INADIMPLEMENTO CONTRATUAL
Impossibilidade de tratamento em hospital credenciado justifica reembolso total de despesa fora da rede

Arte: Hospital Sírio-Libanês

Na ausência de prestador que ofereça o serviço de urgência/emergência, na área geográfica de abrangência do plano de saúde, a operadora deve garantir o transporte do beneficiário e o custeio do tratamento até outro prestador, assim como seu retorno à localidade de origem. É o que revela, em leitura integrada, os artigos 6º e 9º da Resolução Normativa 259/2011, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Assim, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, determinou que uma operadora de plano de saúde reembolse, integralmente, as despesas feitas em hospital não credenciado pelos pais de uma bebê recém-nascida. Segundo o colegiado, por não ter assegurado à consumidora a cobertura dos tratamentos médicos abarcados pelo contrato, a conduta da operadora configurou inadimplemento contratual.

De acordo com os autos, poucos dias após o nascimento, a bebê apresentou quadro de grave baixa ou diminuição de consciência e precisou ser intubada na UTI neonatal do hospital onde nascera, em João Pessoa. Foram detectados indícios de síndrome metabólica, a qual somente poderia ser confirmada com exames complexos, que não eram oferecidos na região.

Considerando o risco de morte, a médica responsável pelo caso solicitou a transferência da recém-nascida para o Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, a qual foi autorizada e custeada pela operadora. No hospital paulistano, os exames revelaram o diagnóstico de acidemia isovalérica, o que levou a bebê a ser internada em UTI e intubada, sem previsão de alta, não tendo a operadora do plano de saúde arcado com os custos dessa nova internação.

Internação fora da rede credenciada não foi simples conveniência do beneficiário

Os pais da recém-nascida, que arcaram com os custos da internação em São Paulo, ajuizaram ação para obter da operadora de saúde o reembolso total dessas despesas. O pedido foi julgado integralmente procedente pelas instâncias ordinárias.

Ministro Marcos Buzzi foi o relator
Foto: Imprensa/CNJ

No STJ, o relator do recurso da operadora, ministro Marco Buzzi, comentou que, segundo a jurisprudência, o reembolso de despesas realizadas fora da rede credenciada, para tratamento de urgência ou emergência, deve ser limitado ao valor de tabela praticado entre o plano de saúde e as entidades conveniadas.

No entanto, no caso em discussão, ele observou que a internação em hospital não integrante da rede credenciada não decorreu de mera conveniência do beneficiário, mas da impossibilidade técnica de continuidade do tratamento até então fornecido em hospital conveniado – situação que foi devidamente informada à operadora.

Operadora descumpriu artigo da Resolução 259 da ANS

O ministro destacou que, nos termos do artigo 6º da Resolução 259/2011 da ANS, quando não houver prestador, integrante ou não da rede assistencial, que ofereça o serviço de urgência ou emergência demandado na região do beneficiário, a operadora deve garantir o transporte do paciente e o custeio de seu tratamento em um prestador apto a realizar o devido atendimento.

O relator apontou que, caso a operadora descumpra tal exigência, o artigo 9º da resolução da ANS prevê que os gastos do beneficiário com tratamento fora da rede credenciada serão reembolsados integralmente, no prazo de 30 dias.

Ele também ressaltou que a rede credenciada não tinha condições técnicas para prosseguir com o tratamento, diante da incapacidade de obtenção de diagnóstico preciso da doença da bebê.

Nesse cenário, segundo o relator, cabia à operadora, de forma proativa, remover a paciente para uma unidade hospitalar, credenciada ou não, capaz de prestar o atendimento necessário e contratualmente previsto, arcando com os custos do transporte e da internação.

‘‘A despeito de regularmente notificada sobre a necessidade de transferência da paciente, e consequente internamento em outro hospital, não há nos autos notícia de que a empresa tenha adotado qualquer das providências estabelecidas pela ANS para casos como este em julgamento. A operadora limitou-se a custear o traslado da paciente à unidade hospitalar não integrante da rede conveniada, omitindo-se sobre seu dever de, ainda assim, custear o tratamento e relegando aos beneficiários o custeio da internação’’, afirmou Buzzi. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Número do processo não divulgado em razão de segredo judicial.

Clique aqui para ler a Resolução 259 da ANS

EXECUÇÃO FISCAL
Não pagar parcela de dívida judicial não é crime de apropriação indébita, diz STF

Foto: Imprensa STF

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), na sessão de terça-feira (17/10), decidiu que o não recolhimento de parcelas de um acordo judicial – que prevê a penhora de parte do faturamento de uma empresa – não configura crime de apropriação indébita. A decisão, por maioria, se deu no julgamento do Habeas Corpus (HC) 215102.

Acordo descumprido

No caso dos autos, a empresa foi submetida a processo de execução fiscal e firmou acordo para o pagamento parcelado de valores relativos à penhora sobre seu faturamento. Um dos sócios foi nomeado depositário judicial, responsável por guardar os bens penhorados e garantir o pagamento à Justiça. Contudo, ele descumpriu o acordo e não efetuou todos os depósitos. Por isso, foi condenado a um ano e quatro meses de reclusão pela prática de apropriação indébita.

Coisa própria

Prevaleceu no julgamento a divergência aberta pelo ministro Nunes Marques de que o crime, nessa circunstância, não é de apropriação indébita, porque não se trata de ‘‘coisa alheia’’, como prevê a definição do artigo 168 do Código Penal (CP).

A seu ver, ao não efetuar os depósitos, o empresário teria se apropriado de coisa própria, pois o valor a ser depositado lhe pertencia. No mesmo sentido votaram os ministros Edson Fachin e Gilmar Mendes, que absolveram o empresário do crime.

Valores penhorados

Para o ministro Dias Toffoli (relator), mesmo sendo proprietário da empresa executada, o sócio não se apropriou de coisa própria, mas de valores submetidos à penhora e que não lhe pertenciam. O ministro André Mendonça acompanhou o relator. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

HC 215102

RECLAMAÇÃO
STF cassa reconhecimento de vínculo de emprego de corretor com construtora

‘‘É lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada’’, diz a tese prevalente na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324 e do Recurso Extraordinário (RE) 958252. Ou seja, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que é lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo.

Assim, o ministro Nunes Marques cassou decisão da Justiça do Trabalho gaúcha que havia reconhecido vínculo de emprego de um corretor de imóveis com a MRV Engenharia e Participações Ltda. Ao julgar procedente o pedido da empresa na Reclamação (RCL) 61514, o relator determinou que seja proferida outra decisão, com base no entendimento da Corte sobre a matéria.

Corretor

O caso teve origem em ação ajuizada por um corretor de Porto Alegre, buscando o reconhecimento do vínculo de emprego com a construtora, como vendedor de imóveis, entre junho de 2014 e janeiro de 2018, com a anotação na carteira de trabalho e o pagamento de verbas decorrentes.

Requisitos

O pedido foi julgado procedente na primeira instância, que entendeu que estavam presentes os requisitos da relação de emprego do artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) manteve esse entendimento, e o trâmite de recurso de revista foi negado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Prestação de serviços

Ministro Nunes Marques foi o relator
Foto: Carlos Moura/SCO/STF

No STF, a empresa alegava ter firmado contrato de prestação de serviços de corretagem imobiliária com corretor autônomo, conforme previsto na Lei 6.530/1978, e que a Justiça do Trabalho teria desconsiderado esse contrato e presumido que a negociação era ilícita, sem que fosse demonstrada fraude. Para a construtora, houve violação da jurisprudência do Supremo no sentido da permissão constitucional de formas alternativas de trabalho diversas da relação de emprego.

Precedentes

Em sua decisão, o ministro Nunes Marques observou que não há nos autos indícios de exercício abusivo da contratação com a intenção de fraudar a relação de emprego. Ele lembrou que, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, o STF reconheceu que a terceirização não resulta, isoladamente, na precarização do trabalho, na violação da dignidade do trabalhador ou no desrespeito a direitos previdenciários.

Ele citou ainda decisões da Corte na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 48, que reconheceu a natureza civil da relação comercial entre empresa e transportadores autônomos; e na ADI 5625, em que o Plenário validou contratos de parceria firmados entre salões de beleza e trabalhadores autônomos.

Segundo o ministro, embora não tratem especificamente de contratos de corretagem imobiliária, esses julgados exemplificam a validade de relações civis de prestação de serviços, nos termos do entendimento firmado na ADPF 324. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Leia aqui a íntegra da decisão

Reclamação 61.514/RS