INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
Alvo de piadas e ofensas no trabalho, muçulmana ganhará R$ 20 mil de dano moral

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A liberdade de religião deve ser preservada e respeitada. Por sua opção religiosa, as pessoas não podem ser alvos de discursos de ódio, de incitações à violência nem de práticas de intolerância, ainda que sob o tom de brincadeira.

Nessa toada, a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) confirmou sentença que condenou uma empresa de manutenção e limpeza e a tomadora dos seus serviços a pagarem, solidariamente, indenização por danos morais a uma auxiliar de limpeza que ouvia piadas e deboches por seguir o islamismo. Dada à gravidade da ofensa, o colegiado aumentou de R$ 10 mil para R$ 20 mil o quantum indenizatório.

Dano moral é a violação a direito da personalidade e ao princípio da dignidade da pessoa, como indica o artigo 5º e incisos V e X da Constituição. Para que surja a obrigação de indenizar o dano moral, é necessário, no âmbito da responsabilidade subjetiva, a existência de dano,de  nexo causal e de culpa ou abuso de direito – artigos 186, 187 e 927 do Código Civil (CC).

Xingamentos no ambiente de trabalho

A reclamante afirmou que durante o contrato de trabalho – junho de 2019 a maio de 2021, quando ajuizou a ação reclamatória, por rescisão indireta – foi alvo constante de intolerância religiosa por parte dos colegas de trabalho. Em várias ocasiões, foi xingada de ‘‘mulher-bomba’’, ‘‘prostituta árabe’’, ‘‘escória da humanidade’’ e ‘‘lixo humano’’.

A empresa que contratou a auxiliar e a tomadora dos seus serviços foram notificadas dos fatos, mas não tomaram nenhuma providência – registram os autos. Ambas foram responsabilizadas civilmente pela Justiça do Trabalho por violarem direitos de personalidade assegurados no inciso X do artigo 5º da Constituição – a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.

Liberdade de crença

O relator do recurso ordinário trabalhista (ROT) no TRT-SP, desembargador Antero Antônio Martins, lembrou que a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, no seu artigo XVIII, garante a liberdade de pensamento, consciência e religião. Este direito implica a liberdade de crença e de manifestação dessa crença, ‘‘pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular’’.

O julgador citou também o artigo 5º da Constituição que, no seu inciso VI, diz ser inviolável a liberdade de crença e assegura o livre exercício dos cultos religiosos. ‘‘O inciso VIII do mesmo artigo diz que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei’’, complementou.

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RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Habilitação de crédito pode ser suspensa até definição do valor no juízo arbitral, diz STJ

Arte: Site da CNI

Num processo de recuperação judicial, havendo cláusula contratual que preveja a resolução de litígio por meio da arbitragem, é possível suspender a habilitação de crédito até que seja definida a existência do próprio crédito e seu respectivo valor na justiça arbitral.

O entendimento foi firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao confirmar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que suspendeu a habilitação do crédito de uma empresa no processo de recuperação – com o consequente indeferimento de seu direito a voto na assembleia de credores. O tribunal estadual concluiu que os documentos juntados aos autos não fizeram prova do crédito, havendo ainda necessidade de discussão da dívida no juízo arbitral.

A empresa apresentou pedido de habilitação de crédito de mais de R$ 70 milhões, mas teve a solicitação negada pelo juiz da recuperação, decisão mantida pelo TJSP. Segundo o tribunal, o administrador judicial questionou a própria existência do crédito e, além disso, haveria pendências no cálculo dos supostos valores devidos. Nesse quadro, seria o caso de deliberação do juízo arbitral antes de eventual inclusão do crédito na ação de recuperação.

Em recurso especial (REsp), a empresa supostamente credora alegou que havia prova incontroversa nos autos da existência e do valor de seu crédito, sendo dispensável, portanto, a instauração de procedimento arbitral.

Mesmo com recuperação, juízo da cognição é quem decide sobre existência do crédito

Ministro Moura Ribeiro foi o relator
Foto: Lucas Pricken/STJ

Relator do recurso no STJ, o ministro Moura Ribeiro destacou que, no tema repetitivo 1.051, a Segunda Seção fixou a data do fato gerador do crédito como marco para estabelecer se ele deve ser incluído na recuperação judicial. Considerando que as datas de prestação de serviços apresentadas pela empresa – e que justificariam o crédito – são anteriores à recuperação, o ministro apontou que os créditos, se existentes, devem ser submetidos aos efeitos da recuperação.

Por outro lado, o relator lembrou, também, que o STJ já definiu que, para além da competência do juízo recuperacional sobre os atos de execução de créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação judicial, cabe ao juízo de conhecimento (seja ele judicial ou arbitral) a avaliação da existência, da eficácia e da validade da relação jurídica estabelecida entre as partes.

‘‘Assim, verifica-se que a discussão sobre a existência do débito e seus valores, por si só, não afasta a competência do juízo recuperacional quanto à análise dos atos de execução de créditos, até porque nem sequer influem na competência cognitiva considerada, na hipótese dos autos, pertencente ao juízo arbitral’’, afirmou.

Segundo Moura Ribeiro, foi verificando essas condições que a Justiça paulista, de forma diligente, suspendeu o pedido de habilitação do crédito e entendeu pela necessidade de comprovação da probabilidade do direito no juízo arbitral.

‘‘Nada impede que, eventualmente requerido pela parte, o juízo recuperacional, com espeque no artigo 6º, parágrafo 3º, da Lei 11.101/2005, defina reserva de numerário para garantia de crédito discutido perante o juízo arbitral, já que possui essa faculdade, condicionada à análise da certeza, da liquidez e da estimativa de valores, conforme o caso’’, concluiu o ministro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.774.649-SP