COCHILO DO FISCO
Mudança na prática administrativa tributária não vale para fatos geradores do passado
A administração tributária não pode mudar o seu entendimento sobre um tributo que não era cobrado em certas situações e, de repente, exigir que seja recolhido em relação a fatos geradores do passado – eventos que originam a obrigação de pagar o tributo.
Conforme a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), se a Fazenda Pública muda sua prática administrativa, isso só pode ter efeitos para fatos geradores ocorridos após a mudança.
Na origem, a Cooperluz Cooperativa Distribuidora de Energia Fronteira Noroeste, sediada em Santa Rosa (RS), impetrou mandado de segurança com o objetivo de não pagar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), instituída para angariar recursos para a implementação de políticas públicas no setor elétrico.
O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido por entender que a subvenção integra o valor final da tarifa de energia e, por isso, deveria compor a base de cálculo do ICMS.
Já o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), apesar de também considerar o pagamento devido, concluiu que essa exigência só poderia ocorrer em relação a fato gerador posterior à notificação sobre a modificação do entendimento do fisco estadual, não sendo admitida cobrança pretérita.
No recurso especial (REsp) dirigido ao STJ, a Fazenda Pública do RS sustentou que a omissão reiterada na cobrança do tributo não exime o contribuinte do pagamento, mas apenas exclui a incidência das penalidades.
Prática reiterada caracteriza norma complementar
O relator do REsp, ministro Francisco Falcão, reconheceu que a falta de cobrança do tributo caracterizou uma prática reiterada da administração tributária e, de acordo com o disposto no artigo 100, inciso III, do Código Tributário Nacional (CTN), essa orientação representa uma norma complementar.
Em análise conjunta do dispositivo citado e do artigo 146 do CTN, o ministro destacou que, quando o tributo passa a ser cobrado em decorrência de uma nova decisão administrativa, a exigência somente será aplicada a fatos geradores ocorridos após essa mudança, não sendo possível impor o pagamento do imposto com base em fatos que aconteceram antes da alteração.
‘‘A alteração na cobrança de imposto que não estava sendo cobrado, em face de uma decisão administrativa, determina que o tributo somente possa incidir quanto a fato gerador posterior à modificação administrativa’’, ressaltou.
Norma tributária deve obedecer ao princípio da irretroatividade
Francisco Falcão admitiu que o artigo 100, parágrafo único, do CTN dispõe sobre a exclusão de penalidades, juros e correção monetária da base de cálculo do tributo. Contudo, acrescentou que a tese defendida pela Fazenda, de que apenas essas parcelas devem ser excluídas, mantendo a cobrança do tributo, contradiz a prática reiterada da administração tributária como norma complementar.
Por fim, o ministro enfatizou que deve ser observada a aplicação do princípio da irretroatividade da norma tributária, no sentido de impedir que as alterações dessas práticas administrativas possam atingir fatos já ocorridos. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.