FLUID RECOVERY
MPT pode executar valores não pleiteados por trabalhadores em ação coletiva, diz TRT-SC

Secom TRT-SC

A Justiça do Trabalho reconheceu como válido o pedido do Ministério Público do Trabalho (MPT) para propor uma execução coletiva residual contra uma fabricante de pisos de cerâmica catarinense, condenada por adulterar o registro de ponto dos empregados. Cerca de 70% dos 4 mil trabalhadores atingidos pela decisão não apresentaram dados para se habilitar a receber o crédito de até R$ 1 mil por meio de ação individual.

Quando o valor pleiteado em uma ação coletiva é considerado pouco relevante ou a condenação é incerta, o titular do direito pode sentir-se desestimulado a ingressar com um processo, nos casos em que é exigida a ação individual — necessária quando valor a receber varia conforme o empregado, por exemplo.

Se apenas uma fração reduzida dos beneficiados com a decisão ingressa com ações individuais, a lei permite que os legitimados a propor ação coletiva possam solicitar a execução do valor residual — medida conhecida como “reparação fluída” (fluid recovery). O objetivo é garantir a reparação do dano à sociedade (o valor residual é revertido a um fundo de reconstituição dos bens lesados) e inibir a continuidade ou reiteração da prática irregular, já que o condenado poderia beneficiar-se de enriquecimento ilícito.

A medida é inspirada na jurisprudência dos Estados Unidos e está prevista no artigo 100 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor): “decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização devida”, afirma a norma.

Natureza coletiva

No pedido apresentado à Justiça do Trabalho de SC, o MPT destacou que, do grupo estimado de 4 mil beneficiários,  apenas 1.286 trabalhadores haviam recebido sua parte da indenização. Alegando não possuir as informações individuais dos beneficiários, o MPT, através da Procuradoria Regional do Trabalho da 12ª Região (PRT-12), pediu que o valor restante da condenação (R$ 4,9 milhões em valores atualizados) fosse executado de forma residual em benefício da coletividade.

A 1ª Vara do Trabalho de Balneário Camboriú entendeu que o MPT não tem legitimidade para promover a execução, que caberia somente aos trabalhadores e seus sucessores. O MPT, então, recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12 SC), argumentando que não estava atuando como substituto processual dos trabalhadores, mas como legitimado coletivo. Assim, não cabe a exigência de identificação de todos os beneficiários remanescentes.

A comunidade será a grande beneficiada

Ao julgar o caso, a 3ª Câmara do TRT catarinense entendeu, por unanimidade, que o artigo 100 do Código de Defesa do Consumidor autoriza o MPT a propor a execução residual, sem a nomeação individualizada dos beneficiados.

Desembargador Nivaldo Stankiewicz
Foto: Secom TRT-SC

‘‘Embora fundada em processo em que se discutem direitos individuais homogêneos, a fluid recovery tem natureza residual e verdadeiramente coletiva, independendo, portanto, da identificação daqueles que seriam os beneficiários de uma execução individual’’, afirmou o desembargador-relator Nivaldo Stankiewicz. ‘‘Os valores alcançados serão revertidos à coletividade, e não a indivíduos’’, completou.

O relator também destacou não haver controvérsia em relação ao número de beneficiados, rejeitando os questionamentos da empresa quanto ao cálculo do montante residual da condenação.

‘‘O número de empregados beneficiários da decisão, bem como o número de empregados já habilitados, servirão de balizadores para o arbitramento da indenização, uma vez que refletem a dimensão do dano a ser reparado’’, esclareceu. ‘‘Não se trata, no caso, de individualizar cada um dos destinatários do direito reconhecido, porque a reparação não será individual”, concluiu.

Após a publicação da decisão, a empresa apresentou embargos de declaração, instrumento jurídico usado para sanar dúvidas e omissões em relação aos textos das decisões. Após o julgamento dos embargos, ainda cabe a possibilidade de recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). (Fábio Borges/Secom TRT-SC)

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0237400-08.2008.5.12.0040 (Balneário Camboriú-SC)

RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Homologação do plano não impede rediscussão de crédito, já habilitado, em revisão contratual

Imprensa STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a habilitação do crédito e a posterior homologação do plano de recuperação judicial não impedem a rediscussão do seu valor em ação revisional de contrato.

A decisão teve origem em ação proposta por uma empresa em recuperação judicial contra o Banco do Brasil, visando à revisão de contratos de empréstimo, em virtude de suposto excesso na cobrança de juros e outras irregularidades.

Ação revisional de contrato bancário

Em sua defesa, o banco alegou que, ao apresentar o pedido de recuperação, a empresa concordou tacitamente com todas as cláusulas inseridas nos contratos, o que impediria o ajuizamento da ação revisional.

Asseverou ainda que seu crédito, de mais de R$ 4 milhões, já devidamente habilitado, não foi impugnado no prazo legalmente previsto, de modo que, sobrevindo a homologação do plano de recuperação, não mais seria possível a rediscussão do valor em ação revisional de contrato bancário.

Reconhecimento judicial da concursalidade submete o crédito à recuperação

Ministro Villas Bôas Cueva
Foto: Imprensa STJ

Relator do processo no STJ, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva ressaltou que, conforme o artigo 59 da Lei 11.101/2005, o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos. O magistrado lembrou que, como decidido pela Segunda Seção, o reconhecimento judicial da concursalidade do crédito, habilitado ou não, torna obrigatória a sua submissão aos efeitos da recuperação.

‘‘A novação, em regra, ainda que pressuponha a anterior homologação de um plano previamente aprovado pela assembleia geral de credores, não se opera por valores nominais, mas pela consolidação dos mais variados meios que a assembleia geral de credores considerar necessários e suficientes para a superação da crise que acomete a empresa em recuperação’’, afirmou no voto.

O ministro observou também que a mesma lei, em seu artigo 50, inciso I, quando utiliza um conceito aberto ao tratar das ‘‘condições especiais para pagamento’’, deixa transparecer que tal norma deve ser interpretada da forma mais ampla possível, admitindo a adoção de qualquer condição que seja aceitável para os credores e que possam contribuir para o soerguimento da empresa recuperanda.

Segundo ele, ‘‘independentemente do meio utilizado – deságio, remissão parcial, parcelamento etc. –, a concessão de condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas não leva em consideração eventuais acréscimos ou decréscimos no valor da dívida habilitada, resultantes de ações judiciais em curso’’.

Condição especial estabelecida no plano acompanha o valor do novo débito

Em relação ao crédito já habilitado, o relator ponderou que, ainda que já tenha sido homologado pelo juízo da recuperação, nada impede que sobrevenham acréscimos ou decréscimos por força de provimento jurisdicional definido em demandas judiciais em curso, a ensejar a aplicação da condição especial definida no plano de recuperação ao novo valor do débito judicialmente reconhecido.

‘‘No caso em apreço, sobrevindo decisão judicial que reconheça ser menor a dívida da empresa recuperanda para com a instituição financeira, a condição especial estabelecida no plano de recuperação deverá ser aplicada sobre esse novo montante’’, comentou.

O magistrado concluiu que a novação se opera no tocante às condições especiais de pagamento estabelecidas no plano, e não sobre valores nominais.

‘‘Se as obrigações previstas no plano de recuperação judicial não forem satisfeitas no prazo devido, a recuperação será convolada [transformada] em falência, e os credores terão seus direitos reconstituídos nas condições originalmente contratadas’’, ressaltou.

Leia o acórdão do REsp 1.700.606-PR

DESEQUILÍBRIO DE FORÇAS
Justiça do Trabalho não deve homologar acordo extrajudicial que só beneficia o empregador, decide TRT-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

A Justiça do Trabalho não pode avalizar transação extrajudicial, com quitação plena do contrato de trabalho, se não constata reciprocidade de concessões no acordo entre as partes. Afinal, se o acordo beneficia apenas a reclamada e prevê pagamento das parcelas fora do prazo legal à reclamante, há evidente desequilíbrio de forças entre as partes, ferindo o princípio da proteção ao trabalhador.

Nesta linha de entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve decisão do juízo da Vara do Trabalho de São Jerônimo, que, ante flagrante vantagem para o empregador, além de indícios de lide simulada, se recusou a homologar transação extrajudicial entabulada entre uma trabalhadora e os donos de uma casa de repouso para a terceira idade.

Para a relatora do recurso ordinário, desembargadora Maria Madalena Telesca, ainda que se reconheça a autonomia da vontade das partes, o instituto do acordo judicial exige a observância de princípios que resguardam os direitos do trabalhador.

Desembargadora Maria Madalena Telesca
Foto: Secom/TRT-4

‘‘Não se verifica, no caso concreto – no qual restam evidentes desequilíbrios entre as partes –, tenha havido a diligência medianamente esperada de parte dos envolvidos, concluindo-se ocorrência de comportamento inadmissível. Nesse contexto, s.m.j., mantém-se os comandos da sentença. Nega-se provimento ao recurso da reclamante’’, fulminou no acórdão.

Homologatória de transação extrajudicial

A autora e os sócios do lar de idosos (Casa de Repouso Doce Aconchego), em 23 de julho de 2021, ajuizaram homologação de transação extrajudicial na Vara do Trabalho de São Jerônimo (RS). Em síntese, narraram que mantiveram relação de emprego no período compreendido entre 1º de março de 2017 a 20 de junho de 2021, acordando que a quitação seria paga de forma parcelada. A proposta de extinção de contrato de trabalho, com quitação total: pagamento de R$ 10,5 mil em sete parcelas mensais. O valor nominal atribuído à causa: R$ 19,3 mil.

Após a audiência conciliatória, o juiz do trabalho Mauricio de Moura Peçanha disse não concordar com uma transação na qual se paga parcialmente as verbas rescisórias com quitação total do contrato. Ele sugeriu a quitação restrita às verbas elencadas no acordo, e não a todos os direitos da trabalhadora, mas a parte reclamada não concordou.

Nessa mesma cerimônia, registra a sentença, a parte reclamante relatou que trabalhou na casa de repouso por 12 ou 13 anos, sofreu acidente de trabalho em 2020 e que só aceitou o modesto valor estipulado no acordo ‘‘por necessidade econômica’’.

Neste quadro, Peçanha entendeu que não poderia homologar o acordo nos moldes do artigo 855-B, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que regula este procedimento, por indícios de fraude aos direitos da trabalhadora. Especialmente em razão do parcelamento da verba rescisória, que afronta o prazo legal.

‘‘Entendo que a pretensão de quitação total (…) comprova a fraude pretendida pela empregadora e a simulação de lide com vício de origem para mascarar descumprimento de direitos trabalhistas em desfavor da empregada, não podendo haver chancela judicial em favor da simuladora. Por conseguinte, extingo o processo sem resolução do mérito, nos termos dos arts. 139, III, 142 e 485, IV, do CPC’’, decidiu o juiz.

Ofício às autoridades competentes

Invocando a obrigação de comunicar irregularidade às autoridades competentes, expressa na Consolidação de Provimentos da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, o julgador determinou a expedição de ofícios à seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS), ao Ministério Público Federal (MPF-RS) e ao Ministério Público do Trabalho (MPT-RS). Todas as instituições terão acesso à cópia do processo trabalhista, para apurar possíveis indícios de fraude e, se for o caso, tomar as medidas cabíveis contra o empregador e/ou a ex-empregada.

‘‘Isso advém da ideia de que se o juiz não tem competência para sanar algum descumprimento à lei de que tome conhecimento, deve comunicar ao agente público que a tenha, pois o juiz deve participar da construção de uma sociedade justa e solidária (art. 3º, I, da CRFB/88) com respeito às instituições estatais e à lei e com a busca da paz social que é um fim do direito’’, concluiu Mauricio de Moura Peçanha.

Recurso ordinário

Inconformadas com o teor da sentença que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, as partes litigantes entraram com recurso ordinário no TRT-4.

A reclamada buscou a reforma do julgado quanto a não homologação do acordo extrajudicial, arguindo pela sua validade e ausência de fraude – além de impedir a expedição de ofícios às instituições. Já a parte reclamante reagiu quanto ao entendimento de ocorrência de conluio entre as partes e procuradores e de lide simulada.

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0020395-50.2021.5.04.0451 (São Jerônimo-RS)

 

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RETALIAÇÃO PATRONAL
Fábrica de calçados é condenada por dispensar auxiliar após ajuizamento de ação

Secom/TST

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame de recurso de revista (RR) da Calçados Bottero contra sentença que a condenou a pagar indenização a uma auxiliar de costura de Sapiranga (RS). A trabalhadora foi dispensada por justa causa 11 dias após ajuizar reclamação trabalhista. De acordo com a decisão, que foi unânime entre os integrantes da Turma, houve prejuízo moral à profissional.

Dispensa 

Ainda com o contrato de trabalho em vigor, a empregada ajuizou a ação em 15 de março de 2013, para requerer, entre outras parcelas, adicional de insalubridade e horas extras. Dias depois, ela informou à Justiça que fora despedida por justa causa em 26 de março. Então, ela pediu a conversão da modalidade de ruptura contratual, com o reconhecimento de despedida sem justa causa, e a condenação da empresa ao pagamento das verbas rescisórias e de indenização por danos morais.

Em sua defesa, a Bottero argumentou que a dispensa fora motivada por reiteradas faltas injustificadas ao trabalho e por indisciplina (segundo a contestação, ‘‘consistente no ato de desacatar ordens de trabalho’’), já que a auxiliar não havia modificado suas atitudes após as medidas disciplinares adotadas.

Retaliação

O juízo de primeiro grau deferiu a reversão da justa causa, concluindo que a despedida caracterizara ato discriminatório e desrespeito ao direito fundamental de acesso à Justiça. Também acolheu a alegação de que a medida fora um ato de retaliação da empresa, deferindo à trabalhadora reparação de R$ 8 mil.

A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, RS), para quem o fato de a dispensa ter ocorrido logo após o ajuizamento da ação fortalecia o argumento da trabalhadora de que havia sofrido revide. Ressaltou, ainda, que a caracterização da ofensa não exige prova do prejuízo causado, bastando estar configurado o desrespeito a direitos fundamentais consagrados na Constituição.

Prejuízo moral

No recurso de revista, a Bottero insistiu na tese da falta de comprovação do dano. Mas, segundo o relator, ministro Evandro Valadão, o direito do empregador de rescindir o contrato de trabalho não o legitima para, usando seu poder diretivo e sua supremacia econômica, punir o empregado que exerceu o direito constitucional de acesso ao Judiciário. “É evidente o prejuízo moral da trabalhadora, ao ver-se punida pelo exercício regular de um direito”, assinalou no acórdão.

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RR-285-27.2013.5.04.0381-RS

CONTRATO DE LEASING
Se o bem não for encontrado, STJ admite converter reintegração de posse em ação de execução

Imprensa STJ

Ao dar provimento ao recurso especial (REsp) de um banco, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, reafirmou que é possível a conversão do pedido de reintegração de posse em ação de execução quando o bem objeto de contrato de arrendamento mercantil (leasing) não é localizado.

De acordo com o colegiado, é válida a extensão das normas previstas no Decreto-Lei 911/1969, que trata de alienação fiduciária, aos casos de reintegração de posse de bens objeto de contrato de arrendamento mercantil.

Carro não localizado

Segundo os autos, o banco ajuizou ação para recuperar o carro que entregou a um cliente, em arrendamento mercantil, em virtude da falta de pagamento das parcelas. Diante da não localização do veículo, o autor pediu a conversão da ação de reintegração de posse em ação de execução.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) confirmou a sentença que encerrou o processo sem análise do mérito, sob o entendimento de que a aplicação do Decreto-Lei 911/1969 seria descabida no caso de arrendamento mercantil, devido à incompatibilidade de procedimentos e à ausência de previsão legal.

Normas da alienação fiduciária se estendem aos contratos de arrendamento mercantil

O relator do REsp, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, lembrou que, segundo a jurisprudência do STJ, em ação de busca e apreensão processada sob o rito do referido decreto-lei, o credor tem a opção de pedir a sua conversão em ação executiva, se o bem não for encontrado.

De acordo com o magistrado, embora essa orientação tenha sido firmada para os casos de contrato de alienação fiduciária, a Lei 13.043/2014 modificou o decreto-lei para permitir a aplicação dos seus procedimentos aos casos de reintegração de posse referentes a operações de arrendamento mercantil (artigo 3º, parágrafo 15, do Decreto-Lei 911/1969).

É ‘‘plenamente aplicável o disposto no artigo 4º do Decreto-Lei 911/1969, que dispõe a respeito da conversão do pedido em ação executiva, por analogia, aos contratos de arrendamento mercantil’’, apontou.

Essa aplicação analógica também está amparada na aproximação dos dois institutos quanto à transferência da posse direta do objeto do contrato, mediante contraprestação do devedor, mantido o domínio do credor, até o pagamento integral da dívida – concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso especial e determinar o prosseguimento do feito na primeira instância.

Leia o acórdão no REsp 1.785.544-RJ