MARCADOR DE GÊNERO
Empresa é condenada por dispensar mulheres e contratar homens em seu lugar
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a Resgate Treinamentos Ltda., de Parauapebas (PA), por dispensar todas as 11 técnicas de enfermagem mulheres de seu quadro funcional e contratar homens em seu lugar. A empresa deverá pagar R$ 5 mil de indenização a seis dessas trabalhadoras, que recorreram à Justiça sustentando serem vítimas de discriminação de gênero.
Homens fizeram curso, e mulheres foram demitidas
Na ação reclamatória, as técnicas de enfermagem disseram que foram demitidas em junho de 2016 ‘‘pelo simples fato de serem mulheres’’ e substituídas por homens. Segundo seu relato, a empresa submeteu todos os técnicos de enfermagem homens a um treinamento de bombeiro civil e os promoveu, contratando 19 novos empregados para substituí-las.
Elas também sustentaram que os homens sabiam o que aconteceria, e elas não. Diante do boato sobre a substituição, os colegas davam indiretas, como: ‘‘o que você ainda está fazendo aqui?’’; ‘‘cuidado, que os novos técnicos estão chegando!’’; e ‘‘não foi demitida ainda?’’.
Em sua defesa, a empresa alegou que é prestadora de serviços e que uma mudança de contrato exigiu a contratação de empregados que pudessem acumular as funções de bombeiro civil e de técnico de enfermagem. Argumentou, ainda, que no mesmo período também dispensou homens.
Para instâncias anteriores, empresa exerceu seu poder diretivo
O juízo de primeiro grau negou o pedido de indenização. De acordo com a sentença, o empregador tinha duas opções, dentro de sua discricionariedade: oferecer formação aos atuais empregados ou renovar seu quadro.
‘‘Esta segunda opção, com menores custos, não retrata dispensa discriminatória, pois o empresário está buscando preservar a continuidade da atividade’’, concluiu o juiz sentenciante.
A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT-8, Pará e Amapá), por entender que não há previsão legal expressa de proporcionalidade na dispensa de homens e mulheres. Ainda de acordo com o TRT, a empresa não está obrigada a oferecer cursos às empregadas.
No recurso de revista (RR) aviado no TST, as trabalhadoras argumentaram que a prestadora de serviços demitiu todas as 11 mulheres do seu quadro, enquanto, dos 42 homens, apenas três foram dispensados.
Segundo as reclamantes, a empresa não optou por buscar pessoas mais capacitadas a exercer o maior número de funções. Em vez disso, capacitou por conta própria os homens que havia na empresa e ainda outros 19 contratados em substituição a elas, ‘‘sem qualquer outro critério além do sexo’’.
Dispensa teve inequívoco marcador de gênero
Contextualizando o caso de acordo com o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a relatora, ministra Kátia Arruda, concluiu que a dispensa teve um inequívoco marcador de gênero.
‘‘A busca pelo melhor quadro de pessoal possível, com pessoas que possam acumular funções, não poderia incluir as mulheres?’’, questionou. ‘‘E se a obtenção do curso de bombeiro civil era imprescindível para manter o emprego, por que a empresa o ofertou quase que exclusivamente aos homens? E por que, mesmo oferecendo o curso a duas mulheres, nenhuma permaneceu no emprego?’’
A relatora assinalou que a Constituição Federal proíbe diferenciações no trabalho ‘‘por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil’’. No mesmo sentido, a Lei 9.029/1995 busca coibir práticas discriminatórias em matéria de trabalho, enquanto a CLT, ao listar práticas que constituem discriminação contra a mulher (artigo 373-A), destaca a utilização do sexo como fator motivador para dispensa ou variável determinante para fins de formação profissional.
Outro fundamento de seu voto foi a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, que combate a discriminação em matéria de emprego e profissão. O conceito de discriminação, segundo ela, inclui a discriminação indireta, que decorre de um dispositivo, prática ou critério aparentemente neutro, mas que, quando aplicado, acarreta uma desvantagem velada.
A decisão foi unânime. Com informações de Carmem Feijó, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.