CULTURA ISLÂMICA
Obediência ao patriarca não exclui culpa por sonegação fiscal, decide TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Alcorão
Reprodução site UFPE

Embora a religião islâmica goze de especial proteção do estado brasileiro (inciso VI do artigo 5º da Constituição), assim como as demais, não se admite a invocação de preceitos do livro sagrado do alcorão para o cometimento de qualquer delito.

Com este entendimento, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) derrubou a principal alegação da defesa de um empresário jordaniano, estabelecido em Rio Grande (RS), que sonegou mais de R$ 5 milhões em tributos federais, mantendo a sentença que o condenou criminalmente.

O réu se declarou inocente do crime de sonegação, capitulado no artigo 1º, inciso I, da Lei 8.137/90, sob o argumento de que seguia as ordens do pai, detentor de 97% das ações da empresa de confecções. Afinal, pela tradição islâmica, sustentava a defesa, o réu não poderia desobedecer às ordens paternas.

No entanto, nas duas instâncias da Justiça Federal, ficou claro que o delito de sonegação se escorou na falsa inatividade da empresa, cujo sócio-administrador omitiu informações à Receita Federal, deixando de levar suas receitas à tributação.

Juiz Danilo Pereira Jr foi o relator
Foto: Imprensa Ajufe

O relator da apelação no colegiado, juiz federal convocado Danilo Pereira Júnior, disse que o dever de obediência dos filhos às ordens paternas jamais pode servir de escudo para a prática de crimes.

Denúncia do Ministério Público Federal

Em agosto de 2020, o Ministério Público Federal (MPF) em Rio Grande denunciou o sócio-administrador da empresa por sonegar Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), contribuição social, Cofins e PIS, no valor de R$ 5,3 milhões, no período de 2012 a 2014. Segundo a fiscalização da Receita Federal, o denunciado omitiu a totalidade das receitas da empresa que deveriam ter sido levadas à tributação.

Em julho de 2021, a 1ª Vara Federal de Rio Grande julgou procedente a ação penal, condenando o empresário. Na exposição dos fundamentos da sentença condenatória, o juízo observou que os valores movimentados pela empresa nos anos de 2012 e 2013 alcançaram R$ 2,5 milhões, superando R$ 14 milhões em 2014.

Empresa inativa, mas com movimentação milionária

O juiz federal Gabriel Borges Knapp ressaltou que a empresa se declarou inativa, sem movimentação de nenhuma espécie, no período auditado e, ao mesmo tempo, apresentou movimentações financeiras vultosas em suas contas bancárias. Ou seja, movimentou quase R$ 20 milhões em três anos, enquanto se declarava inativa à Fazenda Nacional.

Knapp disse que o réu ingressou na sociedade empresarial em novembro de 2007, passando a ter, desde então, poderes de administração, juntamente com o pai, o maior acionista. Logo, cabível, na denúncia, a imputação pelo delito de sonegação.

Reprodução Leoa.Com.Br

Administrador tinha domínio do fato delitivo

‘‘Na condição de administrador, o réu tinha domínio do fato delitivo, cabendo a ele a decisão quanto à prática, ou não, da supressão/redução do pagamento de tributos e contribuições sociais, mediante fraude, consistente, in casu, na omissão da totalidade de suas receitas, no período compreendido entre os anos de 2012 e 2014’’, escreveu na sentença.

O réu acabou condenado a três anos, dois meses e 12 dias de reclusão, em regime inicial aberto, além do pagamento de multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos: prestação de serviços comunitário, à razão de uma hora de trabalho por dia de condenação, e ao pagamento de prestação pecuniária, na quantia de cinco salários mínimos.

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PERSUASÃO RACIONAL
TRF-4 manda INSS restabelecer benefício ao arrepio do laudo pericial

Reprodução Factum.Edu

Nos benefícios por incapacidade, o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial, mas não fica atado à literalidade do laudo técnico. Assim, as conclusões da perícia devem ser analisadas sob o prisma das condições pessoais da parte autora.

Por isso, a 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) reformou sentença que havia negado o restabelecimento do benefício por incapacidade temporária a uma técnica de enfermagem de 36 anos, residente em Viamão (RS), que sofre com desmaios recorrentes. Com a decisão, por unanimidade, a Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi obrigado a restabelecer o benefício.

Os julgadores levaram em consideração os elementos de prova existentes nos autos que demonstram que a condição incapacitante da profissional está presente desde a cessação do benefício anterior.

Benefício suspenso

A autora ajuizou a ação previdenciária depois que a perícia médica do INSS atestou a sua capacidade laboral – o que levou à suspensão do pagamento do benefício, em março de 2019. Seguindo o laudo pericial, que atestava a capacidade para o trabalho, o juízo da 20ª Vara Federal de Porto Alegre julgou o pedido improcedente.

Desa. Ana Cristina Blasi foi a relatora
Foto: Ascom TRE-SC

Insatisfeita com a sentença, a técnica de enfermagem recorreu ao Tribunal. Ela anexou atestados médicos, sustentando que tem problemas neurológicos e cardíacos, com desmaios frequentes. Afirmou que vem se tratando há quase nove anos sem resultados significativos.

Sentença reformada no TRF-4

A 11ª Turma do TRF-4 analisou o recurso e manifestou entendimento diferente do juízo de primeiro grau, reformando a sentença de improcedência. A relatora da apelação, desembargadora Ana Cristina Ferro Blasi, disse que, nestes casos, o julgador não deve ficar preso ao laudo. Antes, deve considerar as condições de saúde do segurado do INSS.

‘‘Comprovada pelo conjunto probatório a persistência da incapacidade da parte autora para o trabalho, mesmo após a cessação do benefício no âmbito administrativo, ainda que em contrariedade à conclusão pericial, é devido o benefício por incapacidade temporária, uma vez que o julgador pode formar sua convicção à luz do princípio da persuasão racional, com base em outros elementos de prova trazidos aos autos (art. 479 do CPC)’’, resumiu a ementa do acórdão de apelação. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Comunicação Social (ACS) do TRF-4.

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5037748-08.2019.4.04.7100 (Porto Alegre)