REVITIMIZAÇÃO
Ambev é condenada a pagar dano moral por fazer o empregado relembrar o acidente de trabalho

Decisão proferida na 9ª Vara do Trabalho de Guarulhos (SP) condenou a Ambev a indenizar um empregado em R$ 17 mil por dano moral. O motivo foi a exposição frequente do trabalhador em reuniões de segurança do trabalho após ele ter se acidentado e perdido parte de um dedo, fazendo-o rememorar o acontecimento trágico de forma contínua.

Da sentença condenatória, cabe recurso ordinário trabalhista (ROT) ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo).

De acordo com os autos, o  reclamante disse que passou a ser chamado para contar sobre a fatalidade aos demais funcionários em diversas reuniões realizadas na fábrica durante dois anos e meio. Afirmou, porém, que nunca foi perguntado se concordava com esse procedimento, o que lhe causava constrangimentos. Alegou ainda que chegou a fazer tratamento psicológico após o ocorrido.

Ambev alegou queria evitar novos acidentes

No processo trabalhista, o empregador argumentou que o profissional foi convidado apenas uma vez para contar sobre o caso. O caráter dos encontros, segundo a empresa, era preventivo, buscando evitar novos acidentes entre os empregados.

Para a juíza Aparecida Fatima Antunes da Costa Wagner, não há provas de que o trabalhador tenha se voluntariado para falar sobre o acontecimento nem de que tenha autorizado a firma a divulgar continuamente o seu caso.

‘‘A conduta da reclamada, ainda que não dolosa, não deixou de exacerbar o dano experimentado, em uma espécie de revitimização’’, aponta a magistrada. A revitimização é entendida como o fenômeno pelo qual a vítima experimenta um sofrimento continuado e repetitivo, mesmo após cessada a violência originalmente sofrida.

‘‘Tem o reclamante – todo ser vivente – o direito ao esquecimento de fatos dolorosos sofridos’’, concluiu a juíza na sentença.

Assim, por não ter buscado formas menos gravosas para conscientizar os demais trabalhadores e por descuidar da saúde psicológica da vítima, a empresa foi condenada a reparar o dano causado. Com informações da Secretaria de Comunicação (Secom) do TRT-2.

Clique aqui para ler a sentença

ATSum 1000631-10.2022.5.02.0313 (Guarulhos-SP)

PREVALÊNCIA DO DOMICÍLIO
Cabe à Justiça brasileira julgar rescisão de contrato de consumo com foro no exterior

Paradisus Cancún, México
Foto: Divulgação Meliá

​Em contratos decorrentes de relação de consumo, firmados fora do território nacional, a Justiça brasileira pode declarar nulo o foro de eleição diante do prejuízo e da dificuldade de o consumidor acionar a autoridade judiciária estrangeira para fazer valer o seu direito.

O fundamento, ipsis literis, é do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, integrante da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele e seus colegas entenderam que o Judiciário brasileiro é competente para processar e julgar uma ação sobre rescisão de contrato de prestação de serviços hoteleiros celebrado no México para ali produzir seus efeitos. Afinal, o foro eleito contratualmente no exterior dificulta o exercício dos direitos do consumidor domiciliado no Brasil.

Contra de hospedagem em Cancún, no México

Na origem do processo, um casal firmou contrato de hospedagem, pelo sistema time sharing [tempo compartilhado num resort de férias], com um hotel da rede Meliá em Cancún, México. Sob o argumento de dificuldades financeiras, o casal ajuizou ação – contra a representante do grupo econômico da rede hoteleira no Brasil – para rescindir o contrato.

O pedido foi julgado procedente, o que resultaria na rescisão contratual com devolução dos valores pagos, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu provimento à apelação da parte demandada, reconhecendo a incompetência da Justiça brasileira para decidir o caso.

Justiça brasileira atua em relações de consumo se o consumidor mora no Brasil

Ministro Villas Bôas Cueva foi o relator
Foto: Gustavo Lima/Imprensa STJ

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva apontou que o artigo 25 do Código de Processo Civil (CPC) admite a possibilidade de eleição de foro internacional, mediante a inclusão de cláusula em contrato escrito, mas ressaltou que o artigo 22, inciso II, do mesmo código, estabelece a competência da Justiça brasileira para julgar demandas de relação de consumo quando o consumidor tiver domicílio ou residência no país.

Ele observou que o contrato discutido no processo é de adesão – tipo em que o consumidor não tem ingerência sobre as cláusulas – e que o casal residente no Brasil é o consumidor final dos produtos e dos serviços ofertados pelo resort, o que atrai a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Nulidade da cláusula de eleição de foro

Além disso, Villas Bôas Cueva lembrou que o artigo 6º, inciso VIII, e o artigo 51, inciso I, ambos do Código de Defesa do Consumidor (CDC), buscam garantir e facilitar ao consumidor a defesa dos seus direitos, o que permite ao juiz declarar a nulidade de cláusulas consideradas abusivas.

Sobre a questão discutida no processo – destacou o relator –, ‘‘o STJ orienta no sentido da nulidade de cláusula de eleição de foro a partir da demonstração do prejuízo ao direito de defesa e de acesso ao Judiciário’’.

Por fim, o ministro registrou que, devido à Súmula 7 do STJ, não cabe rediscutir em recurso especial (REsp) a decisão da instância originária que considerou que a ré atua como representante da empresa mexicana no Brasil, motivo pelo qual se aplica o artigo 21, inciso I, do CPC. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.797.109-SP