CRITÉRIO BIOLÓGICO
INSS vai pagar dano moral por desconsiderar gênero de segurada no pedido de aposentadoria

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Nos pedidos de aposentadoria, o gênero a ser considerado é aquele que consta na certidão do registro civil no ato do requerimento, cabendo ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) promover a respectiva retificação do cadastro em seus sistemas internos.

Por ignorar este procedimento básico, a autarquia previdenciária terá de pagar R$ 3 mil, a título de danos morais, a uma segurada transgênero do Paraná, já que levou em conta apenas o sexo biológico registrado no momento da sua filiação ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), indeferindo a aposentadoria por idade pelo não preenchimento do requisito etário.

A condenação foi imposta pela 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), por maioria de votos, reformando sentença que não viu abalo à honra, à intimidade, ao bom nome e à imagem da segurada – direitos de personalidades delineados no artigo X do artigo 5º da Constituição.

INSS ignorou a mudança de gênero na análise do pedido

Desembargador Márcio Antônio Rocha, voto vencedor
Foto: Sylvio Sirângelo/ACS/TRF-4

O desembargador federal Márcio Antônio Rocha, voto divergente vencedor neste julgamento, destacou que a autora alterou o seu prenome e gênero, na Vara de Registros Públicos de Curitiba, em 2018, solicitando a alteração de cadastro do INSS em 30 de abril de 2019.

O julgador disse que a autarquia fez a alteração, sem óbices, mas, ao analisar o pedido, desrespeitou o histórico da segurada, atribuindo-lhe o gênero masculino por seu critério biológico para justificar o indeferimento da aposentadoria por idade.

Para Rocha, é ‘‘irrazoável e desproporcional’’ o ato administrativo que, plenamente ciente da situação do fato em análise, indeferiu o benefício de aposentadoria por idade à parte segurada, que cumpria o requisito etário conforme o gênero que lhe fora reconhecido por decisão judicial, averbada nos registros da Previdência.

‘‘Tal decisão, evidentemente inesperada e injusta, provocou um choque psicológico e emocional à parte segurada, extrapolando a simples frustração que decorreria do mero indeferimento imotivado ou errôneo do benefício previdenciário a que tinha direito. Portanto, entendo que a decisão administrativa apresenta elementos de culpabilidade, dano e nexo causal ensejadores do dever de indenização por dano moral’’, fulminou o julgador no voto, sendo seguido pela maioria dos seus pares.

Direito civil reconhecido pelo STF

A possibilidade de alteração dos registros civis por mera declaração do interessado foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em favor dos transexuais, no julgamento da ADI 4.275 e do RE 670.422, com repercussão geral (Tema 761).

A tese foi fixada nos seguintes termos:

– O transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil, não se exigindo, para tanto, nada além da manifestação da vontade do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial como diretamente pela via administrativa.

– Essa alteração deve ser averbada à margem no assento de nascimento, sendo vedada a inclusão do termo ‘‘transexual’’.

– Nas certidões do registro. não constará nenhuma observação sobre a origem do ato, sendo vedada a expedição de certidão de inteiro teor, salvo a requerimento do próprio interessado ou por determinação judicial.

– Efetuando-se o procedimento pela via judicial, caberá ao magistrado determinar, de ofício ou a requerimento do interessado, a expedição de mandados específicos para a alteração dos demais registros nos órgãos públicos ou privados pertinentes, os quais deverão preservar o sigilo sobre a origem dos atos.

Processo sob segredo de Justiça

Apelação Cível 5050281-71.2020.4.04.7000/PR

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