ASSÉDIO SEXUAL
Auxiliar de cozinha que recebeu mensagens amorosas do patrão pelo Facebook será indenizada em R$ 10 mil

De acordo com o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o julgador deve valorizar mais a palavra da vítima de assédio sexual, por se encontrar em posição de vulnerabilidade e hipossuficiência – o que não configura desequilíbrio processual.

Por isso, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) resolveu derrubar sentença que livrou um restaurante de Florianópolis de pagar dano moral a uma auxiliar de cozinha que alegou assédio sexual após receber mensagens de cunho amoroso enviadas por um dos proprietários do estabelecimento.

O colegiado, analisando o teor dos depoimentos, entendeu que ficou perfectibilizado o assédio sexual, arbitrando o valor de R$ 10 mil como reparação pelos danos morais causados à trabalhadora.

Com o acolhimento do recurso, o pedido de demissão foi convertido em rescisão indireta, pela falta grave cometida pelo empregador. Isso significa que a autora obteve o direito de receber todas as verbas rescisórias devidas, como se tivesse sido demitida sem justa causa.

Para a relatora do recurso ordinário, desembargadora Teresa Cotosky, o praticante de assédio sexual, em geral, age de forma reservada, longe dos olhos de outros trabalhadores, o que torna difícil a prova pela empregada assediada. ‘‘No caso, há comprovação da investida via rede social, além do depoimento da testemunha, o que, no meu sentir, são suficientes a comprovar os fatos’’, justificou, responsabilizando civilmente o empregador.

O assédio sexual, nos termos do artigo 216-A, caput, do Código Penal (CP), é tipificado como a conduta de ‘‘Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função’’.

O caso concreto

Segundo os autos, o fato aconteceu através da rede social Facebook. O empregador iniciou o contato enviando mensagens aparentemente inocentes à autora da ação, mas rapidamente o tom mudou. Ele passou a insistir com declarações como ‘‘sou mesmo louco por você’’ e ‘‘quer tentar?’’, procurando levar a conversa para um nível mais íntimo, apesar das respostas evasivas da funcionária.

A situação se agravou quando a reclamante foi acusada pela esposa do patrão de manter um relacionamento extraconjugal com ele, intensificando o clima de tensão no ambiente de trabalho, que já havia sido prejudicado pela conduta inadequada e as investidas rejeitadas.

Incomodada com a situação, a auxiliar pediu demissão. Em seguida, buscou a Justiça do Trabalho, acusando o empregador de assédio sexual e solicitando compensação pelos danos sofridos.

Citada pela 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis, a defesa do restaurante não contestou as investidas do proprietário, mas tentou justificar que a funcionária teria correspondido aos ‘‘avanços’’.

Como exemplo, mencionou que ela reagiu com um ‘‘coração’’ a uma publicação compartilhada por ele nos stories. Além disso, com o objetivo de minar a credibilidade da denunciante, também insinuou que ela usava vestimentas ‘‘impróprias’’ durante o trabalho.

Carinho diferenciado

A juíza do trabalho Danielle Bertachini julgou improcedente o pedido de dano moral, por entender que os autos não trazem prova segura de assédio sexual. Afirmou que a interação entre patrão e empregada no Facebook demonstra, na realidade, uma postura de ‘‘carinho diferenciado’’. E isso não se mostra compatível com alguém que de fato se sente importunada.

‘‘Aliás, a referida relação especial iniciada entre ambos – ainda que não concretizada – é confirmada pela própria troca de mensagens trazida com a inicial de fls. 66, datada de outubro de 2021, porque apesar de inicialmente a reclamante escrever ‘pará’ quando o autor fala ser ‘louco por você’, responde, em seguida, a um story símbolo de ‘coração’, atitude que não se mostra compatível com alguém que de fato se sente importunada, muito menos assediada sexualmente’’, destacou a sentença.

A juíza também entendeu que a autora incorreu em litigância de má fé no pedido de danos morais por assédio sexual, multando-a em 1% sobre o valor da causa trabalhista.

A empresa recorreu da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Carlos Nogueira, da Secretaria de Comunicação Social (Secom)/TRT-12.

Para preservar a intimidade da parte, o número do processo foi omitido