COERÇÃO ILEGAL
TJRS defere apreensão de grãos retidos por transportadora que temia não receber o frete

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

É ilegal reter mercadoria do cliente para obrigá-lo a pagar o valor do frete contratado. Para receber pelo serviço, em caso de inadimplemento, o transportador tem de se valer dos meios apropriados de cobrança.

O entendimento foi firmado pela 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), livrando tradicional cooperativa de amargar prejuízo pela retenção indevida, por parte do transportador, de uma grande carga de milho que tinha como destino um grande player da indústria alimentícia.

Desembargador Umberto Sudbrack foi o relator
Foto: Imprensa TJRS

O desembargador Umberto Guaspari Sudbrack, que negou a apelação do transportador, lembrou que a Corte considera ilegal a retenção de mercadorias como forma de coagir a parte contratante ao pagamento de eventuais débitos pendentes com a parte contratada. Assim, confirmou os termos da sentença que julgou procedente a ação de busca e apreensão dos grãos, movida pela cooperativa.

Sudbrack destacou que o transportador sabia que a cooperativa estava em liquidação extrajudicial, experimentando dificuldades financeiras. Entretanto, apesar dos inúmeros títulos protestados, não se poderia de intento fraudulento do devedor.

‘‘Ou seja, resta claro que a requerida/recorrente [transportadora] buscou exercer suas próprias razões de forma despropositada e arbitrária, ante o suposto risco – não evidenciado – de completa insolvência da parte recorrida, procedendo ao depósito da mercadoria em local diverso daquele para o qual deveria ter sido destinada’’, cravou no acórdão o desembargador-relator.

Ação de busca e apreensão

A Cooperativa Agropecuária Alto Uruguai (Cotrimaio) ajuizou ação de busca e apreensão de 232,7 toneladas de milho, que deixaram de ser entregues pela AG Logística e Transportes de Carga à BRF S.A. A carga integra um contrato assinado entre a cooperativa de Três de Maio e a gigante do setor alimentício, prevendo a entrega de 840 toneladas de grãos de milho.

Segundo a inicial, a AG Logística e Transportes de Carga firmou compromisso de entrega de parte deste volume em junho de 2020, mas não cumpriu a sua parte. A autora, por meio de ação de produção antecipada de provas, apurou que os grãos estavam depositados na empresa Cereais Rostirolla, sediada em Passo Fundo (RS)

A Cotrimaio sustentou que o atraso na entrega da mercadoria, nos termos do contrato, dá motivo para a cobrança de multa. Ao final, postulou a tutela de urgência para ser determinada a busca e apreensão da carga mencionada e, no julgamento de mérito, a procedência da ação.

Citada pela 2ª Vara Judicial da Comarca de Três de Maio, a parte ré apresentou contestação. De relevante, alegou que reteve a carga de grãos a fim de compelir a cooperativa a pagar pelo serviço de transporte. Afirmou que os atos praticados não são ilegais ou arbitrários. Invocou a aplicação dos artigos 644 e 751 do Código Civil (CC), bem como do artigo 7º do Decreto-Lei116/1967. Enfim, o estado de insolvência da Cooperativa justifica o arresto da mercadoria.

Sentença procedente

Na análise de mérito, a 2ª Vara da comarca julgou procedente a ação de busca e apreensão, ratificando a medida liminar que consolidou a posse, para a autora, das 232,7 toneladas de milho apreendidas pela ré. Em razões de decidir, a juíza Priscilla Cordeiro explicou que a autora contratou a ré para transportar os grãos, mas esta reteve a carga em razão do não pagamento do frete.

A juíza mencionou que a demandada tinha ajuizado ação cautelar de arresto (processo número 50009876320208210074), na qual inicialmente houve o deferimento do pedido liminar para o efeito de converter a mercadoria em arresto. Contudo, em sede de agravo de instrumento, o deferimento da liminar foi revogado e, nestes autos, deferida a busca e apreensão dos grãos.

‘‘Ademais disso, há precedente do TJRS no sentido de que a medida de retenção adotada pela parte ré não possui amparo no ordenamento jurídico, devendo o credor buscar a saciação do débito pelas vias adequadas’’, escreveu a juíza na sentença.

Derrotada, a transportadora interpôs recurso de apelação no TJRS, repisando o argumento de que a insolvência da cooperativa justificaria o arresto da mercadoria.

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5006063-33.2020.8.21.0021 (Três de Maio-RS)

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