LINCHAMENTO VIRTUAL
Felipe Neto vai indenizar internauta por reproduzir comentário privado em público
O influenciador digital Felipe Neto – que tem 16 bilhões de visualizações acumuladas em suas redes sociais e já figurou na tradicional lista das 100 pessoas mais influentes do mundo da revista norte-americana Times – teve condenação mantida pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) por comentar em público mensagem enviada por internauta em caráter privado.
O influenciador terá, agora, de indenizá-la por danos morais no valor de R$ 5 mil. A decisão, proferida em sede de apelação na 6ª Câmara de Direito Civil, foi unânime.
Covid-19 e a Ciência
O fato foi registrado em maio de 2020, no epicentro da pandemia da Covid-19. O influenciador usava seu espaço para prestigiar a Ciência, pedir a manutenção do isolamento social e clamar por vacinas.
A internauta acessou um dos stories publicados no Instagram do influenciador e enviou mensagem privada em que se contrapunha àquelas ideias nos seguintes termos: ‘‘Com toda a certeza tem que deixar tudo aberto, o que tiver que acontecer vai acontecer, não adianta prorrogar o inevitável’’.
Comentário replicado
Em resposta, Felipe Neto (foto ao lado, extraída do Pinterest) replicou o comentário da internauta em sua conta do Twitter, seguida à época por 11 milhões de pessoas, não sem antes sobrepor a seguinte legenda: ‘‘Faço questão de divulgar. Assim, as pessoas próximas vão saber que essa é uma pessoa que caga para a Ciência e acha que tem que lotar o sistema de saúde e morrer milhares de pessoas SIM. Eu nunca vi tanta gente desumana na minha vida’’. Por fim, acrescentou o endereço do Instagram da autora do comentário em sua publicação.
A autora da ação relata nos autos que, a partir desse posicionamento, teve sua rede social invadida por seguidores do influenciador com ofensas e ameaças que resultaram em um verdadeiro ‘‘linchamento virtual’’.
Ela disse que o ato do réu, ao divulgar a seus seguidores uma mensagem enviada em caráter privado, foi o causador do abalo moral sofrido, e que necessitou recorrer a tratamento psiquiátrico para recuperar sua saúde mental. Pleiteou, então, R$ 40 mil por danos morais e mais R$ 270 por danos materiais, para o reembolso de despesas com consultas médicas.
Publicidade de posicionamento
Na contestação, Felipe Neto alegou não ter cometido ato ilícito, visto que sua conduta resumiu-se a dar publicidade ao posicionamento da própria internauta, ainda que por poucos minutos. Garantiu que não incentivou linchamento virtual e que foi opção da acionante manter seu perfil no Instagram aberto, portanto, apto a receber mensagens de desconhecidos.
Por fim, o réu alegou que a autora da ação também é influenciadora digital e que ganhou mais de 2 mil seguidores e realizou ao menos 133 postagens após o acontecimento, com projeção de seu trabalho.
Sentença de parcial procedência
No primeiro grau, a ação indenizatória foi julgada parcialmente procedente. O influenciador acabou condenado ao pagamento de R$ 30 mil por danos morais mais danos materiais referentes à consulta com psicóloga.
Em apelação ao Tribunal de Justiça, a 6ª Câmara de Direito Civil levou em consideração a circunstância de o fato ter ocorrido no momento da maior emergência sanitária do século, quando soluções e ideias eram fortemente debatidas em um cenário de crise e de risco. Neste cenário, se admite como natural que diversas saídas sejam ventiladas pela sociedade.
‘‘A exposição da ideia da recorrente [autora da ação], embora diferente daquela adotada com respaldo científico por diversos atores públicos e completamente irresponsável […] não foi veiculada ao réu de modo desrespeitoso, mas, ao que tudo indica, a autora apenas declarou a sua opinião de modo privado ao acionado [réu da ação], sem pensar em ofendê-lo’’, anotou o desembargador relator Marcos Fey Probst.
Violação de privacidade
O problema visualizado pela relator foi de outra magnitude. O dano moral, esclareceu, configurou-se no momento em que o influenciador violou a privacidade e a intimidade da demandante, ao tornar público um comentário que recebera de forma privada.
‘‘É que a autora, quando respondeu o story do apelante no Instagram, de maneira que somente ele poderia acessar a mensagem, tinha a legítima expectativa de que ela não fosse divulgada para a grande quantidade de pessoas que acompanham as redes sociais do influenciador digital’’, complementou.
A 6ª Câmara de Direito Civil, entretanto, promoveu adequação no valor da indenização, de forma a seguir casos semelhantes já julgados pelo TJSC. Por isso, fixou o quantum reparatório em R$ 5 mil acrescidos de juros e correção monetária. O colegiado também indeferiu o pleito de indenização material, ressaltando que a autora não comprovou tais gastos, apenas os mencionou na petição inicial. Com informações do jornalista Ângelo Medeiros/Imprensa TJ-SC
Clique aqui para ler o acórdão de apelação
5012580-79.2020.8.24.0018/SC