DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Sócios de fornecedor que encerrou atividades vão arcar com condenação judicial em ação consumerista

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade empresarial quando se deparar com falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da empresa provocados por má administração, como autoriza o artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Diante deste quadro, a 2ª Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis (JECs) da Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, em decisão unânime, confirmou sentença que julgou procedente pedido de desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa de informática que fechou as portas após vender produto defeituoso a um casal na Comarca de Novo Hamburgo (RS).

A decisão, automaticamente, colocou os dois sócios da empresa no polo passivo da ação indenizatória movida pelos consumidores, julgada procedente. Os sócios terão de pagar, do próprio bolso, o valor da condenação em danos morais e materiais – que está em fase de cumprimento de sentença.

A Vara do JEC da Comarca de Novo Hamburgo (RS) entendeu que ficou claro o inadimplemento no cumprimento da sentença por parte da pessoa jurídica. Também apurou que não foi demonstrada a situação de regularidade e sede empresarial.

 Teoria menor da desconsideração

‘‘Como é cediço, o Código Civil (CC) adotou a teoria maior da desconsideração e o CDC adotou a teoria menor da desconsideração, bastando a prova de encerramento irregular e a inadimplência provocados por má administração. Ademais, há entendimento de que a aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica da empresa é justificada pelo fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores’’, discorreu, na proposta de sentença, o juiz leigo Fábio Dalbem Weissheimer.

Segundo o julgador do JEC, pela teoria menor, adotada pelo artigo 28 do CDC, ‘‘permite-se desconsiderar a personalidade jurídica por obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores por má administração da sociedade, dispensando-se prova de abuso de direito ou de ato ilícito’’, complementou.

A relatora do caso na Turma Recursal, juíza Elaine Maria Canto da Fonseca, entendeu que o ato de desconsideração da personalidade jurídica, como decidido na sentença, deve ser mantido. Afinal, a empresa encerrou suas atividades e não foram encontrados bens para satisfazer o pagamento da condenação judicial. Assim, os sócios têm de responder com seu patrimônio pessoal pelo prejuízo imposto aos consumidores.

Para a relatora, o artigo 28 do CDC ‘‘abriu para além das possibilidades havidas no art. 50 do CC, em razão da vulnerabilidade do consumidor, possibilitando que a desconsideração da personalidade jurídica ocorra em diversos outros casos, que não aqueles limitados do art. 50 – desvio de finalidade ou confusão patrimonial’’.

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Processo 019.3.17.0000139-8/RS

Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCO

AÇÃO DECLARATÓRIA
TRF-4 exclui do polo passivo sócio que foi vítima de fraude, mas mantém a execução fiscal contra a empresa

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O artigo 167 do Código Civil (CC) diz que o negócio jurídico simulado é nulo, embora subsista o que se dissimulou, ‘‘se válido for na substância e na forma’’. Por isso, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) acolheu apelação para manter execução fiscal contra uma empresa de Porto Alegre, mas concordou com a exclusão de um dos sócios do polo passivo do processo, por ter sido vítima de fraude contratual – o que afastou o redirecionamento da cobrança contra ele.

O autor ajuizou, em face da União/Fazenda Nacional, pedido de declaração de inexistência de responsabilidade pelos créditos tributários inscritos em dívida relacionados ao Simples Nacional das competências de fevereiro a dezembro de 2003. A execução foi redirecionada para o nome do autor porque o fisco federal constatou a inatividade da sua empresa.

Assinatura falsificada

No curso da ação, o autor provou que, antes deste período, foi afastado da empresa de modo fraudulento – alguém falsificou sua assinatura, repassando as suas cotas sociais a outros dois sócios. Ou seja, a assinatura aposta na alteração contratual não era a dele, mas falsificada, atestou o perito judicial. ‘‘De fato, houve uma simulação contratual, com a suposta exclusão do autor do quadro societário, por tudo que se pôde apurar na instrução desta demanda’’, escreveu na sentença, proferida pela 16ª Vara Federal de Porto Alegre, o juiz Paulo Paim da Silva.

Informações fraudulentas

Em face do ocorrido, Silva citou a nulidade do negócio jurídico, possibilidade expressa no artigo 167, e também o artigo 169, do mesmo Código Civil. Este último dispositivo diz, ipsis litteris: ‘‘O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo’’. Em outras palavras, se o negócio jurídico é nulo, o ato não é convalidado.

Neste caso, ponderou, sendo nulas as alterações contratuais realizadas mediante fraude, devem prevalecer as declarações fiscais anuais que indicam a inatividade da empresa, efetivamente fornecidas pelo autorreal sócio-gerente da pessoa jurídica. Deste modo, os créditos tributários em cobrança, porque constituídos de forma equivocada e com base em informações fraudulentas, devem ser anulados, com a consequente extinção da execução fiscal’’, decidiu o julgador.

Por fim, Silva ressaltou que não seria o caso de redirecionar a execução em face dos dois supostos sócios, já que, aparentemente, foram vítimas da mesma fraude que prejudicou o autor. ‘‘Consigno, de toda forma, que uma vez reconhecida a nulidade das alterações no contrato social da empresa executada em 22/10/2002 e 08/01/2003, fica autorizado ao autor a apresentação desta decisão perante a Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul e à Receita Federal para exclusão daqueles atos e readequação de sua condição de administrador’’, finalizou na sentença.

Apelação ao TRF-4

A Fazenda Nacional apelou ao TRF-4, arguindo que o redirecionado não faz parte do quadro societário. Logo, não tem legitimidade para invalidar os débitos da empresa executada, na medida em que não faz parte da empresa.

O relator do caso na 1ª Turma, desembargador Leandro Paulsen, deu provimento à apelação. Afirmou ser incontroverso que o autor da ação não participou da operação de transferência de cotas sociais da empresa executada de forma fraudulenta – fato reconhecido pela Fazenda Nacional. Assim, ficou claro ele foi vítima de uso indevido de seu nome em negócio simulado.

Entretanto, pontuou que o reconhecimento da irregularidade no redirecionamento da execução não tem o condão de anular a Certidão de Dívida Ativa (CDA) e a execução fiscal nela calcada. No caso, a dívida ‘‘permanece hígida’’, restando claro, apenas, que a responsabilidade pelos créditos tributários não é do autor.

‘‘Dessa forma, entendo que a solução mais adequada é a exclusão de Rafael Pinto Bandeira do polo passivo da execução fiscal, com o prosseguimento dos atos executivos em relação a eventuais outros responsáveis tributários que forem identificados naqueles autos. Assim, afasto a declaração de nulidade da CDA 0040501275974 e de extinção da execução fiscal 50547320920154047100, visto que ambas remanescem hígidas’’, arrematou Paulsen no voto.

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Procedimento comum cível 5029122-39.2015.4.04.7100/RS

 Jomar Martins é editor da revista eletrônica PAINEL DE RISCO

JULGAMENTO DA APELAÇÃO
Liberação de hipoteca judicial não depende de trânsito em julgado da ação, decide STJ​

Imprensa STJ

Após o julgamento do recurso de apelação, não é necessário aguardar o trânsito em julgado da ação para o levantamento ou deferimento da hipoteca judicial. O entendimento foi firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Relator do recurso especial (REsp 1.963.553), o ministro Villas Bôas Cueva afirmou que a hipoteca judiciária recai sobre os bens do devedor com o objetivo de garantir o cumprimento da sentença. Portanto, ‘‘revela-se destituída de sentido a manutenção do gravame após a decisão do tribunal que, dotada de efeito substitutivo, reforma a sentença de mérito, afastando da parte recorrente a condição de devedora’’.

No caso analisado, os recorrentes ajuizaram ação de indenização, que foi julgada procedente, com deferimento do pedido de hipoteca judiciária sobre diversos bens do recorrido. Após o recurso de apelação, a indenização por danos patrimoniais foi reduzida, afastando-se a condenação pelos danos morais.

Efeito substitutivo do acórdão da apelação

Diante disso, o devedor pediu o cumprimento provisório da sentença, fazendo o depósito judicial do valor da condenação e requerendo a liberação da hipoteca judiciária. Os autores da ação não questionaram o depósito, mas impugnaram o pedido de levantamento da hipoteca – o qual foi deferido pelo tribunal de origem.

O ministro Villas Bôas Cueva relembrou que, uma vez provido o apelo, a decisão do tribunal substitui a sentença, passando a viger o que nela foi estabelecido. Destacou ainda que prevalece na doutrina a compreensão de que, substituída a sentença de mérito pela decisão do tribunal em sentido oposto, a condenação que ensejou a hipoteca judiciária deixa de existir, devendo o gravame ser levantado.

Com essa consideração, o magistrado concluiu que ‘‘é possível tanto o deferimento da hipoteca judiciária para aquele que teve seu pedido julgado procedente em apelação quanto o seu levantamento nos casos em que o acórdão reforma a anterior sentença de procedência’’.

Os recursos não inibem a eficácia da decisão

O ministro Cueva acrescentou que o próprio texto normativo do artigo 495, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil (CPC), sugere a desnecessidade do trânsito em julgado da decisão que reforma ou invalida aquela que gerou a hipoteca, ao afirmar que a responsabilidade civil será gerada desde a reforma ou invalidação da decisão originária.

Quanto ao fato de haver recurso pendente contra o acórdão da apelação, o magistrado lembrou que, de acordo com o disposto no artigo 995 do CPC, os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Portanto, apontou, com exceção do recurso de apelação (artigo 1.012 do CPC), a regra geral é a ausência do efeito suspensivo em relação aos demais recursos processuais.

Ao negar provimento ao recurso especial, Villas Bôas Cueva destacou ainda que, no caso julgado, o acórdão recorrido consignou expressamente que é impossível não reconhecer que a hipoteca judiciária não tem mais razão de existir, pois o valor depositado judicialmente, que não foi impugnado, presume-se suficiente para quitar a obrigação.

Leia o acórdão no REsp 1.963.553

DANO MORAL TRABALHISTA
Vigilante que não recebia água potável no local de trabalho será indenizado

Secom/TST

Deixar de fornecer água potável a um vigilante em serviço atenta contra a sua integridade física e psíquica, dando ensejo ao dever de indenizar em danos morais. Por isso, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a GP – Guarda Patrimonial de São Paulo Ltda., sediada no Rio de Janeiro (RJ), a pagar R$ 4 mil a um vigilante por não fornecer água potável nos locais de serviço. A decisão foi unânime.

Trazia água de casa

Na reclamatória trabalhista, o vigilante afirmou que não havia água potável nos postos de trabalho. Disse que permanecia exposto ao sol e à chuva, sem guarita ou infraestrutura mínima para que pudesse exercer suas atividades. Sem o fornecimento de água, o jeito, segundo ele, era trazer de casa. Na avaliação do empregado, a empregadora demonstrou descaso e falta de consideração.

Aventura jurídica

Em resposta à petição, a GP disse que não havia praticado nenhum ilícito e que a obrigação de provar o dano era do vigilante. A empresa qualificou como “aventura jurídica” a pretensão do empregado, “uma manobra para enriquecer ilicitamente”.

Ministro Maurício Godinho Delgado foi o relator do recurso de revista (RR)
Foto: Secom/TST

Sem previsão legal

O juízo da 1ª Vara do Trabalho de Resende (RJ) e o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1) julgaram improcedente o pedido do empregado, no aspecto. Segundo o TRT fluminense, não seria possível concluir a ocorrência de violência de índole extrapatrimonial. Além disso, não existe a obrigação legal ou contratual de fornecimento de água pela empregadora.

Reparação

Todavia, para o relator do recurso do empregado no TST, ministro Maurício Godinho Delgado, as condições de trabalho a que se submeteu o trabalhador atentaram contra sua dignidade e sua integridade psíquica ou física, justificando a reparação moral. “O empregador deve tomar todas as medidas necessárias para prevenir o dano psicossocial ocasionado pelo trabalho”, ressaltou o ministro.

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Processo RR-1926-07.2010.5.01.0521

COMISSÕES DISFARÇADAS
Sem provar empréstimos pessoais, empregador pagará diferenças salariais

Secom/TST

Ministro Amaury Rodrigues Pinto Júnior.                     Foto: Secom/TST

Em decisão unânime, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) negou provimento a agravo de instrumento em recurso de revista (AIRR) aviado por Sales Táxi Aéreo e Serviços Aéreos Especializado, de São Paulo (SP), e outra empresa do grupo contra a condenação ao pagamento de diferenças salariais a uma gerente, relativas a comissões “por fora”.

Segundo o colegiado do TST, as empresas não conseguiram comprovar que os valores depositados na conta da trabalhadora eram decorrentes de empréstimos pessoais, como alegado pela defesa.

Dinheiro e cheques

Contratada em 2011 para a função de gerente de táxi aéreo, porém com registro em carteira de assistente de vendas, a profissional, dispensada em dezembro de 2016, contou que recebia salário fixo de R$ 3 mil e comissão de 5% sobre as vendas de táxi aéreo.

As comissões eram pagas “por fora”, em dinheiro ou em cheques de clientes, conforme extratos bancários apresentados. Ela requereu que esses valores fossem reconhecidos como parte da sua remuneração mensal, repercutindo, assim, nas demais verbas salariais.

Empréstimos pessoais

Em contestação, os empregadores alegaram que a gerente não recebia comissões e tinha outras fontes de renda, pois prestava serviços, também, para sua própria empresa. De acordo com a Sales, alguns depósitos efetuados por suas sócias se referiam a empréstimos pessoais à empregada.

Condenação nos dois graus de jurisdição

A tese dos empréstimos foi rejeitada pelo juízo trabalhista de primeiro grau, por não ter sido solidamente confirmada por nenhuma testemunha nem por documentos. Com isso, as empresas foram condenadas ao pagamento das diferenças decorrentes da integração das comissões nas demais parcelas, como descansos semanais remunerados, 13º salário, férias e Fundo de Garantia. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) manteve a sentença.

Comissões por voo

O relator do agravo com o qual as empresas buscavam rediscutir o caso no TST, ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, assinalou que não foram apresentados documentos para comprovar as alegações de empréstimo. Entretanto, do outro lado, frisou, a testemunha da trabalhadora afirmou que recebia salário fixo, horas de voo e comissões que não eram discriminadas em holerite, mas depositadas diretamente em conta. De acordo com essa testemunha, a venda de voos era feita principalmente pela gerente, que recebia comissão de 5%.

Para o ministro-relator, ao contrário do alegado pelas empresas, não houve má aplicação das regras do ônus da prova. Ao defender que os depósitos diziam respeito a empréstimos pessoais, elas atraíram para si o ônus de comprovar esse fato, e não o fizeram.

Por outro lado, a gerente se desincumbiu do seu ônus de comprovar o recebimento das comissões. Para alterar a conclusão do TRT, seria necessária a reanálise do conjunto fático-probatório, mas esse procedimento é vedado pela Súmula 126 do TST.

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Ag-AIRR-1001089-96.2017.5.02.0088