 a abril/2021), as despesas foram inteiramente bancadas pelo empregador, sem qualquer ônus para o empregado.

‘‘E não poderia ser diferente. Isso porque o interesse na realização do curso era do empregador, que obteria um aprimoramento em sua gestão, evidentemente voltada ao lucro do negócio. Aliás, a capacitação do empregado é utilidade derivada da atividade econômica do empregador (art. 458, §2º, II, da CLT) e se insere no risco do negócio, de modo que não pode ser transferida ao empregado’’, cravou no acórdão.

Para a relatora, contrato é modalidade de negócio jurídico que visa regular situação futura, de modo que as partes conhecem, de antemão, os direitos e obrigações que lhes são afetos. No caso dos autos, a formalização do contrato de patrocínio ocorreu três meses depois de findo o curso, sendo que o autor a ele aderiu em agosto de 2021, quando já passados quatro meses do término do curso.

‘‘A pactuação de condições visando regular situação pretérita e já ultimada é por demais desarrazoada, ainda mais quando se está diante de um contrato de adesão, em que um dos contratantes (empregado) não detém autonomia da vontade e lhes são atribuídas condições e obrigações pecuniárias não previamente ajustadas. Trata-se, a toda evidência, de alteração prejudicial ao obreiro, não admitida no ordenamento jurídico trabalhista, de modo que não pode ser validada, ainda que não tenha havido vício de consentimento por parte do ex-empregado’’, fulminou a desembargadora-relatora no acórdão.

O banco tentou levar a reapreciação do caso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), mas o corregedor regional do TRT-1, desembargador Marcelo Augusto Souto de Oliveira, negou seguimento ao recurso de revista (RR) na fase de admissibilidade. O mesmo ocorreu logo em seguida no âmbito do TST, quando o ministro Aloysio Corrêa da Veiga negou provimento ao agravo de instrumento interposto para derrubar a decisão que barrou o RR no Regional.

Ação de cobrança

Na ação de cobrança ajuizada contra o ex-empregado na 4ª Vara do Trabalho de Campos dos Goytacazes (RJ), o banco alegou que a cláusula 4.7 do contrato de patrocínio educacional prevê, em caso de demissão por justa causa, que o empregado deve restituir 75% do valor do curso – desde que a rescisão trabalhista tenha ocorrido 12 meses após a sua conclusão.

O juiz do trabalho Luís Guilherme Bonin, mesmo reconhecendo a revelia do réu, julgou improcedente o pedido de condenação ao pagamento do valor a título de patrocínio educacional. A revelia ocorre quando o réu não apresenta defesa, não comparece ao processo ou não responde às alegações do autor da ação, mesmo tendo sido citado. Neste caso, o juiz pode presumir que as alegações do autor são verdadeiras.

Na fundamentação, o julgador observou que o contrato de patrocínio foi assinado em 30 de agosto de 2021, quatro meses após a conclusão do MBA, que ocorreu em 29 de abril de 2021. Destacou que a cláusula quinta, que trata da vigência, estabeleceu que os efeitos do contrato retroagem a 1º de outubro de 2019. Contudo – advertiu –, o contrato não pode regular ‘‘situações pretéritas’’ em prejuízo do trabalhador, que é a parte vulnerável na relação trabalhista.

‘‘Além disso, chama a atenção do juízo a ausência dos comprovantes de pagamento de mensalidade nos autos, assim como a ausência de informações quanto à razão pela qual foi aplicada a pena máxima de justa causa ao empregado, já que também não consta informações sobre punições anteriores’’, agregou o julgador na sentença de improcedência.

Clique aqui para ler a decisão que denegou o agravo no TST

Clique aqui para ler a decisão que barrou o recurso de revista

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ATOrd 0100009-36.2023.5.01.0284 (Campos do Goytacazes-RJ)

 

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