DISCRIMINAÇÃO
Construtora pagará dano moral por se omitir em perseguição religiosa contra servente

Reprodução Site TRT-23

Após reconhecer que um empregado umbandista sofreu discriminação religiosa no ambiente de trabalho, a Justiça do Trabalho mato-grossense condenou a construtora Egelte Engenharia Ltda. a pagar-lhe indenização por danos morais no valor de R$ 5 mil. A decisão proferida pela Vara do Trabalho de Diamantino (MT) foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso da 23ª Região (TRT-23, Mato Grosso), ao concluir que a empresa se mostrou negligente diante dos constrangimentos sofridos pelo trabalhador.

Contratado como servente pela construtora responsável por obras do parque industrial de uma usina em Deciolândia, no médio norte mato-grossense, o trabalhador relatou que foi alvo de comentários discriminatórios dos colegas devido à sua religião, a Umbanda. Dentre os vários comentários desrespeitosos, ouviu que era ‘‘macumbeiro’’ e que fazia ‘‘feitiços’’ – tanto no local de serviço como no alojamento dos trabalhadores.

Chacotas no canteiro de obras

O trabalhador relatou que as chacotas se intensificaram após um episódio envolvendo um dos encarregados da obra, seu chefe imediato. O incidente se deu quando o servente preparava um xarope de mel, e seus colegas começaram a dizer que ele estava fazendo ‘‘mel macumbado’’, momento em que o encarregado fez um comentário depreciativo sobre a religião do trabalhador. Este, de pronto, respondeu à provocação.

O episódio, conforme o trabalhador, chegou ao conhecimento de outro encarregado, que perguntou sobre a religião do servente, momento em que ele contou o que vinha passando na empresa. Este encarregado responde que não era ‘‘pra esquentar’’; peão de obra é assim mesmo’’. Na semana seguinte ao incidente com o chefe imediato, o reclamante foi dispensado.

Acionada na Justiça, a empresa se defendeu. Garantiu que, além de não impedir ninguém de professar a própria fé, desconhecia as perseguições, já que o servente não informou a situação para nenhum responsável ou chefe.

Responsabilidade do empregador

Entretanto, sentença da Vara de Diamantino reconheceu a afronta ao direito fundamental de liberdade do trabalhador professar sua fé e crença e a responsabilidade da empresa pelo ocorrido. Afinal, é obrigação do empregador monitorar o ambiente de trabalho, para afastar situações que possam afetar a dignidade dos empregados, e também manter políticas de prevenção de assédio moral ou de práticas discriminatórias.

A condenação apontou ainda ser inaceitável que o preconceito contra a crença do trabalhador tenha sido tratada como mera brincadeira. ‘‘O silêncio implica consentir com atos abusivos no ambiente de trabalho, que deveria ser constantemente medido e avaliado, a fim de certificar que os trabalhadores estão expostos a um ambiente salubre e digno’’, registrou a sentença.

Desembargador Tarcísio Valente
Reprodução TRT-23

O mesmo entendimento foi partilhado pelos desembargadores da 1ª Turma do TRT-MT, ao julgarem recurso ordinário apresentado pela construtora. Conforme destacou o relator, desembargador Tarcísio Valente, o meio ambiente do trabalho saudável é direito de todos os empregados e prestadores de serviço, conforme estabelece a Constituição e convenções internacionais ratificadas pelo Brasil.

‘‘O alcance de tal garantia obtém-se mediante o esforço de todos os envolvidos na cadeia produtiva’’, enfatizou o desembargador, cabendo ao empregador treinar e fiscalizar seus empregados para preservar a saúde física e psíquica no ambiente de trabalho.

A 1ª Turma também avaliou que a alegação de desconhecimento não exime a empresa de arcar com as consequências da postura do encarregado, uma vez que o Código Civil estabelece que o empregador é responsável pelos atos de empregados e prepostos que cometeram alguma violação ao direito de outra pessoa. Com base nisso, manteve indenização de R$ 5 mil, fixada na sentença, por considerar o valor proporcional e adequado ao dano sofrido pelo trabalhador. Com informações de Aline Cubas, Secretaria de Comunicação do TRT-23.

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0000129-72.2023.5.23.0021 (Diamantino-MT)

SOCIEDADE MACHISTA
TRT-15 condena Kalunga a indenizar lactante impedida de trocar de turno para amamentar

Com base no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, editado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a 5ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15, Campinas/SP) reconheceu o direito de uma trabalhadora lactante, que rescindiu seu contrato, de forma indireta, por não ter conseguido trocar o turno de trabalho para amamentar o seu filho.

A decisão – que reformou integralmente a sentença da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté (SP) – condenou a empresa Kalunga S. A. a duas indenizações, de danos morais no valor de R$ 15 mil e de estabilidade à gestante.

A trabalhadora relata que, após ter comunicado sobre a gestação aos seus superiores, algumas condições foram alteradas na empresa. Ela narra que antes era permitido aos funcionários deixarem uma garrafa de água debaixo do balcão – o que foi proibido. Para conseguir beber água, tinha que ir ao andar de cima. A mesma situação se quisesse sentar-se: só poderia ser no andar superior ou na praça de alimentação, por se tratar de um shopping. Os acontecimentos fizeram com que a funcionária tivesse crises de ansiedade, tanto que precisou passar por consultas psicológicas.

No final de sua licença, ela optou pela troca de turno, pois seu filho tinha apenas quatro meses de vida e necessitava continuar com as amamentações noturnas. Porém, no seu retorno, quando recebeu a escala de trabalho, o horário da funcionária permanecia no turno da noite. Diante de tal situação, rescindiu de forma indireta seu contrato de trabalho.

Desa. Adriene Sidnei de Moura Davi
Foto: Comunicação Social/TRT-15

Segundo a relatora do recurso, desembargadora Adriene Sidnei de Moura David, ‘‘o caso em análise atrai a aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, considerando a identificação de hipótese de desigualdade estrutural, marcada pela vulnerabilidade da reclamante, que ao retornar do período de licença maternidade viu-se premida pela necessidade de cuidar de seu filho, amamentando-o, inclusive, e, ao mesmo tempo de cumprir jornada de trabalho que abrangia período noturno’’.

Paradigma masculino

A magistrada afirma que é inegável a dificuldade da mãe trabalhadora conciliar a vida laboral com o trabalho de cuidado e amamentação, somada à circunstância de muitas vezes não se ver acolhida no ambiente laboral construído a partir do paradigma masculino.

A desembargadora relata que a empregadora, além de dizer na contestação que a reclamante não comprovou o pedido que alega ter feito para a troca de turno, deixou claro que a política da empresa está longe de atentar aos normativos que preconizam a proteção à maternidade e à infância.

A decisão concluiu que houve pedido da trabalhadora à empresa para a realização de troca de horário de trabalho, ou de turno, após o retorno da licença maternidade. ‘‘As dificuldades que recaem sobre a mulher, mãe de criança que necessita de cuidados próprios do início da vida e lactante, devem ser tratadas sob uma nova ótica a partir do reconhecimento do ainda não superado papel social de cuidado entregue preponderantemente à mulher, em uma sociedade sabidamente patriarcal e machista’’.

O acórdão reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho, condenou a empresa ao pagamento das verbas rescisórias, decorrentes do período de estabilidade gestante, e a indenização por danos morais. A relatora explica que quando a trabalhadora retornou ao trabalho, após o fim da licença maternidade, se viu em situação de desamparo. ‘‘A atitude da reclamada ao obstar o direito da reclamante de realizar a troca de turno evidencia ato discriminatório e apto a gerar indenização por dano moral.’’ Com informações da Comunicação Social do TRT-15.

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ATOrd 0010661-66.2023.5.15.0009 (Taubaté-SP)