GROSSERIAS
Justiça do trabalho reverte justa causa de técnico de enfermagem punido duplamente

CENTRAL em Lajeado
Reprodução Facebook

Ainda que comprovados os fatos que motivaram a dispensa do trabalhador por justa causa, a dupla punição invalida a causa extintiva do contrato de trabalho alegada pela empregadora, porquanto inadmissível a dupla penalização por comportamento pretérito do empregado.

Esta é a ementa do acordão da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) que reverteu a despedida por justa causa aplicada a um técnico de enfermagem pela CENTRAL – Centro Regional de Tratamento e Recuperação de Alcoolismo, sediada em Lajeado (RS).

Tal como o juízo de origem, os desembargadores entenderam que houve duplicidade da punição pelo mesmo ato. Na data em que o empregado recebeu uma advertência, ele também foi despedido com fundamento no artigo 482 da CLT (mau procedimento ou incontinência de conduta e desídia). A decisão confirmou, por unanimidade, a sentença da juíza Carolina Hostyn Gralha, da 2ª Vara do Trabalho de Lajeado.

Avaliações negativas

Com um vínculo de emprego superior a nove anos, conforme comprovado no processo, o técnico passou a receber avaliações negativas por parte dos pacientes. Desde 2019, foram três advertências baseadas nos relatos dos internos com reclamações sobre a atuação do profissional.

O técnico, por sua vez, afirmou ter um ‘‘histórico de comportamento exemplar’’ e requereu a anulação da despedida por justa causa, com o pagamento de indenização por danos morais.

Provada a advertência na mesma data da despedida, ambas motivadas pela denúncia documentada de ‘‘grosserias e má educação’’, a juíza Carolina destacou que foi evidente a duplicidade da punição. A magistrada converteu a despedida em imotivada e determinou o pagamento das parcelas decorrentes de uma rescisão contratual sem justa causa.

Confirmação da sentença

As partes recorreram ao Tribunal. A empresa, em relação à reversão da justa causa; e o empregado, para obter o pagamento da indenização por danos morais. Ambos os recursos não foram providos pelo colegiado.

A relatora do acórdão, desembargadora Denise Pacheco, manteve o entendimento da primeira instância: ‘‘Há uma dupla punição pelo mesmo ato faltoso, o que fere a singularidade da punição, criando óbice para a validade da justa causa aplicada pelo empregador. Como o reclamante já havia sido advertido naquele dia, não poderia o reclamado aplicar-lhe nova penalidade pelo mesmo ato faltoso’’, concluiu a relatora.

A decisão ainda mencionou os requisitos para uma despedida por justa causa: nexo causal entre a falta e a penalidade; adequação entre a falta e a pena aplicada; proporcionalidade entre elas; imediaticidade da punição; ausência de perdão tácito; singularidade da punição (nom bis in idem); inalteração da punição; ausência de discriminação; e o caráter pedagógico do exercício do poder disciplinar, com a correspondente gradação das penas.

Participaram do julgamento os desembargadores Emílio Papaléo Zin e Wilson Carvalho Dias. As partes não apresentaram recurso. Com informações de Sâmia de Christo Garcia (Secom/TRT-4).

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

ATOrd 0020251-49.2022.5.04.0772 (Lajeado-RS)

DESCARTE DE PESSOAS
Hospital público vai pagar indenização de R$ 50 mil por dispensar trabalhadora doente

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Secom/TRT-RS

A dispensa de trabalhador em condição de fragilidade física contraria o princípio da função social da propriedade, estabelecido na Constituição Federal como informador da ordem econômica brasileira (artigos 170, incisos II e III), e viola todas as leis e tratados que se batem pela proteção da dignidade humana, presumindo-se discriminatória.

Esta, em síntese, foi a conclusão do desembargador Marcelo José Ferlin D’Ambroso, integrante da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul), ao manter sentença que condenou o Hospital Nossa Senhora da Conceição, de Porto Alegre, a pagar dano moral a uma trabalhadora dispensada enquanto recebia auxílio-doença previdenciário. O desembargador-relator considerou a conduta patronal tão grave que aumentou o valor da reparação de R$ 5 mil para R$ 50 mil.

‘‘Com efeito, a prática da [parte] demandada de despedir uma trabalhadora doente, justamente no momento em que mais necessitava de proteção e apoio, indica uma conduta de descarte de pessoas, incompatível com a estrutura de proteção social de um Estado Democrático de Direito e com as obrigações das empresas em relação aos Direitos Humanos. Lucro não é tudo’’, expressou no longo e bem-fundamentado acórdão.

Contrato com prazo determinado e acidente

A reclamante foi contratada no dia 1º de setembro de 2020 mediante contrato de trabalho por prazo determinado de 180 dias. Em 1º de fevereiro de 2021, ela sofreu um pequeno acidente, vindo a fraturar um dos dedos do pé. Como consequência, foi afastada foi trabalho até 10 de março de 2021.

Durante o afastamento previdenciário, a reclamante foi avisada pela sua coordenadora que os contratos de trabalho daquele período seriam renovados. No entanto, logo em seguida, em nova mensagem por WhatsApp, a coordenadora informou que o seu contrato não seria mais prorrogado, ‘‘porque estava no INSS’’. Portanto, em 27 de fevereiro de 2021, estaria sendo feita a rescisão contratual – o que efetivamente foi feito pelo setor de recursos humanos (RH) do Hospital.

A empresa – sociedade anônima controlada pelo Ministério da Saúde – alegou que a extinção da relação se deu por término do contrato de trabalho por prazo indeterminado. Assim, ante a inexistência de qualquer irregularidade no ato da resilição contratual, não se poderia falar de dispensa discriminatória nem dano moral indenizável – que atinge a esfera íntima do trabalhador, causando dor e ferindo os seus valores.

Dispensa discriminatória

O juízo da 23ª Vara do Trabalho de Porto Alegre concluiu que, embora não se trate de doença grave ou que cause estigma ou preconceito, como disciplina a Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), houve dispensa discriminatória. Para a juíza do trabalho Roberta Testani, os elementos probatórios dos autos evidenciam, ‘‘de forma inequívoca’’, que a reclamante somente não teve o seu contrato de trabalho prorrogado porque estava em gozo de benefício previdenciário.

Como a defesa do empregador não impugnou a prova dos autos, a juíza disse que ficou caracterizada a prática discriminatória a que alude o artigo 1º da Lei 9.029/1995, que produz dano moral presumido diante do ilícito cometido.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

ATSum 0020094-58.2023.5.04.0023 (Porto Alegre)

 

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br

FACES DA CIDADANIA
O consumidor cidadão e o impacto dos precedentes do STJ nas relações de consumo

A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez, inscreveu a defesa do consumidor entre os direitos fundamentais. Até então, o Brasil não contava com uma proteção jurídica sistematizada para o consumidor em razão de sua condição de sujeito vulnerável do mercado.

Ao colocar ‘‘a defesa do consumidor’’ como obrigação do estado, prevista no rol de direitos e garantias fundamentais (artigo 5º, inciso XXXII), o texto constitucional a tornou cláusula pétrea, ou seja, não pode ser eliminada nem alterada por emenda. Mais adiante, o texto afirma que a ordem econômica, entre outros princípios, deve observar a defesa do consumidor. Por fim, nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), ficou estabelecido que o Congresso Nacional, dentro de 120 dias da promulgação da Constituição, teria de elaborar o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Embora fora do prazo, a Lei 8.078 foi promulgada em 11 de setembro de 1990, entrando em vigor seis meses depois. O CDC colocou o Brasil numa posição de vanguarda na defesa dos direitos do consumidor e se tornou um importante marco do fortalecimento da cidadania.

Em seu artigo 6°, o código passou a assegurar a proteção da vida e da segurança contra os riscos de produtos e serviços, com efetiva prevenção e reparação, inclusive invertendo-se o ônus da prova pelo juiz; a informação adequada; a proibição da publicidade enganosa e abusiva; a modificação das cláusulas contratuais abusivas, ou sua revisão quando fatos supervenientes as tornarem excessivamente onerosas; o acesso à Justiça; a participação na formulação de políticas de consumo e a educação para o consumo; além da exigência de adequação e eficiência nos serviços públicos.

A proteção do consumidor é uma das múltiplas faces do exercício da cidadania

Código de Defesa do Consumidor, direitos fundamentais, relações de consumo, precedentes do STJ, jurisprudência comentada, série Faces da CidadaniaA série especial Faces da Cidadania mostra como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao interpretar e aplicar as normas consumeristas, vem atuando para garantir o pleno exercício dos direitos do cidadão também nesse campo.

Nas mais de três décadas que se seguiram à promulgação da Constituição e do CDC, o STJ produziu ampla jurisprudência sobre a matéria, com mais de 20 súmulas relacionadas ao direito do consumidor, dentre as quais se destacam:

*Súmula 608 – ‘‘Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão’’.

*Súmula 601“O Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviços públicos’’.

*Súmula 563 – ‘‘O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às entidades abertas de previdência complementar, não incidindo nos contratos previdenciários celebrados com entidades fechadas’’.

*Súmula 359 – ‘‘Cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição’’.

*Súmula 297 – ‘‘O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras’’.

Para a ministra Nancy Andrighi, o consumo cada vez maior de bens, serviços e informações passou a ser um critério de aferição da cidadania. A condição de consumidor, disse, é um importante papel que assumem os cidadãos na sociedade contemporânea, ‘‘sendo fácil perceber que o direito do consumidor está intimamente relacionado à tutela da cidadania’’.

Ministra Nancy Andrighi, Foto: Agência CNJ

Complemento ao microssistema de processos coletivos

Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e membro da comissão que elaborou o anteprojeto do CDC, o professor e advogado Kazuo Watanabe destacou que o Código é reconhecido por seu conteúdo principiológico; isto é, ‘‘como estatuto que contém princípios tutelares abrangentes, e não normas específicas voltadas a fatos típicos’’.

Na sua avaliação, a lei vem cumprindo adequadamente a função de proteger os consumidores, ainda que, em razão do tempo decorrido, tenha precisado de atualizações – como as que disciplinaram o comércio eletrônico e trataram do superendividamento (Lei 14.181/2021).

O professor também ressaltou que o CDC complementou o sistema brasileiro de processos coletivos – o qual, até então, contava apenas com a ação popular e a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), que tutela interesses difusos. ‘‘O Código de Defesa do Consumidor, além de dispor sobre os aspectos faltantes na lei de 1985, como a disciplina da competência, da coisa julgada, das espécies de provimentos, criou e disciplinou mais duas espécies de ação coletiva: a que tutela os interesses coletivos stricto sensu e a que tutela os interesses individuais homogêneos’’, explicou.

Cidadania instrumental do consumidor

Para Dennis Verbicaro, procurador do Estado do Pará, doutor e professor de direito do consumidor, a identidade coletiva como consumidor permite a ocupação de mais espaços políticos de deliberação, o que influi diretamente no aprimoramento dos deveres éticos do fornecedor. ‘‘É o que chamo de cidadania instrumental do consumidor; ou seja, a cidadania emerge da identidade política comum de todos nós, que nos impõe o dever de participar desse diálogo com os agentes econômicos do mercado, sob a mediação do estado e em prol da harmonia das relações de consumo’’, declarou.

Segundo o procurador, essa nova perspectiva de grupo ou de coletividade de consumidores tem uma capacidade muito maior de transformar a realidade: ‘‘Essa rede solidária de influência e articulação política impõe aos empresários a mudança de comportamento, seja voluntariamente – sob a forma de marketing de aproximação –, seja coercitivamente –, pela sujeição jurídica às normas administrativas, civis e penais de proteção ao consumidor, cuja exigibilidade é garantida pela atenta e oportuna atuação cívica da sociedade e pela fiscalização diligente do estado’’.

Quem pode ser considerado consumidor

Estendendo a ideia de consumidor para muito além do adquirente de bens ou serviços, o artigo 17 do CDC prevê a figura do consumidor por equiparação (bystander): também goza da proteção da lei aquele que, mesmo sem participar diretamente da relação de consumo, sofre as consequências do acidente de consumo, decorrente de defeito exterior que ultrapassa o objeto do produto ou do serviço e põe em risco sua segurança física ou psíquica.

‘‘Na hipótese de danos individuais decorrentes do exercício de atividade empresarial destinada à fabricação de produtos ou à prestação de serviços, é possível, em virtude da caracterização do acidente de consumo, o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação, o que atrai a incidência das disposições do CDC’’, disse a ministra Nancy Andrighi.

A ministra relatou o REsp 2.018.386, no qual a Segunda Seção do STJ estabeleceu que as vítimas de supostos danos decorrentes da exploração de uma usina hidrelétrica podem ser consideradas consumidoras por equiparação. Elas alegaram que a produção de energia elétrica no complexo de Pedra do Cavalo (BA) causou danos materiais e morais em razão do impacto na sua atividade pesqueira e de mariscagem.

O colegiado, no julgamento do CC 143.204, em hipótese envolvendo derramamento de óleo, também considerou que os pescadores artesanais prejudicados eram vítimas de acidente de consumo, motivo pelo qual estaria caracterizada a figura do consumidor por equiparação e justificada a incidência do CDC.

Limites da publicidade no CDC

Uma das decisões mais impactantes do STJ na interpretação do CDC foi o primeiro precedente em que se considerou abusiva a publicidade de alimentos dirigida direta ou indiretamente ao público infantil. O julgamento ocorreu em 2016 na Segunda Turma (REsp 1.558.086).

Ministro Humberto Martins
Foto: Imprensa/STJ

Para o relator do recurso, ministro Humberto Martins, a decisão sobre compra e consumo de gêneros alimentícios, sobretudo em época de crise de obesidade, deve caber aos pais, não às crianças. ‘‘Daí a ilegalidade, por abusivas, de campanhas publicitárias de fundo comercial que utilizem ou manipulem o universo lúdico infantil (artigo 37, parágrafo 2º, do CDC)’’, afirmou à época.

Da mesma forma, o tribunal tem vários outros entendimentos sobre os limites da publicidade diante dos direitos do consumidor – entre eles, o que considerou enganosa, capaz de induzir em erro o consumidor, a mensagem que consta em letras minúsculas nas informações contratuais (REsp 1.599.423).

Responsabilidade solidária da cadeia de produção

O CDC também ampliou o campo de incidência da responsabilidade, que passou a alcançar não apenas o fornecedor diretamente ligado ao evento danoso, mas toda a cadeia produtiva envolvida na atividade de risco.

A Quarta Turma, no REsp 1.358.513, relatado pelo ministro Luís Felipe Salomão, decidiu que uma empresa engarrafadora de gás de cozinha e uma distribuidora – revendedora exclusiva da primeira – eram responsáveis solidárias por atropelamento ocorrido durante a entrega do produto, que culminou na morte de um menino de quatro anos, em 2008. A criança andava de bicicleta quando foi atingida pelo caminhão de entrega, no momento em que o motorista realizava manobra em marcha à ré.

Conforme o relator, o CDC estabelece expressamente, no artigo 34, que o fornecedor de produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos. ‘‘Ou seja, estabelece a existência de responsabilidade solidária de quaisquer dos integrantes da cadeia de fornecimento, que venham a dela se beneficiar, pelo descumprimento dos deveres de boa-fé, transparência, informação e confiança, independentemente, inclusive, de vínculo trabalhista ou de subordinação’’, afirmou Salomão na decisão.

O superendividamento na mira das instituições

De acordo com o ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido em abril de 2023), o superendividamento se tornou uma grande preocupação do direito do consumidor em todo o mundo, devido às facilidades de acesso ao crédito.

Ministro Sanseverino
Foto: Imprensa/STJ

Ele foi o relator do REsp 1.584.501, no qual a Terceira Turma analisou se o desconto de empréstimo consignado poderia alcançar quase o valor total do salário do devedor. Por reconhecer que tal situação trazia risco à subsistência do consumidor, o colegiado limitou a 30% os descontos na conta em que ele recebia seus rendimentos.

A decisão da Terceira Turma foi tomada quando ainda tramitava no Congresso o projeto que viria a se transformar na Lei 14.181/2021, a chamada Lei do Superendividamento, que disciplina o crédito ao consumidor. Mesmo reconhecendo que as relações contratuais são regidas pelo princípio da autonomia privada, Sanseverino ponderou que esse princípio se submete a outros, como o da dignidade da pessoa humana.

O problema do superendividamento do consumidor tem recebido atenção especial do Poder Judiciário. Em agosto de 2022, foi lançada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a Cartilha sobre o Tratamento do Superendividamento do Consumidor, elaborada por um grupo de especialistas que teve o ministro do STJ Marco Buzzi como coordenador.

Em novembro do mesmo ano, o STJ promoveu o seminário O Tratamento do Consumidor Superendividado à Luz da Lei 14.181/2021: da trajetória legislativa à sua efetivaçãoNa opinião do ministro Buzzi, coordenador-geral do evento, o controle do superendividamento exige não apenas a atuação do Judiciário, mas um conjunto de ações a serem desempenhadas por vários segmentos sociais e instituições em favor de uma necessária mudança de mentalidade.

Relação entre o direito do consumidor e a proteção de crédito

A relação entre direito do consumidor e proteção de crédito é uma questão frequente nos processos que chegam ao STJ. Em 2009, ao julgar os Temas 40 e 41 dos recursos repetitivos (REsp 1.062.336), a Segunda Seção discutiu a possibilidade de indenização por danos morais diante da falta da comunicação prévia ao consumidor sobre a inscrição de seu nome em cadastros restritivos de crédito – exigência do parágrafo 2º do artigo 43 do CDC –, nos casos em que exista inscrição anterior feita regularmente. O julgamento levou à edição da Súmula 385.

A corte entendeu que o dano moral é configurado quando a entidade de proteção ao crédito aponta como inadimplente alguém que efetivamente não o é. Quando a anotação é irregular, mas o consumidor tem contra si alguma inscrição legítima, não se verifica o direito à indenização, mas apenas ao cancelamento.

Recentemente, no julgamento do REsp 2.056.285, a Terceira Turma estabeleceu que a notificação do consumidor sobre a inscrição de seu nome em cadastro restritivo de crédito exige o envio de correspondência ao seu endereço, sendo vedada a notificação exclusiva por e-mail ou mensagem de texto de celular (SMS). Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

PATRIMÔNIO PÚBLICO
Pavimentadora vai pagar R$ 9 milhões por extrair basalto de forma ilegal no RS

Divulgação Secos/JFRS

A 3ª Vara Federal de Santa Maria (RS) condenou uma empresa de terraplanagem e pavimentações da cidade a pagar mais de R$ 9 milhões à União por extração ilícita de recursos minerais. A sentença, publicada no dia 19 de dezembro, é do juiz Rafael Tadeu Rocha da Silva.

A União ingressou com a ação civil pública (ACP) narrando que a empresa extraiu 360.877 toneladas de basalto no município de Santa Maria sem deter autorização para isso. Afirmou que tal atividade causou prejuízo ao patrimônio público e solicitou o ressarcimento do valor do dano.

Dupla penalização

Em sua defesa, a empresa alegou a violação da Convenção Americana de Direitos Humanos, em razão de dupla punição para uma única conduta, pois celebrou acordo de suspensão condicional do processo penal. Apresentou prejudicial de prescrição, requerendo a improcedência da ação.

Ao analisar o caso, o magistrado pontuou que tanto na proposta de acordo de não persecução penal como na aceitação do benefício da suspensão condicional da ação criminal, nada foi estabelecido quanto ao ressarcimento à União pela extração ilícita. Ele destacou que, ‘‘como as responsabilidades de natureza penal, administrativa e civil são independentes entre si, não configura bis in idem a punição em cada uma dessas esferas pelo mesmo fato imputado ao agente’’.

Propriedade da União

O juiz ainda ressaltou que os recursos minerais são de propriedade da União, sendo que os particulares interessados em sua exploração devem submeter-se aos trâmites legais dos regimes de autorização e de concessão, nos termos do Código Nacional de Mineração, com subsequente recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) à União.

O magistrado sublinhou ainda que a ‘‘exploração irregular, sem licenciamento do órgão mineral ou do órgão ambiental, justifica o acionamento do agente administrativa e judicialmente para o ressarcimento financeiro da União e também para garantir a reparação ambiental’’. Analisando as provas apresentadas na ação, ficou comprovada a atividade ilícita.

Em relação à indenização devida, Silva acolheu o entendimento de que a extração do minério deve corresponder ao valor de mercado e o custo operacional deve ser suportado integralmente pela empresa, em razão do risco assumido por sua conduta ilícita. Ele julgou procedente a ação, condenando a ré a ressarcir R$ 9.021.925,00, que deverão ser corrigidos. Cabe recurso da decisão ao TRF-4. Com informações da Secretaria de Comunicação Social da Justiça Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul (Secos/JFRS).

CONCEITO DE FATURAMENTO
Créditos de IPI a exportadoras não integram base de cálculo de PIS/Cofins, decide STF

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os créditos presumidos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), incentivos fiscais concedidos às empresas exportadoras, não compõem a base de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição da Seguridade Social (Cofins).

O crédito presumido de IPI é um benefício fiscal concedido como forma de ressarcimento pelas contribuições devidas sobre matéria-prima e insumos adquiridos internamente, com o intuito de incentivar as exportações.

Incentivo

O Tribunal acompanhou o voto do ministro Luís Roberto Barroso (relator) no sentido de que os créditos são auxílios financeiros prestados pelo estado às empresas exportadoras, a fim de desonerar o setor. Por não constituírem receita decorrente da venda de bens nas operações ou da prestação de serviços em geral, eles não se enquadram no conceito de faturamento, sobre o qual incidem as contribuições sociais, de acordo com a Lei 9.718/1998.

Caso

A matéria foi objeto do Recurso Extraordinário (RE) 593544, com repercussão geral (Tema 504), julgado na sessão virtual encerrada em 18/12. A União questionava a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) de que os créditos recebidos por uma empresa de equipamentos agrícolas, decorrentes da aquisição no mercado interno de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem, quando utilizados na elaboração de produtos destinados à exportação, não constituem renda tributável pelo PIS e Cofins. Por unanimidade, no entanto, o recurso foi desprovido.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: ‘‘Os créditos presumidos de IPI, instituídos pela Lei nº 9.363/1996, não integram a base de cálculo da contribuição para o PIS e da Cofins, sob a sistemática de apuração cumulativa (Lei nº 9.718/1998), pois não se amoldam ao conceito constitucional de faturamento’’. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

RE 593544