QUEDOU SILENTE
Advogado que abandonou empresária no curso da ação penal pagará 10 salários mínimos à AGU

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Sede do TRF-4 em Porto Alegre
Foto: Diego Beck/ACS/TRF-4

Se o advogado constituído pelo réu deixa de atender a reiteradas intimações do juízo para apresentar as razões de apelação defensiva, abandonando a causa e ocasionando considerável atraso processual, é forçosa a imposição da multa expressa no artigo 265 do Código de Processo Penal (CPP).

O fundamento foi invocado pela maioria da 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) para manter aspecto da sentença criminal que condenou o advogado Manfredo Conrado Barroso Vidal Damaceno, filiado à OAB de Goiás, ao pagamento de multa no valor de 10 salários mínimos por abandono processual – o valor será revertido aos cofres da Advocacia-Geral da União (AGU).

O referido dispositivo do CPP diz, literalmente: ‘‘O defensor não poderá abandonar o processo sem justo motivo, previamente comunicado ao juiz, sob pena de responder por infração disciplinar perante o órgão correicional competente’’.

Intimações ignoradas

No primeiro grau, o juízo da 5ª Vara Federal de Novo Hamburgo (RS) disse que, apesar de devidamente intimado em quatro oportunidades, para que apresentasse os memoriais escritos, o advogado ‘‘permaneceu silente’’.

A desídia do advogado levou a juíza federal Maria Angélica Carrard Benites a enviar ofício à OAB goiana para apuração da infração disciplinar. Afinal, o inciso XI do artigo 34 do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) informa que constitui infração disciplinar ‘‘abandonar a causa sem justo motivo ou antes de decorridos dez dias da comunicação da renúncia’’.

‘‘A conduta do patrono demonstra evidente desrespeito à acusada por ele representada, além de ter retardado o andamento do processo (que conta com vários réus e está incluído na Meta 2), configurando, assim, infração processual (art. 265 do CPP) e administrativa (art. 34, XI, da Lei n. 8.906/94)’’, escreveu na sentença.

A Meta 2, estipulada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), se refere ao julgamento dos casos mais antigos, de forma a atender o princípio da razoável duração do processo: julgar, até 31 de dezembro de 2024, pelo menos, 99% dos processos distribuídos até 31 de dezembro de 2020.

O relator da apelação criminal no TRF-4, juiz federal convocado Marcelo Cardozo da Silva, afirmou que a multa aplicada com base neste dispositivo não é inconstitucional, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ), nem ofende os princípios do juiz natural, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Trata-se, apenas, de sanção de natureza processual, inserida na esfera de discricionariedade regrada do juiz natural do processo.

A ação penal

A ré que ficou abandonada no processo é a empresária cearense Márcia Maria Pereira, sócia majoritária da MP Consultoria e Assessoria Empresarial Ltda., sediada em Sobradinho (DF). Ela e outros foram denunciados pelo Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul (MPF-RS) por suprimir tributos e prestar declarações falsas à Fazenda Nacional.

Segundo consta dos autos, agindo em comunhão de esforços e vontades e com o objetivo de auferir lucro, os denunciados apresentaram, em nome da empresa Hahn Ferrabraz (São Leopoldo-RS), Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais à Receita Federal do Brasil (DCTF), contendo informações falsas que zeraram os seus débitos fiscais. Para tanto, utilizaram procuração ideológica e materialmente falsa.

Após encaminharem os documentos comprovando a ‘‘compensação’’ dos débitos tributários à empresa, os denunciados receberam honorários pelos serviços de assessoria prestados, em montante que ultrapassou R$ 300 mil. O serviço de revisão administrativa dos débitos tributários incluía pendência na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), na Receita Federal do Brasil (RFB) e no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Dentre os mencionados, estavam os débitos vencidos no âmbito da Receita Federal do Brasil e ainda não inscritos em dívida ativa, no valor total de R$ 4.399.795,85, relativos às competências de dezembro de 2008 a outubro de 2009.

No final do processo, a Justiça Federal da 4ª Região acabou condenando a sócia da MP Consultoria e Assessoria Empresarial Ltda às sanções artigo 1º, incisos I e II, da Lei 8.137/90, na forma do artigo 11 da mesma lei – ou seja, pelo crime de suprimir ou reduzir tributos mediante omissão de informações, prestação de declarações falsas e fraude à fiscalização tributária.

A pena privativa de liberdade, estabelecida em dois anos e quatro meses de reclusão, acabou substituída por penas restritivas de direito, consistentes no pagamento de quatro salários mínimos e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas – a ser definida na execução penal.

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Ação Penal 5005751-17.2018.4.04.7108 (Novo Hamburgo-RS)

 

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