RDC 96/2008
Anvisa extrapola a sua competência quando cria regras sobre propaganda de remédios, diz STJ

​No entendimento da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não tem poder normativo para restringir as ações das empresas em matéria de propaganda comercial de fármacos, especialmente quando seus atos regulamentares contrariam as regras estabelecidas na Lei 9.294/1996 e em outros atos legislativos.

Para o colegiado, embora a agência reguladora tenha sido genericamente autorizada a emitir normas para assegurar o cumprimento de suas funções, no que tange especificamente à propaganda de produtos sob controle sanitário, essa competência é mais limitada, estando definida no artigo 7º, inciso XXVI, da Lei 9.782/1999.

No caso, a Aspen Pharma Indústria Farmacêutica Ltda. moveu ação contra a Anvisa, buscando impedir que a agência lhe aplicasse sanções relacionadas ao descumprimento da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 96/2008, que estabeleceu regras sobre propaganda, publicidade, informação e outras práticas ligadas à promoção comercial de medicamentos. Segundo a empresa, a Anvisa excedeu a sua competência ao criar restrições não previstas em lei, o que motivou o pedido para que se abstivesse de aplicar penalidades.

O juízo de primeiro grau decidiu parcialmente a favor da farmacêutica, suspendendo os efeitos da RDC 96/2008, por entender que a agência reguladora violou o princípio da legalidade ao editar o ato. A decisão foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que destacou que a competência para regular a promoção comercial de medicamentos é reservada à lei federal, conforme estabelece a Constituição de 1988.

A agência recorreu ao STJ, sustentando que, além de muito importante para a saúde pública, sua atuação normativa é legítima, uma vez que tem o dever de estabelecer normas, propor, acompanhar e executar as políticas, as diretrizes e as ações em seu âmbito de atuação, bem como controlar e fiscalizar a propaganda de produtos submetidos a tal regime.

Anvisa deve apenas fiscalizar as práticas publicitárias

A ministra Regina Helena Costa, relatora do recurso especial (REsp), disse que o artigo 220 da Constituição proíbe qualquer forma de censura, mas permite que a legislação federal estabeleça restrições à propaganda comercial de produtos como tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias, para proteger a sociedade de danos à saúde ou ao meio ambiente.

Ministra Regina Helena foi a relatora
Foto: Gustavo Lima/STJ

Segundo a ministra, as limitações à propaganda de remédios estão definidas na Lei 9.294/1996, complementada pelo Decreto 2.018/1996, e têm aplicação imediata, devendo ser respeitadas por todos – o que inclui a administração pública.

De acordo com a relatora, a Lei 9.782/1999 estabelece que a atuação da Anvisa em relação aos medicamentos deve estar alinhada à legislação vigente, e, embora a agência tenha um papel regulatório importante, não possui o poder de legislar, cabendo-lhe apenas detalhar as regras fixadas em lei para garantir sua plena aplicação.

Contudo, na avaliação da ministra, a RDC 96/2008 tem diversas disposições cujo conteúdo ultrapassa os limites estabelecidos na Lei 9.294/1996, tais como a proibição de propaganda indireta em cenários de espetáculos e filmes; a vedação de publicidade que mostre pessoas usando medicamentos, especialmente se sugerirem características agradáveis, como sabor; a exigência de advertências, como a indicação de substâncias com efeitos de sedação ou sonolência; e a restrição ao uso de certas expressões na publicidade de medicamentos que não exigem prescrição médica.

Dessa forma, a ministra apontou que, ao editar a resolução, a Anvisa criou obrigações para os particulares, extrapolando sua atribuição de fiscalizar, acompanhar e controlar o exercício das práticas publicitárias, o que é incompatível com sua função regulatória.

‘‘São ilegais as disposições da RDC 96/2008 que, contrariando regramentos plasmados em lei federal, especialmente a Lei 9.294/1996, impõem obrigações e condicionantes às peças publicitárias de medicamentos’’, concluiu ao negar provimento ao REsp.

Instauração de diálogo institucional

Apesar do resultado contrário à Anvisa, a Primeira Turma, de maneira inédita, entendeu necessário abrir um diálogo institucional, comunicando o resultado do julgamento ao Ministério da Saúde e ao Congresso Nacional.

Para a relatora, a iniciativa da agência foi louvável, uma vez que a legislação sobre propaganda de medicamentos precisa ser atualizada para se adequar às novas tecnologias, especialmente em razão da massificação de interações sociais pela internet e dos altos índices de automedicação constatados na sociedade brasileira.

No entanto, mesmo reconhecendo a importância da iniciativa, a ministra ponderou que as restrições efetuadas pela Anvisa não podem ocorrer sem alteração da lei.

Assim, após constatar aparente concordância entre os Poderes Executivo e Legislativo a respeito da necessidade de aperfeiçoamento das regras de propaganda desses produtos, Regina Helena Costa observou que o Poder Judiciário poderia, em diálogo institucional, comunicar a decisão aos órgãos competentes para que avaliem a pertinência de alterar as regras legais sobre a publicidade de medicamentos ou as normas que conferem poderes à Anvisa – entendimento que foi acolhido pelo colegiado. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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REsp 2035645

VENDA CASADA
Empresa de informática indenizará candidato a jovem aprendiz após falsa promessa de emprego

A 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve sentença da 7ª Vara Cível de São Paulo (Foro Regional de Santo Amaro), proferida pela magistrada Claudia Carneiro Calbucci Renaux, que condenou a empresa Evolução Informática Ltda. (SOS Tecnologia) a indenizar adolescente após falsa promessa de emprego. O ressarcimento, por danos morais, foi fixado em R$ 10 mil.

Segundo os autos, a mãe do autor recebeu telefonema de um representante da ré, oferecendo uma vaga de emprego como ‘‘jovem aprendiz’’. Após demonstrar interesse, recebeu mensagens com o endereço, data e horário para a entrevista.

Entretanto, ao comparecer no local, o jovem foi informado de que somente poderia iniciar no emprego caso contratasse um curso profissionalizante ofertado pela empresa.

Em seu voto, a relatora do recurso de apelação, desembargadora Clara Maria Araújo Xavier, destacou que o caso dos autos configurou venda casada e defeito de informação, uma vez que a publicidade ofertada pela instituição induziu o consumidor a erro.

‘‘É clara a ofensa aos direitos da personalidade do autor, que criou expectativa de conseguir vaga de trabalho, vendo suas expectativas frustradas, em razão da desídia da ré’’, afirmou a magistrada.

Completaram a turma de julgamento os magistrados Salles Rossi e Benedito Antonio Okuno.

A decisão foi unânime. Redação Painel de Riscos com informações da Assessoria de Comunicação Social do TJSP.

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1088512-67.2022.8.26.0002 (São Paulo)

MERCADO DE HAMBURGERS
Quem registra primeiro, fica dono exclusivo da marca em todo o Brasil, diz juiz federal de Florianópolis

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

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É o registro e não o uso anterior de uma denominação comercial que constitui o direito à propriedade da marca. Assim, por força do artigo 129 da Lei 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial-LPI), tem direito exclusivo à sua utilização quem primeiro fez o seu registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).

O fundamento levou a 4ª Vara Federal de Florianópolis a julgar improcedentes os pedidos de reconhecimento da marca Usina do Hamburger, existente desde agosto de 2015 em Florianópolis, e da consequente anulação do registro da marca Usina Hamburgueria Gourmet, empresa constituída em maio de 2016 no Rio de Janeiro.

O juiz federal Eduardo Kahler Ribeiro explicou que a empresa catarinense comprovou, de fato, que utilizava o seu nome comercial, como marca, seis meses antes do pedido de registro feito pela hamburgueria do RJ ao Inpi.

Entretanto, afirmou que a proteção da marca possui caráter atributivo, pois é adquirida pelo registro marcário expedido pelo Inpi, que assegura ao titular o seu uso exclusivo em todo o território nacional.

Deus ajuda a quem cedo madruga

Nesse sistema, em regra, quem registra em primeiro lugar, ganha. Ou seja, vale o brocardo jurídico first come, first served (‘‘o primeiro a chegar é o primeiro a ser servido’’).

Nessa toada, o julgador destacou que a parte autora não pode se valer da incidência do artigo 129, parágrafo 1º, da LPI, que estabelece o direito de precedência a quem, de boa-fé, já utilizava há seis meses marca igual ou semelhante para distinguir seu produto ou serviço em determinado nicho de mercado.

É que a jurisprudência firmou entendimento no sentido de que o exercício do direito de precedência somente pode se dar antes de haver um registro; ou seja, trata-se de um direito a ser exercido no âmbito do processo administrativo em trâmite perante o Inpi.

No caso dos autos, o despacho da autarquia federal, no processo administrativo que negou o registro à parte autora, é autoexplicativo: ‘‘A marca reproduz ou imita os seguintes registros de terceiros, sendo, portanto, irregistrável de acordo com o inciso XIX do Art. 124 da LPI: Processo 911910310 (USINA HAMBURGUERIA GOURMET)’’.

Por derradeiro, o juiz sentenciante não acolheu o pedido subsidiário de coexistência de ambas as marcas, considerando o fato dos litigantes operarem em locais distintos no Brasil. É que o artigo 129 da LPI deixa claro que que a proteção do registro de marca é nacional, não sendo possível a convivência de signos semelhantes, ainda que em estados diversos da federação.

‘‘Há que se relevar, também, a possibilidade da marca se difundir em outros Estados, em expansão comercial da empresa, além da crescente utilização do comércio eletrônico, em que há maior visibilidade dos signos marcários. Sendo assim, diante da possibilidade de associação entre as marcas e o risco de confusão ou associação indevida por parte do público consumidor, improcedem os pedidos veiculados pela parte autora’’, definiu o julgador.

Da sentença, cabe recurso de apelação ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).

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5029605-79.2023.4.04.7200 (Florianópolis)

 

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