CONTRAFAÇÃO MUSICAL
Cantores nativistas gaúchos condenados a pagar dano moral por plagiar compositor

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Divulgação

O artigo 5º, inciso XXVIII, alínea ‘‘b’’, da Constituição, protege os autores contra a reprodução não consentida de suas obras. Por sua vez, a Lei 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais) pormenoriza tal proteção, tanto no âmbito material quanto no moral, como se depreende da leitura dos artigos 7º e 22.

A constatação de que estes dispositivos foram flagrantemente violados levou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) a confirmar sentença que arbitrou danos morais em favor do compositor Nei Antônio Fernandes, co-autor da música ‘‘Chora no ombro do velho’’, gravada em 1993 pelo cantor Moraezinho.

Reparação de R$ 60 mil

O autor, com mais de 80 anos de idade, vem, desde 1999, tentando uma composição amigável com os réus, sem sucesso. A música original foi plagiada pelos cantores de música nativista gaúcha Élton Saldanha, Ivonir Machado, Leandro Barcelo e o grupo musical Garotos de Ouro.

‘‘Assim, a toda evidência a composição foi elaborada precedentemente pelo autor, com gravação por terceiro não integrante da lide, e, posteriormente, plagiado em parte pelos demandados, os quais utilizaram o título e o refrão da música, com acréscimos e modificações no restante da letra, na maioria das vezes sem fazer qualquer referência que a propriedade intelectual era do postulante – só houve menção ao nome do autor junto ao ECAD para as reproduções por rádio’’, resumiu no acórdão o desembargador-relator Jorge Luiz Lopes do Canto, da 5ª Câmara Cível.

O relator só diminuiu o quantum indenizatório para o dano moral arbitrado na primeira instância, que caiu de R$ 100 mil para R$ 60 mil, ‘‘atendendo ao caráter reparatório e punitivo deste tipo de indenização, bem como o decurso do tempo de utilização indevida da obra pelos demandados’’. O acórdão foi lavrado com entendimento unânime.

STF não vai reapreciar a decisão do TJ-RS

A pá de cal no caso foi dada no dia 28 de setembro de 2022, quando a Câmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores, do TJ-RS, manteve a decisão que negou seguimento ao recurso extraordinário (RE) interposto pelos réus, que queriam levar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF).

‘‘Em que pese os argumentos expedidos em contrário, a Corte Suprema firmou orientação no sentido de ser inadmissível a interposição de recurso extraordinário para discutir matéria relacionada à ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, da prestação jurisdicional, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada, quando a verificação de qualquer dessas alegações depender de exame prévio de legislação infraconstitucional, por configurar situação de ofensa reflexa ao texto constitucional’’, escreveu no acórdão a relatora do agravo interno, desembargadora Lizete Andreis Sebben.

Plágio comprovado

A obra contrafeita (imitada por contrafação) recebeu o título de ‘‘Chora no ombro do véio’’, similar ao atribuído à canção original. Mas as similaridades não param por aí. Segundo o juízo da Vara Cível do Foro Regional da Tristeza, Comarca de Porto Alegre, trata-se de reprodução literal da parte principal de uma canção: o refrão.

‘‘Observa-se a equivalência entre os refrões, salvo a mera substituição da palavra ‘velho’ por ‘véio’, o que, ao fim e ao cabo, apresenta som/grafia semelhante e o mesmo significado no contexto apresentado’‘, escreveu na sentença a juíza Karla Aveline de Oliveira, referindo-se aos apontamentos do perito judicial.

Em resposta à alegação de um dos réus, de que o autor não teria registrado previamente a sua obra, o que o impediria de buscar a reparação, a julgadora citou o disposto no artigo 18 da Lei dos Direitos Autorais. O dispositivo é taxativo: ‘‘A proteção aos direitos de que trata esta Lei independe de registro’’. A mesma Lei, no inciso I do artigo 29, também é elucidativa: ‘‘Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como: a reprodução parcial ou integral’’.

Sentença parcialmente procedente

Conforme a juíza, o autor, um humilde compositor nativista com mais de 80 anos, testemunhou ao longo de muitos anos os demandados – cantores de prestígio no meio musical, agraciados com muito mais fama – apropriarem-se de sua criação, de forma inadequada e sem o devido e integral reconhecimento formal.

‘‘Assim, tenho que a conduta ilícita da parte ré em reproduzir e explorar comercialmente a aludida composição musical, ao longo de quase vinte anos, sem sequer indicar o nome do demandante como co-autor, enseja a reparação de cunho extrapatrimonial, forte, inclusive, nos artigos 24, II, e 108, da Lei nº 9.610/98, ainda que o mesmo já tenha recebido valores correspondentes aos direitos autorais da execução da canção em rádios’’, cravou na sentença.

No dispositivo sentencial, a juíza Karla Aveline de Oliveira determinou a inclusão do nome do demandante como co-autor da música ‘‘Chora no ombro do véio’’, o que o habilita a receber direitos proporcionais em decorrência da reprodução da canção nos mais diverso tipos de mídia. E arbitrou o valor da indenização em danos moral em R$ 100 mil, a ser paga, solidariamente, por todos os réus da ação.

Clique aqui para ler a decisão que barrou RE

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Clique aqui para ler a sentença

Processo 001/1.05.0006660-8 (Comarca de Porto Alegre)

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