EXECUÇÃO TRABALHISTA
Ar-condicionado não pode ser penhorado porque não é bem supérfluo, diz TRT-RS

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Numa execução de dívida trabalhista, é incabível acolher mandado de penhora sobre o aparelho de ar-condicionado que guarnece a casa do devedor, pois tal equipamento não pode ser considerado ‘‘suntuoso ou supérfluo’’.

A decisão, unânime, é da Seção Especializada em Execução do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul), ao manter despacho que derrubou pedido de penhora no bojo da execução de um processo que se arrasta desde 2007.

Para o relator do agravo de petição (AP) no colegiado, desembargador Carlos Alberto May, a impenhorabilidade prevista no artigo 833, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC), e no artigo 1º, parágrafo único, da Lei 8.009/90 (que protege os bens da família), não deve incidir sobre todos os bens que guarnecem a residência do devedor. A constrição só seria possível se tais bens fossem ‘‘de elevado valor, supérfluos, ou, ainda, existentes em duplicidade’’ – o que não é o caso dos autos.

‘‘Ademais, como bem pontuado pelo juízo de origem, é de conhecimento notório que os valores para instalação/remoção dos aparelhos condicionadores de ar são de monta considerável em relação aos valores dos bens usados, o que não justifica a providência. Assim, nego provimento ao agravo de petição do exequente’’, fulminou o desembargador-relator.

Bem indicado à penhora é ‘‘conforto’’ do devedor

No agravo de petição (AP) dirigido ao TRT-RS, tentando derrubar o despacho que indeferiu o pedido de penhora, o trabalhador argumentou que o ar-condicionado que guarnece a residência do devedor é bem material que excede aquilo que é necessário para o padrão médio de vida. Ou seja, representa um ‘‘conforto’’, que não se sobrepõe ao seu direito, de natureza alimentar – urgente e prioritário.

Citando o disposto no artigo 833, inciso II, do CPC, assegurou que há amparo legal para a penhora do equipamento, ao contrário do que entendeu o juízo da Vara do Trabalho de Santo Ângelo (RS), que derrubou o pedido ‘‘por se tratar de bem de utilidade doméstica’’.

Afirmou que este foi o único bem localizado passível de representar valor econômico para satisfazer, ainda que parcialmente, o crédito exequendo. Assim, a indicação do bem à penhora não pode ser considerada ineficaz, pois surtirá algum efeito prático e, eventualmente, porá fim à execução, evitando a retenção de passaporte ou da carteira nacional de habilitação (CNH) do devedor.

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RTord 02754-2007-741-04-00-0 (Santo Ângelo-RS)

 

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TRABALHO INEXISTENTE
Não há direito a honorários de sucumbência em processo extinto se advogado não atuou

Reprodução internet

Não é possível arbitrar honorários sucumbenciais quando não há nenhuma atuação do advogado da parte vencedora em processo extinto sem resolução de mérito, decidiu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A partir desse entendimento, o colegiado afastou a possibilidade de fixação da verba honorária em favor dos defensores de uma empresa que foi alvo de execução movida pela Caixa Econômica Federal (CEF). Como o banco deixou de complementar as custas iniciais, o processo foi encerrado sem que a defesa precisasse fazer qualquer intervenção.

‘‘Muito embora a regra seja a fixação de honorários sucumbenciais na extinção do processo sem resolução de mérito, impõe-se pontuar que, se os honorários têm por objetivo remunerar a atuação dos advogados, inexistindo qualquer atuação do profissional, não há razão para o arbitramento da verba honorária’’, observou a relatora, ministra Nancy Andrighi.

Após a extinção do processo, a empresa executada recorreu ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) para reivindicar a verba honorária, mas o pedido foi negado. Para a corte local, quando não há atuação de advogado, deve ser afastado o princípio da causalidade em relação aos honorários de sucumbência.

Em recurso especial, a empresa argumentou, com base no artigo 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil (CPC), que os honorários devem ser arbitrados mesmo na hipótese de extinção do processo sem resolução de mérito.

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Imprensa/TSE

Não é razoável remunerar defensor por trabalho que não existiu

Segundo Nancy Andrighi, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios se orienta pelos princípios da sucumbência e da causalidade, mas há ainda um terceiro aspecto ligado à essência do instituto, que é o seu caráter de remuneração da atividade dos advogados.

A relatora disse que os critérios listados no parágrafo 2º do artigo 85 do CPC – entre eles o grau de zelo, o trabalho realizado e o tempo exigido – ‘‘demonstram que os honorários sucumbenciais estão intimamente atrelados à efetiva atuação profissional do causídico na defesa dos interesses de seu cliente’’. Para a ministra, ‘‘não é razoável remunerar trabalho que não existiu’’.

Precedentes do STJ já abordaram questões parecidas

Nancy Andrighi lembrou que a questão do cabimento ou não de condenação em honorários na hipótese de ausência de atuação da defesa já foi analisada sob outros ângulos pelo STJ.

A ministra citou julgados proferidos sob o CPC/1973 que afastam a verba honorária quando ocorre a revelia e o réu vence a causa. No âmbito da Terceira Turma, ela destacou o acórdão do REsp 1.842.356, que examinou especificamente a hipótese de cancelamento da distribuição por falta de complementação das custas judiciais.

No entendimento da relatora, o acórdão recorrido está em consonância com a tese de que a inexistência de atuação do advogado da parte vencedora impede a fixação de honorários sucumbenciais em seu favor. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2091586

CONDUTA DISCRIMINATÓRIA
CVC e franqueada pagarão dano moral por desistirem de recontratar agente de viagens grávida

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) aumentou para R$ 18 mil o valor da indenização a ser paga a uma agente de viagens pela CVC Brasil Operadora e Agência de Viagens S.A. e pela RRBI Tour Viagens Ltda., que desistiram de recontratá-la após ela informar que estava grávida. Para o colegiado, o valor de R$ 6 mil fixado na instância anterior era muito baixo para reparar o dano moral sofrido.

Convite e recusa registrados em mensagens

Na ação trabalhista, a reclamante contou que havia prestado serviços para a RRBI de julho de 2017 a outubro de 2018. Em maio de 2019, recebeu mensagens de WhatsApp da dona da empresa, convidando-a para retornar ao emprego, porque os clientes pediam muito que ela voltasse. Dias depois, ao conversaram pessoalmente, ela informou que estava grávida, e a proprietária passou a dizer que seria necessário levar o fato à franqueadora, CVC Brasil.

Na sequência, ela recebeu um e-mail que dizia que a empresa não havia autorizado a recontratação, e a dona da RRBI, pelo aplicativo de mensagem, perguntou se havia possibilidade de voltarem a conversar após o nascimento do bebê. A troca de mensagens foi apresentada na ação como prova da discriminação.

Condenação

O juízo da Vara do Trabalho de Xanxerê (SC) reconheceu a conduta discriminatória das empresas e condenou-as, solidariamente, a pagar R$ 18,5 mil de indenização. Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12, Santa Catarina) reduziu esse valor para R$ 6 mil, por considerar que a negociação se deu em tom amigável e não teria causado maiores transtornos à profissional, que não chegou a sair do emprego que tinha na época.

Realidade brasileira

O relator do recurso de revista da trabalhadora no TST, ministro Mauricio Godinho Delgado, ressaltou que a Constituição Federal proíbe qualquer prática discriminatória contra a mulher no contexto de trabalho. Mas, ‘‘lamentavelmente, na realidade brasileira’’, ainda há um grau elevado de tolerância à discriminação, incluindo as fases de celebração e término do contrato de trabalho.

Nesses casos, pontuou o julgador, a indenização tem de ser razoável e proporcional à gravidade da conduta, para que esta não fique impune e para desestimular práticas inadequadas aos parâmetros da lei.

A decisão foi unânime.

Posicionamento da CVC 

Embora a gestão do quadro de colaboradores das franquias seja de responsabilidade dos franqueados, por se tratar de empresas distintas, a CVC, como franqueadora, informa ao Painel de Riscos que não compactua com qualquer ato de discriminação ou preconceito. Além disso, ressalta que possui programa especial às suas colaboradoras, Amor de Mãe, para apoio durante a gestação e retorno ao trabalho, com casos inclusive, de contratação e promoção de colaboradoras durante a gestação.

Redação Painel de Riscos com informações da jornalista Lourdes Tavares, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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RR-1227-28.2019.5.12.0025

MANDADO DE SEGURANÇA
Farmácia de manipulação pode comercializar produtos derivados da maconha 

A 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) concedeu mandado de segurança para que uma farmácia de manipulação comercialize produtos derivados da palta da maconha (Cannabis sativa).

O estabelecimento sofreu sanções do Município de São Paulo com base em resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que prevê que produtos de Cannabis devem ser dispensados exclusivamente por farmácias sem manipulação ou drogarias.

Em seu voto, o relator do recurso, desembargador Antonio Celso Aguilar Cortez, destacou que a 10ª Câmara de Direito Público já se manifestou, majoritariamente, no sentido de que ‘‘a Anvisa desbordou do poder regulamentar ao editar a Resolução RDC n. 327/2019, que impede a manipulação de fórmulas magistrais com uso de derivados ou fitofármacos à base de cannabis, porém permite que produtos dessa mesma natureza sejam comercializados pelas farmácias em geral (sem manipulação) e drogarias’’.

O magistrado esclareceu que, pela legislação, tanto as farmácias com manipulação quanto as sem manipulação, ou drogarias, estão autorizadas a realizar as mesmas atividades de comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos.

Dessa forma, segundo o desembargador, a resolução da Anvisa impôs ao estabelecimento indevida desvantagem em relação aos demais, extrapolando o seu poder regulatório e limitando o livre exercício da atividade econômica.

‘‘O poder regulamentar da Anvisa não pode criar obrigação nem restrição não prevista em lei, tampouco impedir a manipulação de medicamentos ou fitoterápicos sem vedação legal expressa’’, concluiu no voto.

Completaram o julgamento os desembargadores Paulo Galizia e José Eduardo Marcondes Machado.

A votação foi unânime. Com informações da Assessoria de Comunicação Social do TJSP.

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1041187-06.2023.8.26.0053 (São Paulo)

TENANT MIX
Shopping pode instalar lojas similares na mesma área, desde que contratos sejam respeitados

​A instalação de lojas do mesmo ramo em um shopping center não configura necessariamente atividade predatória ou ofensa à organização do comércio no local (tenant mix), desde que não haja violação dos contratos firmados com os lojistas.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria de votos, que o Rio Barra  Shopping Center (Rio de Janeiro) não agiu de forma irregular ao permitir a instalação de um restaurante de culinária japonesa em frente a outro já existente.

O conceito de tenant mix (mix de locatários, em tradução livre) se refere a atividade de analisar, organizar e distribuir comércios dentro do shopping. A ideia é que haja dentro do shopping marcas distintas, complementares e harmônicas para que o empreendimento seja atraente, competitivo e rentável.

No caso dos autos, a inauguração do concorrente ocorreu em 2018, quando a previsão contratual de preferência do primeiro restaurante já estava extinta.

‘‘A previsão de preferência apenas temporária não trouxe excessiva desvantagem para o locatário, seja porque a cláusula estava claramente redigida e, portanto, passível de avaliação de risco antes mesmo da instalação do restaurante, seja porque a admissão de outro restaurante do mesmo ramo trouxe aumento no faturamento do recorrido, ainda que se afirme que essa situação não tenha refletido nos lucros’’, destacou o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, autor do voto que prevaleceu no colegiado.

Ministro Villas Bôas Cueva foi o relator
Foto: Gustavo Lima/STJ

Concorrente direto foi autorizado 12 anos após o fim do acordo

O primeiro restaurante e o shopping assinaram contrato de locação que previa a exclusividade na exploração da culinária japonesa por cinco anos, condicionada à consulta sobre possíveis concorrentes. Passados 12 anos do fim do acordo inicial, a administração do shopping autorizou a instalação de outro restaurante do mesmo segmento. A iniciativa levou o primeiro restaurante a ajuizar ação para barrar a abertura do concorrente ou rescindir o contrato.

O juízo de primeiro grau determinou a rescisão do contrato de locação, mas negou os demais pedidos sob a alegação de que não estava prevista a continuidade do direito de preferência por tempo indeterminado. A decisão, entretanto, foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), que apontou violação ao tenant mix e determinou o pagamento de indenização.

Ao STJ, o shopping argumentou que a alteração do tenant mix se ampara nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência. Além disso, negou a prática de atividade predatória, pois a exclusividade para explorar o segmento culinário se limitaria aos 60 meses do contrato inicial.

Alteração do tenant mix não violou a boa-fé objetiva

Villas Bôas Cueva observou que, na relação entre lojistas e o shopping center, devem prevalecer as condições pactuadas nos contratos de locação, salvo se houver desvantagem excessiva para os locatários. Na avaliação do ministro, a previsão temporária de direito de preferência não representou excesso de desvantagem para o locatário, e, na ocasião da instalação do restaurante concorrente, essa prerrogativa já estava extinta havia muito tempo.

‘‘O contrato estipulava claramente até que momento o restaurante poderia contar com o direito de preferência, de modo a planejar suas atividades e adotar estratégias de acordo com esse dado. Do mesmo modo, o shopping aguardou a finalização do prazo para traçar novos delineamentos’’, ressaltou o relator.

O ministro explicou que o tenant mix visa atrair o maior número possível de consumidores e incrementar as vendas. No entanto – prosseguiu –, não é possível garantir que o aumento do número de clientes e das vendas, como ocorreu nesse caso, resultará no incremento dos lucros dos lojistas, o que depende de causas variadas.

Ainda segundo o ministro, diversos centros comerciais surgiram ao redor do shopping com o passar do tempo. Dessa forma, para ele, a alteração do tenant mix não pode ser considerada uma conduta desarrazoada, a ponto de violar a boa-fé objetiva.

‘‘Não há como esperar que o shopping mantenha a mesma organização por 18 anos, mormente se a alteração do tenant mix está prevista contratualmente e é necessário o enfrentamento das novas situações de mercado’’, concluiu Villas Bôas Cueva ao prover o recurso especial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2101659