MENOR ONEROSIDADE
Administração pública pode negativar devedor mesmo sem inscrição prévia na dívida ativa

Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a administração pública pode inscrever o devedor em cadastro de inadimplentes mesmo que não tenha havido o prévio registro na dívida ativa.

O entendimento foi estabelecido pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), que entendeu que a inclusão do devedor em órgão de restrição de crédito só seria possível se a multa resultante de infração administrativa estivesse previamente inscrita na dívida ativa.

Na origem do caso, a Porto Seguro Logística e Transportes ajuizou ação anulatória contra autos de infração lavrados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e pediu a declaração de ilegalidade da inscrição de seu nome em cadastros restritivos de crédito. Em primeiro grau, o juiz determinou a retirada do nome dos cadastros de inadimplentes – decisão mantida pelo TRF-2.

Recurso não discute aplicação do artigo 46 da Lei 11.457/2008

Ministro Francisco Falcão foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

Relator do recurso especial da ANTT, o ministro Francisco Falcão destacou que o caso dos autos não envolve a aplicação do artigo 46 da Lei 11.457/2008, que dispõe sobre a administração tributária e prevê a possibilidade de celebração de convênios com entidades públicas e privadas para divulgação de informações a respeito de inscrição em dívida ativa.

‘‘A presente hipótese não trata da divulgação de informações sobre inscrição em dívida ativa. Refere-se à possibilidade de a administração pública inscrever em cadastros os seus inadimplentes, ainda que não haja inscrição prévia em dívida ativa’’, explicou o ministro.

Segundo Francisco Falcão, a expedição de certidão de dívida ativa (CDA) comprova o débito do devedor, permitindo que o fisco adote as medidas judiciais necessárias. Contudo, o relator ponderou que a expedição da CDA torna mais onerosa para a administração a busca do recebimento de seus créditos.

Negativação é medida menos gravosa

O ministro lembrou que, ao julgar o Tema Repetitivo 1.026, a Primeira Seção entendeu que a anotação do nome da parte executada em cadastro de inadimplentes, entendida como medida menos onerosa, pode ser determinada antes de esgotada a busca por bens penhoráveis.

‘‘Em outras palavras, mutatis mutandis, a inscrição em cadastro de inadimplentes tende a efetivar o princípio da menor onerosidade, já que a negativação do nome do devedor é uma medida menos gravosa quando comparada com a necessária inscrição de dívida ativa’’, completou.

Ao dar provimento ao recurso da ANTT, Falcão apontou que, para realização da anotação restritiva, é suficiente que o credor apresente documento que contenha os requisitos necessários para a comprovação do débito – não sendo, obrigatoriamente, a CDA. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no AREsp 2.265.805

ACIDENTE DE TRABALHO
Sem óculos de proteção, motorista que perdeu visão de um olho não será indenizado

Gafor na coleta de madeira/Divulgação

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a improcedência dos pedidos de compensação por danos morais e materiais de um motorista, vítima de acidente de trabalho, em razão de sua culpa exclusiva.

O colegiado registrou que o empregado, embora devidamente treinado e na posse de equipamento de proteção individual (EPIs), havia desobedecido às regras de segurança da empregadora (Gafor S. A.) ao retirar os óculos de proteção, o que acabou resultando na perda da visão do olho esquerdo. A decisão foi unânime.

Extração de madeira

Na ação, o empregado relatou que exercia tarefa de motorista de caminhão por estradas particulares em áreas rurais em que a empresa realizava extração de madeira. Durante o reparo da esteira de uma máquina florestal, um colega de trabalho marretou um pino, que lançou uma esfera metálica no seu olho esquerdo, ocasionando a perda da visão.

Atividade de risco

O motorista argumentou que sua atividade profissional em área de corte e extração de grandes toras de madeira por estradas particulares o colocava em uma situação de risco. Por essa razão, argumentou que, independentemente de culpa da empresa no acidente, ela teria o dever de compensar o dano sofrido.

Confissão

Ao analisar as provas, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) manteve a conclusão do juízo de primeira instância de que o acidente ocorrera por culpa exclusiva do motorista. Segundo o TRT, o próprio empregado havia admitido em depoimento que estava em posse dos equipamentos de segurança necessários no dia do acidente, inclusive os óculos de proteção. Também informou que foi devidamente treinado sobre a necessidade e a forma de sua utilização.

Descumprimento das normas de segurança

Dessa maneira, a conclusão do colegiado foi a de que, ao retirar o equipamento e permanecer sem ele próximo à zona que sabia ser de risco, o motorista desobedeceu aos procedimentos de segurança da empresa, conforme treinamento recebido.

Culpa exclusiva

Com base nessas premissas, o ministro Alexandre Ramos, relator do recurso do motorista ao TST, concordou que a conduta do empregado foi a causa do acidente de trabalho, sem que tenha sido configurada ação ou omissão da empregadora capaz de atrair a sua responsabilidade pelo dano sofrido.

A conclusão do TRT apenas poderia ser modificada, segundo Ramos, com o reexame dos fatos e das provas, o que é inviável em recurso ao TST. Com informações do técnico judiciário Bruno Vilar, compiladas pela Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

Clique aqui para ler o acórdão

Ag-ED-AIRR-11419-05.2021.5.03.0056

EXECUÇÃO CIVIL
Procura por ativos do devedor no Simba e Coaf é desvio de finalidade, diz STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, mesmo após tentativas infrutíferas de identificar e penhorar ativos financeiros, não é possível realizar pesquisa no Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias (Simba) e no cadastro do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para fins de execução civil.

Por outro lado, o colegiado determinou a expedição de ofício ao Banco Central (Bacen) para que efetue pesquisa no Cadastro Geral de Clientes de Instituições Financeiras (CCS), com o objetivo de localizar bens de titularidade da parte executada.

Cumprimento de sentença

Na origem do caso, trata-se de rescisão contratual de promessa de compra e venda de imóvel, com pedido indenizatório, ajuizada por JNM Comércio de Pedras em Geral Ltda, em face de Votorantim Cimentos S/A, a qual foi julgada improcedente. Em reconvenção, a ação da Votorantim foi julgada parcialmente procedente, a fim de determinar que a ré reconvinda ‘‘dê início às medidas judiciais e extrajudiciais que entender pertinentes ao cumprimento de sua obrigação contratual’’.

Após, sobreveio o trânsito em julgado da decisão. Na fase de cumprimento de sentença, o juízo indeferiu o pedido da Votorantim para que fossem feitas pesquisas de bens da executada no CCS-Bacen e no Simba, bem como expedição de ofício ao Coaf. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão.

No recurso especial (REsp) aviado ao STJ, a empresa credora sustentou que o indeferimento das medidas vai contra os princípios da duração razoável do processo, da proporcionalidade, da razoabilidade e da eficiência.

Simba e Coaf promovem combate à criminalidade

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Lucas Pricken/STJ

A relatora do REsp na Terceira Turma do STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que não é possível atender à pretensão da exequente em relação ao Simba e ao Coaf, pois isso significaria desvio da finalidade desses sistemas, que têm atribuições imprescindíveis no combate à criminalidade.

A ministra apontou que o artigo 5º, inciso XII, da Constituição, estabelece que a proteção ao sigilo bancário pode ser mitigada para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. No entanto, segundo ela, não se pode admitir a devassa de informações sigilosas para a busca de bens que atendam ao interesse meramente privado do credor.

Da mesma forma, a relatora observou que a Lei Complementar 105/2001, que rege o sigilo das operações das instituições financeiras, dispõe que ele só será quebrado na apuração de ilícitos em inquérito ou processo judicial, ou ainda em processo administrativo ou procedimento fiscal nos quais a medida seja indispensável.

Meios atípicos podem ser utilizados subsidiariamente

A ministra ressaltou que, de acordo com o artigo 854 do Código de Processo Civil (CPC), existem sistemas que podem ser utilizados para verificar a existência de bens do devedor, passíveis de controle por atos executivos: BacenJud, RenaJud, Infojud e InfoSeg.

Também apontou que o artigo 139, inciso IV, do CPC, viabiliza a adoção de medidas atípicas como instrumento para a satisfação da obrigação do executado, mas ressaltou que essas medidas não podem se dissociar dos ditames constitucionais. Conforme lembrou Nancy Andrighi, o STJ entende que a adoção de meios executivos atípicos é cabível de modo subsidiário, desde que haja indícios de patrimônio expropriável em nome do devedor.

Quanto ao CCS, a ministra observou que é um sistema de informações cadastrais dos correntistas de instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central (Bacen) que não contém dados relativos a valor, movimentação financeira ou saldos de contas e aplicações.

‘‘Inexiste impedimento à consulta ao CCS-Bacen nos procedimentos cíveis, devendo ser considerado como apenas mais um mecanismo à disposição do credor na busca para satisfazer o seu crédito’’, concluiu no voto. Redação Painel de Risco com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no 2.043.328

IMPORTAÇÕES IRREGULARES
TRF-4 vê comércio ilícito de bens apreendidos em aduana e mantém perdimento de veículo transportador

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Divulgação DB Tesser/Imprensa

Uma vez demonstrado o caráter eminentemente comercial das mercadorias importadas de forma irregular, apreendidas na aduana, a Justiça pode relativizar o princípio da proporcionalidade, autorizando a aplicação da pena de perdimento ao veículo utilizado no transporte.

Com a prevalência deste entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) acolheu apelação da Fazenda Nacional (União) para manter a pena de perdimento sobre um automóvel Citröen Picasso (ano 2008), apreendido pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Alegrete (RS) no dia 22 de novembro de 2019. O veículo transportava uma batedeira e cinco aparelhos de ar-condicionado, adquiridos pelos seus três ocupantes além da cota permitida de US$ 500, na cidade fronteiriça de Rivera (Uruguai).

O juiz federal convocado Rodrigo Becker Pinto, voto vencedor neste julgamento, disse que a ‘‘evidente destinação comercial’’ dos produtos, bem como as condições em que foram apreendidos, indica o ‘‘exercício de atividade ilícita de forma organizada’’ –, justificando a relativização do princípio da proporcionalidade.

‘‘Com efeito, consta do Boletim de Ocorrência acostado aos autos que, além do veículo objeto desta demanda, foi apreendido, na mesma ocasião, um segundo automóvel que viajava em conjunto, no qual foram localizados 05 (cinco) aparelhos de ar-condicionado, além de 04 (quatro) caixas de espumante e uma caixa de licor. Do documento, consta que […] ambos confirmaram que estavam viajando juntos e que estariam vindo da região de Rivera-Uruguai’’, fulminou no voto.

Base jurídica para a pena de perdimento

A pena administrativa de perdimento de veículo, aplicada pela Receita Federal do Brasil (RFB) em apreensões de bens de procedência clandestina, encontra guarida no artigo 5º, inciso XLVI, letra ‘‘b’’, e inciso LIV, da Constituição.

Já no ordenamento legal, está amparada nos artigos 2º e 3º e seu parágrafo primeiro do Decreto-Lei 399/1968 (consolidados no artigo 693 do Regulamento Aduaneiro – Decreto 6.759/2009), bem como no artigo 95, incisos I e II, do Decreto-Lei 37/1966 (artigo 674, incisos I e II, do Decreto-Lei 6.759/2009).

Apreensão de mercadorias na Fronteira

Os autores da ação de restituição alegaram na Justiça que as mercadorias foram adquiridas por valor inferior a US$ 500, supondo, por isso, que ainda estariam dentro da cota de isenção do imposto de importação.

No cerne da questão, eles reclamaram que o valor do veículo, estimado em R$ 16 mil, superava o das mercadorias apreendidas – avaliadas em R$ 7,2 mil. Assim, a Receita Federal não teria justificativa para aplicar a pena de perdimento do veículo.

Vara Federal mandou devolver o veículo

No primeiro grau, o juízo da 1ª Vara Federal de Santa Rosa (RS) julgou procedente o pedido de restituição do veículo, por entender que a autuação aduaneira se mostrou desproporcional, decretando, por consequência, a anulação do ato administrativo de perdimento.

O juiz federal Rafael Lago Salapata levou em conta uma série de circunstâncias: os produtos apreendidos não estavam escondidos em veículo modificado, também não havia comprovação de que os autores comercializavam tais bens, assim como não se tinha notícia de que os tivessem outras mercadorias apreendidas anteriormente.

‘‘Afora isso, o veículo utilizado para transporte é considerado de passeio, possui mais de dez anos de uso e seu valor de mercado é baixo, assim como o valor das mercadorias aprendidas – as quais, quantitativamente, não revelam, por si sós, caracterização da destinação comercial. Assim sendo, impõe-se a procedência do pedido’’, justificou na sentença.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

5004706-20.2019.4.04.7115 (Santa Rosa-RS)

 

AJUDE A EXPANDIR NOSSO PROJETO EDITORIAL.
DOE ATRAVÉS DA CHAVE PIX E-MAIL
: 
jomar@painelderiscos.com.br

PLANO DE SAÚDE
STJ fixa teses sobre obrigação de custear cirurgia plástica após bariátrica

Foto: Divulgação Blanc Hospital

Ao analisar o Tema 1.069 dos recursos repetitivos, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou, por unanimidade, duas teses sobre a obrigatoriedade de custeio, pelos planos de saúde, de operações plásticas após a realização da cirurgia bariátrica.

Na primeira tese, o colegiado definiu que é de cobertura obrigatória pelos planos a cirurgia plástica de caráter reparador ou funcional indicada pelo médico após a cirurgia bariátrica, visto ser parte do tratamento da obesidade mórbida.

A segunda tese estabelece que, havendo dúvidas justificadas e razoáveis quanto ao caráter eminentemente estético da cirurgia plástica indicada após a bariátrica, a operadora do plano pode se utilizar do procedimento da junta médica, formada para dirimir a divergência técnico-assistencial, desde que arque com os honorários dos respectivos profissionais e sem prejuízo do exercício do direito de ação pelo beneficiário, em caso de parecer desfavorável à indicação clínica do médico assistente, ao qual não se vincula o julgador.

Plástica complementar ao tratamento de obesidade previne males de saúde

Ministro Villas Bôas Cueva foi o relator
Foto: Gustavo Lima/STJ

Em seu voto, o relator do recurso repetitivo, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, observou que, conforme o artigo 10, caput, da Lei 9.656/1998, o tratamento da obesidade mórbida é de cobertura obrigatória nos planos de saúde. Segundo o magistrado, esse mesmo dispositivo prevê que ficam excluídos da cobertura os procedimentos clínicos ou cirúrgicos para fins estéticos.

Contudo, o ministro destacou que as operadoras devem custear as cirurgias plásticas pós-bariátrica, a exemplo da retirada de excesso de pele, uma vez que, em algumas situações, a plástica não se limita a rejuvenescer ou aperfeiçoar a beleza corporal, mas se destina primordialmente a reparar ou a reconstruir parte do corpo humano ou, ainda, a prevenir males de saúde.

Villas Bôas Cueva lembrou que o STJ possui jurisprudência no sentido de que a operadora deve arcar com os tratamentos destinados à cura da doença, incluídas as suas consequências.

‘‘Não basta a operadora do plano de assistência médica se limitar ao custeio da cirurgia bariátrica para suplantar a obesidade mórbida, mas as resultantes dobras de pele ocasionadas pelo rápido emagrecimento também devem receber atenção terapêutica, já que podem provocar diversas complicações de saúde, a exemplo da candidíase de repetição, infecções bacterianas devido às escoriações pelo atrito, odor fétido e hérnias, não se qualificando, na hipótese, a retirada do excesso de tecido epitelial como procedimento unicamente estético, ressaindo sobremaneira o seu caráter funcional e reparador’’, declarou.

Não se pode ampliar indiscriminadamente a cobertura dos planos de saúde

O relator também ressaltou que, embora a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tenha incluído apenas a dermolipectomia abdominal (substituída pela abdominoplastia) e a diástase dos retos abdominais no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde para o tratamento dos males pós-cirurgia bariátrica, devem ser custeados todos os procedimentos cirúrgicos de natureza reparadora, para assim haver a integralidade de ações na recuperação do paciente.

‘‘No âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), estão previstos diversos procedimentos cirúrgicos reparadores em pacientes os quais foram submetidos à cirurgia bariátrica, de modo que a ANS já deveria ter atualizado o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, tendo em vista o disposto no artigo 10, parágrafo 10, da Lei 9.656/1998’’, afirmou.

Todavia, segundo o ministro, não é qualquer cirurgia plástica que estará coberta para os pacientes que se submeteram à bariátrica, pois não se pode ampliar indiscriminadamente a cobertura para incluir quaisquer tratamentos complementares, sobretudo se não objetivam a restauração funcional.

‘‘Havendo dúvidas justificadas acerca do caráter eminentemente estético da cirurgia, a operadora de plano de saúde pode se socorrer do procedimento da junta médica estabelecido em normativo da ANS’’, concluiu o relator. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.870.834