ACORDOS TRABALHISTAS
STJ reconhece que pagamento direto do FGTS foi eficaz, mas assegura à União cobrança de outras parcelas

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1.176), reconheceu a eficácia dos pagamentos a título de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) feitos diretamente ao empregado após a publicação da Lei 9.491/1997, em decorrência de acordos homologados na Justiça do Trabalho. Embora tais pagamentos diretos contrariem a legislação em vigor, o colegiado entendeu que não há como desconsiderar que eles foram amparados em acordos homologados pelo juízo trabalhista.

No mesmo julgamento, a Primeira Seção garantiu à União e à Caixa Econômica Federal (CEF) a possibilidade de cobrarem do empregador todas as parcelas que deveriam ser incorporadas ao Fundo, como multas, correção monetária, juros e contribuições sociais – parcelas que não pertencem ao trabalhador e que ficaram fora do acordo na Justiça do Trabalho.

Com a fixação da tese repetitiva, poderão voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial, no STJ ou na segunda instância, que estavam suspensos à espera da definição do precedente qualificado.

Ministro Teodoro Silva Santos foi o relator
Foto: Rafael Luz/STJ

Acordos são homologados na Justiça por decisão irrecorrível

O ministro Teodoro Silva Santos, relator, explicou que a Lei 8.036/1990, em sua redação original, previa o pagamento de algumas parcelas integrantes do FGTS diretamente ao trabalhador, a exemplo do depósito do mês da rescisão e da indenização de 40% do Fundo, no caso de demissão sem justa causa. No entanto, a Lei 9.9491/1997 alterou o artigo 18 da Lei 8.036/1990 para determinar que todas as quantias devidas pelo empregador fossem depositadas na conta vinculada do empregado.

Segundo o ministro, ainda que a lei dispusesse claramente sobre a necessidade de depósito de todas as parcelas devidas do FGTS na conta vinculada, houve muitos acordos em processos trabalhistas que estabeleceram o pagamento direto para o trabalhador, e tais acordos, muitas vezes, não eram comunicados à CEF, o que levava à proposição de execução fiscal contra o empregador para cobrança do Fundo.

‘‘Embora realizado em termos contrários ao que dispõe a legislação de regência, não se pode desconsiderar que o acordo foi submetido ao crivo do Judiciário’’, afirmou o relator, lembrando que a decisão homologatória do acordo é irrecorrível (artigo 831, parágrafo único, da CLT) e faz coisa julgada material, sujeitando-se apenas à ação rescisória (Súmula 259 do Tribunal Superior do Trabalho), cuja apreciação compete à própria Justiça do Trabalho.

Para ele, não cabe à Justiça Federal nem ao STJ, ‘‘à míngua de competência jurisdicional para tanto’’, no julgamento de embargos à execução fiscal, ação anulatória, ação declaratória da inexistência do débito ou de qualquer outra via processual, adentrar no mérito da decisão homologatória para corrigi-la ou desconsiderá-la e assim reconhecer a ineficácia do pagamento feito em desacordo com a determinação legal.

União e CEF não participaram do acordo trabalhista e não podem ser prejudicadas

O ministro declarou que esse cenário não afasta a obrigatoriedade do pagamento, pelo empregador, das parcelas do FGTS que devem ser incorporadas ao Fundo e que não pertencem ao trabalhador, como multas, correção monetária e juros moratórios, além da contribuição social decorrente da demissão sem justa causa – inclusive porque o titular do crédito (União) e o agente operador do fundo (CEF) não participaram da celebração do acordo na Justiça do Trabalho, não podendo ser prejudicados pelo acerto entre patrão e empregado.

‘‘Destarte, embora não se possa negar, no âmbito da Justiça Federal, a eficácia aos pagamentos homologados pelos magistrados trabalhistas sem prévio corte rescisório do decisum pela própria Justiça especializada, ressalva-se a cobrança das parcelas não alcançadas pelo acordo celebrado e, portanto, não acobertadas pela coisa julgada’’, concluiu o ministro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 2003509

REsp 2004215

REsp 2004806

 

SEM FATO GERADOR
Academia inativa não paga anuidade a conselho profissional, define TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Empresa inativa não paga anuidade a conselho de fiscalização profissional. Afinal, sem atividade, não se pode falar em fato gerador a ensejar a cobrança pelo conselho.

Foi o que definiu, por maioria, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em julgamento de apelação que fulminou execução fiscal movida pelo Conselho Regional de Educação Física da 2ª Região (CREF2 – RS) contra uma pequena academia de esportes e recreação, cobrando anuidades de 2013 a 2020. A empresa está inativa desde 2009 perante a Receita Federal.

No primeiro grau, a 3ª Vara Federal de Santo Ângelo acolheu a exceção de pré-executividade oposta pela ré. A sentença observou que, em se tratando de pessoa jurídica, o fato gerador da obrigatoriedade do registro no conselho profissional é a prestação da atividade ou a natureza do serviço relacionado ao ramo fiscalizado, nos termos do artigo 1º da Lei 6.839/80.

‘‘Desse modo, ainda que a pessoa jurídica permaneça registrada no Conselho Profissional, caso não haja o exercício da atividade, não há anuidade a ser cobrada, pois não há fato gerador que a justifique’’, deduziu, laconicamente, o juiz federal Marcelo Roberto de Oliveira.

No segundo grau, o entendimento não foi diferente. ‘‘Comprovando a executada a sua inatividade durante o período referente às anuidades exequendas, deve ser mantida a sentença que extinguiu a execução fiscal, porque demonstrado que a empresa não exerceu qualquer atividade sujeita à fiscalização do exequente’’, reforçou, no acórdão, a relatora que negou a apelação do Conselho, desembargadora Luciane Amaral Corrêa Münch.

O CREF2 – RS já interpôs recurso especial (REsp), que está em fase de análise de admissibilidade, para tentar reverter a decisão do TRF-4 no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

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5003441-08.2022.4.04.7105 (Santo Ângelo-RS)

 

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AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Justiça do Trabalho pode processar avó que explora mão de obra dos netos menores em sistema de economia familiar

Foto Ilustrativa EBC

O vínculo afetivo familiar não impede o reconhecimento de uma relação de trabalho nem descaracteriza vícios da exploração do trabalho infantil, decidiu a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ao reconhecer a competência da justiça trabalhista para julgar uma ação civil pública (ACP) sobre crianças e adolescentes que trabalhavam nas ruas de Corumbá (MS) a mando da avó.

Crianças vendiam produtos e catavam recicláveis

A ação civil pública foi ajuizada em 2019 pelo Ministério Público do Trabalho (MPT-MS), após a constatação da situação de risco envolvendo as crianças. Na apuração, o Conselho Tutelar de Corumbá informou que acompanhava o caso desde 2016 e que a avó havia dito que assumira os cuidados dos netos porque a mãe costumava tratá-los mal quando estava sob efeito de drogas, agredindo-os e deixando de alimentá-los. Segundo o conselho, a mulher levava as crianças para vender produtos pelas ruas e, à noite, recolhiam recicláveis em eventos noturnos.

Apesar das orientações do Conselho, a situação persistia. No Carnaval de 2019, a equipe do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) encontrou as crianças à noite e, por volta de 1h da manhã, uma delas andava descalça com uma sacola com materiais recicláveis. Dias depois, outra foi vista vendendo plantas. Também foi constatado que uma das crianças tinha mais de 20 faltas na escola num curto período.

Na ação, o MPT pede que a avó seja proibida de utilizar mão de obra infantil em qualquer atividade e que as crianças nem mesmo possam acompanhar um adulto nas ruas.

Em sua defesa, a avó alega que está tomando providências para garantir um desenvolvimento saudável para os netos, mas da sua maneira, como pode, porque não recebe auxílio do pai e da mãe das crianças, e “não mede esforços para cuidar de cinco netos ao mesmo tempo”.

Vara e TRT remeteram o caso à Justiça Comum

Para o juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT-24, Mato Grosso do Sul), não cabe à Justiça do Trabalho julgar o caso, porque, apesar de envolver trabalho, a exploração se dava em regime de economia familiar, sem remuneração. Assim, a via adequada para resolver a questão seria a Justiça Comum, mais especificamente as Varas de Direito de Família ou relacionadas a questões de infância e juventude. Por isso, extinguiram a ação, deixando a critério do MPT levar o caso à Justiça Comum.

No recurso ao TST, o MPT argumentou que o fato de as crianças serem submetidas a essa situação pela avó e não receberam remuneração não descaracteriza o trabalho infantil, uma vez que estão sendo usadas como mão de obra. Para o Ministério Público do Trabalho, a gravidade é ainda maior, porque a avó teria o dever de cuidar das crianças e garantir seu desenvolvimento físico, moral e social adequado.

Relatora define competência da Justiça do Trabalho

A relatora do caso no TST, ministra Liana Chaib, assinalou que o trabalho infantil está inserido no conceito de trabalho em sentido amplo e, portanto, é da competência da Justiça do Trabalho, nos termos do artigo 114, inciso I, da Constituição Federal. Ao mesmo tempo, a Lei Complementar 75/93 atribui ao MPT a competência para ajuizar ação civil pública na Justiça do Trabalho para defender direitos sociais constitucionalmente garantidos, entre eles direitos e interesses de crianças e adolescentes decorrentes das relações de trabalho.

Ministra Liana Chaib
Foto: Pedro França/Agência Senado

Atividades estão entre piores formas de trabalho infantil

Liana Chaib ressaltou que a coleta de materiais recicláveis e a venda de produtos nas ruas fazem parte da Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil descritas no Decreto 6.481/2008, que regulamenta a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). De acordo com a lista, a operação industrial de reciclagem de papel, plástico e metal, geralmente vindos da coleta de lixo, envolve riscos ocupacionais como a exposição a agentes biológicos (bactérias, vírus, fungos e parasitas) e, por consequência, a doenças de pele e respiratórias, viroses, parasitoses e mesmo câncer.

O comércio ambulante, por sua vez, apresenta como riscos ocupacionais a exposição a violência, drogas, assédio sexual e tráfico de pessoas, radiação solar, chuva e frio, acidentes de trânsito e atropelamentos. As repercussões à saúde envolvem ferimentos, dependência química, doenças sexualmente transmissíveis, atividade sexual precoce, gravidez indesejada, queimaduras e câncer de pele, desidratação e doenças respiratórias.

Poder familiar não autoriza exploração de mão de obra

Para a ministra Liana Chaib, o pátrio poder, ou poder familiar, não significa que a família seja dona da criança. ‘‘Ela não pode se valer de sua força de trabalho num regime de economia familiar em detrimento da proteção à infância e ao direito ao não trabalho em atividades sabidamente perigosas, insalubres e inadequadas, que não oferecerem qualquer tipo de aprendizado’’, afirmou.

Ainda segundo a ministra, o poder familiar deve ser exercido em um contexto de responsabilização pelo adequado desenvolvimento da criança. ‘‘Mais do que um domínio ou um direito sobre o corpo e a vida de outrem, o poder familiar se caracteriza como o dever de zelar, cuidar e promover o melhor progresso de um ser humano em formação’’.

A seu ver, é preciso afirmar a competência da Justiça do Trabalho no caso, como forma de proteger as crianças e os adolescentes contra a exploração. Portanto, também cabe à Justiça do Trabalho determinar que a avó não exija a prestação de serviços de seus netos.

Por decisão unânime, o colegiado determinou o retorno do processo à Vara do Trabalho de Corumbá para que examine os pedidos do MPT. Com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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TST-RR-24521-28.2019.5.24.0041