DIGNIDADE VIOLADA
Empresa de Campinas (SP) é condenada por proibir auxiliar trans de usar banheiro feminino

Reprodução internet

Negar acesso a banheiro feminino a empregada trans, que apresenta externamente todas as características de mulher, viola direitos de personalidade elencados no artigo 5º da Constituição (intimidade, vida privada, honra e a imagem). Assim, conforme o inciso X, é assegurado o direito à indenização.

Pelo fundamento, a Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a Luxottica Brasil Produtos Óticos e Esportivos Ltda., de Campinas (SP), a pagar R$ 25 mil de indenização a uma auxiliar de almoxarife transgênero, proibida de utilizar o banheiro feminino durante o trabalho. Por unanimidade, o colegiado entendeu que a empresa violou a dignidade da empregada.

Transição

Admitida em outubro de 2008, a auxiliar disse na ação trabalhista que começou a exteriorizar sua identidade feminina em meados de 2011. No ano seguinte, deu início ao ‘‘processo transexualizador’’, que consiste em terapia psicológica e processo clínico de adequação sexual (processo hormonal).

Nesse momento, comunicou à chefia as mudanças e pediu para passar a usar o banheiro feminino. Contudo, só permitiram que ela acessasse o local na parte da noite, e de forma provisória.

Nome social

A empregada disse ainda que foi constrangida ao adotar o nome social. ‘‘Solicitava aos colegas de trabalho e aos supervisores que passassem a me tratar pelo prenome feminino, mas muitos se recusavam, alegando que o crachá ainda continha meu nome de registro civil’’. A situação, confessou, lhe causava imensa dor, pois, apesar de sua aparência e de seu comportamento feminino, era tratada no masculino.

Separação de banheiros

Em contestação, a Luxottica disse que segue a Norma Regulamentadora 24 do Ministério do Trabalho, que prevê instalações sanitárias separadas por sexo.

‘‘Tanto as instalações reservadas ao sexo masculino quanto às destinadas ao sexo feminino cumprem as exigências estabelecidas na norma, constituídas de sanitários individuais, com portas independentes e fechos, garantindo privacidade aos usuários.’’

Registro civil

Quanto ao nome social, a empresa argumentou que a equipe multidisciplinar de gestão de pessoas e recursos humanos havia esclarecido à auxiliar que, de acordo com o artigo 41 da CLT, é obrigação do empregador efetivar o registro de seus empregados, e dele deve constar, entre outras informações, a sua qualificação civil. Assim, não poderia utilizar nome e gênero distinto do registro civil, inclusive nos crachás, por servirem ao controle eletrônico de jornada.

Para a Luxottica, a alteração do crachá somente seria autorizada após a realização da cirurgia de redesignação sexual e ação judicial para alteração do registro civil.

Condições

Ministro Douglas Alencar foi o relator
Foto: Ascom/TRT-RN

A 12ª Vara do Trabalho de Campinas e o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15, Campinas) negaram o pedido de indenização. Para o TRT, a empresa agiu corretamente ao aguardar o fim do processo de redesignação sexual e dos trâmites judiciais para alteração do registro civil, com o uso do nome social como condições para que a empregada pudesse utilizar o banheiro de acordo com a sua identidade sexual.

Saúde mental

No âmbito do TST, ao analisar o recurso de revista (RR) da auxiliar, o relator, ministro Douglas Alencar Rodrigues, disse que o empregador não pode deixar de tomar medidas adequadas para garantir um meio ambiente de trabalho seguro e saudável. Também do ponto de vista da saúde mental, o empregador deve coibur práticas que possam gerar danos de natureza moral ou emocional a seus empregados.

Nome civil x nome social

O ministro lembrou que enquanto o ‘‘nome civil’’ faz parte dos direitos de personalidade (artigo 16 do Código Civil),  o ‘‘nome social’’ é a designação pela qual a pessoa trans se identifica e é socialmente reconhecida. Nesse sentido, lembrou que o artigo 1º, inciso I, do Decreto 8.727/2016, dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas trans no âmbito da administração pública federal.

Além dessa norma, o relator observou a adoção de diversas iniciativas, em termos de políticas públicas e medidas legislativas, voltadas para a proteção desse grupo, com fundamento no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Boa-fé

Para o ministro, a empresa poderia (‘‘e deveria’’) ter evitado situações constrangedoras ou vexatórias à empregada diante de colegas e garantido o respeito à sua integridade moral e psicológica. Esse entendimento se baseia na boa-fé objetiva contratual, da qual decorre o dever de cooperação, colaboração e de cuidado.

Constrangimento

Segundo o relator, a empregada apresentava aspectos estéticos suficientes para validar sua identidade de gênero feminina, pois se identificava como mulher, trajava-se como mulher e se portava como mulher no âmbito da empresa. Nesse contexto, a utilização do nome social era medida necessária para a concretização do seu direito de personalidade, sem causar qualquer ônus ou prejuízo para a empresa. Redação Painel de Riscos com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-11190-88.2015.5.15.0131

PROVA DIGITAL
Geolocalização do celular comprova vínculo de empregada doméstica em Passo Fundo

Arte: TRT-12

As provas digitais, incluindo a coleta de dados de geolocalização, são compatíveis e admissíveis no processo do trabalho, à luz dos artigos 369 e 370 do Código de Processo Civil (CPC) e do artigo 765 da CLT, que concede ampla liberdade ao juízo na direção do processo.

Com isso, o juiz Marcelo Caon Pereira, titular da 3ª Vara do Trabalho de Passo Fundo, reconheceu o vínculo de emprego de uma trabalhadora doméstica, a partir da geolocalização armazenada na conta do Google.

Tomando como base a prova digital, o magistrado determinou o registro do contrato de trabalho entre abril de 2019 e fevereiro de 2023, com o pagamento das verbas trabalhistas e rescisórias devidas. O valor provisório da causa é de R$ 20 mil.

Admitida a prestação do trabalho pelo casal de empregadores, réus na ação reclamatória, a controvérsia se limitava à frequência semanal da empregada. A jornada alegada na peça inicial da ação se estendia de segunda a sexta-feira, enquanto os empregadores defendiam um ou, no máximo, dois dias semanais.

Juiz Marcelo Caon Pereira
Foto: Inácio do Canto/Secom/TRT-4

De acordo com a Lei Complementar nº 150/2015, que dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico, a prestação desse tipo de serviço por até dois dias semanais não caracteriza vínculo de emprego. A jornada por três dias ou mais na semana, por outro lado, o caracteriza.

Ausência de registro de horário

No caso, não houve qualquer registro de horários e nenhuma das partes apresentou testemunhas. Por lei, a ausência de provas levaria ao não reconhecimento do pedido, visto que a empregada não comprovou o que estava alegando. No entanto, ela requereu ao juízo a produção da prova digital.

O magistrado atendeu ao requerimento da trabalhadora. Os relatórios fornecidos pelo Google, mediante extração de dados do celular da empregada, indicaram o comparecimento na residência, durante cinco dias por semana. A margem de erro foi de 20 metros do endereço exato do casal.

O software Veritas, desenvolvido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina), foi utilizado para a filtragem de informações. A ferramenta permite a decodificação dos dados digitais num formato que facilita a interpretação e análise processual.

‘‘Graças à prova digital, a verdade real foi descoberta e um processo que iria ser julgado improcedente, por falta de provas, acabou sendo julgado procedente’’, manifestou o juiz Marcelo Caon Pereira.

Os empregadores recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul). Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

ÁGUAS PASSADAS
Seguradora não precisa cobrir acidente de trabalho anterior à contratação, mesmo sem exigir exames prévios

Foto: Divulgação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que é legítima a recusa de cobertura securitária em acidente de trabalho ocorrido antes da vigência do contrato de seguro de vida em grupo, ainda que a seguradora não tenha exigido exames prévios à contratação.

No julgamento, o colegiado afastou a aplicação da Súmula 609 do STJ por entender que, na hipótese dos autos, a recusa de cobertura securitária não foi baseada na alegação de doença preexistente, mas sim no fato de que o contrato de seguro só teve início após o acidente.

O entendimento foi estabelecido em ação de cobrança e indenização por danos morais ajuizada por um operador de motosserra após acidente de trabalho que lhe causou invalidez permanente. Na Justiça do Trabalho, o profissional fez acordo com a empresa empregadora, Remasa Reflorestadora S.A., que qual se comprometeu a acionar o seguro de vida em grupo.

Ao ser acionada, porém, a Prudential do Brasil Vida em Grupo S.A.,  se recusou a cobrir o sinistro sob a alegação de que o acidente ocorrera antes da vigência da apólice de seguro.

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Pedro França/Agência Senado

Após ter o pedido de indenização negado em primeiro e segundo graus, o autor da ação recorreu ao STJ sob o argumento de que, no momento da contratação do seguro, a seguradora não exigiu a realização de exames médicos, deixando de apresentar contrariedade à adesão do segurado ao contrato de seguro de vida em grupo. Para ele, seria aplicável à controvérsia a Súmula 609 do STJ.

Contrato de seguro de vida está relacionado a evento futuro

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, citou o artigo 757 do Código Civil e a doutrina sobre o tema para explicar que o contrato de seguro de vida está vinculado à garantia de um determinado risco, caracterizado como acontecimento futuro e possível. Para a ministra, a situação do processo diz respeito a acidente de trabalho preexistente à contratação de seguro, que se caracteriza como elemento pretérito e, portanto, não se encaixa na cobertura típica dos seguros de vida em grupo.

Segundo a relatora, o acidente de trabalho anterior à contratação da cobertura securitária é situação diferente da ideia de doença preexistente, o que resulta na inaplicabilidade da Súmula 609 ao caso e da desnecessidade de exigência de exames médicos antes da contratação do seguro.

No caso dos autos, Nancy Andrighi reforçou que o seguro de vida em grupo foi contratado pela empresa empregadora em maio de 2013, ao passo que o acidente de trabalho aconteceu em janeiro do mesmo ano – momento em que, de acordo com a relatora, ainda não havia vínculo obrigacional com a seguradora ou interesse legítimo do contratante.

‘‘Obrigar a seguradora à cobertura de um evento ocorrido anteriormente à celebração do contrato implicaria uma inversão lógica da contratação’’, afirmou a ministra ao negar provimento ao recurso especial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acordão no REsp 2.093.160

REsp 2093160

PROFESSORES
Gilmar Mendes suspende ações sobre inclusão de intervalo de ‘‘recreio’’ na jornada de trabalho

Ministro Gilmar Mendes
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o trâmite de ações na Justiça do Trabalho que envolvam a aplicação da tese de que o intervalo de recreio escolar integra, necessariamente, a jornada de trabalho dos professores; ou seja, faz parte do tempo que se encontram à disposição do empregador.

Em análise preliminar do caso, o ministro considerou que as decisões judiciais que aplicam essa tese, firmada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), violam os princípios da legalidade, da livre iniciativa e da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.

Segundo o decano, o TST compreende que o recreio deve ser computado como tempo efetivo de serviço, pois se trata de curto período de tempo entre aulas que não permite que o trabalhador venha a exercer outra atividade. Ocorre que, segundo Mendes, esse entendimento traz uma presunção absoluta, que não admite prova em contrário, sem que exista previsão legal, ofendendo a autonomia da vontade coletiva de professores e instituições de ensino.

A liminar, a ser submetida a referendo do Plenário do STF, foi deferida pelo ministro relator na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1058, ajuizada pela Associação Brasileira das Mantenedoras de Faculdades (Abrafi).

Jornada de trabalho

O ministro ressaltou que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já traz as hipóteses em que os intervalos de descanso integrarão necessariamente a jornada de trabalho, como no caso dos serviços permanentes de mecanografia, em câmaras frias e nas minas de subsolo, não incluindo os professores.

Ainda de acordo com o relator, dispositivo da CLT, com redação dada pela Lei 13.415/2017, prevê a possibilidade de que o professor possa lecionar em um mesmo estabelecimento por mais de um turno, respeitada a jornada de trabalho semanal, assegurado e não computado o intervalo para refeição.

‘‘Trata-se, assim, de previsão expressa de intervalo intrajornada em relações de trabalho dos professores que não integra a jornada de trabalho’’, apontou.

O decano também frisou que a CLT estabelece, como regra geral, que os intervalos de descanso para repouso ou alimentação nas jornadas acima de seis horas não serão computados na duração do trabalho.

‘‘A princípio, o período denominado recreio se enquadraria, em tese, como espécie de intervalo de descanso intrajornada’’, assinalou na decisão liminar.

Saúde financeira

O ministro também observou que o alto número de processos que trata do assunto justifica a concessão da liminar. A seu ver, as decisões da Justiça do Trabalho podem afetar a saúde econômica e financeira das instituições de ensino e implicar profundas alterações na rotina de trabalho das instituições de ensino.

Na decisão, o ministro Gilmar Mendes também suspendeu os efeitos de decisões que tenham aplicado a tese, até que o STF se manifeste definitivamente sobre a questão. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

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ADPF 1058

GAIVOTA X GAIVOTA
Inpi não pode impedir registro de marca semelhante se consumidores não se confundem  

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Empresas que possuem marcas semelhantes podem conviver harmoniosamente no mercado, desde que o público-alvo seja diferente e que não exista a mínima possibilidade de confusão na cabeça do consumidor.

A conclusão é da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), ao manter sentença que determinou ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) que efetue o registro da marca mista ‘‘Gaivota Imóveis’’, pertencente à empresa com o mesmo nome, do ramo imobiliário, sediada em Balneário Gaivota (SC).

A autarquia federal indeferiu o registro marcário sob o fundamento de que a marca reproduziu ou imitou o registro da marca ‘‘Gaivota’’, pertencente, até então, à Gaivota Corretora de Seguros Ltda, que tem sede em Araras (SP).

Para o Inpi, é irrelevante para a controvérsia judicial o fato de as empresas possuírem sedes em municípios ou estados diferentes, não importando se a proteção conferida pelo registro recaia sobre serviços que são considerados idênticos, semelhantes ou afins. Por isso, defendeu a decisão administrativa que negou o pedido de registro de marca mista à empresa catarinense.

O juízo da 4ª Vara Federal de Criciúma (SC) anulou a decisão da autarquia, por entender que as duas empresas atuam em áreas distintas – a autora da ação anulatória, no ramo imobiliário; e a ré, no mercado de seguros.

Não bastasse isso, do ponto de vista da territorialidade, o julgador advertiu que o indeferimento ao pedido de registro também não se sustenta, pois se trata de empresas sediadas, respectivamente, no sul de Santa Catarina e no interior de São Paulo.

‘‘Concluo, portanto, que não existe semelhança entre as marcas e equivalência sonora capaz de causar confusão e induzir o consumidor a erro, na forma prevista nos incisos V e XIX do art. 124 da Lei n.º 9.279/96 [Lei da Propriedade Industrial]. Assim, diante da possibilidade de convivência entre as marcas, deve ser revista a decisão proferida no processo administrativo nº 912752220’’, decretou na sentença o juiz federal Paulo Vieira Aveline.

O relator que negou a apelação no TRF-4, desembargador Roger Raupp Rios, concordou com o juízo de origem. Ele observou que o sinal marcário, cujo registro pretende a parte autora, ainda apresenta ‘‘necessária distintividade’’ com relação à marca da ré. ‘‘Isso porque, embora haja reprodução da palavra ‘gaivota’, há vinculação a elementos figurativos totalmente diversos’’.

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5005980-09.2020.4.04.7204 (Criciúma-SC)

 

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