DIGNIDADE HUMANA
Fazendeiro não consegue tirar nome de lista do trabalho escravo

Secom/TST

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) julgou improcedente o pedido de um pecuarista de Mato Grosso do Sul para a retirada do seu nome do cadastro de empregadores que mantêm (ou mantinham) trabalhadores em condições análogas à escravidão (conhecida como ‘‘lista suja do trabalho escravo’’). A decisão foi unânime.

Para o colegiado superior, o fato de o proprietário ter arrendado parte das terras para terceiro não o exclui da responsabilidade pela exploração do trabalho em condições degradantes, que ferem a dignidade humana.

Carvoejamento

O pecuarista, proprietário de fazendas em São Gabriel D’Oeste (MS), foi autuado, em 2008, pela fiscalização do trabalho. Os fiscais encontraram três homens e uma mulher submetidos a condições degradantes na atividade de carvoejamento. Eles trabalhavam das 5h às 17h, com pequeno intervalo para o almoço, de segunda a sábado, e, apesar de terem folga aos domingos, não tinham condições de sair do local.

Os trabalhadores recebiam por produção, que variava de acordo com a atividade de cada um. Eles não usavam equipamentos de proteção individual (EPIs) nem passavam por exames admissionais, tampouco recebiam orientações sobre os riscos da atividade. Também não havia instalações sanitárias nem alojamento adequado. Para fazer as suas necessidades fisiológicas, os trabalhadores tinham de utilizar o mato, próximo à bateria de fornos de carvão.

Além de lavrar diversos autos-de-infração, a fiscalização também determinou a inclusão do fazendeiro no cadastro do Ministério do Trabalho e Previdência.

Arrendamento

Contra as medidas, o fazendeiro acionou a Justiça do Trabalho, sustentando ter arrendado parte das terras para uma terceira pessoa, que, agindo com autonomia e independência, teria contratado os trabalhadores para a carvoaria, a partir da madeira que ele havia extraído para a formação de pastagem. Além da exclusão de seu nome do cadastro, ele pedia indenização por danos morais contra a União.

O juízo da 1ª Vara do Trabalho de Campo Grande (MS) julgou o pedido improcedente, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT-24, MS) entendeu que as infrações apontadas pela fiscalização não tinham relação com a submissão de trabalhadores a condições análogas à de escravo.

Ministro Augusto César foi o relator
Foto: Secom/TST

Entre outros pontos, o TRT considerou que o proprietário do imóvel rural havia se comprometido, mediante Termo de Ajuste de Conduta (TAC), a adotar medidas direcionadas às questões que envolvem a exploração de sua área e o trabalho necessário para esse fim. Também entendeu que o fato de ele não ter participado diretamente na carvoaria deve ser considerado para a exclusão do seu nome na lista de empregadores.

A União recorreu, então, ao TST.

Condições degradantes

O relator do recurso de revista (RR), ministro Augusto César, explicou que, a partir da alteração do artigo 149 do Código Penal pela Lei 10.803/2003, o crime de reduzir alguém à condição análoga à escravidão passou a abranger, literalmente, a execução de jornada exaustiva e a sujeição a condições degradantes de trabalho.

‘‘A configuração do trabalho escravo atual não depende da restrição da liberdade do trabalhador, conforme jurisprudência do STF, que entende que o bem jurídico tutelado vai além da liberdade individual, englobando também a dignidade da pessoa humana e os direitos trabalhistas e previdenciários, que constituem o sistema social trazido pela Constituição’’, assinalou.

No caso, o ministro destacou que, no contexto descrito pelo TRT, deve ser reconhecida a violação de dispositivos constitucionais e da Lei 5.889/1973, que estatui normas reguladoras do trabalho rural. Para o colegiado, na condição de proprietário rural, o empregador, ainda que indiretamente, se beneficia da mão de obra das pessoas que prestavam serviços em condições degradantes. Assim, não procede a alegação de que elas prestavam serviços para um arrendatário e explorador de carvoaria no local, e não ao dono das fazendas.

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RR-1001-43.2011.5.24.0001-MS