ABUSO DE MANDATO
Reter indevidamente valores de cliente idoso e doente causa dano moral, decide TJRS

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Advogado que, por abuso de confiança no curso do mandato, retém indevidamente valores expressivos de cliente idoso e doente atenta contra direitos de personalidade assegurados no inciso X do artigo 5º da Constituição – privacidade, intimidade, honra e imagem. Logo, tem de indenizá-lo na esfera moral.

A conclusão é da 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao condenar a advogada Raquel Miriam de Vargas Bocchese, da Comarca de Vacaria, a pagar R$ 10 mil a seu ex-cliente, a título de danos morais. Ela já havia sido condenada no primeiro grau em danos materiais, tendo de devolver R$ 59 mil ao idoso, valor retido de maneira injustificada – sentença confirmada neste aspecto.

Para o juízo de origem, transtornos do autor não passaram de ‘‘mero dissabor’’

Na origem, o juiz Mauro Freitas da Silva, titular da 1ª Vara Cível da Comarca, negou o pedido de danos morais, entendendo que as angústias e o abalo psicológico vivenciados pelo autor da ação indenizatória não passam de ‘‘dificuldades comuns das relações negociais’’. Noutras palavras, tudo se resumiria a ‘‘dissabores’’.

‘‘O que ocorreu foi mero transtorno do cotidiano, não podendo ser acolhido como ofensa a direito subjetivo legalmente tutelado. A indenização por dano moral deve revestir-se de caráter indenizatório e sancionatório de modo a compensar o constrangimento suportado pelo lesado, sem que caracterize enriquecimento e adstrito ao princípio da razoabilidade. No caso em tela, não se consumou qualquer fato constrangedor capaz de impor à ré o dever de indenizar’’, escreveu na sentença.

‘‘Idoso doente privado do valor retido’’, constatou a desembargadora

Desa. Carmem Farias foi a relatora
Foto: Imprensa/TJRS

A relatora da apelação no TJRS, desembargadora Carmem Maria Azambuja Farias, percebeu os fatos de forma diferente. Ela disse que o caso envolve abuso de confiança em mandato firmado entre as partes, uma vez que a advogada retirou alvará no valor de R$ 162 mil e deixou de repassar ao cliente R$ 59 mil – retenção indevida reconhecida nas duas instâncias da Justiça.

‘‘O autor é pessoa idosa, tendo sofrido com enfermidades nos anos de 2016/2017, época em que foi privado do valor retido pela ré, conforme demonstrou pelos documentos anexados, o que configura, a meu ver, dano moral, haja vista que a condição do apelante, aliada à expressividade do valor que deixou de receber, extrapola a esfera do mero dissabor’’, justificou no acórdão, dando provimento à apelação do autor – que faleceu no curso do processo.

Inconformada com a derrota na 15ª Câmara Cível, a advogada interpôs recurso especial (REsp) na 3ª Vice-Presidência do TJRS, para tentar virar o jogo no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os principais pontos alegados na petição: inexistência de retenção indevida de honorários, incorreto dimensionamento dos valores retidos e não configuração da prática de ato ilícito – ou seja, inocorrência de danos morais. A terceira vice-presidente, desembargadora Lizete Andreis Sebben, admitiu o REsp, enviando os autos para apreciação do STJ.

Clique aqui para ler a decisão que admitiu o REsp

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

038/1.17.0003360-5 (Vacaria-RS)

 

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