DEVER DE CONFIDENCIALIDADE
Bancária vai pagar dano moral por não pedir segredo de justiça em reclamatória

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Reprodução

O empregador, como pessoa jurídica, é titular de honra objetiva e faz jus à reparação sempre que o seu bom nome, reputação ou imagem – que integram o seu patrimônio imaterial – forem atingidos por algum ato ilícito do empregado.

Assim, o Banco C6 S/A conseguiu, perante a 8ª Vara do Trabalho de São Paulo, condenar em danos morais uma bancária que trabalhava em regime de home office por expor, na ação reclamatória, inúmeros dados sensíveis e estratégicos para documentar os seus pedidos trabalhistas, sem o cuidado de pedir a decretação de segredo de justiça. O valor da reparação: R$ 6 mil.

Da sentença, cabe recurso ordinário ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo).

Reconvenção

Na reconvenção – no bojo da contestação a inúmeros pedidos –, o banco disse que a autora da ação reclamatória tinha sob sua guarda informações e acesso privilegiados, em razão de sua atividade profissional.

Ao anexar estes documentos à peça inicial, especialmente os voltados ao monitoramento das operações financeiras realizadas pelos clientes, afirmou que ela feriu as cláusulas de confidencialidade e de proteção de dados estipuladas no contrato de trabalho. Ou seja, além de informações sigilosas da empresa, ela divulgou dados de remuneração de pessoas físicas clientes do banco.

Informações sigilosas

‘‘A autora não pleiteou a decretação de segredo de justiça no feito [processo trabalhista], e os documentos mencionados contêm informações sigilosas sobre operações e dados estratégicos da ré e sua divulgação compromete o segredo de empresa. Assim, entendo que não houve observância ao dever contratual de confidencialidade da autora-reconvinda, e que houve dano ao direito ao segredo empresarial da ré-reconvinte’’, confirmou, na sentença, a juíza do trabalho Katiussia Maria Paiva Machado.

Na seara cível, segundo a juíza, a pessoa jurídica goza da proteção aos direitos da personalidade, no que couber, e pode sofrer dano moral. É o que se depreende da leitura combinada do artigo 52 do Código Civil (CC) e da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Segredo empresarial tem proteção jurídica

‘‘Os artigos 223-B e 223-D da CLT definem que causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa jurídica, a qual é titular exclusiva do direito à reparação, sendo imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa jurídica’’, complementou.

A juíza negou, entretanto, o pedido para ‘‘aniquilar todos os documentos, e-mails, fotografias, capturas de tela e informações relacionados ao Banco C6’’, invocando o artigo 17 da Lei 13.709/2018 (LGPD).

‘‘Contudo, referida obrigação de fazer nos termos em que requerida pela ré-reconvinte [banco] é inexequível, pois não é possível o controle do seu cumprimento ou descumprimento na prática. Ademais, a cláusula de confidencialidade e política de privacidade e proteção de dados impede apenas a divulgação de dados da ré-reconvinte’’, finalizou na sentença.

Banco digital

Segundo informa a Wikipedia, o Banco C6 S/A é uma instituição bancária digital de capital fechado voltada a pessoas físicas e jurídicas, sediada na capital de São Paulo.

O projeto do banco foi iniciado em março de 2018, tendo sido lançado e aberto ao público em geral no dia 5 de agosto de 2019, sob a liderança de Marcelo Kalim, ex BTG Pactual. Tem foco voltado ao varejo de alta renda, setor ainda pouco explorado no Brasil.

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ATOrd 1000241-48.2023.5.02.0008 (São Paulo)

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VENDA CASADA
TJSP mantém multa de R$ 11,2 milhões contra práticas abusivas do Banco do Brasil

Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor em São Paulo (Procon-SP), como órgão de fiscalização das relações de consumo, tem competência administrativa para aplicar sanções àquele que violar normas vigentes, sendo que o seu poder de polícia decorre de normas federal e estadual.

Assim, a 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) não teve dúvidas em manter auto de infração que fixou multa de R$ 11,2 milhões ao Banco do Brasil (BB). A decisão foi unânime no colegiado de segundo grau.

Seis infrações ao CDC

De acordo com os autos do processo, o BB acionou a Justiça após ser multado pela prática de seis infrações ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), dentre estas, a imposição de compra de seguro residencial para análise de solicitação de empréstimo – a chamada ‘‘venda casada’’.

O relator do recurso no TJSP, desembargador Paulo Barcellos Gatti, ressaltou em seu voto que a prática de comercializar seguro juntamente com empréstimo consignado viola o disposto no CDC. O magistrado também apontou que, ‘‘em mais de uma oportunidade, as informações fornecidas pelo banco aos consumidores foram insuficientes’’.

BB teve direito à ampla defesa

Sobre o valor da multa aplicada, o julgador destacou que a instituição bancária teve oportunidade de exercer as garantias constitucionais à ampla defesa e ao contraditório no curso do processo administrativo instaurado pela Fundação.

‘‘Com base nos critérios previamente estabelecidos que, consoante mencionado, tão somente pormenorizou aqueles já descritos no artigo 57, caput, do CDC, o órgão administrativo aplicou, fundamentadamente, a correspondente sanção administrativa, conforme se verifica do demonstrativo de cálculo da multa, inexistindo qualquer desproporcionalidade ou irrazoabilidade no procedimento’’, afirmou no voto.

Completaram a turma julgadora os desembargadores Maurício Fiorito e Ana Liarte. Com informações da Comunicação Social do TJSP.

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1036048-10.2022.8.26.0053 (São Paulo)

RELATIVIZAÇÃO DA PROPRIEDADE
STF derruba tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas

Banco de Imagens do STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, na quinta-feira (21/9), a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Por 9 votos a 2, o Plenário decidiu que a data da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988) não pode ser utilizada para definir a ocupação tradicional da terra por essas comunidades.

A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, com repercussão geral (Tema 1.031). Na próxima quarta-feira (27/9), o Plenário fixará a tese que servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 226 casos semelhantes que estão suspensos à espera dessa definição.

O julgamento começou em agosto de 2021 e é um dos maiores da história do STF. Ele se estendeu por 11 sessões, as seis primeiras por videoconferência, e duas foram dedicadas exclusivamente a 38 manifestações das partes do processo, de terceiros interessados, do advogado-geral da União e do procurador-geral da República.

A sessão foi acompanhada por representantes de povos indígenas no Plenário do STF e em uma tenda montada no estacionamento ao lado do Tribunal. Após o voto do ministro Luiz Fux, o sexto contra a tese do marco temporal, houve cantos e danças em comemoração à maioria que havia sido formada.

Ancestralidade

Primeiro a votar nessa tarde, o ministro Luiz Fux argumentou que, quando fala em terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, a Constituição se refere às áreas ocupadas e às que ainda têm vinculação com a ancestralidade e a tradição desse povos. Segundo ele, ainda que não estejam demarcadas, elas devem ser objeto da proteção constitucional.

Direitos fundamentais

Ao apresentar seu voto, a ministra Cármen Lúcia ressaltou que a Constituição Federal, ao traçar o estatuto dos povos indígenas, assegurou-lhes expressamente a manutenção de sua organização social, seus costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos sobre as terras tradicionalmente ocupadas.

Para a ministra, a posse da terra não pode ser desmembrada dos outros direitos fundamentais garantidos a eles. Ela salientou que o julgamento trata da dignidade étnica de um povo que foi oprimido e dizimado por cinco séculos.

Critérios objetivos

O ministro Gilmar Mendes também afastou, em seu voto, a tese do marco temporal, desde que assegurada a indenização aos ocupantes de boa-fé, inclusive quanto à terra nua. Segundo ele, o conceito de terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, que baliza as demarcações, deve observar objetivamente os critérios definidos na Constituição e atender a todos.

Posse tradicional

Última a votar, a presidente do STF, ministra Rosa Weber, afirmou que a posse de terras pelos povos indígenas está relacionada com a tradição, e não com a posse imemorial. Ela explicou que os direitos desses povos sobre as terras por eles ocupadas são direitos fundamentais que não podem ser mitigados.

Destacou, ainda, que a posse tradicional não se esgota na posse atual ou na posse física das terras. Ela lembrou que a legislação brasileira tradicionalmente trata de posse indígena sob a ótica do indigenato, ou seja, de que esse direito é anterior à criação do Estado brasileiro.

O julgamento foi acompanhado por representantes de povos indígenas no Plenário do STF e em uma tenda montada ao lado do Tribunal. Após o voto do ministro Luiz Fux, o sexto contra a tese do marco temporal, houve cantos e danças em comemoração à maioria que havia sido formada.

Caso concreto

O caso que originou o recurso está relacionado a um pedido do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) de reintegração de posse de uma área localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás (SC), declarada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como de tradicional ocupação indígena.

No recurso, a Funai contesta decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), para quem não foi demonstrado que as terras seriam tradicionalmente ocupadas pelos indígenas e confirmou a sentença em que fora determinada a reintegração de posse.

Na resolução do caso concreto, prevaleceu o entendimento do ministro Edson Fachin (relator), que deu provimento ao recurso. Com isso, foi anulada a decisão do TRF-4, que não considerou a preexistência do direito originário sobre as terras e deu validade ao título de domínio, sem proporcionar à comunidade indígena e à Funai a demonstração da melhor posse. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

RE 1017365

CONSUMO MÍNIMO
Cláusula take or pay não dá direito a fornecimento de gás após período contratual

Nos contratos com cláusula take or pay, o pagamento do consumo mínimo não confere ao comprador o direito de, no mês seguinte, obter o produto que deixou de consumir no período anterior, e pelo qual teve de pagar. Foi o que decidiu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao se pronunciar sobre o desfecho de uma ação de cobrança ajuizada em 2010 pela White Martins Gases Industriais, fornecedora de gás comprimido, contra uma microempresa de beneficiamento de minério de ferro em Minas Gerais.

A ação nasceu pelo descumprimento da obrigação de pagar convencionada em contrato de compra e venda do tipo take or pay.

Conforme o processo, a empresa consumidora havia assumido a obrigação de pagar um valor mínimo relativo a certa quantidade de gás. Entretanto, ela deixou de consumir o produto e de pagar o montante devido, mesmo após tratativas para a quitação da dívida.

O juízo de origem condenou a ré a pagar o valor devido, mais juros de mora e correção monetária, com a possibilidade de compensar os valores já pagos. Além disso, o magistrado assegurou à ré o recebimento do produto correspondente ao valor pago, mesmo após o período em que ele deveria ter sido utilizado, sob pena de enriquecimento sem causa da autora da ação. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a sentença.

Cláusula apresenta vantagens para todas as partes

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que a cláusula take or pay obriga o comprador a pagar por uma quantidade mínima especificada no contrato, ainda que o insumo não seja utilizado. Segundo apontou, ‘‘uma das partes assume a obrigação de pagar pela quantidade mínima de bens ou serviços disponibilizados, independentemente da flutuação da sua demanda’’.

A relatora destacou que, apesar de não inserida no ordenamento jurídico brasileiro, essa prática está comumente presente em contratos de prestação continuada de fornecimento de produtos. De acordo com a ministra, a inserção dessa cláusula no contrato proporciona ao fornecedor segurança para investir e atender à demanda do adquirente, enquanto este se beneficia ao pagar um preço menor pelo produto.

‘‘Se houver aquisição da quantidade mínima estipulada ou de quantidade superior a ela, o preço a ser pago corresponderá à demanda efetivamente consumida, não se aplicando a cláusula take or pay’’, completou.

Fornecimento do que não foi consumido inutilizaria a cláusula

Nancy Andrighi afirmou que, mesmo não consumindo a quantidade mínima de produto disponibilizada pelo vendedor no período ajustado, o comprador terá de pagar o valor estipulado na cláusula. Ela ressaltou que, nesse modelo contratual, o comprador assume o risco da oscilação da demanda e, em contrapartida, será beneficiado com um preço menor.

‘‘Por se tratar de um contrato de trato sucessivo, no período subsequente, ela não terá direito ao recebimento da diferença entre o volume mínimo, pela qual pagou, e a quantia efetivamente consumida’’, completou a ministra ao apontar que a desconsideração do risco assumido pela adquirente acarretaria a ineficácia da cláusula take or pay.

Com esse entendimento, foi dado provimento parcial ao recurso para afastar a obrigação imposta à fornecedora de entregar o volume de gás correspondente ao valor mínimo efetivamente pago. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.048.957

CONTRATO COLETIVO
TJSP manda Sul América ressarcir empresa por reajuste abusivo de plano de saúde

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Comete abuso a operadora de plano de saúde que reajusta o prêmio anual dos contratos coletivos por adesão em índices muito acima dos autorizados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Pior, ainda, quando mantém os cálculos obscuros, nem disponibiliza toda a documentação atuarial ao Judiciário, para análise da regularidade do reajuste.

Por isso, a 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve íntegra a sentença que declarou abusivo o reajuste anual de 2017 aplicado pela Sul América Companhia de Seguro Saúde S/A aos contratos coletivos da sua cliente Ferro e Aço Fortunato Ltda, sediada em Santo André (ABC paulista). Assim, a partir daquele ano, os contratos passam a ser reajustados apenas pelos índices da ANS.

Em suma, nos dois graus de jurisdição, não houve demonstração idônea por parte da operadora do plano de saúde acerca dos fatos que ensejaram os reajustes nos percentuais aplicados, o que feriu o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Declaração de abusividade

Fachada Fortunato Ferro & Aço

A empresa afirmou à Justiça que, em 2017, pagava R$ 11,7 mil pela prestação dos serviços, valor aumentado para R$ 27,6 mil em março de 2013. Assim, pediu a declaração de abusividade do aumento e a consequente devolução dos valores pagos a maior.

O juízo da 1ª Vara Cível de São Paulo (Foro Regional de Pinheiros) julgou procedente os pedidos da parte autora, por entender que a prática se revelou abusiva. Afinal, a ré manteve obscuro o cálculo de reajuste, além de não disponibilizar a documentação contábil solicitada pelos peritos.

‘‘Em agindo assim, outra alternativa não resta senão concluir que os reajustes aplicados pela ré para o prêmio da autora não restaram justificados e, sendo superiores aos índices inflacionários reconhecidos para os planos individuais pela ANS, devem ser substituídos por aqueles autorizados. Ademais, constatada a abusividade do aumento, de rigor a devolução dos valores pagos a maior, com correção monetária pela Tabela Prático do TJSP, a partir de cada desembolso, e juros moratórios de 1%, a partir da citação’’, determinou na sentença o juiz Paulo Henrique Ribeiro Garcia. O valor a ser devolvido foi estimado em R$ 291,8 mil – observada a prescrição trienal.

Falta de justificativa concreta para o reajuste

O relator da apelação na 10ª Câmara de Direito Privado do TJSP, desembargador Jair de Souza, manteve a sentença e deu mais robustez à decisão. Em complemento à fundamentação, observou que os planos de saúde coletivos não se submetem aos índices vinculantes da ANS para os contratos individuais/familiares. Entretanto, o percentual reajuste deve encontrar justificativa concreta, sob pena de se converter em prática abusiva.

Tal raciocínio, segundo o julgador, encontra eco no CDC. O artigo 6º, inciso V, diz que são direitos básicos do consumidor a modificação ou a revisão de cláusula contratual que estabeleça prestação desproporcional ou excessivamente onerosa imposta em razão de fato superveniente.

Consumidor colocado em posição de desvantagem

Destacou, por fim, que o CDC prevê a nulidade, de pleno direito, da cláusula que favoreça o fornecedor, direta ou indiretamente, pela variação de valores de forma unilateral (artigo 51, inciso X), bem como estabeleça obrigação considerada abusiva ou que coloque o consumidor em desvantagem exagerada (artigo 51, inciso IV).

‘‘Em razão disso, constitui ônus das operadoras de plano de saúde comprovar o aumento da sinistralidade, dos custos médicos-hospitalares, de administração, de comercialização ou outras despesas incidentes e que, eventualmente, tenham sido utilizadas para quantificar o aumento anual’’, apontou Souza no acórdão.

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1010046-32.2022.8.26.0011 (São Paulo)

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