A liberdade de associação sindical é direito fundamental previsto no artigo 8º da Constituição, cujo inciso V prevê que ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato. No mesmo sentido, a Convenção 98, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), dispõe, em seu artigo 1º, que ‘‘Os trabalhadores deverão gozar de proteção adequada contra quaisquer atos atentatórios à liberdade sindical em matéria de emprego’’.
Por violar flagrantemente estes dispositivos, a Goiasminas Indústria de Laticínios (produtos com a marca Italac) foi condenada a pagar R$ 200 mil a título de danos morais coletivos, no desfecho de uma ação civil pública ajuizada pelo Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação de Passo Fundo. A decisão é da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul), ao confirmar, no mérito, sentença da 2ª Vara do Trabalho de Passo Fundo.
Segundo o processo, foram várias as condutas antissindicais no curso da negociação salarial coletiva de 2019: coagiu os empregados a aceitar a representação da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação do RS, ao invés do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação de Passo Fundo; dispensou todos os empregados que integravam o quadro do Sindicato e os que se recusaram a assinar autorização para se fazer representar pela Federação; dificultou o acesso de dirigentes sindicais às dependências da empresa; incentivou a remessa de cartas de oposição ao desconto da contribuição sindical pelos empregados; negou prosseguimento às negociações coletivas, dentre outras condutas atentatórias à liberdade sindical.
Sediada em Corumbaíba (GO), a Italac possui fábricas, postos de captação e produção de leite nos estados de Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Rondônia, Pará, Rio Grande do Sul e Paraná.
Com a confirmação da sentença, e majoração do quantum indenizatório, a empresa de laticínios deve se abster de praticar atos antissindicais e, também, prosseguir com as negociações coletivas junto ao Sindicato.
Danos morais coletivos
Em 2019, a empresa deu início às negociações salariais coletivas com a Federação dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação do RS, alegando irregularidades na representação do Sindicato. Segundo testemunhas, os prepostos da empresa colocaram em dúvida a regularidade do Sindicato, desencorajando os trabalhadores a se manter sindicalizados.
Ao contestar a versão da empresa e dizer aos demais colegas que não deveriam assinar a nova filiação, um dirigente sindical, empregado do laticínio, foi demitido. Além disso, as testemunhas afirmaram que mensalmente os empregados eram chamados ao setor de recursos humanos para resolver alguma pendência e que, na ocasião, era sugerido que assinassem a carta para cessar as contribuições sindicais.
No primeiro grau, a juíza Cássia Ortolan Grazziotin reconheceu que a despedida do dirigente teve o objetivo de fragilizar a atividade do Sindicato, em afronta ao princípio da livre atuação das entidades sindicais.
‘‘O dano moral coletivo se faz presente quando a lesão transcende à esfera individual, irradiando efeitos em toda a sociedade. Da lesão coletiva surge um sentimento global de repulsa, que permite que os legitimados exijam a reparação em nome de toda a coletividade afetada’’, escreveu na sentença.
Recurso ordinário ao TRT-RS
Desembargador Alexandre Corrêa da Cruz
Foto: Secom TRT-4
As partes recorreram ao TRT-RS no intuito de modificar diferentes aspectos da sentença. A empresa tentou afastar a condenação por dano moral coletivo. Entre outros argumentos, afirmou que o Sindicato não possuía registro regular e que nunca impediu ou desestimulou a filiação sindical dos empregados. Os desembargadores não deram provimento ao recurso e ainda aumentaram o valor da indenização, elevando-a de R$ 100 mil para R$ 200 mil.
O relator do acórdão, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, entendeu que houve abuso de poder. Ele ressaltou os autos trazem prova documental de que a parte reclamada efetivamente solicitou a filiação de seus empregados, lotados na unidade de Passo Fundo, junto à Federação dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação do Rio Grande do Sul.
Para o relator, a simples constatação de irregularidade formal do Sindicato constituiu fator suficiente para a abrupta interrupção das negociações relativas à norma coletiva no ano de 2019. ‘‘A prova de que nos anos anteriores as normas coletivas foram celebradas normalmente com o Sindicato autor, independentemente da alegada irregularidade, reforça a conclusão quanto ao comportamento anômalo da empresa’’, concluiu o desembargador-relator no acórdão.
Os desembargadores Carlos Alberto May e Marçal Henri dos Santos Figueiredo também participaram do julgamento. A empresa apresentou recurso revista ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia (Secom/TRT-4).
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ACPCiv 0021041-77.2019.5.04.0662 (Passo Fundo-RS)