TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS
Existência de grupo econômico não basta para desconsideração da personalidade jurídica e extensão da falência

Ministra Maria Isabel Gallotti
Foto: Imprensa/STJ

Para haver a desconsideração da personalidade jurídica e a extensão da falência, é preciso que seja demonstrado de que forma foram transferidos recursos de uma empresa para outra, ou comprovar abuso ou desvio da finalidade da empresa em relação à qual se pede a desconsideração, a partir de fatos concretamente ocorridos em detrimento da pessoa jurídica prejudicada.

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) cassou os efeitos da extensão da falência decretada contra três empresas, cujos bens foram atingidos no processo falimentar de uma companhia têxtil com a qual mantinham relação econômica.

A companhia teve sua falência decretada em 2009 e, em 2010, foi instaurado incidente de extensão da quebra contra outras três empresas, sob a alegação de que o grupo econômico teria maquiado relações comerciais, motivo pelo qual deveriam ser atingidos os bens das pessoas jurídicas coligadas.

Em recurso ao STJ, as empresas alegaram que não teriam sido apontados os requisitos do artigo 50 do Código Civil para a desconsideração da personalidade jurídica das empresas recorrentes e para a consequente extensão dos efeitos da falência.

Necessidade de provas de confusão patrimonial ou de desvio de finalidade

Segundo a relatora, ministra Isabel Gallotti, para desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa é necessário verificar se existe confusão patrimonial com a falida ou desvio de finalidade. A ministra observou que, no caso em julgamento, foi feita perícia com o objetivo de apurar ‘‘eventual concentração de prejuízos e endividamento exclusivo em apenas uma, ou algumas, das empresas participantes falidas’’.

Embora tais hipóteses não tenham sido provadas pela perícia, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a extensão da falência, com base na descrição que o laudo pericial fez das ‘‘transações estabelecidas entre as sociedades empresárias, desde o repasse da matéria-prima até a venda do produto industrializado’’.

Requisitos para estender a responsabilidade pelas obrigações da empresa falida

Para a relatora, contudo, essa relação das empresas não permite concluir pela existência dos elementos necessários à desconsideração da personalidade jurídica e à extensão da falência. ‘‘O tipo de relação comercial ou societária travada entre as empresas, ou mesmo a existência de grupo econômico, por si só, não é suficiente para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica. Igualmente não é relevante para tal finalidade perquirir se as empresas recorrentes agiram com a intenção de ajudar a falida ou com o objetivo de lucro’’, disse.

A ministra ponderou que a extensão da responsabilidade pelas obrigações da falida às empresas que nela fizeram investimentos dependeria de ‘‘eventual concentração de prejuízos e endividamento exclusivo em apenas uma, ou algumas, das empresas participantes falidas’’ – o que não foi comprovado pela perícia.

Na avaliação de Gallotti, a afirmação genérica de que os custos e riscos ficavam exclusivamente com a falida e os lucros com as demais empresas não é amparada em nenhum elemento de prova do processo, assim como não ficou demonstrada de forma objetiva a confusão patrimonial. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

Clique aqui para ler o acórdão

REsp 1897356

REsp 1900147

REsp 1900147 

TRABALHO DEGRADANTE
Sport Club Internacional é condenado a pagar dano moral de R$ 150 mil a ex-funcionário que fazia as refeições no próprio carro

Por Jomar Martins (jomar@painelderiscos.com.br)

Foto: Divulgação

A ausência de local adequado às refeições do empregado na empresa é ato ilícito do empregador que configura danos morais, cuja responsabilização prescinde da prova do efetivo dano suportado pela vítima. Basta somente a prova do ato ilícito do qual o dano emergiu – o chamado dano in re ipsa.

Por esta linha de fundamento, a 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, Rio Grande do Sul), com maioria de votos, condenou o Sport Club Internacional a pagar R$ 150 mil de danos morais a um ex-dirigente sindical com 45 anos ‘‘de casa’’ (1976-2021), já que as más condições laborais aviltaram a sua dignidade humana.

A decisão reformou sentença da 10ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, que negou o dano moral.

De chefe do Patrimônio a auxiliar de obra

O autor era chefe do Setor de Patrimônio no estádio Beira-Rio, mas foi rebaixado de função, passando a auxiliar nas reformas e obras do Parque Gigante (empreendimento de lazer e esportes anexo ao clube, em Porto Alegre), após ser eleito dirigente da Federação Estadual dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Cultura Física no Estado do Rio Grande do Sul (Fetecfergs).

Em juízo, o reclamante disse que, nos últimos anos, estava ‘‘desativado’’, sem função específica. Que sua sala era na secretaria do Parque Gigante, mas ficava sentado numa cadeira da recepção, à espera de algum trabalho. Isso ocorreu a partir da eleição do presidente Giovanni Luigi (2012-2014), que colocou outra pessoa no Setor do Patrimônio, com outro cargo. A partir daí, sem sala, ficava sentado no seu carro, esperando trabalho.

Na ‘‘nova função’’, ele fazia as refeições dentro do próprio veículo, situação que o deixava constrangido em relação aos demais colegas, sócios e torcedores do clube. Isso além de viver num clima de permanente insegurança, pela constante ameaça de demissão, além de padecer com o câncer de próstata – sofrendo de incontinência urinária, com infecções e até utilizando fralda geriátrica para trabalhar.

Conduta do clube feriu convenções sociolaborais

O relator do recurso ordinário na Corte trabalhista, desembargador Marcelo José Ferlin D’Ambroso, disse que o acervo probatório carreado aos autos mostra, de forma contundente, que o ‘‘Clube do Povo’’ – como é conhecido o Internacional – não disponibilizava local adequado para o trabalhador fazer as suas refeições.

‘‘Ademais, tais inobservâncias afrontam não somente o art. 7, XXII, da Constituição da República, mas também as Convenções 120 e 155 da OIT [Organização Internacional do Trabalho]. No mesmo sentido, há desrespeito às condições de trabalho justas e favoráveis previstas no PIDESC [Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, da ONU] e no Protocolo de San Salvador, como também há ofensa à Declaração Sociolaboral do Mercosul’’, arrematou o julgador no acórdão.

Clique aqui para ler o acórdão

Clique aqui para ler a sentença

0020927-86.2021.5.04.0010 (Porto Alegre)

 

COLABORE COM ESTE PROJETO EDITORIAL.

DOE PELA CHAVE-PIX: jomar@painelderiscos.com.br