MANDADO DE SEGURANÇA
Empregador tem de manter plano de saúde de empregada vítima de violência sexual no trabalho

A 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve decisão liminar de primeiro grau que obrigou uma empresa a seguir com o plano de saúde de uma trabalhadora vítima de violência sexual no ambiente de trabalho.

A decisão resulta de julgamento de mérito de um mandado de segurança movido pelo empregador, que tentava reverter a decisão. O relator do recurso, desembargador  Marcelo José Ferlin D’Ambroso, já havia decidido nesse sentido ao apreciar pedido liminar.

“No que diz respeito ao restabelecimento do plano de saúde para tratamento dos danos psicológicos decorrentes da violência sofrida (plano esse que foi reconhecidamente disponibilizado pela empresa), cabe registrar que a sua manutenção, além de preservar garantias tipicamente trabalhistas, está em consonância com os direitos fundamentais que visam à preservação da saúde e da integridade física e psicológica da trabalhadora, bem como as que reconhecem a função social da empresa (arts. 5º, XXIII e 170, III, ambos da CF)”, disse o relator ao julgar o mérito do mandado de segurança.

Plano de saúde cancelado

A empregada afirmou ter sido vítima de violência sexual no seu ambiente de trabalho. Conforme o relato, a violência foi praticada por um colega quando ela chegava no seu posto para a troca do turno. Após o fato, a trabalhadora precisou se afastar de suas funções em razão do trauma sofrido, passando a fazer acompanhamentos psicológico e psiquiátrico. O acusado foi demitido.

A vítima tentou voltar ao trabalho, mas não conseguiu. Tempos depois, a empresa cancelou o plano de saúde dela. O argumento para esse cancelamento foi o de que a trabalhadora teria parado de pagar a coparticipação. A defesa do empregador sustentou que ela foi avisada previamente de que isso ocorreria se continuasse inadimplente.

A defesa da reclamante, por sua vez, ingressou com ação trabalhista, pedindo o restabelecimento do plano de saúde. Após ouvir as partes e o Ministério Público do Trabalho (MPT), o juízo decidiu por deferir a antecipação da tutela.

‘‘Sem adentrar ao mérito da demanda, cujo juízo de valor somente poderá restar suficientemente claro quando produzidas todas as provas necessárias, acolho o pedido antecipatório, determinando que a Acionada [empresa reclamada] restabeleça o plano de saúde da Autora [reclamante], custeando o valor respectivo, integralmente’’, decidiu o juízo de primeiro grau.

Mandado de segurança no TRT-RS

Des. Marcelo D’Ambroso foi o relator
Foto: Secom TRT-4

A empresa ingressou com mandado de segurança no TRT-4 para tentar reverter essa decisão, mas não obteve êxito. Por unanimidade, os desembargadores da 1ª Seção de Dissídios Individuais mantiveram o que havia sido decidido em primeira instância; ou seja, o restabelecimento do plano de saúde, com pagamento integral pela empresa.

Conforme o desembargador-relator, não se trata de mera liberalidade custear a integralidade do plano de saúde. Ele citou o artigo 6º, parágrafo 3º, inciso I, da Lei 8080/90, que detalha o que se entende por saúde do trabalhador, como, por exemplo, a recuperação e reabilitação de empregados submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho.

Para o magistrado, diante dos fatos narrados e do que consta no registro de ocorrência policial, por exemplo, há evidências de que a trabalhadora sofreu violência sexual praticada por um colega. Lembrou na decisão que a própria empresa entendeu o fato como gravíssimo e promoveu a despedida do acusado.

‘‘Os danos psicológicos oriundos da violência sexual sofrida pela litisconsorte (trabalhadora) são evidentes’’, frisou o desembargador-relator, ao citar um atestado médico que constatou transtorno do estresse pós-traumático e prorrogou o período de afastamento do trabalho por mais 90 dias.

Perspectiva de gênero

Marcelon Ferlin D’Ambroso acrescentou que, para a análise desse caso, é necessário utilizar uma perspectiva de gênero. Lembrou que o Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres da Organização das Nações Unidas (ONU) e citou seu artigo 7º, que prevê a obrigação de ‘‘tomar as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher praticada por qualquer pessoa, organização ou empresa’’.

No voto, o magistrado também selecionou trechos da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994. O artigo 2º define o entendimento de que a violência contra a mulher abrange a violência psicológica ocorrida em qualquer relação interpessoal e o assédio sexual no local de trabalho.

Ainda para fundamentar sua decisão, o desembargador citou o inciso III do artigo 932 do Código Civil, que diz que são também responsáveis pela reparação civil ‘‘o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele’’.

Além da esfera trabalhista, o caso está em análise pela Polícia Civil gaúcha, já que o estupro é crime tipificado no artigo 213 do Código Penal, com penas que vão de seis a 10 anos de prisão. Texto de Eduardo Matos (Secom/TRT-4)

O processo tramita em segredo de justiça.

CRÉDITO PRIVILEGIADO
Lei de recuperação judicial é aplicada para conferir equidade a credores em execução trabalhista

Reprodução CERS

A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) confirmou a aplicação, por analogia, de um dispositivo da lei de recuperação judicial e falência (Lei 11.101/2005) para limitar a 150 salários mínimos o valor a ser pago a dois advogados que deveriam receber honorários sucumbenciais em uma ação com vários outros credores trabalhistas.

O juízo de origem considerou que os valores são dotados de caráter alimentar e, por isso, devem concorrer com os demais beneficiários. Como havia um valor insuficiente para os créditos concorrentes, decidiu pela restrição.

Inconformados, os advogados interpuseram agravo de petição (AP) no TRT-2, argumentado pela inaplicabilidade da Lei nº 11.101/2005, na tentativa de afastar a fixação dos valores a serem pagos na execução. Para tanto, mencionaram o parágrafo 2º do artigo 908 do Código de Processo Civil (CPC), segundo o qual o critério a ser observado para distribuição do dinheiro seria a anterioridade das penhoras.

No entanto, o desembargador-relator Ricardo Artur Costa e Trigueiros afirmou ser acertada a aplicação do diploma legal em questão, em nome da equidade e da razoabilidade. Segundo o magistrado, ‘‘determinação contrária importaria na aniquilação do direito dos demais credores à satisfação dos seus direitos’’.

Lei nº 11.101

A lei que baseou a decisão cria uma classificação de créditos para pagamento de empresas em processos de falência ou recuperação judicial, sendo que os derivados da legislação do trabalho têm tratamento diferenciado, mas somente até o limite de 150 salários mínimos. O que ultrapassar esse limite permanece como crédito, mas entra em outra posição na lista de preferência.

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1000838-69.2016.5.02.0070 (São Paulo)