CÉDULA DE CRÉDITO
Extinção do processo por prescrição intercorrente impede condenação em honorários, diz STJ

Divulgação CalcBank

Após a alteração do artigo 921, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil (CPC) pela Lei 14.195/2021, o reconhecimento da prescrição intercorrente e a consequente extinção do processo impedem a imputação de quaisquer ônus às partes.

O fundamento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), afastando a condenação da parte que deu causa à ação ao pagamento de honorários advocatícios e custas processuais.

Na origem, em ação de execução de cédula de crédito bancário (CCB), movida pelo Banco do Brasil, o juízo de primeiro grau julgou prescrita a pretensão e, por consequência, extinguiu o processo com resolução de mérito.

Na apelação, apesar de o TJDFT manter a extinção do processo, o cliente executado acabou condenado ao pagamento de custas e honorários advocatícios, com fundamento no princípio da causalidade, porque, ‘‘ao inadimplir a obrigação, deu causa ao processo’’ (artigo 85, parágrafo 10, do CPC/15).

Ao interpor recurso especial (REsp) no STJ, o executado pleiteou o afastamento da condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais, sustentando que a sentença foi proferida após a alteração processual, promovida pela Lei 14.195/2021.

Impossibilidade expressa

Ministra Nancy Andrighi
Foto: Lucas Pricken/STJ

A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que, antes da reforma legal, o STJ entendia que, embora não localizados bens penhoráveis para a quitação de seus débitos, a parte que motivou o ajuizamento do processo deveria arcar com o pagamento de custas e honorários advocatícios.

Todavia, a ministra observou que é necessário rever esse entendimento da corte, tendo em vista a alteração do artigo 921, o qual dispõe expressamente que não serão imputados quaisquer ônus às partes quando reconhecida a prescrição intercorrente, seja exequente, seja executada.

Enquanto não for declara a inconstitucionalidade, o dispositivo deve ser aplicado

Nancy destacou que, para os processos em curso, a prolação de sentença, ou de ato equivalente, é o marco fixado para aplicação da nova regra dos honorários, e não a verificação da própria prescrição intercorrente, motivo pelo qual não se deve aplicar o artigo 85, parágrafo 10, do CPC.

A ministra também apontou que, apesar de tramitar no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.005, a qual trata, entre outros temas, da inconstitucionalidade formal e material das alterações acerca da prescrição intercorrente, enquanto não houver julgamento, deve-se obedecer à legislação vigente. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

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REsp 2.025.303-DF

RACISMO & CAPACITISMO
Coca-Cola vai pagar R$ 50 mil por ter preterido trabalhador negro e deficiente em promoção

Foto: Divulgação Brasal Refrigerantes

‘‘O racismo institucional pode assumir quatro formas: ele pode ocorrer quando pessoas não têm acesso aos serviços de uma instituição, quando os serviços são oferecidos de forma discriminatória, quando as pessoas não conseguem ter acesso a postos de trabalho na instituição ou quando as chances de ascensão profissional dentro dela são diminuídas por causa da raça.’’

A doutrina de Adilson Moreira, especialista em Direito Antidiscriminatório, serviu de fundamento para a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10, Distrito Federal e Tocantins) confirmar sentença que condenou a Brasal Refrigerantes S/A, engarrafadora da Coca-Cola, a pagar R$ 50 mil de danos morais a um ex-auxiliar de post mix. Negro e deficiente, o trabalhador acabou preterido numa promoção, sem justificativas plausíveis do empregador.

Relator do caso, o desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran disse que ficou provada a prática de atitude discriminatória, já que a empresa teve oportunidade processual de refutar a alegação de discriminação e não o fez no curso do processo trabalhista.

Três anos ouvindo promessas de promoção

Na petição inicial da ação reclamatória, o trabalhador reclamante afirmou que, por cerca de três anos, ouviu promessas de promoção por parte da empresa. Entretanto, embora seu ótimo desempenho profissional – atestado por testemunhas na instrução processual –, a promoção nunca chegava.

Ele contou que, em determinado momento, surgiu uma vaga para técnico de manutenção, mas que foi preterido por outro empregado, com menos tempo de casa e experiência. Na sua percepção, a promoção não veio, provavelmente, por causa da cor da sua pele, fato que causou ‘‘expressivo desconforto e expectativas frustradas’’. Com esse argumento, entre outros, pediu para ser indenizado em R$ 100 mil, por danos morais.

Em contestação, a defesa do empregador disse que jamais ofereceu ou fez qualquer promessa de promoção ao trabalhador. Para ser promovido, ele teria que fazer uma prova e ter carteira de motorista tipo B, requisitos que não foram cumpridos.

Reclamatória procedente no primeiro grau

A 6ª Vara do Trabalho de Brasília julgou procedente a ação, por entender que as provas testemunhais demonstraram ter havido promessas de promoção não cumpridas. O valor arbitrado para a reparação moral: R$ 50 mil.

‘‘Evidenciado o tratamento discriminatório despendido para com o reclamante, não há, de fato, justificativa para que não tivesse tido as mesmas oportunidades que são dadas aos demais trabalhadores da empresa nas mesmas condições profissionais em que se encontrava, esbarrando em um teto impossível de transpor por preconceito ligado à sua condição física – a qual não era impeditivo, de forma alguma, para o exercício do cargo cuja vaga foi aberta, conforme extensamente comprovado’’, anotou na sentença a juíza do trabalho Maria José Rigotti Borges.

Derrotada no primeiro grau, a empresa recorreu ao TRT-10 por meio de recurso ordinário trabalhista (ROT), requerendo a reforma da sentença. Em síntese, argumentou pela inexistência de qualquer ato ilícito que tenha violado a esfera moral do trabalhador a ponto de causar danos. Alternativamente, pediu a redução do valor da indenização.

Grupos identitários não hegemônicos

Desembargador Pedro Foltran foi o relator
Foto: Imprensa TRT-10/Flick

Ao votar pelo desprovimento do recurso, o desembargador-relator Pedro Luís Vicentin Foltran salientou que a empresa teve oportunidade processual de refutar a alegação de discriminação racial e não fez. Para o desembargador, violações que se vinculam a aspectos intrínsecos a grupos identitários, politicamente não-hegemônicos, possuem desafios próprios para se revelarem. A busca de prova por um nexo de causalidade explícito entre as ações de uma organização e os respectivos danos advindos de práticas discriminatórias, por vezes, ocultam desdobramentos complexos, como aqueles produzidos pelo racismo e o capacitismo, como no caso em análise.

Foltran salientou, ainda, o fato de o trabalhador ser deficiente, o que faz com que vivencie ‘‘o que é trazer em seu corpo – e dele não pode movê-las, mesmo desejando – as marcas que lhe dão identidade, mas que, ao mesmo tempo, o vulnerabilizam no mundo do trabalho: a cor de sua pele e, neste caso, aliada à deficiência’’.

Para o relator, as provas dos autos demonstram que o trabalhador foi, sim, vítima de discriminação. Houve promessas de promoção, conforme mostram os depoimentos, mas quando surgiu a vaga, mesmo que o trabalhador preenchesse os requisitos, não foi promovido. Entre outros argumentos, a empresa chegou a dizer que, além não ter habilitação, requisito para a vaga, o trabalhador não poderia pilotar motocicleta porque teria ‘‘um problema no pé’’. Para o desembargador Pedro Foltran, no caso, o problema não está no trabalhador, mas na empresa.

Valor da indenização

O desembargador ainda votou pela manutenção do valor arbitrado para a indenização. Embora o valor da indenização, por vezes, não seja suficiente para apagar as marcas dos danos impostos – expressou no voto –, não deve servir para o enriquecimento injustificado da parte, mas também não deve ser tão sem significância para o patrimônio do autor da violação lesante, já que não serviria para desestimulá-lo à repetição da conduta discriminatória.

‘‘Tal violação pode extrapolar para outras relações de trabalho, com outras pessoas com deficiência, considerando que as manifestações da reclamada, nos presentes autos, revelam um modus operandi próprio, que expressa uma desresponsabilização da empresa na garantia do direito de pessoas com deficiência ao acesso a seleções, em igualdade de oportunidade com os demais funcionários’’, concluiu o desembargador-relator. Redação Painel com informações de Mauro Burlamaqui, da Assessoria de Imprensa do TRT-10.

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0000357-96.2021.5.10.0015 (Brasília)