DEMORA FATAL
Registro extemporâneo de alteração societária não pode ter efeitos retroativos, diz STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que o registro extemporâneo da retirada de um sócio não tem efeitos retroativos e, como consequência, pode acarretar a manutenção de sua responsabilidade por dívidas contraídas pela sociedade.

‘‘O registro possui, em regra, natureza declaratória, o que permite a caracterização do empresário individual ou da sociedade empresária e sua submissão ao regime jurídico empresarial em virtude do exercício da atividade econômica. No entanto, os atos de modificação societária exigem publicidade pelo registro para produzirem efeitos contra terceiros’’, declarou o relator do recurso especial (REsp), ministro Antonio Carlos Ferreira.

Na origem do caso, uma sociedade limitada registrada na Junta Comercial do Rio de Janeiro (Jucerja) foi transformada em sociedade simples em 2004, o que transferiu o arquivamento das futuras alterações contratuais para o Registro Civil das Pessoas Jurídicas do Rio de Janeiro. Em uma dessas alterações, de 2007, a então sócia administradora deixou a sociedade.

Ministro Antonio Carlos Ferreira foi o relator
Foto: Imprensa/STJ

Ocorre que a alteração que transformou a pessoa jurídica em sociedade simples só foi arquivada na Jucerja em 2014. Após ser citada em execuções fiscais decorrentes de débitos contraídos pela sociedade depois de sua saída, a empresária ajuizou ação contra a Jucerja para que fosse retificada a data do arquivamento da transformação societária, mas não teve êxito nas instâncias ordinárias.

Alterações valem desde o princípio se o registro é feito em 30 dias

No STJ, o ministro Antonio Carlos Ferreira observou que, a partir da transformação em sociedade simples, os atos societários passam a ser registrados apenas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas. No caso em análise, porém, a transformação do tipo de sociedade só foi arquivada na Jucerja dez anos depois, de modo que, nesse período, a autora da ação continuou a figurar como sócia administradora da empresa.

O relator apontou ainda que, nos termos dos artigos 1.150 e 1.151 do Código Civil e do artigo 36 da Lei 8.934/1994, as alterações de contrato social produzem efeitos a partir da data em que foram lavrados, desde que registrados nos 30 dias seguintes; ou a partir da data do registro, se o prazo não for observado.

‘‘A transformação do tipo societário – de limitada para simples – exigia, primeiramente, seu registro na Junta Comercial para, após e em razão de seu novo tipo societário, ser registrada no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do Rio de Janeiro, como determina a legislação. A ausência de continuidade do registro na Junta Comercial possibilitou que as ações fossem direcionadas contra a recorrente exatamente pelo fato de que, formalmente, ela figurava como sócia administradora naquela entidade registral’’, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ

Leia o acórdão no REsp 1.864.618

SONEGAÇÃO
TRF-4 condena empresário que falseou informações na venda de empresa para pagar menos IRPF

Reprodução Internet

É crime aumentar falsamente o capital social da empresa, ao vendê-la, para almejar ganho zero de capital e, assim, reduzir a base de recolhimento do Imposto de Renda. A conduta fraudulenta se amolda ao previsto no artigo 1º da Lei 8.137/90, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e as relações de consumo.

Assim, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve sentença da 23ª Vara Federal de Curitiba, que condenou um empresário paranaense à pena de dois anos e quatro meses de reclusão por sonegação de impostos na venda de sua participação societária numa empresa de agroquímicos.

A pena corporal acabou substituída por prestação de serviços à comunidade e ao pagamento de multa e de prestação pecuniária no valor de R$ 20 mil.

TRF-4 não viu culpa do pai do réu nem do contador

Juiz Danilo Pereira Jr foi o redator do acórdão
Foto: Imprensa/Ajufe

O réu ainda tentou jogar a culpa pela supressão do tributo nas costas do próprio pai – que seria o administrador de fato da empresa – e do contador, responsável pela gestão documental e elaboração das declarações de Imposto de Renda. O colegiado, no entanto, repeliu tal alegação, salientando que o réu, ao deixar a cargo do pai e do contador a elaboração de sua declaração de IRPF, assumiu o risco de produzir os resultados da ação típica.

‘‘Não se isenta da responsabilidade por suas obrigações legais a delegação a terceiros pelo cuidado com suas finanças ou obrigações tributárias. Resultou demonstrado que, no mínimo, o réu assumiu o risco do resultado. É aplicável ao caso, as teorias consagradas no Direito norte-americano da cegueira deliberada (willful blindness) ou evitar a consciência (conscious avoidance douctrine), para deduzir a presença de dolo eventual do acusado, uma vez que o réu se autocolocou na situação de ignorância, não podendo o indivíduo valer-se da própria torpeza’’, registrou na ementa o redator do acórdão, juiz federal convocado Danilo Pereira Júnior.

Venda da Indol do Brasil Agroquímica

O empresário Marcito Dombeck detinha, no início de 2006, uma participação no capital social da empresa Indol do Brasil Agroquímica Ltda avaliada em R$ 84,1 mil. Em 9 de junho do mesmo ano, ele a venderia por R$ 17,5 milhões, declarando, todavia, ganho zero de capital à Receita Federal.

A manobra tinha como objetivo, como se comprovaria no curso do procedimento administrativo fiscal (PAF), suprimir/reduzir o pagamento de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Ou seja, o fisco conseguiu demonstrar, documentalmente, que as integralizações do capital social da pessoa jurídica Indol do Brasil foram simuladas.

O PAF concluiu que, dos R$ 17,5 milhões, R$ 4,8 milhões corresponderam, efetivamente, ao aumento do capital social, enquanto a diferença de R$ 12,7 milhões implicou em base de cálculo para o ganho de capital, desprovida do efetivo recolhimento de Imposto de Renda por parte do contribuinte.

Sobre este valor, em setembro de 2006, o fisco lavrou auto de infração para cobrar R$ 1,9 milhão a título de IRPF não recolhido. Dez anos depois, a Receita Federal informou que o crédito exigível – inscrito em dívida ativo em julho de 2014 – já alcançava a expressiva quantia de R$ 9,6 milhões.

Pelo conjunto destas infrações fiscais, que resvalaram para o crime de sonegação de tributos, Marcito Dombeck foi denunciado em outubro de 2016 pelo Ministério Federal do Paraná (MPF-PR), cuja ação penal foi julgada procedente pela 23ª Vara Federal de Curitiba.

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AÇÃO REVISIONAL
Taxa do CDI não é índice de correção monetária, diz turma do STJ

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que a taxa do Certificado de Depósito Interbancário (CDI) não pode ser usada como índice de correção monetária. Segundo o colegiado, como a correção monetária recompõe a desvalorização da moeda, a aplicação do CDI com esse propósito é inadequada em razão da sua própria natureza.

No caso em julgamento, uma microempresária do setor do vestuário ajuizou ação revisional contra a Cooperativa de Crédito, Poupança e Investimento Aliança RS/SC (Sicredi Aliança), alegando abuso na cédula de crédito bancário, pois a taxa do CDI estava sendo aplicada para fins de correção monetária, quando deveria ser adotado o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

O juízo de primeiro grau reconheceu o caráter abusivo dos encargos e determinou sua redução, vedou a cobrança da comissão de permanência e considerou o INPC como fator de correção monetária que deveria ser aplicado. A cooperativa apelou, defendendo que a adoção do CDI como índice de correção não configura ilegalidade na relação contratual entabulada entre as partes.

Ministro Moura Ribeiro foi o relator
Foto: Flickr

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a utilização do INPC como fator de atualização, por entender que a incidência do CDI na composição dos encargos moratórios, juntamente com os juros, seria abusiva.

CDI reflete rentabilidade de empréstimos entre instituições financeiras

O ministro Moura Ribeiro, relator do recurso especial no  STJ, disse que a correção monetária tem como objetivo preservar o poder aquisitivo da moeda, que perde valor ao longo do tempo. Dessa forma, segundo o magistrado, para a correção do capital, passou a ser indispensável a estipulação de um índice com o intuito de aumentar o valor nominal da moeda e, por consequência, preservar o seu valor real, garantindo o mesmo poder de compra do passado.

O relator ressaltou que a correção monetária não representa ganho de capital, mas apenas mantém o patrimônio inalterado, evitando o enriquecimento do devedor, que deve devolver a quantia emprestada com preservação do seu valor real.

‘‘Considerando que a correção monetária contempla índice que recompõe a desvalorização da moeda, a aplicação da taxa do CDI a esse título se mostra mesmo inadequada, em razão da sua própria natureza. Tal como ocorre em relação à taxa Selic, referido índice não consubstancia propriamente um fator de correção monetária, exprimindo, antes, a rentabilidade de empréstimos de curto prazo realizados entre instituições financeiras’’, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial da cooperativa. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.081.432

SUCESSÃO TRABALHISTA
Caseiro só obtém reconhecimento de vínculo com o último empregador

Reprodução internet

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) limitou a responsabilidade de um empregador doméstico pelos encargos trabalhistas de um caseiro ao período em que ele ocupou o imóvel como inquilino. Com isso, foi afastada a condenação relativa à época anterior, em que o trabalhador prestara serviço ao proprietário.

O entendimento é o de que a sucessão trabalhista (segundo a qual a mudança na propriedade da empresa não atinge os direitos dos empregados) não se aplica ao empregador doméstico. A decisão foi unânime.

Reclamatória

O caseiro trabalhou no sítio, em Belterra (PA), de 2016 a 2021. Na ação, ele contou que, até 2020, trabalhou sem carteira assinada para o proprietário, que depois alugou o imóvel para um comerciante. Este teria proposto um contrato de parceria agrícola, pagando R$ 300 mensais fixos e 35% da safra.

Após a dispensa, ele ajuizou a ação apenas contra o inquilino, mas com pedido de vínculo empregatício desde 2016, alegando sucessão de empregadores.

Parceria

Em sua defesa, o inquilino alegou que, quando alugou o sítio, o caseiro já trabalhava lá, em regime de parceria com o proprietário. Por isso, propôs manter essa parceria, assinando outro contrato, pelo qual o caseiro se comprometeria a zelar pelo sítio e, em contrapartida, receber parte da produção de frutas, verduras e animais criados no local.

Vínculo

O juízo de primeiro grau considerou nulo o contrato de parceria e declarou o vínculo de emprego doméstico por todo o período. A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA), que confirmou a sucessão de empregadores.

Responsabilidade limitada

Ministro Alexandre Ramos
Foto: Secom/TST

No recurso ao TST, o empregador sustentou que sua responsabilidade deveria se limitar ao período em que havia assumido o sítio e firmado contrato de parceria rural, pois os trabalhadores domésticos são regidos por lei específica, e não pela CLT.

Explicando a sucessão

O relator do recurso de revista, ministro Alexandre Ramos, explicou que, quando o vínculo é mantido pela empresa sucessora, aplicam-se os artigos 10 e 448 da CLT, que tratam da sucessão trabalhista. Esses dispositivos, segundo o relator, remetem à ideia de despersonalização do empregador. Assim, o contrato de trabalho está vinculado ao empreendimento econômico, independentemente de quem sejam os seus titulares.

Sem atividade econômica

Contudo, o ministro ressaltou que o conceito de empresa está atrelado à atividade econômica, e esse não é o caso do empregador doméstico. Conforme o artigo 2º da Lei Complementar 150/2015, os empregados domésticos ‘‘prestam serviços de finalidade não lucrativa, ou seja, não desempenham atividade econômica’’.

Novidade do tema

O ministro destacou a novidade da questão, que ainda não foi abordada pela jurisprudência do TST. Segundo ele, não cabe sucessão de empregadores no vínculo de emprego doméstico, porque não há a transferência de um acervo produtivo de uma sociedade para outra. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-402-66.2021.5.08.0109  

ABUSO DE DIREITO
Hospital de Clínicas pagará dano moral por demitir funcionária com 25 anos de contrato dois dias antes da cirurgia

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Desligar empregada acometida de doença que exige intervenção cirúrgica urgente, pelo agravamento do quadro clínico e de fortes dores abdominais, é abuso de direito do empregador, dando margem ao pagamento de danos morais.

A decisão é da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul), ao reformar sentença que julgou improcedente pedido de reparação moral feito por uma prática de laboratório demitida pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) dois dias antes da cirurgia para extração de cálculos na vesícula biliar. Ela vai receber R$ 20 mil.

A trabalhadora, que contava 25 anos de trabalho no hospital, só não conseguiu a reintegração ao seu posto porque o colegiado entendeu que não houve dispensa discriminatória – a doença não era lúpus, esclerose múltipla ou HIV, que trazem, presumidamente, estigma social ao seu portador.

Exame demissional atestou aptidão para o trabalho

Juíza Luciana  Xavier
Reprodução: Amatra IV

Após ser citado pela 7ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, o hospital público federal negou que a reclamante estivesse incapacitada para suas tarefas no dia do ato de dispensa, como sinalizou o Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) demissional. Afirmou que a dispensa se deu, em verdade, pelo baixo desempenho nas últimas avaliações, além de reiteradas advertências e suspensões relativas aos descumprimentos de normativas internas e de processo de trabalho.

A juíza do trabalho Luciana Caringi Xavier não viu dispensa discriminatória e julgou improcedentes os pedidos vertidos na peça inicial. A seu ver, o atestado de 12 dias, apresentado pela reclamante, se refere ao período de recuperação pós-operatório, em razão da cirurgia realizada em 17 de janeiro de 2020 no próprio hospital – pelo convênio médico vinculado ao contrato de trabalho. Logo, o documento não demonstrou incapacidade laboral prévia à dispensa – ocorrida em 15 de janeiro.

Juíza do trabalho não viu urgência na cirurgia

‘‘A autora tinha cálculos na vesícula biliar e fez a cirurgia para retirada, procedimento comum, por laparoscopia, o que, além de não ser estigmatizante, não enseja incapacidade para o trabalho, tampouco foi demonstrada urgência no procedimento. Vinha sofrendo dores de forma não contínua e realizou a cirurgia indicada para tais situações, mas sem revelar os autos qualquer urgência no procedimento’’, escreveu na sentença.

Desa. Beatriz Renck foi a relatora
Foto: Secom/TRT-4

No segundo grau, a relatora do recurso ordinário da trabalhadora na 6ª Turma do TRT-4, desembargadora Beatriz Rencke, reformou totalmente a sentença, por entender que os documentos anexados aos autos dão suporte à principal tese da autora – a de que ela foi demitida doente.

A julgadora observou que o fato de a reclamante ter comparecido ao trabalho no dia 14 de janeiro não afasta a noção de que já estivesse com desconforto físico, sendo certo que o exame ecográfico foi realizado ainda no início da tarde e o encaminhamento cirúrgico também. Embora se trate de procedimento eletivo, disse que a doença já estava presente antes mesmo do desligamento, do qual somente teve ciência a reclamante em 15 de janeiro de 2020. Ou seja, não há como conceber que a realização da cirurgia tivesse por finalidade impedir a dispensa.

Hospital não primou por preservar a saúde de sua funcionária

‘‘Destaco, ainda, que a autora fez todo o tratamento da moléstia junto ao quadro clínico do reclamado, o que importa reconhecer que este deveria ter conhecimento de seu estado de saúde, bem como da existência de procedimento cirúrgico agendado para o dia posterior àquele eleito para o desligamento da trabalhadora, o que leva à presunção de que a atitude do réu não primou por preservar a saúde física e mental da trabalhadora’’, cravou no acórdão a desembargadora-relatora.

A magistrada ainda considerou que o contrato de trabalho entre as partes perdurou por mais de 25 anos, sem qualquer intercorrência. Assim, nesse quadro, não seria razoável o desligamento da prática de laboratório sem qualquer aviso ou justificativa.

‘‘Ainda que não tenha a autora direito à estabilidade legal, ou mesmo à indenização prevista na Lei 9.029/95 – porque a doença que a acometia não se qualifica como estigmatizante –, faz ela jus à indenização por dano moral diante da angústia, dor e incerteza a que foi submetida por conta dos atos praticados pelo empregador, que abusou do direito de rescindir imotivadamente o contrato de trabalho’’, finalizou.

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ATOrd 0020302-95.2020.5.04.0007 (Porto Alegre)

 

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