CRUELDADE
TRT-MT mantém justa causa de operário que esfaqueou vaca viva no momento do abate
Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)
O caput do artigo 5º e o parágrafo 1º da Portaria 365/2021 do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) sinalizam que todo o animal destinado ao abate deve ser submetido a procedimentos humanitários de manejo, antes e durante a sangria. Ou seja, é proibido espancá-los, agredi-los, erguê-los pelas patas, chifres, pelos, orelhas ou cauda, ou adotar qualquer outro procedimento que os submeta a dor ou sofrimento desnecessários.
Por entender que esta norma foi flagrantemente violada, a Justiça do Trabalho de Mato Grosso considerou legal a demissão por justa causa aplicada a um operário da Marfrig Global Foods que, ao maltratar bovinos na hora do abate, descumpriu as normas de bem-estar animal e segurança do trabalho.
O reclamante foi dispensado por atos de mau procedimento e indisciplina/insubordinação, descritos, respectivamente, nas alíneas ‘‘b’’ e ‘‘h’’, do artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A dispensa ocorreu logo após a conclusão da sindicância aberta pelo empregador.
No primeiro grau, o juiz Mauro Roberto Vaz Curvo, da 1ª Vara do Trabalho de Tangará da Serra, afirmou que a conduta do reclamante contrariou o Regulamento Técnico de Manejo Pré-abate e Abate Humanitário do Mapa, além de outras normas de inspeção sanitária, o que poderia acarretar multa e a suspensão de atividades do estabelecimento.
Para Curvo, ao ‘‘testar’’ a faca na pata da vaca, ficou evidente que o trabalhador ocasionou mais dor do que o necessário, o que é vedado pela norma do Mapa. Indo além da seara trabalhista, o julgador lembrou que a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98) criminalizou, no artigo 32, o ato de abusar, maltratar, ferir ou mutilar animais.
‘‘Atualmente, é indiscutível: os animais estão protegidos por leis, e qualquer um que atente contra eles está sujeito a responder pelo crime. Desse modo, ante a proteção aos animais e vedação de práticas que os submetam à crueldade e maus tratos, o abate de animais deve ser realizado sem sofrimentos desnecessários, e as condições humanitárias devem prevalecer em todo o seu processo’’, escreveu na sentença.
No segundo grau, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (TRT-23, Mato Grosso) confirmou os termos da sentença, ressaltando, com base nos vídeos, que o animal ainda estava vivo enquanto era ‘‘estocado’’ nas patas pelo reclamante e seu colega. Tanto que, em função da dor e sofrimento, como mostra o vídeo, o animal recolheu a pata para se proteger.
‘‘Veja-se que as declarações das testemunhas foram ao encontro da mídia [vídeos] trazida aos autos, de modo que não prevalece a tese recursal de contradição da prova oral. A testemunha Cleveson afirma, ainda, que todos os empregados são orientados a não tocar ou mutilar os animais abatidos na calha de sangria’’, pontuou no acórdão a relatora do recurso ordinário, desembargadora-relatora Eleonora Alves Lacerda.
Crueldade, risos e chacota
A sindicância realizada pela Marfrig apurou que, durante a pausa ergonômica do setor de abate, por volta das 20h15min, o operário saiu de seu posto de trabalho, subiu na calha de sangria e passou a ‘‘brincar’’ com a teta de uma vaca, espirrando leite nos colegas, rindo e fazendo chacota.
Após, ao visualizar a funcionária do controle de qualidade e cuidado do bem-estar animal, ele esfregou o úbere da vaca, em evidente gesto obsceno, constrangendo-a, como mostram os vídeos anexados ao processo trabalhista.
Logo em seguida, às 20h21min, ele e seu colega de trabalho começam a afiar as facas e a “testá-las” nas patas do animal, causando-lhe dor. Os cortes, em função da mutilação das patas, estão em desacordo com o procedimento operacional padrão e as normas de segurança e bem-estar animal.
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ATOrd 0000256-17-2023.5.23.0051 (Tangará da Serra-MT)
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