TRABALHO DEGRADANTE
Dália é condenada solidariamente a pagar dano moral existencial a terceirizado no valor de R$ 50 mil
Submeter o trabalhador a ambientes laborais sem as mínimas condições de higiene nem de salubridade, em jornadas exaustivas, causa dano moral presumido, pois tais condutas afetam a sua esfera moral, ensejando o direito à indenização. Para tanto, basta que se prove tão somente a existência destas práticas ilícitas.
Deparando-se com este grave e deplorável quadro laboral, a 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) resolveu aumentar de R$ 4 mil para R$ 50 mil o valor da condenação em danos morais a ser paga a um auxiliar mecânico terceirizado.
O autor da ação reclamatória foi contratado pela empresa Marcos G. Fucks & Cia. Ltda, que presta serviços especializados de manutenção, reparo e instalação de equipamentos industriais para a Cooperativa Dália Alimentos Ltda., de Encantado. A condenação atingiu solidariamente ambos os reclamados.
Por unanimidade, os desembargadores reformaram a sentença do juízo da Vara do Trabalho de Encantado quanto ao reconhecimento do trabalho análogo ao escravo. O reclamante ainda conquistou o direito de receber outras verbas trabalhistas, pois a peça inicial embutia vários pedidos: plus salarial por acúmulo de funções, horas extras e Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Jornadas de trabalho extenuantes
Conforme comprovado, durante os 10 meses de duração do contrato de trabalho, o reclamante prestou serviços em jornadas que chegavam a 15 horas diárias na cooperativa de alimentos. Havia apenas uma folga por mês.
Ele foi trazido ao Rio Grande do Sul pela empresa interposta de mão de obra, que o contratou na cidade de Pé de Serra (BA), a 220km quilômetros de Salvador. À função de auxiliar de mecânico de manutenção, somaram-se atividades de soldagem, pedreiro, eletricista e limpeza de esgoto.
De acordo com as alegações do trabalhador, a promessa foi de alimentação e uma casa para moradia. Ao chegar no destino, o que havia era um local a ser compartilhado com outros oito trabalhadores, com instalações precárias e sem higiene. Até mesmo a conta de luz foi cortada por inadimplência da contratante.
Corte luz e tratamento abusivo
Uma testemunha confirmou o relato do autor da ação. Mensagens também deram conta de tratamento abusivo. Em uma ocasião na qual o auxiliar comunicou ao chefe que não iria ao trabalho por estar doente, a resposta foi: ‘‘também estarei doente no dia do pagamento’’.
A empresa de mão de obra negou todos os fatos. No primeiro grau da Justiça do Trabalho, a jornada excessiva foi reconhecida, havendo a condenação em R$ 4 mil por danos morais. O juiz do trabalho André Luiz Schech, no entanto, não vislumbrou a condição análoga à de escravo. O empregado e a contratante recorreram da sentença ao Tribunal.
Para o relator do acórdão na 8ª Turma do TRT-RS, desembargador Marcelo José Ferlin D’Ambroso, a prova foi suficiente à comprovação de condições degradantes e extenuantes de trabalho, que privaram o empregado de uma vida digna no lapso de duração do contrato.
Compromisso com ambiente laboral sadio
‘‘O trabalho não deve representar mecanismo de retirada de Direitos Humanos, mas sim de respaldo, observância e reparação no caso de violações, especialmente aquelas atinentes ao Meio Ambiente do Trabalho e à dignidade humana. Todos os membros da sociedade têm esse importante dever, inclusive, o Poder Judiciário, que não pode se esquivar de tal leitura essencial na análise de relações de trabalho’’, destacou o relator.
Empregadora e cooperativa foram responsabilizadas de forma solidária. Participaram do julgamento os desembargadores Luiz Alberto de Vargas e Brígida Joaquina Charão Barcelos.
O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT-RS) e a Polícia Federal (PF) foram oficiados quanto às condições de trabalho, em função do enquadramento no artigo 149 do Código Penal (CP) – ‘‘Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto’’.
Ainda cabe recurso da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.
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ATOrd 0020022-03.2020.5.04.0791 (Encantado-RS)