PRESTADOR DE SERVIÇO
Aplicativo de transporte pode suspender imediatamente por ato grave, mas deve garantir defesa posterior ao motorista

99 Divulgação

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não existe impedimento para que a plataforma de aplicativo de transporte individual suspenda imediatamente a conta de motorista em razão de ato considerado grave, ainda que a empresa deva oferecer a possibilidade de posterior exercício de defesa visando ao recredenciamento do profissional.

Esse foi o entendimento do colegiado ao negar recurso de motorista excluído da plataforma de transporte por aplicativo 99 Tecnologia Ltda. por suposto descumprimento do código de conduta da empresa. De acordo com os autos, o profissional teria encerrado corridas em locais totalmente diferentes daqueles solicitados pelos passageiros, sem qualquer justificativa.

Após ter sua ação julgada improcedente em primeiro e segundo graus, o motorista recorreu ao STJ e argumentou que o rompimento do vínculo entre as partes foi feito de forma abrupta, sem notificação prévia e sem respeito ao direito do contraditório e da ampla defesa.

Mais de 1,5 milhão de brasileiros trabalham por meio de aplicativos

Ministra Nancy Andrighi foi a relatora
Foto: Lucas Pricken/STJ

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial (REsp), explicou que a hipótese dos autos não envolve relação entre a plataforma e o usuário do aplicativo, motivo pelo qual não é aplicável o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Ainda segundo a ministra, até o momento, não foi reconhecida a existência de vínculo empregatício entre os profissionais prestadores de serviços e as plataformas, de modo que a Terceira Turma reconhece essa relação como civil e comercial, prevalecendo a autonomia da vontade e a independência na atuação de cada parte (REsp 2.018.788).

Por outro lado, a relatora lembrou que, atualmente, mais de 1,5 milhão de pessoas trabalham por meio de aplicativos de serviço (dados de 2022 do IBGE), exigindo atenção do Judiciário sobre a possibilidade de um profissional ter sua atividade interrompida por uma decisão sumária, sem ter a chance de se defender ou mesmo saber do que está sendo acusado. Ela também lembrou que, embora as plataformas de transporte individual sejam pessoas jurídicas de Direito Privado, seu objeto social (o transporte) é de interesse público.

Análise automática de dados de prestadores de serviços está sujeita à LGPD

Nancy Andrighi comentou que as análises de perfil realizadas pelas plataformas digitais decorrem, muitas vezes, de decisões automatizadas, tendo em vista que a inteligência artificial (IA) tem ganhado espaço no processamento de dados, inclusive os pessoais.

Nesse sentido, a ministra comentou que o conjunto de informações analisadas no processo de descredenciamento do perfil profissional do motorista de aplicativo se configura como dado pessoal – atraindo, portanto, a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

‘‘Nesses termos, o titular dos dados pessoais, que pode ser o motorista de aplicativo, possui o direito de exigir a revisão de decisões automatizadas que definam seu perfil profissional’’, apontou.

Plataforma pode ser responsabilizada por ato grave praticado por prestadores de serviço

Em relação à notificação prévia do motorista, a relatora destacou que, a depender da situação, a plataforma pode ser responsabilizada por eventuais danos causados ou sofridos por seus usuários, cabendo a ela examinar os riscos que envolvem manter ativo determinado prestador de serviço.

Por isso, para a ministra, sendo o ato cometido pelo motorista suficientemente grave, trazendo riscos ao funcionamento da plataforma ou a seus usuários, não há impedimento para a imediata suspensão do perfil, com possibilidade de posterior exercício de defesa para buscar o recredenciamento.

No caso dos autos, Nancy Andrighi apontou que, após o cometimento do suposto ato grave, o motorista foi informado sobre as razões de sua exclusão da plataforma e pôde, na medida do possível, exercer a sua defesa, ainda que a decisão lhe tenha sido desfavorável.

‘‘Com efeito, não se vislumbra ilegalidade ou abusividade na conduta da recorrida (99 Tecnologia Ltda.) que, a partir de uma análise de alocação de riscos, considerando o dever que possui de zelar pela segurança de seus usuários, e após ouvir a argumentação do recorrente, decidiu que era adequado o descredenciamento permanente do perfil profissional do motorista’’, concluiu a ministra. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2135783

REDIRECIONAMENTO
Ex-dirigente responde por obrigações tributárias exigíveis apenas no período de sua gestão, diz TRF-4

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

O diretor de uma empresa não responde juridicamente por obrigações tributárias não recolhidas se estas foram constituídas no período em que ainda não estava investido no cargo, com poder de gerência. Afinal, o Código Tributário Nacional (CTN) exige contemporaneidade entre o exercício da administração da pessoa jurídica e o momento em que configurado o fato gerador do tributo.

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve sentença que concedeu parcial segurança para afastar a responsabilidade tributária do professor, gestor e empresário Maurício Fontoura Trindade, ex-vice-diretor geral do Instituto Porto Alegre da Igreja Metodista (IPA), por obrigações anteriores a novembro de 2020.

Mandado de segurança

No mandado de segurança impetrado contra ato do delegado da Receita Federal em Porto Alegre, o autor afirmou que o não recolhimento aos cofres públicos do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e das Contribuições Sociais Retidas na Fonte (CSRF) deu-se pela crise econômica.

No entanto, classificou o ato de responsabilização fiscal de ilegal, já que não houve apuração de eventual dolo, fraude ou simulação na sua conduta, nos termos do artigo 3º, parágrafo 3º, da Lei Complementar 187/2021.

Dívidas anteriores à gestão

O juízo da 13ª Vara Federal de Porto Alegre acolheu parcialmente o pedido, por entender que ao autor foi imputada responsabilidade por inadimplemento de tributos anteriores ao seu período de gestão, sob o fundamento de que teria tomado ciência e não efetuado os pagamentos.

‘‘Com efeito, ao que se vê dos autos, o impetrante foi indicado à função de Vice-Diretor Geral em 24/11/2020. Ainda, segundo informou a própria autoridade impetrada, o impetrante foi de fato investido no cargo em 10 de março de 2021, ao passo que lhe está sendo imposto o pagamento de diversos tributos vencidos ao longo de 2020’’, constatou, na sentença, o juiz federal Evandro Ubiratan Paiva da Silveira.

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5059306-65.2021.4.04.7100 (Porto Alegre)

 

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MANDADO DE SEGURANÇA
Gozo de licença médica não impede dispensa por justa causa, decide TST

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (TST) rejeitou o recurso de uma ex-empregada da Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras) em Betim (MG) que, após ser demitida por justa causa durante o afastamento previdenciário, pretendia ser reintegrada imediatamente no emprego.

Segundo o colegiado superior, a garantia provisória de emprego, mesmo decorrente do gozo de licença médica, não impede a rescisão contratual por justa causa.

Dispensa após apuração de irregularidades

A empregada foi dispensada depois que a Petrobras apurou que ela havia apresentado recibos superfaturados de mensalidades escolares ao pedir reembolso de benefício educacional. Segundo a empresa, a demissão se deu a partir de uma apuração rigorosa.

A empregada, então, ajuizou ação trabalhista alegando que, em casos semelhantes, a Petrobras não havia aplicado a mesma penalidade. Pedia, assim, uma antecipação de tutela para ser imediatamente reintegrada, enquanto o processo corria, que foi deferida pelo juízo de primeiro grau.

Contra essa decisão, a Petrobras entrou com um mandado de segurança no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3, Minas Gerais), que manteve a reintegração. Para o TRT, a penalidade não era proporcional à falta cometida e, no momento da dispensa, o contrato de trabalho estava suspenso em razão de licença-saúde.

Licença não impede justa causa

No TST, o entendimento foi outro. Segundo o relator, ministro Amaury Rodrigues, o fato de a trabalhadora estar em licença médica não garante a manutenção do vínculo se ela foi dispensada por justa causa.

Rodrigues lembrou também que a alegada desproporcionalidade entre a falta cometida e a punição exige análise de fatos e provas, o que não se pode fazer em mandado de segurança. No caso, as provas já registradas não são suficientes para confirmar essa conclusão.

O ministro também observou que, ainda que o contrato de trabalho seja suspenso durante o benefício previdenciário, o vínculo permanece íntegro, ‘‘de modo que não há impedimento para a rescisão contratual por justa causa’’. Redação Painel de Riscos com informações de Ricardo Reis, coordenador de Editoria e Imprensa da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do TST.

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0010320-33.2023.5.03.0087 (Betim-MG)

Ag-ROT-0011574-11.2023.5.03.0000

SERVIÇO DEFEITUOSO
Empresa não prova funcionamento do rastreador e é condenada a indenizar por furto de motocicleta

De acordo com o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o fornecedor responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação do dano causado ao consumidor por defeito relativo à prestação do serviço.

Assim, por não comprovar que o aplicativo de rastreamento estava funcionando no momento do furto, a Virtual Rastreamento (Edson José Ramos Junior) foi condenada a pagar R$ 27 mil a um casal que teve a sua motocicleta furtada próximo à Ermida Dom Bosco – capela situada no Lago Sul de Brasília. A decisão é da 1ª Vara Cível de Ceilândia (DF).

Falha no sistema de rastreamento

Os autores da ação narram que firmaram contrato de rastreamento veicular, por meio de telefone, cujo objeto era uma motocicleta. Afirmam que, em fevereiro de 2023, o veículo foi furtado próximo à Ermida Dom Bosco, fato que foi imediatamente comunicado ao réu para que realizasse localização e o bloqueio do bem.

Informam que o réu não teve sucesso em bloquear e localizar a motocicleta e que, por isso, houve falha na prestação do serviço de rastreamento.

Comunicação de furto com atraso

Na defesa, o réu argumenta que recebeu o comunicado do furto quase duas horas após de ocorrido o evento e que esse tempo foi suficiente para a atuação dos bandidos. Conta que, em contato com a polícia, foi informado de que a motocicleta foi para a região do Complexo Penitenciário da Papuda, onde não há sinal de GPS.

O réu sustenta que não é possível garantir a volta do veículo, em caso de roubo ou furto, e não há como impedir a ação de criminosos, o que afasta a sua responsabilidade.

Fornecedor não prova funcionamento do aplicativo

Na sentença condenatória, a juíza Márcia Regina Araújo Lima pontua que, apesar de o funcionário do réu afirmar que os alertas, o rastreamento do veículo e a possibilidade de bloqueio estavam disponíveis para os autores da ação, não há prova que tais funções estavam operantes. Destaca que nem mesmo a funcionária da empresa teve sucesso em bloquear o veículo.

Por fim, a magistrada salienta que a eventual demora na comunicação ao réu não afasta a sua responsabilidade, pois os serviços prestados eram a emissão de alertas ao consumidor e bloqueio da ignição, em caso de perigo iminente – o que não ocorreu.

Assim, ‘‘tenho por evidenciada a falha na prestação de serviço, e, portanto, a responsabilidade objetiva do réu quanto ao dano sofrido pelo autor’’, concluiu a juíza. Dessa forma, o réu deverá indenizar o autor a quantia de R$ 27.021,00, a título de danos materiais.

A sentença desafia recurso de apelação ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Imprensa do TJDFT.

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0720499-80.2023.8.07.0003 (Ceilândia-DF)

CONTRATAÇÃO DE RISCO
TRT-RS cassa decisão que impedia VT de analisar a legalidade de informações desabonadoras contra motoristas

Foto: Divulgação/Secom/TRT-4

A Justiça do Trabalho tem competência para julgar casos em que o trabalhador está na iminência de sofrer danos em razão da inserção de seu nome em lista de risco, já que as consequências advindas de informações prestadas a potencial empregador podem restringir ou alterar a igualdade de oportunidade ao acesso à colocação no mercado de trabalho, equiparando-se, portanto, aos danos detectados em fase pré-contratual.

Seguindo esta linha de fundamento, a 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul) decidiu que a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar a ação de um motorista contra empresas de gestão de risco que têm o potencial de produzir cadastros negativos de profissionais. As rés do processo: GPS Logística e Gerenciamento de Riscos S.A. e Telerisco Informações Integradas de Risco S.A.

Extinção da ação no primeiro grau

No primeiro grau da Justiça Trabalhista, a ação havia sido extinta sem resolução do mérito. O juiz da 28ª Vara do Trabalho, Átila da Rold Roesler, entendeu que não se tratava de relação de trabalho, mas de ação cível com pedido de retirada do nome do trabalhador dos cadastros e indenização por dano moral.

Segundo o processo, as empresas faziam listas desabonadoras de motoristas destinadas às seguradoras. Cientes das ‘‘estrições’’, as transportadoras não contratavam os motoristas que as seguradoras informavam ser ‘‘sem cobertura para a apólice contratada’’.

O representante de uma das empresas informou que a pesquisa inclui consultas a órgãos públicos, a cadastros de quantidades de viagens dos motoristas e que as transportadoras pagam para ter acesso ao cadastro. Disse que a cada embarque das cargas é feita uma consulta.

Pela segunda empresa demandada, a informação foi de que não havia cadastros e consultas a perfis dos profissionais, mas apenas planejamento de rotas, rastreamento de veículos, escoltas e planos de viagens.

Desembargadora Lúcia Ehrebrink, do TRT-RS

Proteção desde a fase pré-contratual

Ao julgar o recurso ordinário interposto pelo motorista, a relatora do acórdão, desembargadora Lúcia Ehrenbrink, ressaltou que o ordenamento jurídico protege as partes contratantes desde a fase pré-contratual.

A relatora disse que o artigo 427 do Código Civil (vinculação da proposta) e 442-a da CLT (vedação de exigência de experiência prévia superior a seis meses no mesmo tipo de atividade) são exemplos dessa proteção.

Para a magistrada, que citou casos análogos já decididos pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), as provas tornam evidente que a natureza jurídica da pretensão tem relação direta com a relação de trabalho.

‘‘Não se encontra em debate vínculo de emprego, mas, sim, a prestação de um trabalho de motorista pelo autor, a terceiros, que está sendo obstado pelas reclamadas com base nas suas informações. Esta lide deve ser dirimida na Justiça criada especialmente para as relações de trabalho’’, definiu. a desembargadora.

‘‘Pelo exposto, dá-se provimento ao recurso ordinário do reclamante para cassar a decisão que extinguiu o processo sem resolução de mérito e determinar que é da Justiça do Trabalho a competência para examinar o presente processo’’, concluiu a desembargadora-relatora.

Participaram do julgamento os desembargadores João Alfredo Borges Antunes de Miranda e João Batista de Matos Danda.

Ainda cabe recurso da decisão. Redação Painel de Riscos com informações de Sâmia de Christo Garcia/Secom/TRT-4.

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ATSum 0020137-14.2022.5.04.0028 (Porto Alegre)