SOCIEDADE MACHISTA
TRT-15 condena Kalunga a indenizar lactante impedida de trocar de turno para amamentar

Com base no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, editado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a 5ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15, Campinas/SP) reconheceu o direito de uma trabalhadora lactante, que rescindiu seu contrato, de forma indireta, por não ter conseguido trocar o turno de trabalho para amamentar o seu filho.

A decisão – que reformou integralmente a sentença da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté (SP) – condenou a empresa Kalunga S. A. a duas indenizações, de danos morais no valor de R$ 15 mil e de estabilidade à gestante.

A trabalhadora relata que, após ter comunicado sobre a gestação aos seus superiores, algumas condições foram alteradas na empresa. Ela narra que antes era permitido aos funcionários deixarem uma garrafa de água debaixo do balcão – o que foi proibido. Para conseguir beber água, tinha que ir ao andar de cima. A mesma situação se quisesse sentar-se: só poderia ser no andar superior ou na praça de alimentação, por se tratar de um shopping. Os acontecimentos fizeram com que a funcionária tivesse crises de ansiedade, tanto que precisou passar por consultas psicológicas.

No final de sua licença, ela optou pela troca de turno, pois seu filho tinha apenas quatro meses de vida e necessitava continuar com as amamentações noturnas. Porém, no seu retorno, quando recebeu a escala de trabalho, o horário da funcionária permanecia no turno da noite. Diante de tal situação, rescindiu de forma indireta seu contrato de trabalho.

Desa. Adriene Sidnei de Moura Davi
Foto: Comunicação Social/TRT-15

Segundo a relatora do recurso, desembargadora Adriene Sidnei de Moura David, ‘‘o caso em análise atrai a aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, considerando a identificação de hipótese de desigualdade estrutural, marcada pela vulnerabilidade da reclamante, que ao retornar do período de licença maternidade viu-se premida pela necessidade de cuidar de seu filho, amamentando-o, inclusive, e, ao mesmo tempo de cumprir jornada de trabalho que abrangia período noturno’’.

Paradigma masculino

A magistrada afirma que é inegável a dificuldade da mãe trabalhadora conciliar a vida laboral com o trabalho de cuidado e amamentação, somada à circunstância de muitas vezes não se ver acolhida no ambiente laboral construído a partir do paradigma masculino.

A desembargadora relata que a empregadora, além de dizer na contestação que a reclamante não comprovou o pedido que alega ter feito para a troca de turno, deixou claro que a política da empresa está longe de atentar aos normativos que preconizam a proteção à maternidade e à infância.

A decisão concluiu que houve pedido da trabalhadora à empresa para a realização de troca de horário de trabalho, ou de turno, após o retorno da licença maternidade. ‘‘As dificuldades que recaem sobre a mulher, mãe de criança que necessita de cuidados próprios do início da vida e lactante, devem ser tratadas sob uma nova ótica a partir do reconhecimento do ainda não superado papel social de cuidado entregue preponderantemente à mulher, em uma sociedade sabidamente patriarcal e machista’’.

O acórdão reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho, condenou a empresa ao pagamento das verbas rescisórias, decorrentes do período de estabilidade gestante, e a indenização por danos morais. A relatora explica que quando a trabalhadora retornou ao trabalho, após o fim da licença maternidade, se viu em situação de desamparo. ‘‘A atitude da reclamada ao obstar o direito da reclamante de realizar a troca de turno evidencia ato discriminatório e apto a gerar indenização por dano moral.’’ Com informações da Comunicação Social do TRT-15.

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ATOrd 0010661-66.2023.5.15.0009 (Taubaté-SP)