DANOS MORAIS
Empregador que informa motivo da demissão por justa causa a terceiros viola direitos de personalidade

Imprensa/TRT-SP

A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) manteve condenação, por danos morais, de uma empresa de serviços de portaria e limpeza de Guarulhos (SP) que informava a qualquer interessado sobre a justa causa aplicada a um ex-empregado. Além de ser obrigada a pagar indenização, no valor de R$ 4 mil, a companhia foi proibida de prestar informações quanto à forma de dispensa do trabalhador.

O rapaz exercia a função de controlador de acesso e alega ter sofrido desligamento arbitrário por justa causa. Após ajuizar reclamação trabalhista, as partes se conciliaram em audiência.

No entanto, o ex-empregado enfrentou dificuldades ao tentar se recolocar no mercado. Chegou a ser aprovado em vários processos seletivos, mas foi rejeitado após os contratantes buscarem referências junto ao antigo empregador, quando foram informados da dispensa por falta grave do profissional.

Contato telefônico

O trabalhador pediu, então, que sua esposa ligasse para a empresa onde atuou, simulando interesse na contratação dele para um novo emprego. Ao questionar sobre a rescisão contratual em duas ocasiões, ela também foi informada da justa causa.

A ligação telefônica foi gravada, e o material, anexado aos autos. Para o funcionário, são evidentes os impactos causados em sua vida profissional e social, atingindo sua imagem e honra – direitos de personalidade assegurados no artigo, inciso X, da Constituição.

Em defesa, a companhia nega a alegação de dispensa arbitrária do trabalhador, afirmando ter cumprido a aplicação gradativa de penas disciplinares até chegar à justa causa. Afirma que não divulga publicamente informações sobre seus ex-empregados e acusa o rapaz de usar provas ilícitas, com quebra de sigilo telefônico.

Informações desabonadoras a qualquer pessoa

Desembargadora Ivani Contini Bramante
Foto: Márcia Yamamoto/ALESP

No acórdão, de relatoria da desembargadora Ivani Contini Bramante, os magistrados afirmam que o caso não configura interceptação telefônica, pois não houve ato de terceiro que tenha violado a comunicação das partes.

‘‘Evidenciado nos autos que a reclamada divulga, a qualquer pessoa que entre em contato telefônico, que o reclamante foi dispensado por justa causa, o que pode gerar inegável dificuldade para retorno ao mercado de trabalho, bem como gera clara ofensa à honra do trabalhador’’, constata a desembargadora-relatora.

Com base na Constituição Federal (CF), no Código de Processo Civil (CPC) e na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a decisão esclarece: ‘‘O ordenamento jurídico brasileiro, portanto, seja no âmbito constitucional, seja nas normas infraconstitucionais, protege o sigilo de dados e os direitos da personalidade, o que não impede, entretanto, a utilização de informações obtidas por meios eletrônicos para efeito de provas de fatos, observados, obviamente, os limites constitucionais e legais estabelecidos’’.

A Turma manteve a condenação do empregador em R$ 4 mil por danos morais, além de fixar multa de R$ 500,00 para cada informação desabonadora prestada sobre o profissional pelo ex-empregador.

Clique aqui para ler a sentença

Clique aqui para ler o acórdão

1000092-94.2020.5.02.0319 (Guarulhos-SP)

RICOCHETE
Dispensa motivada por amizade com desafetos do empregador é discriminatória

Secom TST

 A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), do Tribunal Superior do Trabalho (TST), considerou discriminatória a dispensa de um executivo da Indaiá Brasil Águas Minerais Ltda. em razão da amizade com ex-empregados considerados desafetos de um dos sócios da empresa. Para o colegiado, a discriminação se deu de forma indireta (em ricochete), ultrapassando o poder diretivo do empregador.

‘‘Feios e gordos’’

Na ação reclamatória, o empregado, engenheiro eletricista, disse que trabalhara na empresa por cerca de 20 anos até chegar ao cargo de superintendente. Em outubro de 2012, durante suas férias, um de seus subordinados, por telefone, informou que a empresa estava buscando nomes para substituí-lo. O motivo seria o fato de ele ter postado fotos de viagem com dois ex-empregados de quem um dos diretores não gostava, alegadamente por serem ‘‘feios e gordos’’, e não admitia que seus funcionários se relacionassem com eles.

Ao retornar das férias, ele disse que foi impedido de ingressar na empresa. Seus objetos pessoais foram recolhidos e entregues em sua residência em caixas de papelão. Ainda de acordo com seu relato, outros três empregados que participaram da viagem também foram dispensados.

Faculdade do empregador

A empresa, em sua defesa, sustentou que o ato da dispensa é uma faculdade conferida a todo empregador para encerrar um contrato de trabalho. Segundo a Indaiá, a demissão fora uma decisão financeira, e não motivada por amizades mantidas fora do ambiente de trabalho.

Intolerância pela amizade

O juízo de primeiro grau fixou a indenização em R$ 150 mil, valor mantido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (TRT-7, Ceará), por entender que o caso se trata de intolerância pela amizade de empregados com os ex-empregados, cuja inimizade do sócio da empresa resultou da condição física dessas pessoas. Segundo o TRT cearense, não se pode acreditar que quatro funcionários do primeiro escalão tenham sido dispensados ‘‘sem qualquer motivo’’, ao mesmo tempo e logo após a viagem de férias.

Sem amparo legal

Ao julgar recurso de revista (RR) da empresa, a Quarta Turma afastou a condenação, por entender que não se poderia presumir, a partir da decisão do TRT, que o empregado fora vítima de ato discriminatório, pois estaria se criando uma discriminação de forma reflexa, sem amparo em lei.

De acordo com o colegiado, não havia referência a sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade do empregado como motivo da dispensa, o que afastaria o enquadramento do caso na Lei 9.029/1995, que veda práticas discriminatórias nas relações de trabalho.

Contra essa decisão, o supervisor interpôs embargos à SDI-1.

Caso peculiar

Ministro Aloysio Corrêa da Veiga
Foto: Secom TST

O relator dos embargos, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, disse que se trata de um caso peculiar, porque a dispensa ocorrera não por ato discriminatório contra o próprio empregado, mas por ele manter amizade com desafetos de um de seus diretores. A seu ver, essa espécie de ‘‘discriminação por ricochete’’ requer uma reflexão sobre os limites do poder diretivo do empregador e a amplitude da função social do contrato de trabalho e da inibição do exercício abusivo desse direito.

Poder potestativo

Segundo o ministro, o poder potestativo do empregador de dispensar empregados tem previsão no artigo 2º da CLT. Entretanto, esse está vinculado ao exercício de todas as atividades administrativas da empresa, como organizar regras de trabalho, fiscalizar e mesmo aplicar punições. ‘‘Esse poder decorre da necessidade de controlar a prestação dos serviços para o fim de conferir a produção e a qualidade do produto final do trabalho’’, explicou.

Dignidade ferida

No caso dos autos, contudo, a conduta empresarial de demitir o empregado em razão de suas relações pessoais atinge a dignidade e causa sofrimento.

‘‘Não há como admitir que ofensa relacionada com a qualidade física de amigos pessoais seja argumento para demissão de um empregado, quando o poder diretivo tem limite na qualidade do trabalho e no cumprimento das regras empresariais – que, no caso, não foram fundamento da dispensa’’, assinalou.

Vedação legal

O relator observou, ainda, que o artigo 1º da Lei 9.029/1995 veda a discriminação ‘‘por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros’’. Trata-se, segundo ele, de um rol exemplificativo. ‘‘Cabe entender que a discriminação pode ocorrer de várias formas, incumbindo apenas decifrar se a intenção do empregador está vinculada ou não ao trabalho, já que nem sempre as razões efetivas são enunciadas de forma tão explícita’’, ressaltou.

Para o ministro, a dispensa infundada, com fundamento na amizade do empregado com pessoa desafeta do empregador, ‘‘e, mais ainda, quando a razão da inimizade decorre de aversão descabida a características físicas dessas pessoas’’, sustenta o entendimento de efetiva discriminação, que deve ser repudiada.

Com o reconhecimento da dispensa discriminatória, foi restabelecida a decisão do TRT, e o processo retornará à Quarta Turma para o exame dos demais temas do recurso.

Clique aqui para ler o acórdão

E-ED-RR-2016-68.2014.5.07.0016-CE

CAÇA AO CLIENTE
Marca alheia em link patrocinado do Google é concorrência desleal, diz STJ

Imprensa STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu concorrência desleal na conduta de uma empresa anunciante na internet que utilizou a marca registrada de concorrente como palavra-chave no sistema de links patrocinados do Google. O objetivo da manobra era conseguir resultados privilegiados nas buscas e direcionar clientes para os seus serviços.

Ao analisar a questão inédita na corte, o colegiado manteve o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que condenou a anunciante a pagar danos morais de R$ 10 mil.

‘‘Além da flagrante utilização indevida de nome empresarial e marca alheia, a utilização de links patrocinados, na forma como engendrada pela ora recorrente, é conduta reprimida pelo artigo 195, incisos III e V, da Lei de Propriedade Industrial, e pelo artigo 10 bis da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial’’, afirmou o relator do recurso especial  (REsp), ministro Luís Felipe Salomão.

No sistema de links patrocinados, a empresa que paga pelo serviço tem o endereço de seu site exibido com destaque nos resultados das pesquisas sempre que o internauta busca por determinadas palavras-chaves.

Para anunciante, desvio de clientela seria normal na livre concorrência 

Na origem do processo, a ação foi proposta por uma empresa de turismo cujo principal produto é a promoção de viagens à Disney. Segundo a empresa, ela era detentora de todos os direitos relativos à sua marca, porém, quando um usuário pesquisava no Google usando o seu nome como palavra-chave, o buscador mostrava como primeiro resultado a página de outra empresa – prestadora do mesmo tipo de serviço.

Em primeira instância, o juízo reconheceu o uso indevido da marca da autora para prática de concorrência desleal e fixou a indenização por danos morais em R$ 15 mil, valor reduzido para R$ 10 mil pelo TJ-SP.

No RESp, a empresa ré alegou que a captação de clientela é inerente a qualquer atividade econômica, especialmente no âmbito do e-commerce. Para a empresa, considerar reprimível qualquer desvio de clientela implicaria a eliminação da própria livre concorrência.

Sistema de patrocínio é lícito, mas deve respeitar propriedade intelectual

Ministro Luís Felipe Salomão
Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

O ministro Luís Felipe Salomão lembrou que o artigo 195 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) prevê como crime de concorrência desleal, entre outras condutas, o emprego de meio fraudulento para desviar, em proveito próprio ou alheio, os clientes de outra empresa.

No âmbito do sistema de links patrocinados – um dos ferramentais mais importantes do e-commerce –, o ministro comentou que, embora seja lícita a contratação do serviço de priorização de resultados de pesquisa, a inexistência de parâmetros ou proibições de palavras-chaves nas ações publicitárias pode resultar em conflitos relacionados à propriedade intelectual.

No caso dos autos, Salomão considerou que a utilização de marca de outra empresa como palavra-chave para direcionar o consumidor do produto ou serviço concorrente é, como entendeu o TJSP, capaz de causar confusão quanto à atividade exercida por ambas as empresas.

‘‘O estímulo à livre iniciativa, dentro ou fora da rede mundial de computadores, deve conhecer limites, sendo inconcebível reconhecer lícita conduta que cause confusão ou associação proposital à marca de terceiro atuante no mesmo nicho de mercado’’, concluiu o ministro ao manter a indenização fixada pelo TJ-SP.

REsp 1937989-SP

ACÚMULO DE DÍVIDAS
Philip Morris não indenizará distribuidor de cigarros por rompimento de contrato, decide TJ-SP

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: CNN

Não há necessidade de perícia contábil para aferir os prejuízos suportados por uma empresa que perdeu o contrato de distribuição, por investimentos feitos em fundo de comércio ou lucros cessantes, se a rescisão contratual que deu ensejo à ação indenizatória ocorreu sem abuso de direito, de forma motivada e com previsão na própria minuta contratual entabulada entre as partes.

Por isso, a 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou apelação de uma distribuidora de cigarros que teve o contrato rompido pela Philip Morris após quase meio século de parceria comercial. A empresa parceira queria ser indenizada pelo ‘‘abrupto rompimento’’, mas a multinacional provou nos autos que a rescisão era justificável, o que a dispensaria de dar o aviso prévio para a denúncia do ajuste.

O relator da apelação, desembargador Paulo Alcides Amaral Salles, lembrou que no ajuste contratual realizado em 1999 consta a ‘‘expressa possibilidade’’ de desfazimento do negócio se o contratado atrasar o pagamento de quaisquer compras realizadas junto à contratante. Os sucessivos aditamentos não alteraram esta exigência.

Para Salles, o inadimplemento contratual da parte apelante é incontestável, dado os diversos atrasos no pagamento das mercadorias adquiridas. ‘‘Embora a recorrente [Distribuidora Reis] afirme que o último instrumento de confissão de dívida, assinado em 07/08/2015, ainda estava no prazo para pagamento, os outros débitos já estavam há muito vencidos e foram esses que ensejaram a ruptura do contrato’’, escreveu no acórdão.

Contrato atípico

Ao concluir o voto, o desembargador-relator esclareceu que a distribuição por intermediação é um contrato atípico. Por isso, os direitos e deveres das partes são os expressamente previstos no ajuste. No presente contrato, pontuou, não há estipulação específica sobre a indenização pela clientela em caso de extinção da relação por justa causa.

‘‘Ademais, os gastos com a constituição do fundo de comércio e captação de clientela são inerentes à relação de distribuição e devem ser compreendidos como parte do risco do negócio, não podendo ser imputado ao distribuído’’, encerrou, confirmando o teor da sentença.

Rescisão unilateral

Após ter aberto e consolidado mais de 6.500 pontos de venda nos Estados de Goiás, Tocantins e Distrito Federal, a Distribuidora de Cigarros Reis, sediada em Brasília, foi à Justiça pleitear indenização da Philip Morris, que pediu resilição abrupta do contrato de distribuição por intermediação em 2015, pondo fim a 46 anos de relacionamento comercial. Nesta modalidade, o empresário (distribuidor) assume, perante o outro (distribuído), a obrigação de criar, consolidar ou ampliar o mercado dos produtos deste último, comprando-os para revender. O ajuste foi firmado por prazo indeterminado e sem exclusividade.

Na petição, a Distribuidora Reis denunciou que a Philip Morris desrespeitou o prazo de 90 dias, livremente acordado, para implementar a resilição, obrigando-a a encerrar as suas atividades em seis dias. Esse prazo exíguo gerou graves prejuízos, impactando no manejo da frota de veículos distribuidores, questões trabalhistas, dentre outras.

Assim, por infringir a ordem econômica, entende que a ré deve indenizá-la por todo este fundo de comércio e pelos lucros cessantes, tendo em vista as disposições do artigo 36, parágrafo 3º, incisos III e IV, da Lei 12.529/2011.

A Philip Morris se defende

Citada pela 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem, do Foro Central Cível da Comarca de São Paulo, a ré alegou que a cláusula apontada como fundamento não estava em vigência. Além disso, a autora violou a boa-fé objetiva ao reclamar sobre o prazo de 90 dias para resilição depois de três anos da rescisão contratual.

A multinacional também sustentou a existência de justa causa para a resilição contratual, o que a exime de qualquer obrigação de indenizar, conforme autoriza o artigo 715 do Código Civil (CC): ‘‘O agente ou distribuidor tem direito à indenização se o proponente, sem justa causa, cessar o atendimento das propostas ou reduzi-lo tanto que se torna antieconômica a continuação do contrato’’.

Sentença improcedente

O juízo da 2ª Vara julgou a ação indenizatória improcedente, por entender que no contrato entabulado em 1989 – usado como paradigma pela parte autora – havia cláusula dispondo sobre a possibilidade de rescisão motivada a qualquer tempo, em interpretação contrario sensu. No efeito prático, o contrato poderia ser rescindido sem justa causa por qualquer das partes, a qualquer tempo, mediante aviso prévio por escrito de 90 dias.

‘‘É evidente, portanto, que, havendo justa causa, não haveria a necessidade de aviso prévio de 90 dias, seja no contrato de 1989, seja nos posteriores; neste caso, havendo apenas a disposição expressa dos casos de justa causa para esclarecer a sistemática da resolução contratual sem a necessidade de denúncia ou de aviso prévio’’, esclareceu o juiz Luís Felipe Ferrari Debendi.

Conforme o julgador, a questão do descumprimento do aviso prévio pela parte ré ou de eventual conduta abusiva depende da verificação da existência ou não de justa causa para a rescisão contratual.

Sucessão de inadimplementos

Nesse sentido, em que pese a argumentação da Distribuidora Reis, alertou, os autos trazem ‘‘robusta comprovação’’ de que a extinção do contrato ocorreu por uma sucessão de inadimplementos, que se arrastou por mais de um ano, com instrumentos de confissão de dívida e diversos aditivos com prorrogações.

‘‘Inclusive tal fato já era de pleno conhecimento da autora, conforme se verifica nos e-mails de tratativas das confissões de dívida, nos quais restou bem claro que o motivo da rescisão contratual foi o inadimplemento da autora, que, por sua vez, poderia ser efetuado a qualquer tempo’’, complementou.

O juiz concluiu que a rescisão não foi abusiva nem abrupta, como vinha repisando a parte ré, pois ocorreu após um ano, com 11 confissões de dívida e repactuação de prazos e formas de pagamento, ao fim do qual restou a autora como devedora de montante milionário. ‘‘Inexistindo ato ilícito ou abuso de direito, não há como responsabilizar a ré por quaisquer prejuízos experimentados pela autora’’, decretou na sentença de improcedência.

Clique aqui para ler o acórdão

1085239-19.2018.8.26.0100  (São Paulo)

AJUDE A EXPANDIR NOSSO PROJETO EDITORIAL.
DOE ATRAVÉS DA CHAVE PIX E-MAIL
:
 jomar@painelderiscos.com.br

CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Ação arbitral autorizada por assembleia prevalece sobre ação antiga de acionista minoritário

Imprensa STJ

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a prevalência de ação arbitral patrocinada por uma companhia, aprovada em assembleia geral extraordinária e proposta sob a titularidade da própria sociedade empresária, sobre procedimentos arbitrais anteriores, de iniciativa de acionistas minoritários.

Ao analisar o conflito de competência, o colegiado entendeu que a companhia seguiu as regras legais de realização da assembleia e de ajuizamento do procedimento arbitral, de forma que os acionistas minoritários não tinham legitimidade extraordinária para promover as ações.

Os três procedimentos, ajuizados em tribunais arbitrais vinculados à mesma câmara de arbitragem, discutiam a responsabilização dos acionistas controladores por supostas condutas ilícitas na gestão da sociedade. Os dois mais antigos foram movidos por acionistas com menos de 0,01% das ações, em legitimação extraordinária, e, inicialmente, incluíram no polo passivo a própria sociedade empresária. Depois, a sociedade prosseguiu como mera interveniente nesses procedimentos.

No conflito de competência, a companhia alegou que não pôde promover imediatamente o procedimento arbitral com o mesmo objeto porque a assembleia geral extraordinária designada para deliberar sobre a medida foi suspensa judicialmente. Dessa forma, só após o levantamento da suspensão é que a sociedade conseguiu realizar a assembleia e, na sequência, em legitimação ordinária, entrar com a ação arbitral – quando as duas ações dos sócios minoritários já estavam em andamento.

STJ tem competência para decidir conflito entre dois juízos arbitrais

Ministro Marco Aurélio Bellizze
Foto: Sergio Amaral/STJ.

O relator na Segunda Seção do STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que, no caso dos autos, a câmara de arbitragem não disciplinou solução para o impasse criado quando dois tribunais arbitrais proferem decisões inconciliáveis em procedimentos parcialmente idênticos. Nas ações movidas pelos acionistas individuais, o tribunal arbitral proferiu decisão negando a sua extinção; já na ação mais recente, a corte arbitral reconheceu a sua prevalência sobre os feitos mais antigos.

Nesse contexto, o ministro lembrou que, de acordo com o artigo 105, inciso I, alínea ‘‘d’’, da Constituição, compete ao STJ processar e julgar, originariamente, os conflitos de competência entre quaisquer tribunais.

‘‘A jurisprudência da Segunda Seção, tomando como premissa a compreensão de que a atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem possui natureza jurisdicional, reconhece a competência desta corte de Justiça para dirimir conflito de competência em que figura, seja como suscitante, seja como suscitado, o tribunal arbitral’’, esclareceu o magistrado.

Segundo ele, apesar de não compor organicamente o Poder Judiciário, o tribunal arbitral deve ser compreendido na expressão ‘‘quaisquer tribunais’’ prevista no artigo 105 da Constituição, o que significa que cabe ao STJ decidir o conflito de competência entre dois tribunais arbitrais. O relator também destacou que a câmara à qual os tribunais arbitrais estão vinculados não tem poder jurisdicional para dirimir o conflito, por possuir apenas atribuições administrativas.

Minoritários só teriam legitimidade extraordinária em caso de inércia da companhia

Com base na Lei 6.404/1976, Bellizze apontou que, em regra, a ação de reparação de danos causados ao patrimônio social por atos dos administradores ou controladores deve ser proposta pela companhia diretamente lesada – titular natural do direito. Apenas em caso de inércia da sociedade é que a lei confere, de forma subsidiária, a legitimidade extraordinária para o acionista promover a ação.

O relator destacou que o ajuizamento da ação de responsabilização pela companhia exige a realização de assembleia geral para deliberar sobre o assunto. E que a inércia capaz de justificar a legitimação extraordinária dos acionistas apenas ficaria caracterizada se, passados três meses da aprovação pela assembleia, o titular do direito lesado não tivesse tomado a medida judicial ou arbitral cabível.

Para o ministro, contudo, a companhia não se mostrou inerte na tomada das providências legais para a propositura da ação, o que torna os acionistas minoritários ilegítimos para ajuizar seus procedimentos.

‘‘Não se pode conceber que a companhia, titular do direito lesado, fique tolhida de prosseguir com ação social de responsabilidade dos administradores e dos controladores, promovida tempestivamente e em conformidade com autorização assemblear, simplesmente porque determinados acionistas minoritários, em antecipação a tal deliberação e, por isso, sem legitimidade para tanto, precipitaram-se em promover a ação social de responsabilidade de controladores’’, concluiu Bellizze.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.