EXECUÇÕES FISCAIS
Decisão do STJ sobre seguro garantia traz alívio aos contribuintes

Por Douglas Guilherme Filho

Diamantino Advogados Associados

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu no dia 21 de fevereiro o julgamento do AREsp 2.310.912/MG, que envolvia a possibilidade de liquidação antecipada de seguro garantia em processos de execuções fiscais.

Por 4 votos a 1, a 1ª Turma do STJ enterrou de vez a possibilidade de a Fazenda Nacional exigir a liquidação antecipada do seguro garantia, equilibrando a relação de forças entre Fisco e contribuintes.

Conforme registra o site ConJur, ‘‘o resultado do julgamento representa uma mudança de posição muito importante para o contribuinte. A liquidação antecipada do seguro garantia, até então amplamente admitida pelo Judiciário, tem grande impacto nas contas das empresas’’.

Proferido sob a sistemática dos recursos repetitivos, o entendimento deve ser seguido por todo o Poder Judiciário.

A decisão se mostra de extrema relevância aos contribuintes, na medida que evitará que sejam adotadas medidas coercitivas pela União, notadamente a exigência de que as seguradoras tenham que depositar em juízo o valor do prêmio, sem que haja o desfecho final da discussão judicial.

Na prática

Na prática, obsta a possibilidade de que a seguradora venha propor uma ação de cobrança/regresso em face de contribuinte, de maneira antecipada por ter depositado uma alta quantia em juízo para satisfazer os interesses fazendários, com o objetivo de recuperar o valor do prêmio, a qual, posteriormente, poderá se tornar inexigível, em decorrência do desfecho desfavorável ao ente público nos autos da ação executiva.

O resultado foi precedido de grande apreensão por parte dos contribuintes. O receio era que a Corte formasse posicionamento consolidado para determinar que as seguradoras depositassem em juízo o montante que seria objeto de garantia antes mesmo do trânsito em julgado.

O oferecimento do seguro garantia não tem o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, por não se tratar de uma das hipóteses taxativas previstas no artigo 151 do Código Tributário Nacional (CTN).

Apesar disso, depois da edição da Lei 13.043/2014, tal modalidade passou a constar expressamente no rol de garantias que podem ser oferecidas pelo executado em processos executivos (art. 9º da Lei de Execuções Fiscais).

A mudança legislativa introduzida pela Lei 13.043/2013 não se empenhou em fixar o momento em que a garantia poderia ser executada, via de regra, com trânsito em julgado (como ocorre no caso do depósito judicial).

Além disso, caso os Embargos à Execução Fiscal opostos pelo contribuinte sejam julgados improcedentes, ainda que seja interposto recurso, este não teria efeito suspensivo, permitindo que sejam adotados atos expropriatórios.

Vem daí a discussão se a Fazenda Nacional, poderia ou não, requerer a liquidação antecipada do seguro garantia, o que certamente traria grandes custos aos contribuintes, notadamente pelo fato de que eles estariam sujeitos a arcar com o prêmio que as seguradoras haviam contratados.

Todavia, no curso do julgamento, sobreveio fato de extrema relevância para o desfecho da questão envolvendo as apólices de seguro garantia.

Com o intuito de restabelecer o voto de qualidade em favor do Fisco (aquele que dá ganho de causa à Fazenda Nacional em caso empate em processos administrativos federais que envolvam créditos tributários), com nítido cunho arrecadatório, o Governo Federal se viu obrigado a conceder algumas benesses aos contribuintes. Dentre elas, a vedação à liquidação antecipada do seguro garantia.

Inicialmente, essa possibilidade havia sido vetada pelo presidente Lula, quando promulgou a Lei 14.689/2023. Entretanto, esse veto foi derrubado pelo Congresso, restabelecendo essa garantia ao contribuinte.

Nesse contexto, já na plena vigência da Lei 14.689/2023, o julgamento do AREsp 2.310.912/MG foi retomado. Prevaleceu a divergência inaugurada pelo ministro Gurgel de Faria, acompanhado pelos ministros Benedito Gonçalves, Paulo Sérgio Domingues e Regina Helena Costa, que alterou o seu voto anterior, em favor dos contribuintes.

Douglas Guilherme Filho é coordenador da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

COPROPRIETÁRIOS
Herdeiros respondem solidariamente por dívida condominial, mesmo além do quinhão hereditário

Fachada Condomínio Renoir, em Belo Horizonte

Subsistindo o regime de copropriedade sobre um imóvel após a partilha, por ato voluntário dos coerdeiros que aceitaram a herança, esses sucessores coproprietários respondem solidariamente pelas despesas condominiais, independentemente da expedição do formal de partilha, resguardado o direito de regresso previsto no artigo 283 do Código Civil (CC).

A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), entendendo, também, que, nesse caso, em razão da solidariedade, não se aplica a regra legal que limita a obrigação de cada herdeiro ao valor de seu quinhão hereditário.

Um condomínio edilício em Belo Horizonte ajuizou ação de cobrança contra o espólio de um homem, a viúva meeira e seis filhos do falecido, pedindo que fossem condenados solidariamente a pagar o montante de R$ 4.325,57, uma vez que teriam deixado de quitar as taxas mensais de condomínio relativas ao imóvel do qual todos eram proprietários. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a decisão de primeiro grau que julgou o pedido procedente.

No recurso ao STJ, os herdeiros e a viúva contestaram a responsabilidade solidária, alegando que, após homologada a partilha, cada herdeiro coproprietário somente responderia pela dívida condominial do imóvel na proporção do seu quinhão hereditário, ainda que não expedido o respectivo formal de partilha.

Morte é o fato gerador da posse e da propriedade dos bens herdados

Ministro Marco Aurélio Bellizze foi o relator
Foto: Sergio Amaral/STJ

O relator do recurso no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, afirmou que, com a morte de uma pessoa, é aberta a sucessão, transferindo-se de imediato a posse e a propriedade dos seus bens e direitos aos sucessores, à luz do princípio da saisine previsto no artigo 1.784 do CC.

Segundo o ministro, a responsabilidade pelos débitos do falecido e por aqueles cujo fato gerador ocorra após a abertura da sucessão, mas antes da partilha, recai sobre a massa indivisível da herança, a qual pertence aos sucessores e é administrada pelo inventariante até a homologação da partilha (artigo 1.991 do CC).

Bellizze destacou que, após a partilha, a responsabilidade passa para os herdeiros, na proporção da parte de cada um na herança e limitada ao respectivo quinhão, sendo a expedição do formal de partilha mero procedimento solene destinado à regularização da posse e da propriedade dos bens, além de servir de fundamento à eventual propositura de execução forçada pelo sucessor.

Credor tem direito a exigir de um ou de alguns dos devedores a dívida comum

De outro lado, o ministro ressaltou que, quando a herança inclui imóvel do qual decorram despesas condominiais, deve-se atentar para a natureza propter rem dessas obrigações, o que possibilita ao credor cobrar a dívida de quem quer que seja o proprietário.

De acordo com Bellizze, a solidariedade, nesse caso, resulta da própria lei, na medida em que o artigo 1.345 do CC admite a responsabilização do proprietário atual do imóvel pelas despesas condominiais anteriores à aquisição do bem. Daí decorre a possibilidade de cobrança da integralidade da dívida de quaisquer dos coproprietários, ressalvado o direito de regresso do condômino que pagou toda a dívida contra os demais codevedores, nos termos do artigo 283 do CC.

O ministro, inclusive, apontou que, ao disciplinar a solidariedade passiva, o artigo 275 do CC estabeleceu que o credor tem direito de exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum, e que caso o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.

‘‘Havendo, nesse contexto, solidariedade entre os coproprietários de unidade individualizada pelas despesas condominiais após a partilha, revela-se inaplicável o disposto no artigo 1.792 do CC, segundo o qual o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança’’, concluiu, negando provimento ao recurso especial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 1.994.565

REsp 1994565

REPERCUSSÃO GERAL
STF irá decidir se existe vínculo empregatício entre motoristas e plataformas de aplicativos

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir se existe vínculo empregatício entre ‘‘motoristas de aplicativo’’ e empresa criadora e administradora da plataforma digital. Neste primeiro momento, em deliberação unânime do Plenário Virtual, foi reconhecida que a matéria tem repercussão geral; ou seja, é relevante do ponto de vista social, jurídico e econômico e ultrapassa os interesses das partes envolvidas no processo.

A questão é tratada no Recurso Extraordinário (RE) 1446336 (Tema 1291), apresentado ao STF pela plataforma Uber, que narra existirem mais de 10 mil processos sobre tema tramitando nas diversas instâncias da Justiça trabalhista.

O julgamento de mérito, fase em que o colegiado irá decidir se há ou não vínculo trabalhista, será realizado pelo Plenário em sessão a ser agendada posteriormente. A decisão a ser tomada pelo Tribunal será aplicada aos demais processos semelhantes na Justiça.

Reconhecimento de vínculo

Ministro Edson Fachin foi o relator
Foto: Carlos Moura/SCO/STF

A empresa questiona decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que reconheceu a existência de vínculo empregatício entre uma motorista e a empresa. Para a corte trabalhista, a empresa deve ser considerada uma empresa de transporte e não uma plataforma digital.

O TST considerou que a subordinação fica caracterizada porque o motorista não possui nenhum tipo de controle em relação ao preço das corridas e ao percentual a ser descontado sobre o valor. A autonomia do trabalhador, destaca a decisão, está restrita apenas à escolha de horários e corridas.

Além disso, a empresa estabelece parâmetros para aceitar determinados motoristas e faz unilateralmente o desligamento do motorista, caso ele descumpra alguma norma interna.

Livre iniciativa

No Supremo, a Uber argumenta que a decisão do TST tolhe o direito à livre iniciativa de exercício de atividade econômica e coloca em risco ‘‘um marco revolucionário’’ nos modelos de mobilidade urbana, com potencial de inviabilizar a continuidade de sua atividade.

Relator

Em sua manifestação pelo reconhecimento da repercussão geral, o ministro Edson Fachin (relator) destacou a necessidade de que o STF apresente uma solução uniformizadora para a controvérsia, pois, além de o debate ser um dos mais relevantes na atual conjuntura trabalhista-constitucional, há decisões divergentes sobre o tema, ‘‘o que tem suscitado uma inegável insegurança jurídica’’.

Fachin também destacou o impacto sobre milhares de profissionais e usuários e, por consequência, sobre o panorama econômico, jurídico e social do país. A seu ver, é necessário conciliar os direitos trabalhistas, garantidos pela Constituição Federal, e os interesses econômicos, tanto dos motoristas de aplicativos quanto das empresas. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

RE 1446336

COMODATO
Fornecedor de peças responde objetiva e solidariamente por acidente de trabalho, diz TRT-SP

Des. Ricardo Ballarini foi o relator
Foto: Secom/TRT-2

A degradação do meio ambiente do trabalho, resultante de atividades que prejudicam a saúde, a segurança e o bem-estar dos empregados, caracteriza-se como poluição do meio ambiente laboral e atrai a responsabilidade objetiva de indenizar os danos causados. É o que diz o artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/81 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente), combinado com o artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição.

Amparada neste fundamento jurídico, a 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2, São Paulo) reformou sentença da 71ª Vara do Trabalho de São Paulo para reconhecer e a responsabilidade solidária de três empresas de eletrodomésticos – Whirlpool S.A, Atlas Indústria de Eletrodomésticos Ltda. e Electrolux do Brasil S.A. – pelos danos sofridos por um operador de prensa que trabalhou na MMLBPS Ind. e Com. de Artefatos de Metal Ltda e a Fugiusi Serviços Industriais de Metalurgia, Imp. e Exp. Ltda.

O operário, trabalhando para estas duas empresas de produtos acabados, teve os dedos esmagados em acidente de trabalho, o que deu origem à ação reclamatória. No fim, todas as cinco empresas acabaram respondendo objetiva e solidariamente pelo acidente.

Contrato de natureza comercial

O contrato firmado entre os dois empregadores e as três companhias foi considerado de natureza comercial, razão pela qual essas não podem ser responsabilizadas por parcelas tipicamente trabalhistas, ainda que realizassem acompanhamento, orientação e fiscalização de padrões técnicos dos equipamentos.

No entanto, o fato de as empresas fornecerem itens em comodato aos empregadores sem garantir condições de segurança as torna responsáveis em relação ao acidente de trabalho e suas consequências.

Segundo o desembargador-relator Ricardo Nino Ballarini, os autos demonstram que as máquinas de prensa cedidas não contavam com todos os recursos de segurança e que o profissional não recebeu treinamento específico para operar o equipamento do acidente, utilizado na produção de painéis de fogão.

Para o magistrado, “é de se ressaltar que a segurança e a saúde no ambiente de trabalho constituem direito fundamental do trabalhador, como concreta derivação dos seus direitos relacionados com a promoção e o desenvolvimento de um meio ambiente de trabalho equilibrado e sustentável”.

Com a decisão, todas as cinco empresas envolvidas deverão arcar solidariamente com os valores arbitrados pela sentença, sendo pouco mais de R$ 40 mil de pensão mensal convertida em parcela única, R$ 30 mil em indenização por danos morais e R$ 15 mil por danos estéticos. Redação Painel de Riscos com informações da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TRT-2.

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0000543-17.2014.5.02.0071 (São Paulo)

CDC
Consumidor pode exigir medidas reparatórias após 30 dias do prazo para conserto do produto com defeito

A extrapolação do prazo de 30 dias para conserto de produto com defeito dá ao consumidor o direito de exigir uma das medidas reparatórias previstas no artigo 18, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC): a substituição do bem, a restituição imediata do valor pago ou o abatimento proporcional do preço.

De acordo com a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), caso o consumidor opte pela restituição da quantia paga, o fato de ter permanecido utilizando o produto não afasta a incidência de juros de mora.

O caso julgado diz respeito a um consumidor que, ao longo de sete meses, fez tentativas infrutíferas de solucionar o defeito de um veículo Duster comprado na concessionária Renault Rubi Veículos Ltda, localizada em Itabuna (BA).

Ao acionar a Justiça, o consumidor pediu a restituição do dinheiro que havia pagado. O juízo de primeiro grau negou o pedido, entendendo que o defeito seria causado pelo desgaste natural de uma peça, que acabou substituída em uma das idas à oficina.

Já no segundo grau, com base em laudo pericial que atestou a existência de vício do produto, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) determinou a imediata restituição do valor e o pagamento de indenização por danos morais, com juros e correção monetária.

Divulgação Rubi

No recurso especial (REsp) ao STJ, a Renault do Brasil alegou que o consumidor poderia optar, apenas, por uma das medidas reparatórias do CDC se o produto tivesse se tornado inadequado ao consumo ou tivesse seu valor reduzido. Sustentou também que o acréscimo de juros de mora ao valor restituído representaria enriquecimento ilícito, pois as perdas e danos do consumidor teriam sido compensadas pelo uso do carro.

Consumidor não pode arcar com ineficácia da correção do problema

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que o CDC atribuiu ao fornecedor o dever de zelar pela qualidade de seu produto; se não o cumpre, o Código determina a correção do defeito no prazo máximo de 30 dias.

Para a ministra, esse prazo deve ser contado, sem interrupção ou suspensão, desde a primeira manifestação do vício até seu efetivo reparo, não se renovando a cada vez que o bem é levado ao fornecedor para correção do problema. A partir da extrapolação do prazo de 30 dias, o consumidor passa a ter o direito de recorrer aos mecanismos reparatórios previstos no artigo 18 do CDC.

Nancy Andrighi esclareceu que o uso do produto com defeito durante a tramitação do processo não altera as consequências naturais do descumprimento da obrigação pelo fornecedor. ‘‘Conforme já decidiu esta corte no REsp 1.297.690, não é legítimo esperar que o consumidor tenha que suportar, indefinidamente, os ônus da ineficácia dos meios empregados para a correção do problema apresentado’’, asseverou a ministra.

Ministra Nancy Andrighi, Foto: Agência CNJ

Juros são decorrência do descumprimento da obrigação

Com relação aos juros de mora, a ministra disse que sua função é ressarcir o credor pelo atraso no pagamento da dívida, sendo, portanto, uma consequência do inadimplemento, conforme estabelece o artigo 395 do Código Civil.

Ao citar precedente da Terceira Turma (REsp 2.000.701), Nancy Andrighi confirmou que a opção do consumidor pela restituição da quantia paga nada mais é do que o direito de resolver o contrato em razão do inadimplemento por parte do fornecedor.

‘‘Ou seja, se o fornecedor, interpelado, judicial ou extrajudicialmente, não restitui de forma imediata, pratica ato ilícito relativo, devendo arcar com os juros de mora que lhe são inerentes’’, declarou no voto. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Leia o acórdão no REsp 2.101.225

REsp 2101225