DÍVIDAS TRABALHISTAS
Postagens em redes sociais não justificam retenção de passaporte de devedores

Arte de Leo Rangel para o site Tupãense.com.br

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2), do Tribunal Superior do Trabalho (TST),  rejeitou recurso de uma auxiliar de serviços gerais que pretendia a retenção dos passaportes dos sócios da Home Sweet Home Serviços Ltda., de Curitiba, condenados em ação trabalhista movida por ela. Segundo o colegiado, não ficou demonstrada a proporcionalidade da medida.

Medidas coercitivas

Na ação reclamatória, ajuizada em 2014, a empresa foi condenada a pagar R$ 20,4 mil à auxiliar. Na execução trabalhista, não foram encontrados bens ou valores para quitar o débito com a ex-empregada. Como medida coercitiva, o juízo de primeiro grau determinou o cancelamento dos cartões de crédito, a suspensão das carteiras nacionais de habilitação (CNH) e a retenção dos passaportes dos sócios da empresa devedora.

Direito de ir e vir

Contra a decisão, os sócios impetraram habeas corpus, alegando que a suspensão da CNH e dos passaportes restringia seu direito fundamental de ir e vir e que não havia garantia de que isso viabilizaria o pagamento do débito trabalhista. O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9, Paraná) manteve o pedido em relação à CNH, mas liberou os passaportes.

Ostentação

No recurso ordinário trabalhista (ROT) endereçado ao TST, a auxiliar sustentou que a execução já se estende por mais de sete anos e que, após a concessão do habeas corpus, verificou as redes sociais dos devedores para avaliar a importância do passaporte no seu cotidiano. Com fotos anexadas aos autos, ela disse que um deles é chefe de cozinha, proprietário de um restaurante ‘‘secreto’’ que cobra valores elevados para reservas de pequenos grupos e fazia churrascos com carnes nobres para os amigos.

O outro devedor, por sua vez, havia feito diversas viagens internacionais no curso do processo, para destinos como Barcelona (Espanha), República Tcheca, Disney (EUA) e Amsterdã (Holanda). Também alegou que eles haviam aberto novas empresas após o ajuizamento da ação trabalhista.

Ministro Douglas Alencar foi o relator
Foto: Ascom TRT-RN

Ocultação patrimonial

O relator do recurso, ministro Douglas Alencar Rodrigues, explicou que o Código de Processo Civil (CPC) permite a adoção de medidas coercitivas atípicas para a satisfação de dívidas reconhecidas em juízo ‘‘em caráter excepcional’’. Segundo ele, essas medidas são adequadas quando houver indícios de ocultação patrimonial.

No caso, a decisão que suspendeu os documentos, de maio de 2020, registrou que já haviam sido tentadas todas as medidas tradicionais de execução (penhoras, BacenJud, inscrição no Serasa, CNIB etc.). Contudo, não havia nenhuma indicação de que os devedores estariam ocultando bens nem de que seu padrão de vida revelasse patrimônio suficiente para satisfazer a execução.

Para o ministro, a retenção dos passaportes não deve ser empregada como mera punição dos devedores. (Com informações de Lourdes Tavares/Secom TST)

Clique aqui para ler o acórdão

 ROT-1021-05.2021.5.09.0000-PR 

AÇÃO EXIBITÓRIA
Herdeiras da Sadia não conseguem indenização por falta de acesso a provas para anular doação de ações

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de duas filhas do fundador da Sadia, que pediam indenização com base na teoria da perda de uma chance, em razão da dificuldade para obter elementos de prova a tempo de impugnar supostas doações inoficiosas de ações – realizadas décadas atrás – que teriam favorecido seus irmãos unilaterais.

As recorrentes pretendiam responsabilizar a BRF S/A, sucessora da Sadia, por não ter apresentado dois livros societários em prazo hábil para subsidiar o ajuizamento de ação destinada a anular as doações e restabelecer a participação societária de seu pai. Os ministros, porém, entenderam que não foi demonstrado o nexo de causalidade entre o extravio dos documentos e o prejuízo que as recorrentes alegam ter sofrido.

As duas herdeiras ajuizaram ação indenizatória de danos materiais e morais argumentando que receberam participação acionária inferior à que seria efetivamente devida. Pediram reparação de danos causados pela conduta da empresa, que deixou de apresentar dois livros societários em ação de exibição de documentos, os quais comprovariam sua alegação de que o pai doou cotas de participação societária somente aos outros filhos.

Aplicação da teoria da perda de uma chance exige certeza do prejuízo

A sentença julgou a ação improcedente. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) confirmou a decisão, ao entendimento de que ‘‘nem toda chance perdida é indenizável, mas somente aquela plausível e provável, à luz das circunstâncias do caso concreto’’.

Segundo o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, na perda de uma chance, há prejuízo certo, e não apenas hipotético, situando-se a certeza na probabilidade de obtenção de um benefício, frustrado por força do evento danoso imputado. ‘‘Repara-se a chance perdida, e não o dano final’’, acrescentou o magistrado.

Ministro Paulo Sanseverino foi o relator
Foto: Rafael Luz/Imprensa STJ

No processo analisado – afirmou o ministro –, a alegação central é de que teriam sido realizadas diversas doações pelo dono da Sadia, ao longo da vida, beneficiando os irmãos unilaterais das recorrentes e privando as duas da participação societária a que teriam direito.

Sanseverino entendeu que os pressupostos para o reconhecimento da responsabilidade civil por perda de uma chance foram bem sintetizados pelo acórdão do TJ-SP, segundo o qual, ainda que a companhia tivesse cumprido a decisão judicial que determinou a exibição dos livros, a situação hereditária das recorrentes dificilmente seria modificada.

Pretensão das herdeiras foi atingida pela prescrição

A corte estadual considerou que as doações foram realizadas há cerca de 60 ou 70 anos e, embora a anulação de doação inoficiosa seja imprescritível, o mesmo não ocorre com a pretensão de restituir a participação social, nem com a possível ação de sonegados – as quais já estariam prescritas, afastando-se a probabilidade segura de sucesso da ação anulatória e de seus efeitos patrimoniais.

Ao negar provimento ao recurso especial das herdeiras, o relator destacou não haver nexo de causalidade entre o extravio dos dois livros da companhia e o insucesso que elas tiveram em sua tentativa de anular as doações.

Conforme Sanseverino, como o TJ-SP reconheceu a prescrição da pretensão de restabelecer a participação acionária do autor da herança, a revisão dos fundamentos dessa decisão – quanto à ocorrência ou não de causa interruptiva do prazo prescricional – exigiria o reexame das provas do processo, o que é vedado pela Súmula 7.

Leia o acórdão no REsp 1.929.450SP

LIBERDADE ASSOCIATIVA
Associação não pode cobrar taxas de morador não associado em loteamento aberto, diz TJ-RS

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Site da Consultoria Severgnini

‘‘É inconstitucional a cobrança, por parte de associação, de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei 13.465/17 ou de anterior lei municipal que discipline a questão’’, diz a tese firmada no acórdão do recurso extraordinário (RE) 695911-SP, Tema 492, do Supremo Tribunal Federal (STF), que transitou em julgado em 7 de maio de 2022.

Por isso, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), em duas instâncias internas, manteve íntegra a sentença proferida pela 1ª Vara Cível da Comarca de Gravataí (região metropolitana), que julgou improcedente uma ação de cobrança intentada pela Associação dos Proprietários e Moradores do Vale Ville contra um casal residente no loteamento do mesmo nome.

Em juízo de retratação, na sessão de 23 de agosto de 2022, a 11ª Câmara Cível do TJ-RS manteve o acórdão que havia negado a apelação da Associação – julgamento realizado em 15 de agosto de 2018 –, pois não levou em consideração a tese firmada no Tema 492 do STF.

Tese não alterou o acórdão de apelação

O relator da apelação neste segundo julgamento, desembargador Guinther Spode, disse que, mesmo com a nova tese, não via motivos para alterar a decisão anterior do colegiado. É que a petição inicial informa que o período inadimplido pelos réus vem a ser anterior à Lei a que a tese faz referência.

‘‘Destarte, sendo a cobrança relativa a período anterior à Lei 13.465/17 e, não tendo o município legislado quanto à obrigação de condôminos, proprietários ou moradores, a manutenção do resultado de improcedência do apelo é medida que se impõe’’, decretou o desembargador-relator.

Desembargador-relator Guinther Spode
Foto: Imprensa TJ-RS

A pá de cal nas pretensões da Associação veio no dia 27 de outubro, quando a 3ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça negou seguimento do recurso especial (REsp) e do recurso extraordinário (RE), endereçados, respectivamente, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF). A decisão foi proferida pela 3ª vice-presidente, desembargadora Lizete Andreis Sebben,

Ação de cobrança

Na ação, protocolada em junho de 2015, a Associação cobra ‘‘taxas de contribuição manutenção’’ relativas ao imóvel do casal, no valor de R$ 834,51, relativa ao período de junho de 2013 a junho de 2015. Ainda pede que os réus sejam condenados a pagar as ‘‘cotas vincendas’’.

Citados pela 1ª Vara Cível da Comarca, os réus apresentaram contestação. Em síntese, sustentaram que não fazem parte da Associação. Além disso, informaram que o loteamento é aberto, sendo as ruas e avenidas de responsabilidade do Município de Gravataí.

Sentença improcedente

O juiz Sílvio Tadeu de Ávila observou que a autora é meramente uma associação, e não um condomínio, de direito. Além disso, não contestou a alegação de que os réus não são a ela associados.

Nesta linha, a teor do que prevê o artigo 5º, inciso II, da Constituição, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. E o juiz reforçou: ninguém pode ser obrigado a associar-se ou a permanecer associado, como prevê o inciso XX do mesmo artigo.

‘‘Tudo considerado, o juízo é o de improcedência, devendo a autora, se assim o entender, transmudar-se em Condomínio, a ser constituído e registrado na forma da lei, para então, sim, poder cobrar dos condôminos as rubricas de regência. À toda evidência, não está a autora a agir sob má-fe, mas meramente à luz do que interpreta ser jurídico, qual seja a cobrança do que entende lhe seja devido. Isso posto, julgo improcedente o pedido’’, fulminou na sentença.

Clique aqui para decisão da 3ª VP do TJ-RS

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença                                                           

015/1.15.0007285-2 (Gravataí-RS)

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