SUCESSÃO TRABALHISTA
Tabeliã que coagiu empregados a entrar na Justiça contra antecessor não reverte condenação em danos morais coletivos

A tabeliã responsável pelo Cartório do Terceiro Tabelionato de Notas de Goiânia, Ana Maria Félix de Sousa Longo, vai ter mesmo de pagar indenização de R$ 500 mil a título de danos morais coletivos. Ela pressionou os empregados do cartório a ajuizarem ações trabalhistas contra o tabelião antecessor, para se livrar do passivo trabalhista.

O último recurso contra a condenação foi rejeitado pela Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que considerou o valor da indenização compatível com a gravidade da conduta praticada.

Ações contra o titular anterior eram condição para recontratação

O Ministério Público do Trabalho de Goiás (MPT-GO), em 2014, recebeu denúncias de que, ao assumir a titularidade do cartório, a tabeliã estaria exigindo que os empregados pedissem demissão e entrassem na Justiça contra o antecessor como condição para serem recontratados.

A intenção seria se livrar de eventuais dívidas do titular anterior. De acordo com as denúncias, ela chegava a indicar qual advogado os trabalhadores deveriam procurar para ajuizar essas ações.

Na apuração do caso, o MPT obteve o áudio de uma reunião no cartório em que ela, ‘‘em alto e bom som’’, impunha essa condição para a recontratação. Entre outras manifestações, ela dizia: ‘‘não adianta, se não entrou na Justiça, não tem conversa; eu tô falando desde o primeiro dia’’. Havia ainda relatos de perseguição e condutas desrespeitosas e humilhantes.

Em sua defesa, a tabeliã negou essa versão dos fatos e sustentou que não tinha nenhuma relação ou obrigação para com os empregados contratados pelo antigo titular, depois de ter assumido o cargo por aprovação em concurso público.

‘‘Poderia muito bem ter recebido o acervo (os livros e fichas dos registros) e montado a serventia em outro local e com outros empregados’’, afirmou na peça de defesa.

Coação ficou comprovada

O juízo de primeiro grau julgou a ação improcedente, explicando que a sucessão trabalhista – situação em que as obrigações de uma empresa passam para outra, quando há mudança de propriedade ou controle – não se aplica aos cartórios.

O motivo é que a mudança da titularidade não tem natureza comercial, mas se dá por delegação do poder público, sem relação entre o antecessor e o sucessor. Também entendeu que não ficou comprovada a coação de empregados.

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) reformou a sentença, levando em conta que somente foram recontratados os empregados que, por coação, ajuizaram ação trabalhista contra o ex-tabelião, o que reforça a tese do assédio moral. Também foi constatado que todas as ações, à exceção de uma, foram ajuizadas pela advogada indicada pela tabeliã.

Para o TRT, a conduta configura dano moral social aos empregados do cartório. Nesse caso, a indenização não tem nada a ver com o fato de não haver sucessão trabalhista, porque o dano decorreu de condutas praticadas pela nova tabeliã ao assumir a titularidade.

Valor foi compatível com a gravidade dos fatos

Ao recorrer ao TST, a tabeliã questionou o valor da condenação, que seria, a seu ver, desproporcional. Mas o relator, ministro Fabrício Gonçalves, observou que o TRT considerou, ao decidir, os fatos ocorridos e as provas dos autos, aplicando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Pela indicação da gravidade dos fatos, ele não considerou o valor exorbitante, tendo em vista o caráter compensatório e educacional da medida. Ainda de acordo com o ministro, para rever a decisão, seria necessário reexaminar fatos e provas, e não cabe ao TST fazer esse exame nessa fase processual (Súmula 126).

A decisão foi unânime. Redação Painel de Riscos com informações de Carmem Feijó, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão do TST

ACP 0011310-65.2014.5.18.0008 (Goiânia)