LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA
Cláusula de renúncia às benfeitorias não se estende às acessões

Foto: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a cláusula de contrato de locação imobiliária que prevê renúncia à indenização por benfeitorias e adaptações não pode ser estendida à hipótese de acessão (aquisição do direito de propriedade sobre os acréscimos feitos no imóvel).

A partir desse entendimento, o colegiado restabeleceu a sentença que reconheceu o direito de um empresário a ser ressarcido depois de construir uma academia em propriedade alugada, mas não conseguir viabilizar o negócio por falta de regularização, que dependia da locadora. O valor do ressarcimento: R$ 1,1 milhão.

‘‘A obra realizada pelo locatário configurou uma acessão – e não uma mera benfeitoria, até porque o valor por ele investido no imóvel alcançou um montante elevado, que supera o senso comum para uma simples adaptação do bem para suas atividades’’, avaliou o relator do caso na Terceira Turma, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Ação apontou enriquecimento sem causa da proprietária

Ministro Marco Aurélio Bellizze foi o relator
Foto: Sergio Amaral/STJ

Sem poder iniciar as atividades da academia, o empresário parou de pagar os aluguéis até que a situação do imóvel fosse regularizada, mas se viu obrigado a deixar o local devido à ação de despejo movida pela proprietária. Posteriormente, o imóvel foi alugado para outra pessoa, que fez uso de toda a estrutura construída.

Por essa razão, o antigo locatário ajuizou ação, alegando enriquecimento sem causa da dona do imóvel e pedindo indenização por danos materiais.

O juízo de primeiro grau acolheu o pedido, mas a decisão foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). A corte entendeu que a cláusula de renúncia ao direito de indenização estabelecida no contrato de locação abrangeria não só as benfeitorias, mas todas as alterações feitas no imóvel. Nessa situação, estaria incluída a construção (acessão) feita para adequar o local à atividade que o locatário pretendia desenvolver.

Benfeitoria e acessão não podem ser tratadas da mesma forma

O ministro Bellizze apontou que a existência de uma nova construção no imóvel ficou claramente demonstrada no processo, havendo divergência entre as instâncias ordinárias quanto ao alcance da cláusula de renúncia a indenizações.

Segundo o relator, é preciso diferenciar os conceitos de benfeitoria e acessão, institutos que não podem ser tratados da mesma forma: a primeira é uma melhoria de natureza acessória realizada em coisa já existente, enquanto a acessão é a aquisição da propriedade de acréscimos, nas formas previstas no artigo 1.248 do Código Civil (CC).

‘‘Por isso, mostra-se inviável estender a previsão contratual de renúncia à indenização por benfeitoria também à acessão, notadamente porque o artigo 114 do CC determina que os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente’’, observou Bellizze.

Código Civil prevê indenização para locatário que age de boa-fé

O magistrado ressaltou ainda que o locatário não pôde explorar a academia por falta de alvará de funcionamento, o qual não foi obtido devido ao desinteresse da proprietária do imóvel. ‘‘Ou seja, o locatário foi impedido de iniciar suas atividades em decorrência de ato da locadora’’, disse, lembrando que, segundo o artigo 1.255 do Código Civil, quem edifica em terreno alheio perde a construção para o proprietário, mas tem direito à indenização se agiu de boa-fé.

‘‘O locatário procedeu de boa-fé, inclusive mediante autorização da locadora, para a realização das obras, podendo-se cogitar a má-fé da proprietária, consoante presunção do artigo 1.256, parágrafo único, do CC, já que a construção se deu com o seu conhecimento e sem impugnação de sua parte’’, concluiu o relator ao dar provimento ao recurso especial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.931.087

REsp 1931087